Pelos vistos, da polémica odisseia em torno dum
investimento que poderia chegar aos 200 milhões de euros – que agora se diz que
era o montante que a instituição tutelada pelo Estado tinha disponível para investir
(dizia alguém
que tanto vale investir em ações como em obras de arte) – por parte da SCM (Santa Casa da Misericórdia de Lisboa), resultará, quando muito um investimento simbólico. Porém, seria bom que
o Ex.mo Provedor esclarecesse em que montante se traduz um
investimento simbólico, pois na cena ibérica vimos um banco ser comprado por um
euro.
O provedor da SCML, como é de lembrar, chegou a falar
em 200 milhões de euros, 10% do capital da CEMG (Caixa
Económica Montepio Geral), para a instituição ter no banco uma palavra a dizer, através de dois
administradores da sua confiança, mas esse cenário terá sido abandonado. Isto é,
o negócio Misericórdia no Montepio
não deverá ser tão ambicioso como inicialmente previsto e anunciado. Mesmo
assim, a SCML, como já tinha sido anteriormente equacionado, só entrará no
capital do Montepio Geral em conjunto com outras instituições de solidariedade
social que, no total, irão fazer um investimento simbólico, segundo avança o Público (acesso reservado) de hoje, dia 10, ficando, assim, pelo caminho as
possibilidades de só a SCML, por si, adquirir 10% por 200 milhões de euros ou
6% por 160 milhões de euros (diz o ECO, mas 160 milhões seriam 10% do
último valor do banco passado à Comunicação Social).
Segundo o Público, já
mencionado, a mudança de posição começou a 14 de fevereiro, depois de a
SCML ter prescindido dos trabalhos do Haitong, que estava a fazer uma análise
aprofundada ao Montepio. Quer dizer que não chegou a ser feita a avaliação
iniciada. Será que as contas do Banco acusariam resultados piores que os
vertidos para a Comunicação Social?
Segundo aquele diário, o provedor Edmundo Martinho terá
argumentado que não foi feita uma “avaliação firme” da instituição nos prazos
acordados. E o Haitong ripostou dizendo que a AMMG (Associação
Mutualista Montepio Geral) não
facultou a informação requerida. E a pergunta “porquê?” faz levantar consistentemente
a dúvida sobre o rigor e a transparência da dona em relação a si própria e ao
seu banco.
De momento, ainda falta a apresentação das contas da AMMG, a dona da CEMG,
de 2016 e de 2017, estando a instituição à espera de decisão do Ministério das
Finanças para mudar o seu estatuto. Com efeito, abdicando de ser IPSS (instituição particular
de solidariedade social) e de, como
tal, ser isenta de IRC, a associação mutualista quer poder beneficiar
de créditos fiscais, como as empresas, nomeadamente os bancos, que
permitirão equilibrar as contas do grupo que, segundo estimação a
partir dos dados espreitados pela Comunicação Social, poderão vir a atingir
os 350 milhões de euros em capitais negativos.
Sendo assim, o banco Caixa Económica Montepio Geral não vale o que inicialmente
se fez crer e a sua proprietária AMMG acusa um défice considerável.
O Público avança que a alteração do regime de abandono
do estatuto de IPSS e a aquisição do estatuto de empresa terá sido aprovada ao
final da tarde do dia 9.
***
Todavia, a ambiguidade alastrou à governança do banco,
o que leva a crer que ou há juízo na administração e nos procedimentos ou o
futuro está em perigo.
Passaram-se
quase três meses desde que Tomás Correia anunciou que a atual
administração liderada por José Félix Morgado estava de saída.
Foi em dezembro passado. Embora não coloque em causa o normal funcionamento do
banco, este atraso tem impedido a Caixa Económica de avançar com outras
operações de relevo, seja a venda de carteiras de crédito, seja a emissão de
títulos de dívida de alta subordinação, como é exigido pelo BCE.
Entretanto, foi convidado para chairman do banco
Nuno Mota Pinto. Entretanto, sem dar cabal prova de competência ou de incompetência,
será substituído por Carlos Tavares, que vai
temporariamente acumular os cargos de presidente do conselho de administração e de
presidente executivo até a dona do Montepio encontrar um novo CEO com experiência
no retalho. E o antigo Ministro da Economia dos governos presididos por Durão
Barroso e por Santana Lopes e antigo presidente da CMVM será garantidamente o
chairman do Montepio.
E Nuno Mota Pinto continuará no banco, mas
será despromovido a administrador executivo.
A lista
de administradores vai incompleta para o Banco de Portugal até ao próximo dia
12, porque vão faltar alguns administradores não executivos. Aliás, tanto do lado da Associação
Mutualista como do Banco de Portugal há uma espécie de consenso: não vale a
pena fechar a lista sem que os nomes apresentem total credibilidade e confiança
dos responsáveis.
