domingo, 18 de março de 2018

O médico que revolucionou a pediatria e o desenvolvimento infantil


Faleceu, na manhã do passado dia 13 de março, Thomas Berry Brazelton, notável pediatra, cientista e autor norte-americano (escreveu 30 livros e mais de 200 artigos académicos), perito em desenvolvimento infantil e que salientou a importância do contacto “pele com pele” nas primeiras horas de vida do bebé.
O notável professor na Escola de Medicina de Harvard foi também apresentador de televisão e colunista na imprensa.
Nascido a 10 de maio de 1918 (perfaria 100 anos no próximo mês de maio), em Waco, no Texas, graduou-se, em 1940, na Universidade de Princeton e, em 1943, na Universidade de Columbia. Desde 1988 era professor emérito de Pediatria na Faculdade de Medicina de Harvard. Os principais hospitais em todo o mundo utilizam o método de avaliação Brazelton (NBAS).
O Centro Brazelton em Portugal, liderado pelo pediatra português Gomes-Pedro considera como uma “perda tremenda para todos aqueles que tiveram o privilégio de aprender e difundir o seu alvo de intervenção” a morte do perito em desenvolvimento infantil, que se tornou um inspirador e um mentor. E, no seu ‘site na internet, pode ler-se:
O mundo perdeu um verdadeiro herói para bebés, crianças e famílias”.
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O autor da obra “O Grande Livro da Criança”, traduzida em Portugal, era professor emérito de pediatria na Harvard Medical School e foi um dos clínicos e defensores mais influentes em pediatria e em desenvolvimento infantil da era moderna.
Era um grande admirador de Benjamim Spock, o primeiro a aplicar a psicanálise na pediatria, que tinha como um herói. Brezelton entendia que a relação dos pais com os bebés começava antes do nascimento (ideia que influenciou pedagogos e vários oradores sagrados) e acreditava que os progenitores deviam ser ajudados a ler os sinais que as crianças davam e não ensinados a seguir uma espécie de guião fixo.
E foi um pioneiro no conceito de pediatria de família, segundo o qual o médico deixava de ser alguém que tratava da criança quando ela estava doente, para passar a ser o pediatra que conhecia a criança nas várias etapas de desenvolvimento.
Brazelton foi o criador do modelo Touchpoints – seguido e implementado entre nós pelo pediatra Gomes-Pedro, que criou a Fundação Brazelton/Gomes-Pedro – que assenta num pressuposto simples de conceber, mas difícil de praticar: o de que são os pais os maiores conhecedores dos seus próprios bebés e que os especialistas devem estar presentes para dar aconselhamento técnico e para apoiar os progenitores, passando-lhes a ideia de que eles têm as ferramentas necessárias para criarem os filhos. Trata-se de abandonar o “modelo patológico”, em que o profissional de saúde apenas realiza exames físicos para praticar um modelo “relacional”.
Defende também que o desenvolvimento das crianças e dos adolescentes se faz através de momentos-chave, os tais touchpoints (conceito criado por Brazelton), que são patamares no crescimento e desenvolvimento a que se deve dar especial atenção. Por exemplo: quando um bebé está a começar a andar, pode comprometer outras competências já adquiridas, como a regulação do sono ou a alimentação. É percebendo quais são, quando acontecem e porque existem estes touchpoints que os pais, os educadores, a comunidade em geral podem apoiar melhor o bebé e a criança. E fazem-no pelo método de avaliação comportamental que leva a “fortalecer os primeiros laços de paixão da família pelo bebé”. É um método que consiste numa abordagem teórica e prática de um modelo de desenvolvimento perspetivado em momentos-chave focado no bebé e criança e centrado na família.
Este conceito, enquanto modelo filosófico que explica o desenvolvimento humano, modificou o modo de intervenção dos profissionais envolvidos com a criança, enquanto educadores que aprendem a privilegiar, assumidamente, a relação bebé-família. No fundo, defende-se que “para se alcançarem melhores resultados, as crianças precisam de ter pais convictos das suas competências e capacidades”.
Em Portugal, o modelo já é aplicado por vários pediatras e Gomes-Pedro acredita que existem “ótimos profissionais” com capacidade para o desenvolver.
Para Gomes-Pedro, Brazelton “demonstrou que o desenvolvimento humano não é uma trajetória meramente linear, mas de patamares, socalcos, correspondentes a crises e à respetiva reorganização, por parte do bebé e da família”.
A Escala de Avaliação do Comportamento Neonatal Brazelton (NBAS) avalia não só as respostas físicas e neurológicas dos recém-nascidos, mas também o seu bem-estar emocional e as diferenças individuais, e utiliza uma ampla gama de 38 condutas para construir um perfil de comportamento do bebé até aos 2 meses de idade. 
Em vida, Brazelton escreveu, como se referiu já, mais de 200 artigos científicos e 30 livros nas áreas da pediatria, desenvolvimento infantil e parentalidade. Algumas das suas obras estão traduzidas em mais de 20 línguas.
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O pediatra Mário Cordeiro sustenta que, “sem se saber Brazelton, não se sabe pediatria”. Com efeito, este pediatra português conhecia Brazelton muito bem. Apesar de não ser amigo próximo, ainda se recorda do “sorriso aberto” de Brazelton de cada vez que o encontrava em ocasiões sociais. Cordeiro teve como tutor em Oxford um discípulo direto de Brazelton, pelo que assegura que o autor da obra “O Grande Livro da Criança” o influenciou “brutalmente”.
Recordando que era uma pessoa muito empática, simples e discreta – nada exibicionista, embora tivesse a clara noção de que tinha introduzido uma mudança significativa na pediatria –, Mário Cordeiro assegura que uma das grandes inovações do pediatria norte-americano foi a humanização da criança, o reconhecimento de que esta tem competências e desempenhos a partir do momento em que nasce, e também o reconhecimento das competências parentais.
O melhor conselho que reteve da escola de Brazelton foi o “saber escutar as famílias e as crianças, respeitá-las e pensar que, por muito que saibamos, há sempre algo de razão no que as pessoas dizem”. E sintetiza: “Afinal, os pais não são “pedintes da saúde”, mas “parceiros.
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Porém, mais importante do que tudo isto terá sido o destaque que o cientista norte-americano deu à felicidade. Neste sentido, declarou ao The Washington Post: “Gostaria de saber o que é preciso fazer para que os pais relaxem e não levem a parentalidade tão a sério”.
Na verdade, tão pernicioso pode ser para as crianças a negligência dos pais e o desleixo como a sua obsessão protecionista de os controlar em tudo e em todos os momentos. É preciso saber articular o cuidado necessário, equilibrado e salutar com a progressiva autonomia, embora com o oportuno aconselhamento, de modo que pais e filhos possam e saibam fruir do prazer de viver.
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Talvez seja conveniente que muitos dos nossos pediatras revisitem as teorias de Tomás Berry Brazelton e os centros de saúde ou as unidades familiares de saúde sejam dotados do número de pediatras qualificados para fazerem o cabal acompanhamento técnico e humano das nossas crianças, as quais, muitas vezes, estão dependentes das possibilidades económicas dos pais que se veem obrigados a recorrer ao mercado de saúde privado, desembolsando por consulta qualquer coisinha como 70€ ou mais. Quem aguenta tal exigência ao orçamento familiar com o nível salarial médio em Portugal?
2018.03.18 – Louro de Carvalho

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