sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Das palavras homónimas que se grafam e dizem “pedologia”


O Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, apresenta duas entradas para “pedologia”, composto erudito grego.
A pedologia, contra o que alguns pensam, não estuda os pés e suas doenças – o que é objeto da parónima podologia (do grego pous, podós, pé) e cuidado dos podologistas –, mas o estudo do solo; e tem a homónima pedologia conexa com a ciência e a educação das crianças, como se verá.
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Pedologia e edafologia
Baseado nos apontamentos de antanho sobre “solos e climas” dum velho curso de jovens empresários agrícolas, direi que, no âmbito dos solos, pedologia é a ciência que estuda o solo, a sua forma, origem, classificação e propriedades. A palavra fez-se unindo pedon (pédon, ou), que vem do grego e significa solo (aquilo que de fundamental o constitui), terra, região, planície, e lógos (lógos, ou), que é entendido, no grego, como estudo e em demais aceções, como se verá a seu tempo – a que se adicionou o sufixo -ia, variante do grego -eia, a significar atividade, ação.
A cultura da terra para satisfação dos animais e, em especial do homem, é ancestral e, com a designação de edafologia, interessa aos agrónomos, silvicultores, técnicos agrários e quejandos. 
Começou a constituir-se como ciência em 1880 na Rússia, quando o geógrafo Vasily Dokuchaev, creditado por estabelecer as bases das ciências do solo e da paisagem, observou que o solo não era um simples amontoado de materiais, mas resultado duma complexa interação de inúmeros fatores (clima, organismos e topografia), que, agindo por certo período de tempo sobre o material de origem, faziam o solo deixando-o no modo como se nos apresenta. O solo é, com efeito, um recurso natural tão importante como a água e o ar: sustenta as florestas, campos, ruas, construções e tudo o que é necessário à vida; e filtra e armazena parte da água que bebemos. Nele, os alimentos de origem vegetal crescem e se desenvolvem; nele, vivem as plantas que filtram o ar e produzem boa parte do oxigénio que respiramos; e, nele, ocorrem os principais ciclos biogeoquímicos, como o da água, o do carbono e o dos nutrientes. O papel do solo é ainda mais relevante em países com grande vocação agropecuária. Pela sua importância, devemos protegê-lo, para o que importa um diagnóstico apurado, já que os solos variam muito conforme o relevo, rocha, vegetação e clima. Por conseguinte, conhecer o solo, figurativa e literalmente, é o suposto da sustentabilidade. Assim, os estudos pedológicos são fundamentais para: corrigir a fertilidade natural do solo; neutralizar-lhe a acidez; identificar solos apropriados para cada cultura; monitorar o teor de matéria orgânica; e preservá-lo dos perigos da erosão.
Desta feita, a ciência do solo ajudam a compreender os danos causados por catástrofes ambientais e a procurar soluções para a recuperação do solo afetado.
O ponto de partida para uma análise pedológica é o estudo e o exame do perfil do solo em seu meio natural. Com a abertura de trincheiras, descrever-se-á o solo, tendo em conta caraterísticas como transição, profundidade e espessura dos horizontes e camadas, cor, textura, raízes e classes de reação do solo. Após a colheita de diversas amostras, elencam-se os solos em vários níveis categóricos consoante as suas caraterísticas. Por fim, analisa-se e categoriza-se o solo de acordo com a classificação de solos do nosso Sistema de Classificação de Solos.
A pedologia é, pois, o estudo dos solos no seu ambiente natural. É um ramo da geografia física e um dos dois ramos das ciências do solo, sendo o outro a edafologia (do grego edáfos, eos ou ous, solo, pavimento, fundo, empedrado + logos + -ia). Contudo, enquanto a pedologia considera o solo como um corpo natural, um produto sintetizado pela natureza e submetido à ação de intemperismos, a edafologia imagina o solo enquanto viveiro natural para os vegetais – o solo arável e agro-florestal. A pedologia estuda a pedogénese (do grego génesis, eos – princípio, origem, geração, criação, produção), a morfologia e a classificação de solos. É seu propósito suportar áreas da ciência como a agronomia, geografia, geologia e ciências ambientais. (cf https://pt.wikipedia.org/wiki/Pedologia; https://www.ufrgs.br/divulgacaodaciencia/2016/07/16/ciencia-do-solo-pedologia-o-que-e/).
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Afim da pedologia e mais antiga como prática empírica é, como se disse, a edafologia, que trata da influência dos solos em seres vivos, particularmente as plantas, incluindo o uso do solo pelo homem para proporcionar o desenvolvimento das plantas. Também é o nome duma disciplina dos cursos de ciências agrárias, como agronomia, engenharia florestal, etc., que estuda os solos como substrato básico para os vegetais (tipo de solo, estruturação, porosidade, densidade etc.).
