terça-feira, 13 de março de 2018

Boa altura para reformas estruturais


O Álvaro não está preocupado com um abrandamento na Zona Euro, numa altura de expansão da economia mundial, mas frisa a importância da continuação de reformas, incluindo em países como Portugal.
A OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) revê em alta previsões para G20, mas Zona Euro abranda, bem como o Reino Unido. Na verdade, de acordo com os dados divulgados hoje, dia 13 de março, a economia mundial deverá continuar a crescer até 4%, mas nem todos os países crescem tanto e ao mesmo ritmo, e há riscos, desde o ambiente de tensão e o crescente protecionismo até ao abandono de reformas estruturais.
Trata-se da revisão em alta da maior parte das previsões económicas da OCDE para os membros do G20 para 2018 e 2019, mas uma coisa mantém-se: a Zona Euro e o Reino Unido vão ter um abrandamento nos próximos anos. O PIB mundial manterá um ritmo dinâmico de crescimento, de acordo com a OCDE, chegando aos 4% este ano e no próximo.
Nas suas previsões económicas, publicadas no Interim Economic Outlook do mês de março, a organização foi mais otimista do que na sua última publicação congénere, em novembro de 2017. Desde os Estados Unidos até países como a África do Sul e a Turquia, o crescimento “deverá ser muito mais robusto do que se antecipava antes”.
Porém, a OCDE não se esquece de formular as recomendações julgadas necessárias. Embora esteja a economia mundial em fase de grande pujança e de conjuntura positiva, fica um claro aviso: “os países devem aproveitar o momento para melhorarem as suas circunstâncias nacionais”. Assim se pode ler no predito relatório:
Tanto as economias avançadas como as emergentes devem aproveitar a janela de oportunidade que dá uma economia global mais forte para levar a cabo as reformas estruturais que são necessárias para impulsionar a formação, o emprego e os salários.
Nem todas as previsões são positivas. Para o Reino Unido, por exemplo, a OCDE prevê abrandamentos no crescimento tanto em 2018 como em 2019 e o aumento da inflação a afetar os rendimentos das famílias, “por entre uma incerteza contínua sobre a relação futura entre o Reino Unido e a União Europeia” que afeta o investimento das empresas.
Na Zona Euro, a OCDE vê um ritmo de crescimento que “deverá manter-se robusto e alargado”, graças ao aumento do investimento e da procura mundial forte. Porém, o grupo não deverá manter sempre o mesmo nível de crescimento: se os países da moeda única cresceram 2,5% em 2017, a OCDE prevê 2,3% em 2018 e 2,1% em 2019, o que, mesmo assim, é ainda uma revisão em alta relativamente às previsões de novembro.
Por isso, a OCDE sustenta que os governos nacionais devem encontrar formas de aproveitar este momento positivo na economia mundial – o que vale tanto para as economias mais avançadas como para as emergentes, pois, como sublinham os economistas, “as previsões positivas a curto prazo só se podem traduzir em resultados a médio termo se forem postas em prática reformas estruturais que incentivem o investimento, o comércio livre e a produtividade”.
São basicamente duas as razões por que uma boa conjuntura económica deve ser aproveitada para implementar reformas: por um lado, os custos a curto prazo da implementação de reformas profundas serão menos intensos em alturas de crescimento do emprego e da procura: por outro lado, é de procurar aumentar a inclusividade do mercado de trabalho nestas alturas, promovendo a integração dos grupos menos representados, desde as minorias étnicas às mulheres. E a OCDE faz uma advertência:
 No entanto, (…) os esforços reformistas abrandaram tanto nas economias de mercado avançadas como nas emergentes, inclusive em 2017.
Assim, a organização avisa: as tendências para o protecionismo e a diminuição do impulso reformista são dois grandes riscos para a prosperidade mundial.
Num momento em que os Estados Unidos ameaçam impor tarifas às importações de aço e de alumínio e em que a União Europeia pensa retaliar com inúmeras tarifas, por exemplo, sobre o sumo de laranja, manteiga de amendoim ou jeans, a OCDE adverte, nas suas previsões, que o protecionismo é uma das grandes fontes de tensão, “um risco chave que afetaria negativamente a confiança, o investimento e os empregos”. E o relatório, face ao conflito internacional relativo à possível implementação de tarifas sobre o aço, entende que “os governos de economias que produzem aço devem tentar evitar escalar o conflito e procurar soluções globais para reduzir a capacidade excessiva da indústria global de aço”.
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No dia em que a OCDE divulga as suas previsões macroeconómicas para os países do G20, o seu economista-chefe da OCDE e antigo ministro da Economia português, Álvaro Santos Pereira, que preferia que o tratássemos simplesmente por Álvaro e não por Ministro (com efeito, Álvaro continua a ser, mas ministro não), explicou melhor ao ECO a perspetiva positiva dos economistas da instituição e afirmou que Portugal beneficia desta conjuntura positiva, mas não deve deixar de continuar a fazer as reformas estruturais que se impõem.
