segunda-feira, 30 de junho de 2014

Os Santos Protomártires da Igreja de Roma

Peixe         XP    
Antes de Constantino          Depois de Constantino
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A 30 de junho, após a solenidade dos apóstolos Pedro e Paulo, a Igreja Católica, segundo o calendário romano universal pós-conciliar, celebra os primeiros Mártires da Igreja de Roma, vítimas da perseguição de Nero, subsequente ao incêndio de Roma, ocorrido a 19 de julho do ano 64.
Nunca o seu número foi contabilizado. E dos nomes, a História regista os dos Apóstolos Pedro e Paulo. Os outros luzem no firmamento eclesial como luminosa constelação de anónimos. O primeiro ato deste drama martirológico teve início na noite de 19 de julho daquele predito ano, com os repetidos toques de trombetas dos vigias postados em pontos-chave da capital do mundo de então, toques de alerta, bem conhecidos e temidos, logo seguidos dos primeiros gritos de incêndio.
Numa cidade de Roma superpovoada, com bairros pobres em que se amontoavam casas de madeira, um incêndio era acidente corriqueiro. Porém, este logo se revelou dotado de grande poder destruidor. Em poucos minutos, os brados de “Fogo! Fogo”, cada vez mais alarmantes, espalharam-se pelas ruas do bairro popular do Grande Circo e, logo depois, por outros. As labaredas pareciam ter-se estendido simultaneamente por várias zonas habitacionais, devorando implacavelmente residências e lojas comerciais. Topando no percurso depósitos de óleo e outros materiais combustíveis, alastraram por toda a urbe e subúrbios em torno dos montes Palatino e Célio. Quando, ao fim de 6 dias, se extinguiram os diversos focos de incêndio, haviam sido destruídos 10 dos 14 bairros da metrópole imperial. Tão pavorosa fora a catástrofe que se tornou impossível calcular o número de mortos.
Como, durante esses terríveis dias, grandes grupos de homens terão sido vistos a impedir, por meio de ameaças, a ação de quantos tentavam jugular o incêndio e mesmo alguns terão sido vistos a atiçar o fogo, os romanos imediatamente se puseram a proferir doestos contra Nero, a quem acusavam de ter provocado o incêndio ou de, pelo menos, o ter favorecido. Hoje, essa acusação deixou de merecer o crédito que tradicionalmente lhe foi atribuído.
Não obstante, é facto inegável que o Imperador, para se livrar da incomensurável vaga de indignação contra si levantada, alijou a culpa para os cristãos. Para o homem que mandara matar a própria mãe, a construção de tal calúnia pouco lhe pesaria na consciência. Por consequência, Nero mandou prender, de início, quantos se proclamavam cristãos. Delatores movidos pelos mais vis interesses logo possibilitaram a prisão de muitos outros. Alguém da coevidade afirmava ter sido uma grande multidão. Foram todos sumariamente condenados à morte – o que parece contrariar o propalado rigor do processo judicial romano – e cruelmente martirizados. Em breve se espalhou pelo Império, à maneira de aforismo, a palavra de ordem: “Non licet esse christianus”, não é permitido ser cristão”.
A sanha bimilenária do Príncipe das Trevas e de seus asseclas humanos está bem espelhada nas cenas brutais e execrandas dessa primeira perseguição. Não se limitaram os algozes a torturar e, a seguir, decapitar ou crucificar os putativos criminosos em espetáculos no Circo de Calígula e Nero, localizado na Colina do Vaticano. “Tudo quanto se pode conceber na imaginação de um sádico a quem se concedesse plena liberdade para praticar o mal, foi posto em prática numa atmosfera de pesadelo”, afirma o historiador Daniel Rops, na sua História da Igreja de Cristo.
Segundo o referido autor, foi aberto à populaça o jardim do parque imperial, onde se organizaram “caçadas” em que os alvos eram cristãos revestidos de peles de animais ferozes para assim serem perseguidos e, por fim, dilacerados pelos cães. Mulheres eram arremessadas ao ar por brutais chifradas de touros, numa visual analogia com episódios de fábula mitológica. Não faltaram sequer ignominiosos ultrajes e atentados à donzelia das meninas. Caindo a noite, os carrascos ergueram numerosos postes ao longo das diversas alamedas do parque, nos quais amarraram corpos de cristãos besuntados de resina e pez e lhes atearam fogo, a fim de servirem de iluminação festiva. Decorado com o traje de cocheiro, Nero passeava em seu carro puxado a cavalos pelas ditas alamedas abarrotadas de espectadores deslumbrados e iluminadas por aquelas tochas humanas.
Clemente Romano, o terceiro sucessor de São Pedro, relata, na sua Epístola aos Coríntios (capítulos 5 e 6), as horrorosas cenas daquela noite, das quais foi testemunha visual. E o historiador latino Tácito (Annales 15,44), homem claramente hostil ao Cristianismo, escreveu que tal excesso de atrocidade acabou por levantar em algumas parcelas da opinião pública um movimento de piedade para com os cristãos.
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Naquele tempo, a par da considerável comunidade judaica, em Roma, vivia a pequena comunidade dos cristãos. Sobre estes pouco conhecidos, circulavam denominações caluniosas, designadamente: de ateus, porque recusavam o culto ao Imperador, considerado um deus; de idólatras, porque nas catacumbas eram encontradas esculturas do Crucificado, perante as quais viram prostrados os fiéis; de antropófagos, porque diziam comer o corpo de Cristo e beber o Seu sangue; e de incestuosos, porque se tratavam por irmãos e irmãs e havia casamento e prole entre eles.
Só a partir do século IV, depois do édito de Milão e do aparecimento misterioso do lábaro a Constantino, com o sinal da cruz e o letreiro “in hoc signo vinces”, é que a cruz passou a ser o símbolo do cristianismo e se inventou o monograma de Cristo XP, formado pela sobreposição das duas primeiras letras (digrama) da grafia da palavra grega Cristo (grego: "Χριστός"), chi = ch  e rho = r, de tal forma a produzir o monograma(vd epígrafe). O Chi Rho é uma das primeiras formas de cristograma, e é usado por cristãos. Embora não seja tecnicamente uma cruz, o Chi Rho evoca a crucificação de Jesus, bem como simboliza o seu status como o Cristo, o Messias, o Ungido. Até aí o emblema dos cristãos (vd epígrafe) era o peixe e o seu símbolo ou marca era Ichthys ou Ichthus (do grego antigo ἰχθύς, em maiúsculas ΙΧΘΥΣ ou ΙΧΘΥC, significando “peixe”), mas funcionava como o acrónimo da expressão “Iēsous Christos Theou Yios Sōtēr”, que significa “Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador” (em grego antigo, Ἰησοῦς Χριστός, Θεοῦ ͑Υιός, Σωτήρ).
A sua doutrina não é conquista do génio inquieto de homens perscrutadores; nem professam, como fazem alguns, um sistema filosófico humano.
Vivendo em cidades gregas ou bárbaras, conforme a sorte reserva a cada um, e adaptando-se às tradições locais quanto às roupas, à alimentação e a tudo o mais da vida, dão exemplo de estilo próprio de vida social maravilhosa, que, segundo a confissão de todos, tem em si qualquer coisa de incrível. 
Vivem na sua respetiva pátria, mas como estrangeiros. Participam de todos os deveres como cidadãos e suportam as obrigações como estrangeiros. Qualquer terra estrangeira é pátria para eles e qualquer pátria lhes é terra estrangeira. Casam-se como todos os outros e geram filhos, mas não os abandonam. Têm em comum a mesa, mas não o leito. Vivem na carne, mas não segundo a carne. Passam sua vida na terra, mas são cidadãos do céu. Observam as leis estabelecidas, mas com seu modo de vida as superam. Amam a todos e por todos são perseguidos.
Não são conhecidos e são condenados. Dá-se-lhes a morte, e eles dela recebem a vida. São pobres, mas a muitos tornam ricos. Nada possuem, mas têm tudo em abundância.
São desprezados, mas encontram no desprezo a glória diante de Deus. Ultraja-se a sua honra e acrescenta-se testemunho à sua inocência. Insultados, abençoam. Demonstram-se insolentes com eles, e eles tratam-nos com respeito. Fazem o bem e são punidos como malfeitores. E, punidos, gozam como se lhes dessem vida. Os judeus fazem-lhes guerra como raça estrangeira. Os gregos perseguem-nos, mas aqueles que os odeiam não sabem dizer o motivo de seu ódio. Para dizer com uma só palavra, os cristãos estão no mundo como a alma está no corpo. (da Carta a Diagoneto, sec. II e III).