O estudo do solo vem preocupando o homem desde há muito, embora não se reconhecesse à atividade edafológica o estatuto de ciência. De facto, há uma série de estudiosos que são considerados como precursores da edafologia.
São exemplificativos os casos do poeta grego Hesíodo (séculos VIII-VII a.C.) que, em “Os trabalhos e os dias”, expõe muitas das técnicas agriculturais e muitos dados do pensamento económico, e do poeta latino Vergílio (século I a.C.), que, nos quatro livros das “Geórgicas”, recolhe de várias fontes da sociedade conhecimentos do mundo rural numa perspetiva bucólica e expõe a vida e o trabalho do campo, ensinando muitas técnicas agrárias. E é o caso de Catão, censor romano, que, nos séculos III-II a.C., procedeu no seu “De re rustica”, sem preocupações poéticas, à 1.ª classificação do solo. Mas o escritor mais importante desse tempo terá sido Columela, que legou à posteridade muitos trabalhos de análise das caraterísticas do solo e várias classificações com valor agrícola. No século VII, foi o sábio andaluz Ibn al-Awan que prosseguiu o trabalho dos antecessores apresentando classificações novas e mais completas. Porém, a verdadeira revolução edafológica chegou no século XVIII, quando Valerius introduziu a química no estudo do solo, passando a analisar as plantas comparando os resultados com a análise química dos solos em que germinavam – o que serviu de base ao desenvolvimento agroindustrial moderno. (cf https://conceitos.com/edafologia/).
Em suma, a edafologia trata da influência dos solos em seres vivos (sobretudo plantas), incluindo o uso do solo pelo ser humano com a finalidade de proporcionar o desenvolvimento das plantas e otimizar o resultado do esforço agricultural ou silvícola (cf https://pt.wikipedia.org/wiki/Edafologia).
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O predito Dicionário da Porto Editora dá entrada só a uma palavra cognata de pedologia nesta aceção: pedogénese (nome composto do grego pedon + génesis), reprodução partenogenética (em que intervém um só gâmeta) de um animal no estado larvar. E apresenta entrada para uma palavra cognata de edafologia: edáfico (adjetivo formado do grego edáphos, eos ou ous + o sufixo -ico), relativo à constituição físico-química dos solos e sua importância para a alimentação das plantas.
É certo que tem palavras parónimas como edace ou edaz (adjetivo uniforme), que consome, devorador, voraz; e edacidade (nome feminino), qualidade de edace, voracidade, glutonaria. Mas estas provêm do latim, respetivamente edax, edacis e edacitas, atis – derivadas do verbo edo, is, ere, edi esum, que significa devorar, comer, consumir, arruinar, estragar.
Já o Dicionário Grego-Português, de Isidro Pereira (fundamental neste excursus) é mais abundante.
Assim, regista: pediás, ádos (nome feminino e adjetivo), a significar, respetivamente, planície e plano; pediêrês, es (adjetivo), da planície; pedinós, ê, on (adjetivo), que forma uma planície, que está em lugar plano, que vive na planície; pedíon, ou (nome neutro), planície, terra trabalhada, campo, (plural) superfície plana, superfície plana dum líquido (mar, lago…); pedíonde (advérbio), na planície; pedionómos, on (adjetivo composto de pedíon + o verbo némo, habitar, distribuir, ocupar, ter, alimentar-se, pastar), que habita na planície; pedobámôn, on (adjetivo, do verbo báino – caminhar, andar, separar…), que caminha pelo solo; pédilon, ou (nome neutro), sandália, calçado, movimento rítmico (sobre o solo); pedóthen (advérbio), desde o chão, do fundo (da alma ou do coração); pédoi (advérbio), sobre o chão; pédon, ou (nome neutro), solo, terra, país, planície; pédonde (advérbio), para a terra, para a planície; pedoplóktypos, on (adjetivo), que faz ressoar a planície sob as patas dos cavalos; e pedostibês, és (adjetivo, do verbo steíbo – pisar aos pés, pisar, apisoar, pôr o pé, frequentar, recorrer, saltar), que pisa a terra, que avança pelo solo.
