quarta-feira, 30 de outubro de 2019

Reabriu, envolto em polémica, o complexo do Palácio de Cristal


Com capacidade para oito mil lugares, o recinto reabriu envolto em polémica, no passado dia 28 de outubro, sem a presença da atleta que dava o nome ao Pavilhão, sem os vereadores do PS, do PSD e da CDU, bem como do Presidente da República, embora deste não se saiba se a ausência sucedeu por discordância da designação ou por motivos de saúde, até porque se sujeitou hoje, dia 30, a um cateterismo e desobstrução das coronárias,
Em causa está a introdução da designação “Super Bock Arena” antes da designação anterior “Rosa Mota”. Esta designação “Super Bock Arena”, no centro do conflito entre a atleta e a Câmara Municipal do Porto a quem cabia autorizar ou não a alteração do nome do pavilhão, foi proposta em 2018, como suplemento. E, segundo a atleta, a nova designação resultou de uma decisão tomada à revelia do acordado com a Câmara Municipal do Porto.
O consórcio responsável pela reabilitação do pavilhão Rosa Mota no Porto assegurava em 2018 que não se tratava de uma alteração da designação formal, que se manteria Pavilhão Rosa Mota, mas apenas da “adoção suplementar do branding” prevista no caderno de encargos.
No anexo que suportava a proposta apresentada e aprovada com os votos contra do PS, PSD e CDU, na reunião do executivo de novembro de 2018, o consórcio Círculo de Cristal, que venceu o concurso público internacional, solicitava “autorização para acrescentar”, no uso corrente do Pavilhão Rosa Mota e durante a vigência do contrato, a marca comercial “Super Bock Arena” à designação, como previsto no respetivo caderno de encargos. E garantia:
Não se trata, por isso, de um pedido de alteração da toponímia ou designação formal do equipamento, que se manterá ‘Pavilhão Rosa Mota’, como é vontade da Câmara Municipal do Porto e do concessionário, mas apenas a adoção suplementar de branding, neste caso de uma empresa com fortes ligações à cidade e à região”.
Esta possibilidade de alteração da designação estava prevista no caderno de encargos e no contrato de reabilitação do equipamento, cabendo sempre ao município aprovação ou não do naming, como demonstra a proposta de autorização, onde o município refere que houve um primeiro pedido efetuado pelo concessionário, que o presidente Rui Moreira não aceitou.
No documento, sustenta-se que esta proposta “não altera a designação formal ou corrente do equipamento, traduzindo-se apenas na adoção suplementar de branding”, salvaguardando assim “a ligação de um dos mais importantes e emblemáticos equipamentos da cidade a uma das maiores atletas da história do desporto português, que nasceu e cresceu na cidade do Porto”.
Todavia, na reunião do executivo do dia 28, o Presidente da Câmara Municipal, o independente Rui Moreira, em resposta aos vereadores que defendiam que a autarquia devia exigir o cumprimento do que foi aprovado, disse que o “incómodo” existente com a nova denominação é com o logótipo, sublinhando que autarquia não tem meios, nem recursos para se opor. Também disse que a atleta manteve reuniões com a Super Bock, as quais a autarquia foi alheia, uma vez que o contrato que existe é com o concessionário. E sublinhou que a proposta do nome fazia parte do caderno de encargos, pelo que era legítimo ao concessionário propor a sua alteração, mas lembrou que a primeira designação proposta foi recusada porque fazia desaparecer o nome “Pavilhão Rosa Mota”.
Também o Bloco de Esquerda disse estar contra a alteração do nome do Pavilhão Rosa Mota, tendo desafiado a Câmara do Porto a promover uma discussão alargada para o regresso daquele equipamento à esfera pública e municipal. Assim, em comunicado, a Comissão Coordenadora Concelhia do Bloco de Esquerda – Porto diz querer “reverter de imediato esta apropriação indevida, impedindo a alteração do nome daquele que é e será, para o Porto, o Pavilhão Rosa Mota” ao mesmo tempo que pretende uma “discussão alargada na cidade que permita a renegociação do contrato e seu regresso à esfera pública e municipal”.
Lembrando ter estado “contra a entrega do Palácio de Cristal a entidades privadas pela mão de Rui Rio, em 2009, a par do movimento que na altura se gerou no Porto” e que em 2014 “denunciaram na Assembleia Municipal o modelo de reabilitação deste equipamento municipal essencial à cidade, votando contra a proposta de entrega a privados apresentada por Rui Moreira”, o BE aponta para as contas do município para justificar a sua posição.
Na proposta, o município afirmava que o modelo encontrado para a reabilitação do Pavilhão Rosa Mota “é favorável ao interesse público”, representando, além do mais, uma vantagem financeira para a Câmara que “receberá – além de direitos na utilização do equipamento – um valor de quatro milhões de euros [por ano] ao longo de 20 anos”.