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Nero descarregou sobre os cristãos, com a sua fúria e hipocrisia, as acusações a si feitas, condenando-os a cruéis sacrifícios. E teve a responsabilidade de haver dado início à absurda hostilidade do povo romano, que até aí era muito tolerante em matéria de religião, sobretudo em relação aos cristãos: a ferocidade com que fustigou os presumíveis incendiários não encontra justificação no supremo interesse do império. Aquela perseguição não se circunscreveu ao ano incendial de 64, mas estendeu-se ao ano 67.
Dos mártires no circo de Nero destacam-se, como já foi referido, os Apóstolos São Pedro e São Paulo, que foram presos e encerrados no cárcere Mamertino, onde não cessaram de fazer o seu apostolado, vindo a conseguir até a conversão dos próprios carcereiros. Pedro, o Príncipe dos Apóstolos foi crucificado (de cabeça para baixo, a seu pedido, por não se julgar digno de morrer como Cristo) e sepultado no lugar onde se erigiu a sumptuosa basílica de São Pedro, e Paulo, o Apóstolo dos Gentios, foi decapitado nas Águas Salvianas (evitou a crucifixão apoiado no estatuto de cidadão romano) e sepultado na via Ostiense, no lugar onde se encontra a magnífica Basílica de São Paulo Extramuros.
A esta primeira perseguição sucederam-se mais nove, ao longo dos 250 anos subsequentes, até que Constantino deu a paz à Igreja, em 313. Calcula-se que, nessa fase da Igreja, 6 milhões de mártires terão selado com a morte a sua fé em Jesus Cristo, ou seja, em média, 24 mil por ano, 66 por dia.
“O sangue dos mártires é semente de novos cristãos” (sanguis martyrum semen christianorum), como escreve Tertuliano. Esse sangue que regou e empapou a terra nos primeiros séculos do Cristianismo continua a produzir seus frutos até hoje, e assim será até ao dia em que a humanidade inteira for convocada para o derradeiro ato da História, quando o Cristo Glorioso ditar a última sentença: “Vinde, benditos de meu Pai”... “Afastai-vos de mim, malditos” (Mt 25, 34.41).
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Referida que foi a primeira perseguição massiva aos cristãos, há que recordar que, logo após o nascimento de Cristo, se deu o martírio dos santos inocentes, pela sanha de Herodes a descarregar-se sobre as crianças com menos de dois anos de idade, e que o primeiro mártir do cristianismo foi o diácono Estêvão. E ao martírio do protomártir dos cristãos seguiram-se outros diversos. Só que o martírio dos primeiros cristãos não advinha dos pagãos, mas dos judeus, mesmo na diáspora, já que os seguidores de Jesus apresentavam como Messias e Senhor aquele cuja crucifixão as autoridades políticas e religiosas do judaísmo solicitaram ao poder romano, exatamente por se afirmar filho de Deus. Aqueles que não aceitavam Jesus de Nazaré como o Messias que havia de vir, não podiam tolerar nem a denominação de “deicidas” nem a profanação da Torá, da Sinagoga e do Templo por este grupo pusilânime. Paulo, que passou a ser vaso da eleição divina e o Apóstolo dos Gentios, até à visão da estrada de Damasco, fora feroz perseguidor de Jesus nas pessoas dos cristãos.
Por outro lado, não se podem olvidar os factos que dão conta da intensa e alargada perseguição aos cristãos na atualidade. O próprio Papa Francisco a denuncia:
“Os cristãos perseguidos são uma preocupação que me toca de perto como pastor. Sei de muitas coisas sobre perseguições que não me parece prudente contar aqui para não ofender ninguém. Mas, em alguns locais é proibido ter uma Bíblia ou ensinar o catecismo ou levar uma cruz… Mas quero deixar claro uma coisa: estou convencido de que a perseguição contra os cristãos, hoje, é mais forte que nos primeiros séculos da Igreja. Hoje, há mais cristãos mártires do que naquela época. E não é por fantasia, é por números”. (vd La Vanguardia, 13-06-2014).

Devem, ainda, acrescentar-se os inúmeros casos de vedação de acesso à profissão, a desempenho de cargo público, precarização no trabalho e até despedimento; de ridicularização e chacota pelo facto de adesão pública à fé cristã ou suspeita de prestação privada do culto; e de anulação de meios de expressão da doutrina e do culto, como ataque a boletins e estações de inspiração cristã, destruição, danificação e abandono de templos, proibição e condicionamento de procissões, etc.