Depois, surgem vocábulos com a raiz pez- (a letra zeta equivalia a um dígrafo dz); péza, ês (nome feminino), tornozelo, extremidade, borda (o que anda ou está mais junto ao solo); pézarkhos, ou (nome masculino, com o verbo árkho, guiar, ir à frente, mandar), comandante de infantaria; pezétapoi, ôn (nome masculino só no plural), guarda a pé (entre os macedónios); pezéo (verbo), ir a pé, atravessar a pé; pezê (advérbio), a pé, em terra; pezikós, ê, ón (adjetivo e nome no neutro), respetivamente, próprio da infantaria e infantaria; pezothêría, as (nome feminino – do nome neutro theríon, ou, fera, besta, monstro, animal), caça a animais terrestres ou em terra; pezothêrikós, ê, ón (adjetivo), relativo à caça aos animais terrestres ou em terra; pezomakhéo (verbo, de mákhomai, combater), pelejar a pé; pezomakhía, as (nome feminino), combate em terra, combate de infantaria; pezómakhos, on (adjetivo), que combate a pé ou em terra; pezonómos, on (adjetivo, do verbo némo, já referido), que pasta em terra, que combate em terra; pezoporéo (verbo, do verbo poréuo, atravessar, transportar), viajar a pé, ir por terra; pezós, ê, ón (adjetivo), pedestre, que vai a pé, que vai por terra, que se produz em terra, que não sobressai da terra, (em sentido figurado) prosaico, comum.
Relacionadas com a palavra edafologia, temos: édaphos, eos, ou ous (nome masculino já referido), solo, pavimento, fundo, empedrado; édelthlon, ou (nome neutro), fundamento dum templo, templo; édos, eos, ou ous (nome masculino), cadeira, assento, residência, fundamento, base;
E, como cognatos do verbo édo (equivalente ao latino edo, comer, devorar) – a significar comer, consumir, roer, devorar – temos os vocábulos: edanós, ê, ón (adjetivo), saboroso, bom para comer; edaphízo (verbo), arrasar, destruir por completo; edema, atos (nome neutro), alimento; edestês, ou (nome masculino), comedor, comilão; edestós, ê, ó ón (adjetivo), comido, consumido – e no plural neuro, nome a significar comida sólida, comestíveis; edêtýs, ýos (nome feminino), comida, alimento; edôdê, ês (nome feminino), comida, alimento; edôdimos, on ou ê, ón (adjetivo), comestível. Isto, porque o principal alimento vem do solo ou do que pisa o solo.  
Entretanto, o Diccionario Manual Griego-Español no atinente a pedíon acrescenta o significado de termo de uma povoação e menciona um advérbio pedíoio a significar “pela planície”.
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Pedologia como ciência da educação
Também o Dicionário da Porto Editora, já referido, considera a pedologia como nome feminino com o significado de estudo da educação infantil e ciência do primeiro ensino. Esta palavra é um composto erudito de dois elementos gregos: pedo (de pais, paidós – criança, filho, jovem, escravo) e logía (de lógos, lógou – palavra, dito, matéria de estudo ou de conversação, revelação, máxima, sentença, exemplo, decisão, resolução, pretexto, condição, promessas, argumento, ordem, menção, notícia, conversação, explicação, justificação, estima, opinião, juízo, inteligência, razão, razão de uma coisa – a que se junta o sufixo -ia, do grego -ía, variante de -eia, a significar atividade, ação).
E o mesmo Dicionário dá entradas a palavras cognatas daquela como: pedontia, ramo da odontologia que trata da dentição e das doenças dos dentes das crianças (do grego, odôus, odontos – dente); pedofilia, atração sexual patológica de adulto por crianças ou prática de atos sexuais com crianças (do grego filia, as – amizade) e pedófilo (adjetivo), relativo a pedofilia ou (nome) pessoa que pratica pedofilia; pedogamia (nome aplicado em botânica a par de endogamia), fecundação realizada entre gâmetas separados, mas que tiveram origem comum, ou seja, no mesmo invólucro celular (do grego gámos, gametê e gamétês – respetivamente, matrimónio, esposa e marido); pedopsiquiatra e pedopsiquiatria (nomes), a significar, respetivamente, especialista de pedopsiquiatria e disciplina médica dedicada ao estudo e tratamento das perturbações mentais das crianças (do grego iatréuo – curar, cuidar); pedonomia (nome), parte da pedagogia que estabelece as leis e as regras aplicáveis à educação das crianças (do grego nómos – lei, regra, norma); pedagogia, pedagogice, pedagogista, pedagogismo e pedagogo (nomes, do grego ágo, conduzir, guiar, orientar), a significar, respetivamente, teoria da arte, filosofia ou ciência da educação com vista à definição dos seus fins e dos meios capazes de os realizar; presunção de pedagogo; pessoa versada em pedagogia, pedagogo; processo ou sistema dos pedagogos; e 1escravo que na antiguidade acompanhava as crianças à escola, 2professor de crianças, 3pessoa que se dedica à pedagogia, pedagogista, 4pessoa que se aplica à pedagogia, que ensina, professor, 5pessoa que se gaba de ser erudita, pedante, 6pessoa que se julga no direito de julgar os outros; pedagogicamente (advérbio), de modo pedagógico, à maneira de pedagogo; pedagógico (adjetivo), relativo ou conforme à pedagogia; pederasta e pederastia (nomes, do grego paiderastês, ou e paiderastía, as – respetivamente), a significar, respetivamente, homem que pratica sexo com rapaz jovem e prática homossexual de homem com rapaz jovem ou prática homossexual; pediatra ou pediatro e pediatria (nomes provindos do verbo iatréuo – o grego tem os nomes iatêr, iatéros e iatrós, ou, médico; iatrêion, ou, clínica; iatoría, as, ciência da medicina; e iátreusis, eos, ação de cuidar ou de curar), a significar, respetivamente, especialista das doenças das crianças e especialidade que estuda as crianças e as suas doenças; pediátrico (adjetivo), relativo à pediatria.