Diz o predito perito-chefe e Diretor do departamento de Economia da OCDE que a organização “vê a economia mundial numa luz positiva”, sendo que, segundo ele, já “estamos a sair do modo de recuperação e a entrar na expansão” – com taxas de crescimento que rondam os 4%. E adianta uma posição pessoal:
Se as coisas continuarem a correr bem, não ficaria surpreendido se em maio revíssemos novamente em alta estas previsões”.
Mas o economista-chefe refere os motivos por que isto está a suceder. Por um lado, “o comércio mundial está a crescer a taxas razoáveis”; por outro, o investimento começa “a aparecer com força em vários países”, o que é “a grande novidade” e constitui o principal motivo da atual evolução da situação económica. E exemplifica com alguns casos: a Alemanha está com “um aumento do investimento bastante interessante”, como aliás “noutras partes da Europa”, mas também “em países como a Índia”. Ora, o aumento do investimento tem um significativo “reflexo no comércio mundial”.
Mas há um terceiro fator “que tem estimulado e vai estimular ainda mais o comércio mundial”: os estímulos fiscais. Nos Estados Unidos esse estímulo é de cerca de 1% do PIB todos os anos, e na Alemanha de cerca de 0,2% do PIB.
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Não obstante, parece que a Zona Euro se encontra em contracorrente, pois aí as previsões são de uma redução gradual do ritmo de crescimento. E, a este respeito, Santos Pereira não interpreta isto como um abrandamento, já que as principais economias europeias estão “a crescer bem acima do verificado nos últimos anos”. E especifica: França já a crescer a ritmos acima dos 2%, Itália chega aos 1,5%, que são ritmos bastante apreciáveis”. E é possível que em maio haja revisão em alta das previsões.
Para que tal seja viável, há riscos a ter em atenção e que é preciso cautelar. Por um lado, entrevê-se “uma possível escalada de tensões no comércio mundial”; e, por outro, é fácil cair “na tentação de continuar as tendências protecionistas”. E há ainda outros riscos, mas que são mais positivos porque vêm associados “à normalização das economias mundiais”. Por exemplo, a nível dos mercados financeiros, os preços das ações estão um bocadinho mais altos e mesmo altos em alguns países. No entanto, diz Santos Pereira, “é natural que haja um pouco mais de volatilidade”.
Estas tendências protecionistas não são novas e a tentação é que elas se mantenham. Na verdade, desde 2008, mais de 1.200 medidas protecionistas foram aplicadas só nos países do G20. E assiste-se a um aumento gradual do protecionismo, o que não é desejável que aconteça, dado o seu enorme impacto no comércio mundial.
E, olhando o passado, verifica-se que os períodos em que “houve uma escalada das tensões protecionistas” foram “de menor crescimento”.
Também há problemas com os excessos, por exemplo na produção do aço e do alumínio. Ora, estes problemas de excessos devem ser resolvidos a nível internacional. Por isso, diz Santos Pereira que “a OCDE tem um fórum mundial para resolver a questão do excesso de aço, exatamente para estimular o diálogo, para chegarmos a uma solução”. Será, pois, através do diálogo que se deverão tomar medidas, sem necessidade de recorrer ao protecionismo.
O economista-chefe da OCDE também perfilha a ideia de que as economias que não pertencem ao G20, como Portugal, beneficiam deste clima positivo. E explica:
Obviamente que quando a economia mundial está em expansão e quando falamos, como no caso da economia portuguesa, de uma economia aberta, é possível beneficiar disso. No caso de Portugal, pode beneficiar ainda mais quando a economia europeia está a expandir a um ritmo que já não se via há algum tempo. Claro que isso tem um impacto positivo sobre a economia nacional e esperamos que continue.”.
E também, lembrando que, em 2005 e 2006, a economia nacional não crescia apesar do crescimento europeu, sublinha que o que mudou agora “foram as reformas do mercado laboral, entre outras, que foram feitas desde então”.
Por fim, diz que Portugal tem de continuar com as reformas. Elenca alguns pontos: continuação da melhoria do clima de negócios; baixas de impostos (É importante, como muitos países neste momento estão a baixar as suas taxas de impostos das empresas, que Portugal faça o mesmo); administração pública; sustentabilidade da segurança social; justiça; e educação. E considera fundamentais as duas últimas.
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Porém, é de questionar de que tipo de reformas se fala. Se é de emagrecer até à estilização a administração pública, se é pelo aumento dos custos de produção (sobretudo energia e burocracia) e baixa de salários, se é pela ultraliberalização do mercado de trabalho, da educação e da saúde, se é pela diminuição ou privatização da justiça ou pelo emagrecimento da segurança social – não são benéficas tais reformas, a não ser para os grandes interesses. Se for para reforço do bem-estar de todos, realização da cidadania, fortalecimento do Estado e robustez da sociedade, sejam bem-vindas!  
2018.03.13 – Louro de Carvalho


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