domingo, 29 de junho de 2014

Sobre o Credo do Povo de Deus – A Fé da Igreja

A 24 de novembro de 2013, solenidade de Nosso Jesus Cristo Rei do Universo, Francisco presidiu à celebração do enceramento do Ano da Fé, que, de acordo com a sua convocação pela carta apostólica “Porta Fidei”, de Bento XVI, teve início oficial no dia 11 de outubro de 2012, data que celebrava os 50 anos da abertura do Concílio Vaticano II.  
Porém, haverá quem não se recorde de que, já depois do encerramento do Concílio Vaticano II, a Igreja celebrara outro Ano da Fé, iniciativa de Paulo VI, para assinalar a celebração do XIX centenário do martírio, em Roma, dos apóstolos Pedro e Paulo – os dois maiores dos Apóstolos, considerados colunas da verdade e alicerces da fé católica – que ocorreu cerca do ano 67 de nossa era. Daí, a data daquele “Ano da Fé”, colocado entre as festas de São Pedro e São Paulo, entre 29 de junho de 1967 e 29 de junho de 1968.
Daquele primeiro “Ano da fé” pós-conciliar a Igreja recebeu uma herança preciosa: o “Credo do Povo de Deus”, assumido por Paulo VI, não só pessoalmente, mas também como humilde detentor do exercício do ministério Petrino e professado por si no dia do encerramento do Ano da Fé, a 30 de junho de 1968.
A génese da sua elaboração que, a seguir, se sintetiza, vem no livro Correspondence” (vol. VII), entre o teólogo e cardeal suíço Charles Journet e o filósofo francês Jacques Maritain, ou seja, as 303 cartas que os dois trocaram entre 1965 e 1973, publicado em França. Entretanto, o cardeal Georges Cottier – discípulo de Journet e teólogo emérito da casa pontifícia – antecipara informações sobre o Credo ao mensário internacional 30 Dias, que lhe dedicou a capa de um dos seus números.
Em 1967, Maritain, de 85 anos, a morar em Toulouse com os Irmãos de Charles de Foucauld, acabava de publicar Le Paysan de la Garonne (Desclée de Brouwer, 1966), crítica contundente à Igreja pós-Conciliar, a seu ver, “ajoelhada aos pés do mundo”. A 12 de janeiro, Journet escreve a Maritain que se vai encontrar com o Papa, em Roma. Não sabem ambos que Paulo VI tenciona iniciar o Ano da Fé. Porém, Maritain respondeu a Journet confiando-lhe que, nos dias anteriores, lhe viera à mente a ideia de o Pontífice redigir uma profissão de fé completa e detalhada, na qual explicitasse tudo o que está realmente contido no Símbolo de Niceia. Esta seria, na história da Igreja, a profissão de fé de Paulo VI.
Sem que Maritain o tenha pedido, Journet fotocopia a carta do filósofo e entrega-a ao Papa, quando se reúne com ele a 18 de janeiro. Então, Paulo VI pede ao teólogo opinião sobre o estado da Igreja, que Journet definiu como “trágico”. Tanto ele como o Papa estão impressionados com a publicação ocorrida no ano anterior na Holanda, com o aval dos bispos, do Novo Catecismo, com o escopo de substituir na Igreja a ortodoxia tradicional pela moderna, na expressão da Comissão Cardinalícia nomeada por Paulo VI, de que Journet fazia parte, para analisar o predito catecismo.
Entretanto, a 22 de fevereiro de 1967, festa da Cátedra de São Pedro, Paulo VI, pela exortação apostólica Petrum et Paulum, determina a celebração do Ano da Fé. E, dois dias depois, Maritain anota no seu diário: “É acaso a preparação para uma profissão de fé que ele mesmo proclamará?”.
No mesmo ano, de 29 de setembro a 29 de outubro, reúne-se em Roma o primeiro Sínodo dos Bispos, em cujo relatório final a Comissão Doutrinal submete ao Papa a proposta de uma declaração sobre os pontos essenciais da fé. E, a 14 de dezembro, Paulo VI recebe novamente Journet, que lhe reapresenta a ideia de Maritain, ao que Paulo VI responde que lhe haviam sugerido a promulgação dum novo símbolo da fé no final do Concílio Vaticano II. O próprio Papa havia pedido ao teólogo dominicano Yves Congar a preparação do texto, mas que, não lhe parecendo satisfatório, foi arquivado. Depois, subitamente, Paulo VI solicitou a Journet que preparassem um esquema daquilo que pensavam que devia ser feito. Retornado à Suíça, Jornet refere a solicitude do Papa a Maritain, o qual, no começo do novo ano, enquanto está em Paris, redige um esquema de profissão de fé, que, terminado a 11 de janeiro de 1968, o envia a Journet, no dia 20. Este, por sua vez, no dia seguinte, remete-o a Paulo VI.
No texto elaborado por Maritain como simples rascunho, Journet encontrava resposta às dúvidas suscitadas pelo Catecismo Holandês e por outros teólogos sobre dogmas como o pecado original, a missa como sacrifício, a presença real de Cristo na Eucaristia, a criação a partir do nada, o primado de Pedro, a virgindade de Maria, a Imaculada conceição, a assunção – pelo que o envia ao Papa sem nada acrescentar.
A 6 de abril, chega uma carta de Roma, do teólogo dominicano Benoît Duroux, consultor da Congregação da Doutrina da Fé, a elogiar o texto e a correlacioná-lo com alguns comentários tidos por Journet como provenientes de Paulo VI, que, por seu turno, envia ao cardeal um cartão de agradecimento.
Assim, no dia 30 de junho de 1968, Paulo VI pronuncia solenemente na Praça de São Pedro, o Credo do Povo de Deus. Maritain vem a saber disso apenas a 2 de julho por leitura de um jornal. Pelas citações, intui que o Credo proferido pelo Papa coincide amplamente com o rascunho que escrevera. Entre as poucas variações, há uma que se refere aos judeus e muçulmanos. Maritain citara explicitamente o testemunho comum de que judeus e muçulmanos louvam o único Deus juntamente com os cristãos. Paulo VI, do seu lado, dá graças à bondade divina pelos muitos crentes que compartilham com os cristãos a fé no único Deus, mas sem citar explicitamente o judaísmo e o islamismo.
O texto deste Credo recalca o formulado no Concílio de Niceia, que se recita habitualmente na celebração da missa de domingos e solenidades, acrescido de importantes complementos e desenvolvimentos.
É louvável o esforço do Papa de enquadrar numa sequência harmoniosa as verdades reveladas por Deus, colocadas para o nosso conhecimento e propostas para o nosso consentimento. Assim, através de uma profissão clara e detalhada, Paulo VI, que lembrara aos bispos a necessidade de proclamar pública e assiduamente o símbolo da fé, formulou a crença cristã em Deus Trindade, destacando as verdades ao alcance da Igreja sobre Jesus Cristo e o Espírito Santo. Mas compendiou explicitamente também as verdades sobre Maria, a Igreja, a nossa realidade de pecadores envoltos nas consequências do pecado humano, mas chamados à santificação pela ação da graça divina, revelada em Jesus Cristo e levada por diante pelo ministério da Igreja.
Com o título de “Credo do Povo de Deus” retoma-se a afirmação central do Concílio sobre a Igreja, que identificou a sua realidade e missão em termos de “povo de Deus”, no contexto da visão bíblica que é sintetizada nas palavras do Profeta Jeremias: “Eu serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo” (Jr 32,38), sem esquecer as dimensões de esposa de Cristo, Corpo de Cristo e rebanho de Deus.
Será certamente útil conferir este “Credo do Povo de Deus”, que termina em doxologia triságica, na sequência que ele próprio destaca, para percebermos a riqueza de verdades que Deus nos revelou, e o desafio de as conhecer bem e as professar de maneira consciente e comprometida.
O arrazoado diacronicamente exposto mostra como Paulo VI se socorria da colaboração de qualquer pessoa que de boa vontade lhe mostrasse a situação da Igreja e sugerisse o contributo singelo para a melhoria. O exemplo de Maritain é apenas um dos muitos de que Paulo VI se fazia assessorar informalmente. O contexto dramático da redação da profissão de fé de Montini é a outra face da visão (essa mais otimista) da Igreja do Vaticano II (a lufada de ar fresco), da Ecclesiam Suam (a encíclica do diálogo) ou da Evangelii Nuntiandi (a exortação mobilizadora do apostolado transformador do mundo).
O esforço de síntese do Credo, que vem a seguir, não é mais do que um esforço que visa abrir o apetite para a leitura da Profissão de Fé de Paulo VI, explanada, elucidativa, de resposta a dúvidas, desmandos e esforços de equilíbrio. Constitui um bom farol de orientação da barca de Pedro, não condicente, apesar de tudo, com a visão catastrofista de Maritain e de Journet.
O texto de Paulo VI está distribuído por 30 pontos. Só que os primeiros sete refletem o conteúdo da homilia antecedente deste Credo, atinente ao contexto da celebração do Ano da Fé, cujos frutos resultam da vivência esforçada de todos e ao contexto que levou a esta proclamação da fé da Igreja, não deixando de relevar, ao lado do visível dramatismo, as notas que permitem o otimismo da esperança.
Síntese/condensação do texto do Credo do Povo de Deus, de Paulo VI, 30 de junho de 1968