Ao que o ECO apurou, “a acumulação de funções por
parte do antigo presidente da CMVM será transitória”. O Jornal Económico já tinha avançado que Tavares seria chairman do
banco, em substituição do primeiro nome proposto, o de Francisco Fonseca da
Silva, chumbado pelo Banco de Portugal por ter relações comerciais com o
próprio banco. Com este novo modelo de governação, a Associação Mutualista,
dona do banco, cria uma solução temporária que apenas permite ganhar tempo até encontrar um novo CEO com um
perfil diferente do de Mota Pinto.
Em princípio, o Banco de Portugal não vai opor-se a
esta administração, pois ainda há pouco mais de um ano foi o próprio BCE (Banco Central Europeu) que autorizou António Domingues
a assumir funções de CEO e chairman na
Caixa Geral de Depósitos durante seis meses. Assim, se o regulador máximo
aceita, Carlos Costa deverá também alinhar pela mesma bitola e Tomás Correia
terá meio ano para selecionar um novo presidente da Comissão Executiva.
Quanto
a Nuno Mota Pinto, esta “despromoção” para administrador executivo face ao
cargo para o qual tinha sido apontando desde início (de CEO) tem sobretudo a ver com a falta de vocação do
ex-administrador do Banco Mundial para aquilo que é o negócio core da Caixa Económica Montepio: o retalho. E questões
relacionadas com incumprimento de crédito pouco ou nada tiveram a ver com isto.
***
Associação
Mutualista Montepio Geral vem aguardando
parecer das Finanças para beneficiar de créditos fiscais, tal como bancos e empresas já usufruem, na
esperança de que a vantagem fiscal equilibraria capitais nas contas de 2017. Terá
mesmo sido enviado um pedido de informação vinculativa às
Finanças para assegurar que não há qualquer obstáculo a
este processo.
Com efeito,
como já acima se deu a entender, o que acontece até agora é que, como IPSS, a Associação Mutualista Montepio Geral está isenta do
pagamento de impostos,
nomeadamente do IRC, mas, por outro lado, não pode tirar
partido de um regime de que bancos e empresas já usufruem: o dos créditos
fiscais. Em termos práticos, em cima da mesa está a possibilidade de a própria mutualista renunciar ao regime de
isenção fiscal para passar a pagar também ela impostos, mas
isto sem alterar a sua natureza de instituição social. Sendo assim, é de perguntar
por que motivo lhe interessa a natureza de instituição social, quando uma empresa
pode também e com mérito perseguir objetivos sociais, além dos económicos.
Esta
opção por que a AMMG quer enveredar só avançará a partir do momento em que
houver luz verde do Terreiro do Paço. O Ministério das Finanças recusou
comentar a informação por dever de sigilo fiscal.
Seja
como for, nada está ainda decidido e fechado neste momento. Em boa verdade, as
discussões dentro da Associação Mutualista Montepio ainda não passaram do
simples plano teórico e os técnicos que estão a trabalhar neste dossiê podem
até chegar à conclusão de que não é viável seguir este caminho, mas querem
deixar esta porta aberta.
Dentro
de alguns dias haverá nova reunião extraordinária do Conselho Geral da
associação e mais detalhes poderão ser anunciados nessa altura.
Na reunião informal de fevereiro, que juntou os 21 conselheiros
da associação, não
foram avançados dados concretos em relação ao efeito que poderá ter nas contas
da associação.
Ainda
assim, depois de 2016 ter terminado com um défice nos capitais próprios entre
300 e 350 milhões de euros naquilo que são as contas consolidadas da
mutualista, conforme avançou o Público,
é expectável que esta solução produza um efeito fiscal que venha a corrigir a
insuficiência nos capitais da associação ao ponto de se repor um cenário de
equilíbrio entre o passivo e o ativo nas contas consolidadas de 2017. Isto é, o
património da associação viria a igualar as responsabilidades, algo que não
acontece neste momento.
Assim,
além do efeito fiscal positivo, a AMMG aproveitaria o “efeito calendário” para
apresentar resultados mais positivos, pois as contas consolidadas de 2016 (que deverão registar os tais capitais
próprios negativos entre os 300 e os 350 milhões de euros) deverão ser aprovadas na assembleia
geral do final de março. E, logo a seguir, seriam apresentadas as contas
consolidadas de 2017, mas já com um enquadramento mais favorável.
***
Enfim, são
graves as situações que estão por clarificar ao nível da avaliação do banco, da
administração do banco e do défice da AMMG. E fica a SCML com saudades de participar
no Montepio nestas condições, restando-lhe a consolação dum investimento
simbólico em aliança solidária de ou com outras instituições sociais. Assim,
nem o banco fica com saúde e as instituições sociais, que nunca foram
especificadas, arrepelam-se por terem beliscado os seus fins sociais. É como
diz o povo: nem o pai morre nem os filhos
comem a sopa.
Ainda gostava
de saber em que é que o Montepio, dito na área da economia social, se distingue
dos outros bancos. Mas isso é outra conversa!
2018.03.10 –
Louro de Carvalho
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