Marcelo Rebelo
de Sousa cumpriu, no passado dia 9, dois anos de mandato como Presidente da
República, cargo para que foi eleito a 24 de janeiro de 2016 com 52% dos votos.
Considerou os incêndios de 2017, que mataram mais de 100 pessoas, “o ponto mais
doloroso” da sua presidência e assinalou a efeméride com uma aula/debate com
alunos do ensino secundário duma escola do Laranjeiro, em Almada. Há um ano,
Marcelo celebrou a data com uma aula no Pedro Nunes, o liceu da sua juventude,
além dum passeio nas ruas e esplanadas de Belém durante o qual ajudou a vender
a revista Cais.
O Presidente
cumpre dois anos de mandato num momento em que tem acentuado a urgência de
acordos de regime alargados até às eleições do próximo ano. Assim, defendeu perante
o novo presidente do PSD, Rui Rio, na semana passada:
“É agora que temos de pensar, de falar, de
juntar esforços, de promover convergências, de definir e tentar fazer vingar
objetivos. Não é daqui a meses, em pleno ano eleitoral de 2019, quando já for
tarde.”.
O
ex-comentador político e professor de Direito, que completou 69 anos em
dezembro, foi eleito nas presidenciais de 2016, à 1.ª volta, apresentando-se
como um moderado empenhado em “fazer pontes” e “promover consensos”. E, desde a
posse, a 9 de março de 2016, num clima de bipolarização e crispação entre os
dois maiores partidos, PS e PSD, foi renovando os apelos a convergências
setoriais, mas sem resultados. Afirmando-se como um Presidente popular e interventivo,
no centro da vida política, com presença mediática e uso constante da palavra,
analisa e deixa recomendações sobre os temas da atualidade.
Nos últimos
meses, reconheceu que “o tempo que falta para pactos de regime não é muito
longo” e traçou uma meta temporal, pedindo aos partidos que, entre os
congressos deste ano e as eleições europeias e legislativas de 2019, façam
convergências, pelo menos, sobre a organização do poder público, a saúde e a
justiça.
Rui Rio, que
sucedeu a Pedro Passos Coelho na liderança dos sociais-democratas, saiu do 37.º
Congresso do PSD com uma mudança de mensagem quanto a esta matéria, manifestando
abertura a entendimentos com o Governo do PS em questões estruturantes, desde
logo, a descentralização e os fundos comunitários.
Ao completar
dois anos da tomada de posse, o Chefe de Estado destacou três circunstâncias em
que teve de “exercer a autoridade” para evitar incompreensão social face ao
poder: a polémica das declarações de rendimentos da anterior administração da CGD
(Caixa Geral
de Depósitos), os
incêndios de 2017 e o veto às alterações à lei do financiamento dos partidos. Disse
que são situações extremas, porque o Presidente, de facto, tem de ser muito
cumpridor em relação aos seus poderes. E ele é professor de direito
constitucional. Mais: votou a Constituição. Portanto, segundo diz, tem “a
obrigação de conhecer bem a Constituição”, acrescentando: “Sou muito cuidadoso em relação a isso”.
O Chefe de
Estado classificou os fogos de junho e de outubro do ano passado, que no seu
conjunto mataram mais de cem pessoas, como “o ponto mais doloroso” da sua
presidência e prometeu nunca mais largar o assunto. Descrevendo-se como um
Presidente extrovertido e afetivo, com presença constante junto dos cidadãos,
admitindo que se “expõe muito”, mas rejeitou que isso lhe retire “autoridade
nos momentos cruciais”. Tem feito um acompanhamento permanente e ativo da
governação e da atividade parlamentar, ouvindo regularmente (de três em três
meses) os partidos com assento na
Assembleia da República, as confederações patronais e sindicais e o Conselho de
Estado. Já convocou 8 vezes o Conselho de Estado. Em contraste, nos 10 anos de
mandato do antecessor, Cavaco Silva, este órgão de consulta presidencial
tinha-se reunido, no total, 12 vezes.