1. Cremos num só Deus – Pai, Filho e Espírito Santo – Criador das coisas visíveis, o mundo onde decorre nossa vida passageira; e invisíveis, como os puros espíritos e a alma espiritual e imortal em cada homem.
 2. Cremos que o Deus único é uno na essência e demais perfeições: omnipotência, ciência, providência, vontade e amor. É Aquele que é, como Se revelou a Moisés; é Amor, como garante o Apóstolo João. Só Ele pode dar-nos conhecimento exato e pleno de Si, revelando-Se como Pai, Filho e Espírito Santo, de cuja vida nos é dado participar aqui na obscuridade da fé e, depois, na luz sempiterna. A mutualidade das relações, constitutiva da unicidade das Três Divinas Pessoas, perfaz a bem-aventurada vida íntima do Deus Santíssimo – facto que os crentes testemunham connosco ante os homens, mesmo não conhecendo o mistério da Trindade. Cremos no Pai, que desde a eternidade gera o Filho; no Filho, Verbo de Deus eternamente gerado; e no Espírito Santo, Pessoa incriada, que procede do Pai e do Filho como Amor sempiterno de ambos. Cremos nas Pessoas Divinas, eternas e iguais, em que a vida e a felicidade superabundam e se consumam na superexcelência e glória da Essência incriada, devendo venerar-se a Unidade na Trindade e a Trindade na Unidade.
4. Cremos em Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, Verbo eterno, nascido do Pai antes de todos os séculos, consubstancial ao Pai, por quem tudo foi feito; Encarnado pelo Espírito Santo, de Maria Virgem, e feito homem; igual ao Pai, na divindade, mas inferior a Ele, pela humanidade; uno, não por confusão de naturezas, mas pela unidade de pessoa.
5. Habitou entre nós, cheio de graça e verdade; anunciou e fundou o Reino de Deus, revelando em Si o Pai; deu o mandamento novo de nos amarmos uns aos outros como Ele nos amou; ensinou a via das bem-aventuranças – pobreza e mansidão, paciência no sofrimento, sede de justiça, misericórdia, pureza de coração e pacificidade, aceitação da perseguição por mor da virtude; sob Pôncio Pilatos padeceu, Cordeiro de Deus que carregou o pecado do mundo e morreu crucificado por nós, trazendo-nos a salvação no Sangue redentor; sepultado, ressuscitou ao terceiro dia por seu poder, elevando-nos à participação na vida divina, a graça; subiu ao céu, donde virá de novo, mas em glória, a julgar os vivos e os mortos, segundo o mérito de cada um: quem seguir o Amor e a Misericórdia terá a vida eterna; porém, quem os recusar em definitivo terá por destino o fogo incessante. E o seu reino não terá fim.
6. Cremos no Espírito Santo, Senhor e fonte de vida, adorado e glorificado com o Pai e o Filho; que falou pelos profetas e foi enviado por Jesus, depois da ressurreição e ascensão ao Pai; que ilumina, vivifica, protege e governa a Igreja, purificando seus membros, que não rejeitam a graça; que penetra no íntimo da alma, tornando, com Sua ação, o homem capaz de observar o preceito de Cristo: sede perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste
7. Cremos que Maria Santíssima, sempre Virgem, se tornou Mãe do Verbo Encarnado, nosso Deus e Salvador, Jesus Cristo; que, por esta eleição singular, em consideração dos méritos do Filho, foi, de modo mais sublime, remida e preservada imune do pecado original, superando as demais criaturas pelo dom de uma graça insigne.
8. Associada por vínculo estreito e indissolúvel aos mistérios da Encarnação e Redenção, a Virgem Imaculada, após o curso de sua vida terrestre, foi elevada em corpo e alma à glória celestial; e, tornada semelhante ao Filho, ressuscitado dentre os mortos, participou, por antecipação, da sorte dos justos. Cremos que a Mãe de Deus, nova Eva e Mãe da Igreja, desempenha lá do céu o ofício materno para com os membros de Cristo, cooperando para gerar e desenvolver a vida divina em cada um dos remidos.
9. Cremos que todos pecaram em Adão, o que significa que a culpa original fez que a natureza, comum aos homens, caísse num estado em que sofre as consequências dessa culpa. É, pois, a natureza decaída, despojada do dom gratuito que a adornava, ferida em suas forças naturais e submetidas ao domínio da morte, que é transmitida a todos os homens.
10. Cremos que Nosso Senhor Jesus Cristo, pelo Sacrifício da Cruz, nos remiu do pecado original e dos nossos pecados pessoais, de sorte que se impõe como verdadeira a sentença do Apóstolo: onde abundou o delito, superabundou a graça.
11. Cremos professando um só Batismo, instituído por Cristo para a remissão dos pecados, que deve ser ministrado também às crianças que não cometeram pecado algum, para que, nascidas sem a graça sobrenatural, renasçam da água e do Espírito para a vida divina.
12. Cremos na Igreja una, santa, católica e apostólica, edificada por Cristo sobre a pedra, que é Pedro. É o Corpo de Cristo, sociedade visível, estruturada hierarquicamente e comunidade espiritual. Igreja terrestre, Povo de Deus peregrinando na terra, e Igreja enriquecida de bens celestes, germe e começo do Reino de Deus, por meio do qual a obra e os sofrimentos da Redenção continuam, ao longo da história humana, aspirando com todas as forças à consumação perfeita, que se conseguirá na glória celestial, no fim dos tempos. Formada, no decurso do tempo, por Jesus com os Sacramentos que emanam de sua plenitude, a Igreja faz, por eles, com que seus membros participem do mistério da Morte e Ressurreição do Senhor, pela graça do Espírito Santo que a vivifica e move. É santa, apesar de incluir pecadores no seu seio, pois em si mesma não goza de outra vida senão a da graça. Se realmente seus membros se alimentam dessa vida, santificam-se; se dela se afastam, contraem pecado e impureza espiritual, que impedem o brilho e a difusão da santidade. Por isso, ela faz penitência por esses pecados, tendo o poder de livrar deles seus filhos pelo Sangue de Cristo e pelo dom do Espírito.