E fala-se na paideia como cultura da educação equivalente à latina humanitas, o saber e o cuidado do homem.   
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O Dicionário Grego-Português, de Isidro Pereira, já citado, apresenta os nomes paidagogeion, ou (escola ou antessala da escola), paidagogía, as (direção de crianças, educação, pedagogia), paidagogós, ou (escravo encarregado de levar as crianças à escola, precetor de crianças); paidárion, ou e paidíon, ou e paidískos, ou (menino, pequeno escravo), paideia, as ou paídeusis, eos ou paídeuma, atos (educação, exercício); paiderastês, ou e paiderastía, as (respetivamente, que ama os meninos, pederasta; e pederastia); paidiá, as (jogo, divertimento, bagatela); paidískê, ês (menina de condição livre, escravazita, jovem prostituta) e o diminutivo paidiskárion, ou (donzela); paidogonia, as (procriação de filhos – de gonê, ês e gónos, ou – procriação, semente, descendência); paidopóia, as (procriação de filhos – do verbo poiéo, fazer, produzir, criar); paidourgía, as (procriação de filhos – do nome érgon, ou, ação, trabalho, obra); paidomania, as (paixão louca pelos meninos – de mania, as, tara); paidotríbês, ou (mestre de ginástica para crianças – do verbo tríbo, praticar, exercer, gastar, extenuar); paidotrophía, as (educação de meninos – do verbo trépho, alimentar, engordar, educar, formar, construir); e paidophonía, as (morte de meninos – do nome phónos, ou, morte, matança, assassinato).
E apresenta: paidagôgéo (verbo), instruir, educar crianças, dirigir, governar, cuidar (de enfermo, criança, etc.); paidagôgikós, ê, ón (adjetivo), pedagógico e, no feminino, também nome a significar arte de cuidar duma doença; paideîos, on (adjetivo), infantil; paiderastéo (verbo, do verbo erastéo, estar apaixonado por, amar com paixão), amar os meninos; paidéuo (verbo), instruir, educar, formar, ensinar, domar, domesticar, paidikós, ê, ón (adjetivo), relativo às crianças, infantil, inocente, pueril e, no neutro, também nome a significar criança favorita, querida; paidióthen (advérbio), desde a meninice; paidnós, ê, ón (adjetivo), infantil, pueril e, como nome masculino e feminino, também menino e menina; paidóborós, ón (adjetivo, do adjetivo borós, á ón – glutão, voraz), que devora os meninos; paidiboskós, ón (adjetivo, do verbo bósko – apascentar, levar a pastar, alimentar e, na voz média, saciar-se de, pastar), que alimenta, que educa (crianças); paidogónos, on (adjetivo), que gera filhos, paidoktónos, on (adjetivo, do verbo ktéino, matar, assassinar), que mata crianças, que mata os seus filhos; paidolymás, ádos (adjetivo, do verbo limáino – manchar, corromper, destruir), que faz perecer o seu filho; paidomanês, és (adjetivo, do nome manía, as – tara), louco por crianças; paidopoiéo (verbo, do verbo poiéo – fazer, criar, produzir), gerar filhos, adotar; paidopoiós, on (adjetivo), que gera filhos; paidosporéo (verbo, do verbo spéiro – semear, gerar, produzir, disseminar, espargir), gerar filhos, adotar; paidotribéo (verbo, do verbo tríbo – exercer, praticar, gastar), formar os meninos com a ginástica, instruir, exercitar; paidotrophéo (verbo, do fome trophê, ês – alimentação, educação), alimentar, educar crianças; paisotróphos, on (adjetivo), que alimenta, que educa meninos; e paidogónos, on (adjetivo, de gonê, ês e gónos, ou – procriação, semente, descendência), que gera filhos.
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Excursus sobre o “logos”
Recorde-se que o grego, como se pode ver no mencionado Dicionário Grego-Português, de Isidro Pereira, também apresenta o termo logía, logías (nome feminino próximo de logos, mas provindo de lego – juntar, enumerar, contar, recolher, eleger) a significar “coleta para pobres” e lógion, logíou (nome neutro), a significar predição, resposta do oráculo.
