O Álvaro não está preocupado com um abrandamento na Zona Euro, numa altura
de expansão da economia mundial, mas frisa a importância da continuação de
reformas, incluindo em países como Portugal.
A OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Económico) revê em alta previsões para G20, mas Zona Euro abranda, bem como o Reino
Unido. Na verdade, de acordo com os dados divulgados hoje, dia 13 de março, a economia mundial deverá
continuar a crescer até 4%, mas nem todos os países crescem tanto e ao mesmo
ritmo, e há riscos, desde o ambiente de tensão e o crescente protecionismo até
ao abandono de reformas estruturais.
Trata-se da revisão em alta da maior parte das previsões económicas da OCDE
para os membros do G20 para 2018 e 2019, mas uma coisa mantém-se: a Zona Euro e
o Reino Unido vão ter um abrandamento nos próximos anos. O PIB mundial manterá um ritmo dinâmico de crescimento, de acordo
com a OCDE, chegando aos 4% este ano e no próximo.
Nas suas previsões económicas, publicadas no Interim Economic Outlook do mês de março, a organização
foi mais otimista do que na sua última publicação congénere, em novembro de
2017. Desde os Estados Unidos até países como a África do Sul e a Turquia, o
crescimento “deverá ser muito mais robusto do que se antecipava antes”.
Porém, a OCDE não se esquece de formular as recomendações julgadas
necessárias. Embora esteja a economia mundial em fase de grande pujança e de
conjuntura positiva, fica um claro aviso: “os países devem aproveitar o momento
para melhorarem as suas circunstâncias nacionais”. Assim se pode ler no
predito relatório:
“Tanto as economias avançadas como as
emergentes devem aproveitar a janela de oportunidade que dá uma economia global
mais forte para levar a cabo as reformas estruturais que são necessárias para
impulsionar a formação, o emprego e os salários”.
Nem todas as previsões são positivas. Para o Reino Unido, por
exemplo, a OCDE prevê abrandamentos no crescimento tanto em 2018 como em 2019
e o aumento da inflação a afetar os rendimentos das famílias, “por entre uma
incerteza contínua sobre a relação futura entre o Reino Unido e a União
Europeia” que afeta o investimento das empresas.
Na Zona Euro, a OCDE vê um ritmo de crescimento que “deverá manter-se robusto
e alargado”, graças ao aumento do investimento e da procura mundial forte.
Porém, o grupo não deverá manter sempre o mesmo nível de crescimento: se os
países da moeda única cresceram 2,5% em 2017, a OCDE prevê 2,3% em 2018 e 2,1%
em 2019, o que, mesmo assim, é ainda uma revisão em alta relativamente às
previsões de novembro.
Por isso, a OCDE
sustenta que os governos nacionais devem encontrar formas de aproveitar este
momento positivo na economia mundial – o que vale tanto para as economias mais
avançadas como para as emergentes, pois, como sublinham os economistas, “as previsões positivas a curto prazo só se
podem traduzir em resultados a médio termo se forem postas em prática reformas
estruturais que incentivem o investimento, o comércio livre e a produtividade”.
São basicamente duas as razões por que uma boa
conjuntura económica deve ser aproveitada para implementar reformas: por um lado, os custos a curto prazo da
implementação de reformas profundas serão menos intensos em alturas de crescimento
do emprego e da procura: por outro lado, é de procurar aumentar a inclusividade
do mercado de trabalho nestas alturas, promovendo a integração dos grupos menos
representados, desde as minorias étnicas às mulheres. E a OCDE faz uma
advertência:
“No
entanto, (…) os esforços reformistas abrandaram tanto nas economias de mercado
avançadas como nas emergentes, inclusive em 2017”.
Assim, a organização avisa: as
tendências para o protecionismo e a diminuição do impulso reformista são dois
grandes riscos para a prosperidade mundial.
Num momento em que os Estados Unidos ameaçam impor tarifas às
importações de aço e de alumínio e em que a União Europeia pensa retaliar
com inúmeras tarifas, por exemplo, sobre o sumo de laranja, manteiga de
amendoim ou jeans, a OCDE adverte,
nas suas previsões, que o protecionismo é uma das grandes fontes de tensão, “um
risco chave que afetaria negativamente a confiança, o investimento e os
empregos”. E o relatório, face ao conflito internacional relativo à possível
implementação de tarifas sobre o aço, entende que “os governos de economias que
produzem aço devem tentar evitar escalar o conflito e procurar soluções globais
para reduzir a capacidade excessiva da indústria global de aço”.
***
No dia em que a OCDE divulga as suas previsões macroeconómicas para os
países do G20, o seu economista-chefe da OCDE e antigo
ministro da Economia português, Álvaro Santos Pereira, que preferia que
o tratássemos simplesmente por Álvaro e não por Ministro (com efeito,
Álvaro continua a ser, mas ministro não), explicou melhor
ao ECO a perspetiva positiva dos
economistas da instituição e afirmou que Portugal beneficia desta conjuntura
positiva, mas não deve deixar de continuar a fazer as reformas estruturais que
se impõem.