13. Herdeira das promessas divinas e filha de Abraão no Espírito, por meio do povo de Israel, cujos livros guarda e cujos Patriarcas e Profetas venera; edificada sobre o fundamento dos Apóstolos, cuja palavra sempre viva e cujos poderes pastorais vem transmitindo de geração em geração, no sucessor de Pedro e nos Bispos em comunhão com ele; gozando, enfim, da perpétua assistência do Espírito Santo, tem o encargo de conservar, ensinar, explicar e difundir a Verdade por Deus revelada aos homens, de modo velado, pelos Profetas e, plenamente, por Jesus. Cremos em todo o conteúdo da Palavra de Deus, por escrito e por tradição, proposto pela Igreja, em declaração solene e no Magistério ordinário e universal; e na infalibilidade do Sucessor de Pedro, quando fala ex cathedra, como Pastor e Doutor dos cristãos, e do Colégio dos Bispos, quando com o Papa exerce o Magistério supremo. 
14. Cremos que a Igreja, fundada por Cristo, que por ela orou, é una, na fé, no culto e no liame da comunhão hierárquica, em cujo seio, a variedade ritual e a diversidade do património teológico e espiritual ou disciplinar declaram a sua unicidade.
 15. Reconhecendo que fora da estrutura eclesial há elementos de santificação e verdade, que como dons próprios da Igreja impelem à unidade, e crendo na ação do Espírito que suscita em todos os discípulos o desejo da unidade, esperamos que os cristãos, ainda não em plena comunhão com a Igreja, se unam num só rebanho sob o único Pastor. 
16. Cremos que a Igreja é necessária à Salvação, pois só Cristo é o Mediador e caminho da salvação, e Ele se nos torna presente no seu Corpo, que é a Igreja. Mas o desígnio divino abrange todos os homens, e mesmo os que, ignorando sem culpa o Evangelho e a Igreja, procuram a Deus com sincero coração e se esforçam, sob o influxo da graça, por cumprir com obras a sua vontade, conhecida pela consciência, obtêm a salvação eterna.
 17. Cremos que a Missa, celebrada pelo sacerdote, na pessoa de Cristo, mercê do poder do sacramento da Ordem, e oferecida em nome de Cristo e dos membros do seu Corpo Místico, é o real Sacrifício do Calvário, tornado presente em nossos altares. Cremos que, como o Pão e o Vinho consagrados pelo Senhor na última ceia se converteram no seu Corpo e Sangue, que iam ser oferecidos por nós na Cruz, assim o Pão e o Vinho consagrados pelo sacerdote se convertem no Corpo e Sangue de Cristo que assiste gloriosamente do céu. Cremos que a presença do Senhor, sob as espécies que aparecem aos sentidos como dantes, é presença verdadeira, real e substancial
18. Neste sacramento, Cristo, para se nos dar em alimento e nos associar pela unidade do seu Corpo Místico, como foi vontade sua, está presente pela mudança de toda a substância do pão e do vinho no seu Corpo e Sangue, permanecendo apenas inalteradas as propriedades de pão e vinho, que percebemos pelos sentidos – mudança misteriosa que a Igreja chama com total exatidão e conveniência transubstanciação
19. A única e indivisível existência de Cristo nosso Senhor, glorioso no céu, não se multiplica, mas torna-se presente pelo Sacramento nos vários lugares da terra onde o Sacrifício Eucarístico se celebra. E, depois da celebração, a mesma existência permanece presente no Santíssimo Sacramento, que permanece no sacrário do altar como o coração vivo de nossas igrejas. Por isso, somos obrigados, por dever suavíssimo, a honrar e adorar, na Sagrada Hóstia que os nossos olhos veem, o próprio Verbo Encarnado que eles não podem ver e que, sem ter deixado o céu, se tornou presente diante de nós.
20. Confessamos que o Reino de Deus, começado aqui na terra na Igreja de Cristo, não é deste mundo, cuja figura passa, e cujo crescimento não pode ser confundido com o progresso da cultura humana ou das ciências e artes técnicas, mas consiste em conhecer cada vez mais as riquezas insondáveis de Cristo, em esperar sempre com maior firmeza os bens eternos, em responder mais ardentemente ao amor de Deus, enfim, em difundir-se cada vez mais largamente a graça e a santidade entre os homens. Mas com o mesmo amor, a Igreja é impelida a interessar-se continuamente pelo verdadeiro bem temporal dos homens, pois, não cessando de advertir todos os seus filhos de que não possuem aqui na terra morada permanente, estimula-os a que contribuam, segundo as condições e os recursos de cada um, para o desenvolvimento da sociedade humana; promovam a justiça, a paz e a união fraterna entre os homens; e prestem ajuda aos irmãos, sobretudo aos mais pobres e infelizes. Destarte, a grande solicitude com que a Igreja, Esposa de Cristo, acompanha as necessidades dos homens, suas alegrias e esperanças, dores e trabalhos, não é outra coisa senão o ardente desejo que a impele com força a estar presente junto deles, tencionando iluminá-los com a luz de Cristo, congregar e unir a todos naquele que é o único Salvador – solicitude que não significa acomodação às coisas do mundo ou diminuição do fervor com que esperamos o Senhor e seu Reino eterno. 
21. Cremos na vida eterna e em que as almas dos que morrem na graça de Cristo – quer as que ainda se purificam no Purgatório, quer as que são recebidas por Jesus no Paraíso, logo que se separam do corpo, como sucedeu ao Bom Ladrão – formam o Povo de Deus para além da morte, que será totalmente vencida na Ressurreição, em que as almas se reunirão aos corpos. 
22. Cremos que as almas, reunidas com Jesus e Maria no Paraíso, constituem a Igreja celeste, onde, gozando da felicidade eterna, veem a Deus como Ele é e participam com os santos Anjos, em grau e modo diversos, do governo divino exercido por Cristo glorioso, já que intercedem por nós e ajudam nossa fraqueza com a sua solicitude fraterna.
23. Cremos na comunhão de todos os fiéis: dos que peregrinam sobre a terra, dos defuntos que ainda se purificam e dos que gozam da bem-aventurança do céu, formando todos uma só Igreja. E cremos que nesta comunhão dispomos do amor misericordioso de Deus e dos Santos, atentos a nossas orações, como Jesus garantiu: pedi e recebereis. Professando a fé e apoiados na esperança, aguardamos a ressurreição dos mortos e a vida do século futuro.