Da mesma família temos as palavras: logádên (advérbio, provindo de légo – vd logía) – coletivamente, selecionadamente; logaríon, logaríou (nome neutro) – palavrita, sentença breve, mau discurso (sentido pejorativo); logás, logádos (nome masculino – do verbo légo, que significa escolher, juntar, enumerar – homónimo do verbo légo, que significa dizer, declarar, falar…; e do verbo légo, que significa deitar, adormecer, ficar inativo) – eleito, escolhido; logeíon, logeiou (nome neutro) – parte da cena onde se colocavam os atores para falar; logéus, logéos (nome masculino) – orador; logídion, logidíou (nome neutro diminutivo) – conversa curta; logáo (verbo usado só no presente) – ter ânsia de falar, e logízomai (verbo médio-passivo) – calcular, contar, ter em conta, refletir, raciocinar, considerar, inferir, deduzir; logikós, ê, ón (adjetivo) – lógico, que serve a palavra, conveniente ao raciocínio; lógimós, ê, ón e logistéos, a, on (adjetivos) – notável, digno de menção; lógios, ía, on (adjetivo) – eloquente, hábil no falar; logismós, ou (nome masculino) – conta, cálculo, raciocínio, reflexão, motivo, faculdade de raciocinar; logiótês, logiótêtes (nome feminino) – eloquência; logistikós, ê, ón (adjetivo) – relativo ao raciocínio ou ao cálculo (no neutro, pode ser nome a significar razão, faculdade de raciocinar); logistês, logistôu (nome masculino); logographéo (verbo composto de lógos e graphéo, escrever) – escrever discurso para outrem; logografia, as (nome feminino) – composição de discurso; logographikós, ê, ón (adjetivo) – relativo à prosa ou a um discurso; logográphos, ou (nome masculino) – escrito em prosa, historiador, autor de discursos para outrem; logomakhéo (verbo composto de logos e makhéo, lutar) – disputar, bater-se em palavras; logomakhía, as (nome feminino) – disputa, querela, logomaquia; logopoiéo (verbo composto de lógos e poiéo, fazer, criar) – ficcionar, efabular; logopoiós,óv (adjetivo e, no masculino, nome) que faz prosa, novelista, historiador; e logonekhontôs (advérbio) – com prudência, refletidamente.
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Concluindo
Embora tenha ficado fora do âmbito desta reflexão o atinente à podologia, esta não deixa de ter uma relação semântica com pedologia (referente a solo) e com pedologia (referente a criança). Com efeito, o pé ou equivalente é a parte do corpo do ser humano e dos diversos animais que está mais em contacto com o solo, o chão. Mesmo a mão do mamífero, com a qual este mexe na terra ou nela insere a semente, uma raiz ou um caule, não deixa de ser uma extremidade correspondente ao pé. Por outro lado, a criança, por força das suas circunstâncias de crescimento e desenvolvimento, muito se agarra ao solo, ao chão – porque nele se senta, porque se arrasta nele, nele se deita, o pisa e nele se enrosca, sobretudo em tempo de birra.
O referido dicionário de Isidro Pereira, menciona muitos vocábulos conexos com a infantaria. São os militares que passam e agem mais em contacto com o solo e que, por isso, asseguram a progressão no terreno e garantem a ocupação do território conquistado. Neste âmbito, o latim oferece muitas palavras cognatas de pedes, is (nome masculino: pé), como por exemplo, pedes, itis e peditastellus, i (nomes masculinos: peão, infante, soldado de infantaria); peditatus, us (nome masculino; infantaria); peda, ae (pegada); pedalis, e (adjetivo: de um pé, do tamanho dum pé, feito para o pé, próprio para o pé); pedarius, a, um (adjetivo: relativo ao pé, que vai a pé); pedatim (advérbio: pondo um pé atrás do outro); pedatus, a um (adjetivo: empado, que tem pés); pedatus, us (nome masculino: aproximação do inimigo; ataque); pedester, tris, e ou pedestris, e (adjetivo: que está de pé, que anda a pé, pedestre); pedetemptim ou pedetentim (advérbio: pé ante pé, caminhando com precaução, lentamente, prudentemente); pedica, ae: (nome feminino: armadilha para apanhar animais pela perna ou pelos pés, laço, peias, ferros presos aos pés); pediculus, i ou pedunculus, i (nomes masculinos diminutivos de pedes, pé: pedúnculo, pedículo), pediculus, i (nome masculino diminutivo de pé: piolho); pedis, is (nome masculino: piolho); pedisequa, ae (nome feminino: criada, escrava que acompanha a pé); e pedisequus, i (nome masculino: escravo que acompanha a pé, lacaio, pajem, sequaz).