Diz o predito perito-chefe e Diretor do
departamento de Economia da OCDE que a organização “vê a economia mundial numa luz positiva”, sendo que,
segundo ele, já “estamos a
sair do modo de recuperação e a entrar na expansão” – com taxas de crescimento
que rondam os 4%. E adianta uma posição pessoal:
“Se as coisas continuarem a correr bem, não
ficaria surpreendido se em maio revíssemos novamente em alta estas previsões”.
Mas o economista-chefe refere os motivos por que
isto está a suceder. Por um lado, “o comércio
mundial está a crescer a taxas razoáveis”; por outro, o investimento começa “a
aparecer com força em vários países”, o que é “a grande novidade” e constitui o
principal motivo da atual evolução da situação económica. E exemplifica com
alguns casos: a Alemanha está com “um aumento do investimento bastante
interessante”, como aliás “noutras partes da Europa”, mas também “em países
como a Índia”. Ora, o aumento do investimento tem um significativo “reflexo no
comércio mundial”.
Mas há um terceiro fator “que tem estimulado e vai estimular ainda mais o
comércio mundial”: os estímulos fiscais. Nos Estados Unidos esse estímulo é de
cerca de 1% do PIB todos os anos, e na Alemanha de cerca de 0,2% do PIB.
***
Não obstante, parece que a Zona Euro se encontra
em contracorrente, pois aí as previsões são de uma redução gradual do ritmo de
crescimento. E, a este respeito, Santos Pereira não interpreta isto como um
abrandamento, já que as
principais economias europeias estão “a crescer bem acima do verificado nos
últimos anos”. E especifica: “França
já a crescer a ritmos acima dos 2%, Itália chega aos 1,5%, que são ritmos
bastante apreciáveis”. E é possível que em maio haja revisão em alta das
previsões.
Para que tal seja viável, há riscos a ter em
atenção e que é preciso cautelar. Por um lado, entrevê-se “uma possível escalada de tensões no comércio mundial”;
e, por outro, é fácil cair “na tentação de continuar as
tendências protecionistas”. E há ainda outros riscos, mas que são
mais positivos porque vêm associados “à normalização das economias mundiais”. Por
exemplo, a nível dos mercados financeiros, os preços das ações estão um
bocadinho mais altos e mesmo altos em alguns países. No entanto, diz Santos
Pereira, “é natural que haja um pouco mais de volatilidade”.
Estas tendências protecionistas não são novas e a
tentação é que elas se mantenham. Na verdade, desde 2008, mais de 1.200 medidas protecionistas foram
aplicadas só nos países do G20. E assiste-se a um aumento gradual do
protecionismo, o que não é desejável que aconteça, dado o seu enorme impacto no
comércio mundial.
E, olhando o passado, verifica-se que os períodos em que “houve uma
escalada das tensões protecionistas” foram “de menor crescimento”.
Também há problemas com os excessos, por exemplo na produção do aço e do alumínio.
Ora, estes problemas de excessos devem ser resolvidos a nível
internacional. Por isso, diz Santos Pereira que “a OCDE tem
um fórum mundial para resolver a questão do excesso de aço, exatamente
para estimular o diálogo, para chegarmos a uma solução”. Será, pois, através do
diálogo que se deverão tomar medidas, sem necessidade de recorrer ao
protecionismo.
O economista-chefe da OCDE também perfilha a
ideia de que as economias que não pertencem ao G20, como Portugal, beneficiam
deste clima positivo. E explica:
“Obviamente que quando a economia mundial
está em expansão e quando falamos, como no caso da economia portuguesa, de uma
economia aberta, é possível beneficiar disso. No caso de Portugal, pode
beneficiar ainda mais quando a economia europeia está a expandir a um ritmo que
já não se via há algum tempo. Claro que isso tem um impacto
positivo sobre a economia nacional e esperamos que continue.”.
E também, lembrando que, em 2005 e 2006, a economia nacional não crescia
apesar do crescimento europeu, sublinha que o que mudou agora “foram as
reformas do mercado laboral, entre outras, que foram feitas desde então”.
Por fim, diz que Portugal tem de continuar com as
reformas. Elenca alguns pontos: continuação
da melhoria do clima de negócios; baixas de impostos (É
importante, como muitos países neste momento estão a baixar as suas taxas de
impostos das empresas, que Portugal faça o mesmo); administração pública; sustentabilidade da segurança social; justiça;
e educação. E considera fundamentais as duas últimas.
***
Porém, é de questionar de que tipo de reformas
se fala. Se é de emagrecer até à estilização a administração pública, se é pelo
aumento dos custos de produção (sobretudo energia e burocracia) e baixa de salários, se é
pela ultraliberalização do mercado de trabalho, da educação e da saúde, se é
pela diminuição ou privatização da justiça ou pelo emagrecimento da segurança
social – não são benéficas tais reformas, a não ser para os grandes interesses.
Se for para reforço do bem-estar de todos, realização da cidadania,
fortalecimento do Estado e robustez da sociedade, sejam bem-vindas!
2018.03.13 – Louro de Carvalho
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