Bendito seja Deus: Santo, Santo, Santo! Amém.

Sobre o Dia do Peregrino: – Porquê a síndrome de urbanismo exacerbado?

De acordo com a informação da agência Ecclesia, a Assembleia da República aprovou, no dia 27 de junho, a instituição do Dia do Peregrino, a celebrar a 13 de outubro. A iniciativa decorre do projeto de resolução n.º 1050/XII, da maioria PSD/CDS, que visa “dignificar o papel do peregrino na construção da sociedade portuguesa”, pelo que recomenda (trata-se somente de uma recomendação!) ao Governo a instituição do Dia do Peregrino.
O texto justifica a iniciativa com a verificação de que, em Portugal, “existe uma forte tradição na realização de peregrinações cristãs direcionadas para os mais variados locais de culto, com destaque para aquelas que decorrem no Santuário de Fátima”. E acrescenta que a condição de peregrino “não se esgota na intenção de caminhar na direção de um lugar sagrado”, antes, “o ato de peregrinar abrange uma amplitude que vai muito para além da condição de crente de quem o pratica, abrangendo uma dimensão social, cultural e económica que se deve também valorizar”.
O projeto de resolução em causa passou com os votos da maioria e do PS, e com a abstenção do PCP, BE e PEV. No entanto, 26 deputados socialistas abstiveram-se, contrariando o sentido de voto da sua bancada, entre os quais se contam: Jorge Lacão, Pedro Silva Pereira, Pedro Nuno Santos, Ferro Rodrigues, Ana Catarina Mendes, Eduardo Cabrita e Ana Vitorino. E quatro deputados, também do PS – Pedro Delgado Alves, Marcos Perestrello, Isabel Moreira e Sérgio Sousa Pinto – votaram contra.
Não vendo, apesar das justificações apresentadas, interesse especial nesta iniciativa parlamentar e consequente tomada posição governativa futura, devo, no entanto, pronunciar-me criticamente sobre a respeitável posição dos deputados que votaram contra e dos que optaram pela abstenção. Uma vez que a questão se colocou, ela deve ser convenientemente encarada dos pontos de vista epistemológico e pragmático. Para tanto, é conveniente proceder a um pequeno excursus sobre o sentido das noções de peregrino e peregrinação, como se explana a seguir.
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É certo que os termos peregrino e peregrinação têm hoje uma conotação religiosa, mas nem sempre assim foi. E essa conotação hodierna não esgota o sentido religioso que se lhe atribui nem é assumida exclusivamente nesse sentido por Cristo, segundo o Evangelho de Mateus, “era peregrino e agasalhastes-me” (Mt 25,35; cf 25,38.43.44). Neste passo evangélico, o peregrino é aquele que está em penúria e desconforto, porque se encontra fora de casa e sem recursos para se proteger, abrigar e agasalhar. Do lado da caminhada, partilha da situação e dificuldade do caminhante para um santuário ou para uma festividade, para uma feira, para a leira que está longe do povoado, para o exílio. Eventualmente, pode sofrer semelhante situação o aventureiro, o emigrante e o imigrante e até o turista. A tradição portuguesa conta com o precioso contributo de outros viandantes que prestaram um serviço inestimável às populações mais arredadas dos benefícios da civilização e do progresso, como os almocreves, os azeméis, os cantores e artesãos ambulantes e, ainda hoje, a plêiade de carteiros, estafetas e inúmeros bate-portas, que nos permitem não sair da nossa zona de conforto, mas satisfazer muitos dos nossos encargos, apesar de muitos nada mais fazerem do que incomodar.
Também, o cristianismo, na esteira de filósofos como Platão, considera a vida na Terra uma constante peregrinação que termina no momento em que o homem regressa ao híperurânio platónico ou chega ao patamar do paraíso prometido e espiritualmente almejado, preparado para os homens desde o princípio do mundo (cf Mt 25,34).
Qualquer dicionário de latim-português nos fornece suficientes subsídios para o entendimento do significado do termos acima grifados e na pluralidade de sentidos explicitados. Neste caso, podemos ater-nos ao de Francisco Torrinha, de 1945.
Devemos começar por afirmar que tudo se radica nas palavras latinas “ager, agri” (campo, terreno, território…) e a preposição “per” (através de, por…), que nas palavras derivadas serve de prefixo. Assim, se formou o verbo “peragrare”, que significa percorrer (viajando), atravessar, visitar sucessivamente; e o nome “peragratio, onis” (ação de percorrer, percurso). Depois, formou-se o advérbio “peregre” (por influência de longe e com metafonia de “a” para “e”: *pero, longínquo + ager – no campo, no estrangeiro); e, como derivados de “peregre”, os adjetivos “peregrinus” (que viaja no estrangeiro, que vem do estrangeiro, estrangeiro, estranho, bárbaro, não cidadão romano) e “peregrinabundus” (dado a longas viagens, que percorre terras longínquas, que corre terras viajando), o verbo “peregrinari” (verbo depoente: andar em viagem, viajar, viajar pelo estrangeiro, percorrer, andar, estar ou viver no estrangeiro) e os nomes “peregrinatio, onis” (longa viagem, grande viagem, peregrinação, exílio, viagem pelo estrangeiro), “peregrinator, oris” (o que viaja muito, o que corre terras, o que é dado a largas viagens) e “peregrinitas, atis” (condição, costumes, moda, acentuação ou falar de estrangeiro). É de reparar que o adjetivo peregrinus (adjetivo da primeira classe), como os termos da mesma família, consolidam a metafonia do “a” em “e” por influência do “i” no corpo da palavra.
Na língua portuguesa, o termo “peregrino” surge na primeira metade do século XIII, para denominar os cristãos que viajavam a Roma (que passaram a chamar-se também romários ou romeiros e a sua ação romaria ou romagem – termos esses derivados da palavra “Roma”) ou à Terra Santa (onde atualmente se encontra o Estado de Israel e os Territórios Palestinianos) para visitar os lugares sagrados, umas vezes como castigo autoimposto com o escopo de redenção de determinados pecados e outras vezes para cumprir penas canónicas. Desses peregrinos surgiria mais tarde a ideia e o movimento bélico das Cruzadas, com vista à “reconquista” dos lugares que os cristãos consideravam santos e que estavam em poder de islâmicos.
Porém, o ato de peregrinar e as peregrinações formais ocorrem desde os tempos mais remotos, mesmo nos chamados tempos primitivos em que predominavam os costumes ou ritos pagãos, bem como no judaísmo (neste caso, em relação a Jerusalém onde estava o Templo, Lc 2,22). Existem escritos de locais de peregrinação muitas vezes ofuscados pela própria cristianização, como é o caso da Catedral de Santiago de Compostela, que dizem ter sido construída em sítio onde passaria antes uma outra rota mais antiga e pagã, a da peregrinação à Finisterra  (fim-da-terra, cabo do mundo), na costa mais ocidental da Europa, para ver o deus Sol a “morrer” no mar e que no dia seguinte ressuscitaria no oriente, nos territórios do sol nascente. O designativo de Sol Nascente é atribuído pela Bíblia ao Messias vindouro, que a Liturgia Católica, apoiada nos escritos neotestamentários, aplica a Jesus Cristo.
As primeiras peregrinações cristãs  datam do início do século IV (quando o Cristianismo ganhou carta de alforria, tornando-se religio lícita pelo édito de Milão em 313, de Constantino, já que, antes, era a religião clandestina das catacumbas romanas), e tinham por destino a Terra Santa (a mais conhecida e a primeira a deixar relato de peregrinação é a hispânica Erétria, uma provável familiar de Teodósio I, imperador romano, que tornou o cristianismo religião oficial do império). Mais tarde, tiveram grande incremento mercê da pregação de São Jerónimo.
Por outro lado, as peregrinações começaram também abranger locais onde estavam sepultados os apóstolos, os mártires e outros santos, com destaque para lugares onde se diz ter aparecido a Santíssima Virgem Maria ou onde foi encontrada misteriosamente uma imagem sua.
Em Portugal, são muitos os lugares de peregrinação. O destaque vai necessariamente para o Santuário de Fátima, que emparceira em volume e notoriedade com o Santuário de Lourdes, em França. No entanto, não podem ignorar-se lugares de peregrinação, romagem ou romaria como: Abadia (Amares); Almortão (Idanha-a-Nova); Beata Alexandrina de Balazar (Póvoa de Varzim); Bom Jesus (Braga); Cárquere (Resende); Cerejais (Alfândega da Fé); Coração de Jesus (Ermesinde); Cristo-Rei (Almada); Lapa (Sernancelhe); Monte da Virgem (Vila Nova de Gaia); Peneda (Arcos de Valdevez); Penha (Guimarães); Remédios (Lamego); Sameiro (Braga); Santa Luzia (Viana do Castelo); São Bento da Porta Aberta (Terras do Bouro); e tantos outros.
Para peregrinar em sentido religioso, há que ter em conta que não se trata apenas do ato de caminhar (no caso da peregrinação a pé), ou executar um trajeto com um determinado número de quilómetros. É característica inerente ao peregrinar a motivação “por” ou “para algo”.
A peregrinação tem, assim, um sentido e um valor acrescentado que é necessário descobrir por cada pessoa que a empreende. Tal não significa que quem se encontre a viajar sem rumo, sem destino ou sem motivação não precise de acolhimento, apoio e orientação.
Ao conceito de peregrino corresponde genericamente a situação do homem sobre a terra que perfaz o seu tempo de provações para merecer a Terra Prometida, à maneira dos hebreus no deserto após o êxodo do Egito, onde eram oprimidos pelo poder faraónico (Ex 7,1ss). O termo “peregrino”, em conformidade com o excursus etimológico percorrido acima, designa aquele que se sente estranho ou estrangeiro no sítio ou no meio onde está ou vive e, por conseguinte, mais não faz do que procurar a cidade ideal. A carta a Diagoneto (entre os séculos II e III ) afirma categoricamente que os cristãos estão no mundo, mas vivem como se não foram do mundo:
Vivem em sua respetiva pátria, mas como estrangeiros. Participam de todos os deveres como cidadãos e suportam as obrigações como estrangeiros. Qualquer terra estrangeira é pátria para eles e qualquer pátria lhes é terra estrangeira. Casam-se como todos os outros e geram filhos, mas não os abandonam. Têm em comum a mesa, mas não o leito. Vivem na carne, mas não segundo a carne. Passam a vida na terra, mas são cidadãos do céu.”. (vd http://gracaquebasta.blogspot.pt/2007/06/carta-diagoneto.html, ac.2014.06.28).