E o predito Dicionário de Grego-Português e Português-Grego apresenta; podabrós, ón (adjetivo: de pés delicados); podagós, ón (adjetivo: condutor); podarga, as (nome feminino: gota, peia, podarga); podargáo (verbo: sofrer da gota); podargós, ê, ón ou podargós, ón (adjetivos: que sofre da gota, relativo à gota); podaniptêr, êros e podoniptêr, êros (nomes masculinos: lava-pés); podániptron, ou (nome neutro: água para os pés, banho de pés); podákrês, es (adjetivo: de vigorosos pés, de pés ligeiros); podéndytos, on (adjetivo: que cai sobre os pés); podeôn, ônos (nome masculino: pele da pata duma fera, colo de odre, odre, cabo de vela de navio, língua de terra); podêgéo (verbo: guiar os passos, guiar, conduzir); podemeknês, és (adjetivo: talar, que chega aos pés); podêmenos, ê, on (adjetivo: de pés como o vento, rápido como o vento); podêrês, es (adjetivo: talar; até aos pés); podiáios, a, on (adjetivo: de um pé de comprido); podízo (verbo: travar); podistêr, êros (adjetivo: talar, que chega aos pés); podoktýpê, ês (nome feminino: a que fere a terra com o pé, bailarina); podostrábê, ês (nome feminino: instrumento para retorcer os pés); podópsestrôn, ou (nome neutro: tapete, objeto para limpar os pés); podôkeia, as e podôkía, as (nomes femininos: rapidez de pés); e podôkês, es (adjetivo: ativo, de pés rápidos).
Também em termos a origem das palavras, os radicais pod-, paid-, ped- encontram-se no indo-europeu em proximidade física, fonético-fonológica e semântica.
Por tudo isto, não teimemos até às últimas consequências a insistir na diferença entre as palavras. São efetivamente muito mais os traços que as unem que os que as diferenciam. É, de facto, o contexto e a situações circunstanciais que a s tornam diferentes. Assim, raramente respondo à questão qual o significado duma determinada palavra, antes de perguntar em que contexto está empregue. Quem diria que a ortopedia (do adjetivo orthós, ê, ón, direito, ou do verbo orthóo, endireitar, levantar, retificar + pais, paidós, criança menino) tinha originariamente a ver com educação corporal de crianças. Como de pequenino se endireita o pepino, também era em menino que se lhe endireitavam as pernas e, consequentemente, os ossos. Depois de crescidos, em adultos, podia ser demasiado tarde. Mas, como a medicina e a cirurgia evoluíram muito, já se endireitam os adultos!
Não resisto a registar, pela ligação do homem ao solo, o mito da esfinge. Na tradição grega, ela é imaginada com um corpo de leão e uma cabeça de mulher, mas na tradição egípcia, a figura de mulher é substituída pela de homem. Seja como for, ela é associada a enigmas, pois, na lenda grega, a esfinge afligia a cidade de Tebas, devorando os homens que não conseguissem responder à sua pergunta, “Que animal anda pela manhã sobre quatro patas, à tarde sobre duas e à noite sobre três?”. Ora, Édipo, personagem mitológica, decifrou o enigma, respondendo que é o homem, pois gatinha na infância (manhã), anda ereto (sobre os dois pés) na idade adulta (tarde) e necessita de bengala na velhice (noite).
Derrotada e frustrada, a esfinge atirou-se ao precipício e morreu. Enfim, cabecinha pensadora, a de Édipo!
Por mais que São Paulo nos apele a que nos afeiçoemos às coisas do Alto (cf Cl 3,2), nós persistimos em virar a face para o chão. E, como o outro, beijamos a terra a mãe comum de todos ou o sítio para onde voltaremos… se a fé se esgotar.
2018.08. 31 – Louro de Carvalho

quinta-feira, 30 de agosto de 2018

“Reservas” sobre abertura tranquila do ano letivo


Às 15,49 horas do dia 30 de agosto, o site do DN assinalava que “pais e diretores têm «reservas» sobre abertura tranquila do ano letivo”.
Neste sentido, a Confap (Confederação Nacional das Associações de Pais) sublinhava as “perturbações graves” nos preparativos do próximo ano letivo, lembrando que houve problemas mesmo em anos mais tranquilos. Por seu turno, os diretores pediam a divulgação urgente das colocações de professores. E, enquanto era dito tudo isto, o Ministro da Educação garantia à TSF que há condições para tudo começar a tempo.
A Confap dizia-se “contente” com o otimismo do Ministro, que garantia estarem reunidas as condições para o próximo ano letivo começar “com normalidade e tranquilidade”. Não obstante, esta estrutura associativa representativa dos encarregados de educação não escondia as suas “reservas” relativamente à convicção de Tiago Brandão Rodrigues, frisando que os meses de verão ficaram marcados por “perturbações” nos preparativos do regresso às aulas, em particular devido à greve às reuniões de avaliação, que atrasou, mas não anulou, o lançamento de classificações finais e o processo de constituição de turmas.
