terça-feira, 24 de junho de 2014

A propósito das declarações de Cristiano Ronaldo

Uma das particularidades comunicacionais deste campeonato mundial do mundo de 2014, organizado pelo Brasil, conta-se, a par da entrada das equipas em campo com um número de criancinhas equivalente ao dos membros da cada equipa, a série de conferências de imprensa geridas por diferentes jogadores em regime de sucessividade. Isto sem impedir que hic et nunc seja dada a palavra a técnicos e jogadores em outras ocasiões. Tal é o poder irresistível da Comunicação Social para aliciar personalidades, dar uma ajudinha à sua promoção pública e satisfazer o seu ego pessoal e profissional.
Todavia, sem negar ou desvalorizar o direito de alguém pegar num microfone, no quadro da inquestionável liberdade de pensamento e de expressão, é de reconhecer que algumas pessoas não dispõem da noção do justo equilíbrio quando são chamadas a gerir as vicissitudes da capacidade técnica própria e dos seus semelhantes e ultrapassam facilmente as marcas.
Tal parece ser o caso das declarações prestadas por Cristiano Ronaldo após o fim da partida futebolística com os EUA, que terminou empatada a duas bolas. O capitão da equipa de Paulo Bento falou à imprensa, mostrando-se conformado com as duas más prestações na prova mundial em solo brasileiro, que tem dispensado a melhor simpatia aso portugueses. O capitão da seleção nacional remeteu o favoritismo do sucesso, que alegadamente nunca estivera do lado português, para outras seleções congéneres e confessou que nunca acreditara no triunfo da equipa das quinas.
“Temos que ser humildes e saber a capacidade que temos. Neste momento, há melhores seleções e melhores jogadores que os nossos. Somos uma equipa média, se calhar, sim. Seria mentir se dissesse que éramos uma seleção de topo”. – Declarou o famoso jogador do Real Madrid.
Escuda-se ele e seus admiradores na justificação de que falara a título pessoal. Todavia, é muito difícil admitir que passe para a opinião pública a ideia de que é possível tomar, numa circunstância como esta, uma declaração de caráter meramente pessoal. Ninguém olha para o considerado melhor jogador do mundo como se tivesse despido a farda de líder da seleção de Portugal neste campeonato mundial, para classificar, a título meramente pessoal, de equipa média um grupo que ultrapassou os escolhos que encontrou para entrar no competitivo areópago mundial.
De facto, temos que ser humildes e reconhecer a capacidade que temos e valorizar a capacidade dos outros. Porém, não se afigura legítimo partir para um empreendimento desta envergadura sem fé nas capacidades médias de si próprio, de cada companheiro e da equipa, sobretudo se a sua coordenação depende do declarante. O próprio selecionador deu a mão à equipa e concretamente a Ronaldo, sempre manifestando a capacidade da equipa, a necessidade de trabalho e imputando a responsabilidade da primeira derrota à equipa na sua globalidade e não especialmente a Ronaldo.
Também é certo que no âmbito do futebol não é provável que haja milagres. Todavia, é interessante e pertinente atentar nas palavras do Padre Vítor Melícias, que afirma que até os milagres bíblicos operados por Cristo implicavam a fé. Ora, nestes termos, a primeira condição para haver milagre disponível para Portugal nesta competição mundial é que eles (jogadores e técnicos) acreditem, tenham fé desportiva.
Ora, Cristiano reconheceu que não visualizava Portugal como campeão do mundo: “Portugal nunca foi favorito, nunca pensei que poderia ser campeão do Mundo, sinceramente. Aliás, basta ver a qualificação e a necessidades dos jogos com a Suécia, foi difícil desde o princípio”. – Justificou.
Embora o homem não possa dispensar-se de dizer toda a verdade e só a verdade, é desejável que o líder saiba gerir os momentos e as doses da revelação da mesma. Cristiano deveria, do meu ponto de vista, ter atentado na gravidade da situação com que se depara a equipa nacional, à qual, no quadro da responsabilidade de solidariedade e de liderança que detém para com ela, deveria uma palavra de conforto e de estímulo para os dias que se avizinham. 
Com efeito, a seleção das quinas está com pé e meio fora do Mundial, depois de uma estrondosa derrota com  a poderosa Alemanha e um empate comprometedor diante dos estranhos Estados Unidos da América, no ambiente quente e húmido de Manaus.
De calculadora ou de tablet nas mãos, como avisam os observadores, os portugueses voltam a fazer mirabolantes contas, procurando uma combinação milagrosa que lhes dê a passagem à fase seguinte. Para tal, torna-se imperioso vencer a seleção do Gana, condição essencial para se pensar em resolver com o favor da sorte aquilo que não se soube até agora determinar exclusivamente dentro das quatro linhas.
Assim, que ânimo pode o capitão Ronaldo imprimir às suas “tropas” depois de ter badalado Urbi et Orbi o seu ceticismo sobre as capacidades de Portugal e de ter oferecido ao mundo as afirmações de sua descrença ab initio, embora com o presunçoso remendo de que poderia ter ficado pelas vitórias em campeonatos disputados pelo seu clube, mas afiançando untuosamente que estava ali para ajudar, para colaborar, para fazer o seu melhor. Era o que faltava estar ali para complicar ou para se exibir!
Valha-nos a declaração equilibradamente crente do declarante que lhe sucedeu na Comunicação Social, jogador menos visível, mas seguramente mais contido e, esse sim, mais humilde.
De resto, é necessário declarar que aqueles que não têm jeito para gerir negócios públicos frente à comunicação social, como o atual governo e os tugas da bola, não devem privilegiar o uso indiscriminado dos briefings com jornalistas e fotógrafos. Como também é de recordar que quem só sabe de futebol nem de futebol sabe. Ou seja, beber o chá do equilíbrio e resistir à tentação do deslumbramento perante os fãs, aplicar-se acurada e insistentemente nos objetivos e tarefas próprios da atividade, oportuna e inoportunamente, com saber, entrega e atualização devem ser as marcas fundamentais do profissional e do líder.
Se calhar, é de exigir ao futebolista o saber académico, o saber desportivo, o saber profissional num quadro de segura deontologia e humana solidariedade. Que pena o desporto ter-se transformado no negócio dos grandes, na guerra dos interesses, na fonte de dinheiro fácil, no esquema do vale tudo”, no vedetismo da áurea mediania!

Sem comentários:

Enviar um comentário