O termo “peregrino” exprime assim, além do caráter transitório de uma situação existencial, o desprendimento interior em relação ao presente e a ligação a fins escatológicos e de natureza superior. A Alma de peregrino pode significar a conformação com um idealismo um tanto sentimental, aliado a uma certa utopia (mas o homem é também o sujeito que sonha, imagina, idealiza – o que também contribui para a realização humana). Mas essa marca de peregrino vem conotada com as ideias de expiação e purificação, contra qualquer tipo de luxo ou ostentação, bem como a de preito de homenagem àquela entidade (Cristo, Maomé, Osíris, Buda – ou seus enviados) que santificou os comummente reconhecidos lugares de peregrinação, a da côngrua identificação pessoal com o titular desses lugares e a da assimilação de suas diretrizes.
O cajado a que se arrima o peregrino simboliza a prova de resistência, o despojamento e o amparo de que minimamente necessita; e o bornal com o cantil, a reabastecer de vez em quando, representam o mínimo de víveres exigíveis para aguentar a caminhada. (cf Chevalier, J e Cheerbrant, A – Dicionário dos Símbolos: Teorema, 1994; cf http://pt.wikipedia.org/wiki/Peregrina%C3%A7%C3%A3o, ac.2014.06.28).
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Em face do exposto, é de concluir o seguinte:
Não parece essencial ou pertinente a criação do Dia do Peregrino, sendo censurável a iniciativa da maioria parlamentar se o que a moveu foi a esperteza saloia de contabilizar ganhos políticos ante um eleitorado, sensível a estas matérias, que a penalizou eleitoralmente por duas vezes consecutivas. Se assim for, estamos perante uma atitude – não demagógica, porque essa significaria uma arte apurada de condução do povo – eminentemente provinciana e de âmbito supinamente paroquial no pior sentido do termo (que, em si, também o tem de positivo).
Os senhores deputados que se refugiaram no voto contra ou na abstenção, uma vez levantada a questão, deveriam assumir, do meu ponto de vista, outra postura. Se o problema era responder a uma provocação, não lhes cairiam os parentes na lama se votassem a favor, embora com necessária declaração de voto a denunciar a provocação e aquela atitude provinciana. Se o motivo assenta efetivamente em valores republicanos como a laicidade, a secularidade ou a não confessionalidade do Estado, tenho de discordar pelos seguintes motivos:
Não se trata de princípios absolutos, já que devem articular-se com outros valores como os da tolerância e convivência, e o do respeito pelas tradições ancestrais e pela idiossincrasia popular.
Contrariar a ideia de peregrinação não contribui pragmaticamente em nada para a mais-valia de progresso que as reformas e as revoluções queiram implementar em termos civilizacionais e culturais no Estado e/ou no povo.
Como se pode verificar pelo conteúdo do excursus praticado, as ideias de “peregrinação” e de “peregrino”, sem as negarem, ultrapassam em larga medida as malhas da religiosidade.
No quadro da laicidade positiva, ultimamente definida e reconhecida, não é crível nem desejável que a República não preste um serviço (ou apoie as entidades disponíveis par o prestar) de apoio, acolhimento e orientação aos inúmeros peregrinos (sobretudo os que marcham a pé) rumo a santuários ou a celebração de efemérides significativas para o seu credo.
Não deve a República desperdiçar mais uma oportunidade que lhe é oferecida no sentido da reflexão em ordem ao combate à exploração que alguns fazem sobre a situação dos peregrinos a pé, cobrando-lhes mais que o devido ou negando o atendimento àqueles que legitimamente viajam em autocarro.
Há dias de tudo: do pai, da mãe, do animal, do professor, do estudante, do enfermeiro, do bombeiro, etc. Porque não o dia do peregrino? Que encargo traz este? Que engulho cria?
Não é decente responder a uma atitude provinciana com uma postura de urbanismo exacerbado, a coberto da confissão do mais fundamentalista republicanismo.

Ademais, interrogo-me se os candidatos a deputados mantêm esse escrupuloso prurido republicanicista quando, a nível local, visitam bispos, feiras, igrejas, missas, procissões, centros paroquiais, romarias, etc. Ou será que o voto, e só o voto, justifica e republicaniza tudo?