Jorge Ascensão, presidente da Confap, declarava a este respeito:
Não sei se as condições estão reunidas. Sei que percebemos, por parte das escolas e das pessoas que têm essas responsabilidades, algumas das quais não gozaram ainda férias, que o processo de preparação do próximo ano letivo começou tardiamente.”.
Por outro lado, dizia esperar que “tenha corrido bem, que esteja tudo organizado, que os professores estejam todos colocados a tempo, que as autarquias tenham resolvido problemas de pessoal, que estejam asseguradas as atividades de enriquecimento curricular”. No entanto, admitia ter havido “um esforço, nomeadamente na constituição de turmas”, para ultrapassar os atrasos causados pelas greves. E dá o benefício da dúvida a Tiago Brandão Rodrigues:
Ficamos contentes [com] que o Ministro esteja tão confiante. Tem mais informação do que nós e, seguramente, tem dados que o levam a ter essa confiança.”.
Todavia, deixa uma ressalva: “Obviamente que todos os factos nos levam a ter alguma reserva”.
Este dirigente associativo parece dar uma no cravo, outra na ferradura e parece querer tudo: que não haja greves, que haja classificações e turmas a tempo e horas, que os professores sejam colocados e que tenham as suas reivindicações de colocação resolvidas.
Ora, não se pode querer tudo. Como é do conhecimento público, a Assembleia da República (AR) legislou, contra a vontade do Governo, no sentido de uma emenda ao processo de concurso dos professores e educadores de infância e o Presidente da República, na sequência da mensagem tácita que deixou quando recebeu os professores reivindicantes, promulgou o decreto parlamentar. O Governo, apesar da sua discordância, plasmada no requerimento ao Tribunal Constitucional a solicitar a apreciação sucessiva da constitucionalidade do diploma parlamentar, assumiu o preceito sobre os concursos. E, somente após a publicação da legislação adequada é que a Diretora-Geral de Administração Escolar exarou o aviso de abertura dos concursos, sendo que, em cada um dos procedimentos concursais, se têm em conta aspetos relevantes: prazo de oposição a concurso, organização das listas provisórias, tempo de reclamação/desistência, resposta à reclamação/desistência, listas definitivas, colocação/não colocação. A seguir à colocação dos professores de nomeação definitiva, vem a oposição a concurso para as necessidades não permanentes (mobilidade interna e contratação inicial), cujo processo é análogo. Entretanto, há os caos de pedido de aproximação à residência por motivos especiais, tal como houve concursos específicos para professores do ensino artístico. Ora este ano, tudo se atrasou por efeito da publicação necessariamente tardia da legislação. E, após a referida tomada de posição de pais e diretores, foram publicadas as listas de colocação e de não colocação de mobilidade interna e contratação inicial – muito a tempo de as aulas começarem (entre 12 e 17 de setembro).  Porém, o presidente da Confap, escudado na experiência de anos anteriores, reforça:
Mesmo quando não existem condicionalismos, como existiram no final deste último ano letivo, muito graves e perturbadores, normalmente os inícios de anos letivos têm sempre algumas questões. Este ano é preciso haver um esforço redobrado para que, pelo menos, as coisas não corram pior do que normalmente já acontece.”.
E reitera que existe a convicção de que “houve esse esforço”, nomeadamente por parte do Ministério da Educação e das escolas. Até frisou que algumas pessoas nem gozaram férias, devendo saber que, embora os professores sejam aquele grupo de profissionais que dispõe de um tempo muito curto para gozo de férias, só em casos verdadeiramente excecionais é que não se podem gozar as férias, a não ser por má gestão de recursos ou por falta de delegação de competências.  
Ora, se o líder da Confap pensa que houve o esforço que enfatiza, porque não acredita no futuro?
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Já os diretores esperavam sobretudo que fossem rapidamente divulgadas as listas de colocação dos professores. E o secretário-geral da Fenprof, minutos antes da divulgação das listas, criticara o facto de “a um dia útil” do termo do prazo, não terem sido feitas estas colocações.
A este respeito, Filinto Lima, presidente da ANDAEP (Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas) estarem globalmente ultrapassadas as dificuldades relativas à constituição de turmas e lançamento de horários para o próximo ano, muito por mérito das escolas. E explicitou: 
De facto, as escolas tiveram um mês de agosto muito trabalhoso – foi dos mais trabalhosos dos últimos anos –, no sentido de colaborar para o arranque positivo do ano letivo..
No entanto, acrescentou que, para a tranquilidade prometida pelo Ministro poder ser uma realidade, é “urgente” que sejam conhecidos os resultados do concurso nacional, pois, “faltam chegar às escolas milhares de professores” e, por conseguinte, “neste momento, milhares de professores não conhecem as suas colocações”.