Ainda não
recorreu ao Tribunal Constitucional, mas utilizou seis vezes o poder de veto
político, em relação a 2 decretos do Governo, sobre acesso a informação
bancária e estatuto da GNR, e a 4 diplomas do Parlamento, sobre gestação de
substituição, os transportes do Porto e de Lisboa e alterações ao financiamento
dos partidos. E, neste sentido, em janeiro de 2017, definiu-se como um Presidente
que não recorre frequentemente ao Tribunal Constitucional como uma espécie de
defesa, mas que exerce “sem complexo nenhum” o veto político, perante fortes
divergências.
Na política
externa, fez mais de 30 deslocações ao estrangeiro, a maior parte a países da Europa.
Realizou 9 visitas de Estado, a Moçambique, Suíça e Cuba, em 2016, Cabo Verde,
Senegal, Croácia e Luxemburgo e México, em 2017, e São Tomé e Príncipe, em
fevereiro deste ano.
Além disso,
lançou, com o Primeiro-Ministro, António Costa, um modelo inédito de celebração
do Dia de Portugal, iniciando as
cerimónias em território nacional e prosseguindo-as junto de comunidades
portuguesas no estrangeiro: em França, em 2016, e no Brasil, em 2017,
seguindo-se os Estados Unidos, em 2018.
Em dezembro
do ano passado, teve de ser operado de urgência a uma hérnia umbilical, o que o
obrigou a cancelar toda a agenda até janeiro, incluindo a deslocação às regiões
atingidas pelos fogos prevista para a altura do fim de ano, e a abrandar o
ritmo nas semanas seguintes.
Continuo a
pensar que é temerário basear-se no estatuto de Professor de Direito para agir
como Presidente. O direito não é ciência exata. E há diplomas que merecem alto
escrutínio coletivo.
***
Marques Mendes manifestou-se convicto de que Marcelo
Rebelo de Sousa irá recandidatar-se a um segundo mandato em Belém. O
conselheiro de Estado, no seu habitual comentário na SIC, considerou que o
Presidente da República avançará para mais 5 anos em Belém em qualquer dos
cenários políticos mais prováveis que resultarão das legislativas de 2019. Se
houver maioria absoluta do PS, que, para Mendes, não é a situação que o
Presidente mais apreciará, avançará porque tem uma tarefa essencial a cumprir: “fazer o reequilíbrio político”. Isto
porque o PSD, neste cenário sairá fragilizado. Se não houver maioria absoluta
dos socialistas, então a reeleição do Presidente é necessária “enquanto fator de estabilidade e de normalidade
política”.
O Presidente mantém o tabu se tenciona ou não concorrer pela
segunda vez. Ainda no dia em que celebrou o segundo aniversário na Presidência,
remeteu a decisão para o verão de 2020.
Marcelo é assim. Nega ser candidato àquilo que pode e quer
vir a ser. Não seria presidente do PSD ainda que Cristo viesse à Terra, mas foi.
Dificilmente seria candidato Presidente da República e foi. E convenhamos que se
preparou bem e com muito tempo.
Além disso,
se todos os Presidentes até agora se recandidataram – e ganharam – porque não há
de o atual fazer o mesmo? Só se a situação política cá ou lá fora se alterar muitíssimo,
o que não parece muito provável. Porém, às vezes a história faz inesperadamente
o pino. E não é preciso ser comentador de qualquer tv, que aliás diz o que quer
e como quer, sem qualquer contestação contraditória. Pode a saúde dele não o
permitir. Mas, quanto a tabus, Cavaco habituou-nos, fazendo-nos passar meses a
fio sobre a sua candidatura a presidente do PSD e a 1.ª a Belém!