sexta-feira, 27 de junho de 2014

A família como preocupação sinodal e pontifícia

Em dois momentos bastante próximos, a temática da família vai ser estudada em duas assembleias gerais do Sínodo dos Bispos – uma extraordinária e uma ordinária – o que revela a momentosidade da instituição familiar e o melindre que a sua problemática representa para a Igreja Católica, no quadro dos desafios que o mundo contemporâneo lança àquela instituição que até há relativamente poucas décadas ninguém punha seriamente em questão.
O Papa Francisco, na linha das constantes preocupações dos seus predecessores, convocou em 8 de outubro de 2013 a III Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos a decorrer, no Vaticano, entre 5 e 19 de outubro de 2014, que incidirá sobre “os desafios pastorais da família no contexto da evangelização”, tema amplamente discutido na primeira sessão de trabalho do Santo Padre com o Conselho dos oito de cardeais. O diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, o Padre Frederico Lombardi, advertia então que “esta é a maneira pela qual o Papa deseja promover a reflexão e o caminho da comunidade da Igreja, com a participação responsável do episcopado de diferentes partes do mundo.”
A esse respeito a Secretaria Geral do Sínodo deu início à preparação dos trabalhos sinodais mediante o envio do Documento Preparatório, que suscitou uma vasta e diversificada resposta eclesial por parte do povo de Deus, não dada a conhecer por todas as conferências episcopais, diga-se em abono da verdade. O documento, publicado no mês de novembro de 2013, depois de dois capítulos de reflexão prévia sobre “o sínodo: família e evangelização” e “a Igreja e o evangelho sobre a família” (este desdobrado em “o projeto de Deus Criador e Redentor e o ensinamento da Igreja sobre a família”), apresenta um questionário estruturado em oito grupos de perguntas relativas ao matrimónio e à família e mais um epigrafado por “outros desafios e propostas”.
Os oito grupos de questões elencam-se segundo os seguintes subtemas, qual deles o mais candente: a difusão da Sagrada Escritura e do Magistério da Igreja a propósito da família; o matrimónio segundo a lei natural; a pastoral da família no contexto da evangelização; a pastoral para enfrentar algumas situações matrimoniais difíceis; as uniões de pessoas do mesmo sexo; a educação dos filhos no contexto das situações de matrimónios irregulares; a abertura dos esposos à vida; e a relação entre a família e a pessoa.
Este ano, a 24 de junho, o Secretário-Geral do Sínodo dos Bispos apresentou o Instrumentum Laboris, que nasce das respostas ao questionário constante do aludido documento Preparatório.
Aquele Instrumentum, como documento de trabalho-base para a reflexão e chamariz para as intervenções dos padres sinodais, vem estruturado em três partes e retoma, em conformidade com uma ordem funcional à assembleia sinodal, a matéria do referido questionário. A primeira parte glosa a temática do Evangelho da família, entre desígnio de Deus e vocação da pessoa em Cristo, quadro em que se relevam o conhecimento e a receção dos conteúdos bíblicos e dos documentos do Magistério da Igreja, incluindo as várias dificuldades, entre as quais a compreensão da lei natural. A segunda aborda as várias propostas de pastoral familiar, os relativos desafios e as situações mais difíceis. E a terceira parte equaciona a problemática da abertura à vida e da responsabilidade educacional dos pais, que caraterizam o matrimónio entre o homem e a mulher (sem margem para dúvidas), com referência particular às situações pastorais que marcam a atualidade ambivalente espelhada no mundo. Parece, mesmo por uma leitura apressada, a aprofundar quanto antes, que nenhum problema fica esquecido no documento de trabalho, inclusive os atinentes ao ponto do questionário referenciado como “outros desafios e propostas”, esperando-se que os bispos procedam a uma reflexão acurada sem preconceitos e usufruam da liberdade de intervenção sem inibições.
Na certeza de que as dificuldades não condicionam irreversivelmente a vida familiar e de que as pessoas não se encontram ante problemáticas inéditas, a Igreja constata de bom grado os claros impulsos que parecem induzir uma nova primavera para a família. Não é por acaso que se encontram testemunhos significativos em inúmeros congressos eclesiais, onde se manifesta nitidamente, sobretudo nas novas gerações, um renovado desejo de família e de vida familiar. Perante tal aspiração, a Igreja sente-se solicitada a oferecer “assistência e acompanhamento, a todos os seus níveis, em fidelidade ao mandato do Senhor de anunciar a beleza do amor familiar”. Em seus encontros com as famílias, o Papa encoraja o olhar com esperança sobre o próprio futuro, recomendando os estilos de vida pelos quais se gera, conserva e se faz prosperar o amor em família: pedir licença, agradecer e pedir perdão, não deixando que o sol se ponha sobre desavença ou incompreensão, e tendo a humildade do pedido de desculpa de um cônjuge ao outro. (cf “premissa” do Instrumentum Laboris).
Sendo assim e, de acordo com o texto da apresentação do documento de 24 de junho, “considerando a amplidão e a complexidade do tema, o Santo Padre definiu um itinerário de trabalho em duas etapas distintas no tempo e no escopo, que constitui uma unidade orgânica”: a Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo, em 2014, constará de um trabalho em que os Padres sinodais avaliarão e aprofundarão os dados, os testemunhos e as sugestões das Igrejas particulares, com vista a enfrentar os novos desafios sobre a família (trabalho de avaliação, reflexão e aprofundamento – provavelmente ainda sem decisões resolutivas); e a Assembleia Geral Ordinária do Sínodo, em 2015, mais representativa do episcopado, inserindo-se no precedente trabalho sinodal, meditará ulteriormente sobre as temáticas abordadas para encontrar adequadas linhas de ação pastorais (é o trabalho de conclusões e linhas de rumo).
Muitas expectativas estão criadas em torno dos trabalhos sinodais e do carisma lúcido e voluntarioso do Papa Francisco. São tantas e tamanhas as situações que pedem uma orientação eclesial caldeada pela exigência e pela abertura, que pode desenhar-se um sério risco frustracional (parodiando a nossa Presidenta do Parlamento) face às altas expectativas. Para que o eventual risco fique jugulado ou ao menos minorado, cada um dos peritos – em teologia, antropologia, sociologia, psicologia, gestão de afetos, ciências da saúde, etc. – caraterizados pela suficiente dose de boa vontade deverá oferecer os seus préstimos reflexivos a tempo e fora de tempo e os bispos, mormente os que tiverem assento nas assembleias sinodais agendadas, devem auscultar o genuíno sensus Christi et Ecclesiae, refletir em profundidade e usufruir do direito de intervir sem inibições, de acordo com a consciência do múnus e do sentido de serviço à humanidade.
A lei não tem de ser dura nem deixar de o ser; basta que seja feita para o homem e não vice-versa. E que a lei suprema seja já não a Salus Reipublicae, mas a Salus Animarum, não vertida em código de anátemas, mas em código de inclusão das bem-aventuranças.
A nós, que não temos competências do saber e da intervenção nas pantalhas da ciência e muito menos no areópago sinodal, resta-nos a poderosíssima arma da lex orandi de que é exemplo o final do Instrumentum Laboris:
Oração à Sagrada Família

Jesus, Maria e José, 
em vós nós contemplamos 
o esplendor do amor verdadeiro, 
e dirigimo-nos a vós com confiança.

Sagrada Família de Nazaré, 
fazei também das nossas famílias 
lugares de comunhão e cenáculos de oração, 
autênticas escolas do Evangelho 
e pequenas igrejas domésticas.

Sagrada Família de Nazaré, 
nunca mais nas famílias se viva a experiência 
de violência, fechamento e divisão: 
quem quer que tenha sido ferido ou escandalizado 
conheça depressa a consolação e a cura.

Sagrada Família de Nazaré, 
o próximo Sínodo dos Bispos 
possa despertar de novo em todos a consciência 
da índole sagrada e inviolável da família, 
a sua beleza no desígnio de Deus.

Jesus, Maria e José, 
ouvi e atendei a nossa súplica.


Amém.