Refere que, no ano passado, ano que assume ter sido “excecional” e “muito positivo”, as listas dos concursos nacionais foram divulgadas a 25 de agosto (parece esquecer o nacional descontentamento dos que ficaram muito longe da sua residência). Mas, neste ano, ainda não são conhecidas. O prazo é o final do mês, ou seja: esta sexta-feira. Porém, segundo Filinto Lima, idealmente as colocações já deveriam ser conhecidas, até porque existe um prazo de dois dias úteis para a sua aceitação pelos docentes. E diz acreditar que, se a divulgação for feita até esta sexta-feira, que a maioria dos professores estará nas escolas a 3 de setembro. Confessa querer ser otimista, mas que o seu otimismo está condicionado à colocação dos professores, e lembra que muitos destes docentes “serão colocados a centenas de quilómetros das suas áreas de residência”.
Não obstante, não esquece o que se passou no ano passado, por si dito excecional e muito positivo. Com efeito, sublinha que, em circunstâncias normais, o concurso deste ano teria servido apenas para assegurar contratações a termo, destinadas a cobrir horários para os quais as escolas não tinham resposta com os docentes dos quadros ou alvo de colocações plurianuais, o que implicaria “números residuais” de novas colocações. Todavia, devido à polémica relativa aos destacamentos de professores dos quadros nos concursos do ano passado, a AR ordenou a repetição do concurso nacional, que habitualmente decorre apenas de quatro em quatro anos. Assim, explica, Filinto Lima, o número de lugares em aberto é, neste momento, muito significativo, dando o exemplo do seu Agrupamento: 
No caso concreto do meu Agrupamento, pedi cerca de 40 professores novos. O grosso deverão ser QZP [quadros de zona pedagógica]. Já os tinha cá mas deixei de ter, porque os QZP têm todos de ir a concurso.”.
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Entretanto, o mesmo DN, às 18,56 horas do dia 30 de agosto, um dia antes do termo do prazo dado, anunciava os “20 mil professores colocados nos concursos”, sublinhando que as “listas foram publicadas há momentos no portal da Direção-Geral da Administração Escolar” e que “apenas seis mil colocações são de professores contratados, metade dos quais em horário incompleto”. Isto a somar a alguns (os que não concorreram à mobilidade interna) dos 3.500 que vincularam no concurso externo extraordinário.
Segundo o DN, concretiza-se a aspiração dos diretores de verem as listas divulgadas antes do fim do mês, de modo que os docentes podem apresentar-se nas escolas a partir do dia 3.
O aludido diário diz que, este ano, se realizaram sete concursos distintos: concurso interno antecipado, concurso externo ordinário, concurso externo extraordinário, concurso interno e concurso externo do ensino artístico, mobilidade interna e contratação inicial. Segundo o ME (Ministério da Educação), “foram vinculados cerca de 3500 professores, que se vão somar aos também cerca de 3500 docentes que vincularam no ano passado, o que representa um número de vinculações sem precedentes”. Por outro lado, “na mobilidade interna, foram distribuídos cerca de 14 000 horários a docentes do quadro [quadros de escola ou agrupamento e de zona pedagógica], dos quais cerca de 11 000 em horários completos e cerca de 3 000 em horários incompletos”. E, “na contratação inicial [contratos anuais], ficaram colocados perto de 6000 docentes contratados, dos quais cerca de 3000 em horários completos”.
Além disso, conclui-se que a repetição de concurso para os docentes dos quadros acabou por favorecer os contratados, pois sobraram mais horários completos. Na verdade, o número de contratos anuais com horário completo, como vem a suceder nos últimos anos na chamada contratação inicial, não é muito significativo. No entanto, o ME dá a entender que poderia ter sido bastante mais baixo. Os docentes sem vínculo permanente com o ME acabaram por beneficiar da decisão da AR, que ordenou a repetição dos concursos da mobilidade interna do ano passado, por não ter sido então permitido aos docentes do quadro concorrerem a horários incompletos. Com efeito, o ME confirma que, em cumprimento da Lei n.º 17/2018, de 19 de abril, “foram distribuídos horários completos e horários incompletos na mobilidade interna aos professores do quadro” que “esta circunstância explica a necessidade de contratar cerca de 3000 docentes externos para ocupar horários completos, apesar de terem vinculado aos quadros 7000 professores nos últimos dois anos”.
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Ora, a haver perturbações no arranque do ano letivo, estas ou serão residuais ou se deverão ao braço de ferro entre os professores, que não desistem da contagem integral do tempo de serviço e de outras condições, e o Governo que reinterpreta a cláusula orçamental de “o tempo de serviço”.
Depois, enquanto se mantiver o regime concursal baseado na equidade, haverá sempre pequenas falhas de não impossível colmatação.  
2018.08.30 – Louro de Carvalho