***
Sobre os próximos desafios
do Presidente, que andou por Oliveira do Hospital, de visita à Feira do Queijo,
Marques Mendes elencou cinco: a Europa, sobretudo a negociação dos fundos
estruturais; o crescimento económico; os incêndios florestais, que se tudo
correr bem mostrará que valeu a pena Marcelo ter sido exigente com o governo; o
Orçamento de Estado para 2019; e a escolha do novo rosto para a
Procuradoria-Geral da República, depois de o Governo ter dado nota de que não
quer a continuidade de Joana Marques Vidal.
O Presidente da República, em Oliveira do Hospital, disse
que os portugueses devem ser mais exigentes e que não deve haver cidadãos de
primeira e de segunda. Assim falou no almoço em que foram homenageadas as
vítimas dos incêndios de 2017 e alguns voluntários e entidades que se distinguiram
na cadeia de solidariedade:
“Nós somos todos
portugueses de primeira. Quando nascemos foi para sermos todos portugueses de
primeira e esse é o desafio: temos de trabalhar até todos podermos ser
portugueses de primeira.”.
Marcelo, que visitou a
Feira do Queijo da Serra da Estrela, organizada pelo município de Oliveira do
Hospital, disse a cerca de um milhar de pessoas que “mais do que ficarmos
presos à memória do passado é olharmos para o presente e exigirmos mais no
futuro”. E frisou:
“Queremos um Portugal
onde nunca mais se repita o que aconteceu e que haja condições para que o
futuro desse Portugal, desses portugais de que é feito Portugal, seja um
futuro mais igual para que não haja uns que sejam do Portugal de primeira e
outros de segunda, terceira, quarta ou quinta”.
No seu discurso, o
Presidente começou por escolher as palavras – “memória”, “coragem”, “renascimento”, “povo” e “Portugal” – para analisar o sofrimento das
populações dos territórios afetados pelos incêndios de 2017 e enfatizou:
“Quem sofreu, quem tem
de ter coragem, quem está a fazer renascer Portugal: o povo, que somos nós
todos. […] Estamos a fazer renascer estes municípios, estas áreas, este
interior, mas estamos a fazer renascer Portugal.”.
Salientando que já se vê a recuperação de casas e empresas,
alguma reflorestação, preocupação com limpeza e mudança de mentalidade das
pessoas, o Presidente da República sublinhou:
“Há muito a fazer e temos de ser exigentes
connosco próprios, com os agentes políticos e as entidades públicas, privadas e
sociais”.
Depois daquele almoço, que
terminou depois das 17 horas, o Chefe de Estado plantou uma árvore em Ervedal
da Beira, junto às instalações do clube ‘motard’, e visitou uma serração em
Vila Franca da Beira, que retomou a laboração em 26 de janeiro.
***
Porém, Marques Mendes também falou sobre o congresso do CDS,
frisando que Cristas não repetirá no país o resultado de Lisboa. Mas avisou: “Vai crescer e o crescimento será sempre
feito à custa do PSD”. Por isso, considerou “imprudência” desvalorizar a
líder centrista, apesar de ter reconhecer “um exagero” na ideia de que o CDS
poderá ser em 2019 maior do que o PSD, até porque o sucesso da estratégia de
Assunção depende do PSD, que só se estiver fraco é que permitirá o crescimento
do partido mais à direita. E o antigo líder socialdemocrata reiterou que é erro
CDS e PSD concorrerem em separado às legislativas de 2019, pois, “do ponto de
vista nacional, isto significa fazer o jogo do PS e entregar o poder ao PS. De
resto, António Costa é o único beneficiário desta estratégia”.
***
Quanto a Marcelo, obviamente que tem a via aberta para a
recandidatura. E, se aguentar o 1.º mandato, porque não há de fazer um segundo?
Que faça autocrítica sobre o exercício do 1.º e que não tenha por escopo apenas
colocar a frente do Governo um dos seus.
2018.03.11 –
Louro de Carvalho
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