Porém, na proposta não consta o valor pelo qual o concessionário cedeu a exploração do naming ao Grupo Super Bock e sobre o qual a autarquia não recebe qualquer percentagem. O Grupo Super Bock também não o esclareceu. E o arquiteto José Carlos Loureiro, autor do projeto do edifício inaugurado em 1952 e então chamado “Pavilhão dos Desportos”, escusou-se a comentar a polémica, por considerar que “não houve qualquer tipo de consideração” pela sua pessoa, enquanto autor.
Entretanto, a nova designação do Pavilhão foi já adotada pela aplicação de navegação ‘Google Maps’, onde surge com a designação de “Super Bock Arena – Pavilhão Rosa Mota”.
Não foi por acaso ou inocentemente que, a 8 de outubro, o Presidente da República afirmava, num intervalo na audição dos partidos, para inaugurar o programa desportistas no Palácio de Belém: “a Rosa Mota é mais importante do que todos os governos ou presidentes de Portugal”.
A não comparência da atleta e dos vereadores do PS, PSD e CDU na cerimónia de inauguração tem a ver com o facto de não se conformarem com a “menorização” do nome da campeã olímpica no frontispício.
Não obstante, o Presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Moreira, na cerimónia passou praticamente ao lado da polémica, enfatizando que antes de haver um Porto conhecido pelo desporto e pela cultura, “já o era devido ao Vinho do Porto”.
Embora se admita que a Câmara Municipal não tem força para impor o alegado cumprimento do acordado – habitualmente quem paga manda – e considerando que é melhor a recuperação do Pavilhão com a designação atual do que mantê-lo com a designação anterior, mas totalmente degradado e quase inutilizável, é de vincar que a cidade do Porto está umbilicalmente ligada ao vinho (como está ligada às tripas), mas não tem de estar totalmente aos pés do vinho. No caso vertente, o imóvel está ligado ao desporto, tanto assim que a designação inicial era “Pavilhão dos Desportos”. E a designação de “Pavilhão Rosa Mota” resulta da prestação olímpica e de outras da atleta portuense, não valendo também perguntar – como alguns fazem – o que ela fez ou não pela cidade, pois, sem cair no exagero de Marcelo Rebelo de Sousa, há que dizer que a atleta honra o nome de Portugal e da cidade do Porto naquilo que ela melhor sabe fazer e que ajuda a projetar o país para o mundo da fama. Terra que não saiba reconhecer os seus ilustres – coevos ou antepassados – tem um futuro duvidoso.
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A propósito da polémica em volta da atleta Rosa Mota, que ficou indignada, por conta de o seu nome ficar associado ao do patrocinador das obras do pavilhão (a Super Bock), Rui Moreira, escreveu na manhã do dia 29, na sua página pessoal do Facebook, que “o tempo, nestas coisas, é o melhor conselheiro”. Num texto em que o autarca se congratula com o facto de o pavilhão Rosa Mota já estar “de novo ao serviço de uma cidade que não tinha um espaço multiusos”, Rui Moreira reitera que, “ao contrário do que foi escrito e dito, a toponímia não mudou” e frisou:
Respeitámos o nome da minha amiga Rosa Mota e ainda fizemos algo que – desde que em 1991 aceitou batizar o então ‘Pavilhão dos Desportos’ – nunca tinha acontecido. O seu nome passou a estar agora inscrito na fachada e pela primeira vez.”.
E, quanto ao mau estar de Rosa Mota – por ter o seu nome associado a uma bebida alcoólica – Rui Moreira foi perentório:
Não tenham problemas com ‘bebidas alcoólicas’. Quando o Porto era uma cidade quase desconhecida, foi o Vinho do Porto que a promoveu.”.
O autarca, no Facebook, repetiu a ideia divulgada no esclarecimento no dia 28:
Não acredito que o nome da atleta fosse mais respeitado com um pavilhão em ruína, sem uso e sem o seu nome lá escrito, do que agora que empresas portuguesas e do Porto nele decidiram investir muitos milhões e modernizar.”.
E concluiu:
Mas o tempo, nestas coisas, é o melhor conselheiro”.
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Por seu turno, Rosa Mota prepara-se para maratona em defesa do nome do “seu” pavilhão. Sem grandes comentários à polémica por causa do novo nome daquele que é conhecido por pavilhão Rosa Mota, o ex-treinador e companheiro da atleta diz estar a preparar-se para “uma batalha que vai durar durante vários anos” pela defesa do nome do “Pavilhão Rosa Mota”, que foi inaugurado sob a designação de “Super Bock Arena – Rosa Mota”, uma designação que fora acordada como suplementar.
O desabafo que faço é que estou a preparar-me para uma batalha que vai durar vários anos”, afirmou em declarações à Lusa, José Pedroso, que se escusou a tecer qualquer outra declaração.
Em carta dirigida à Câmara Municipal do Porto, conhecida no dia 28, Rosa Mota diz sentir-se enganada aduzindo que o seu nome foi subalternizado para destacar uma marca de bebidas alcoólicas. Com efeito, nessa carta, a campeã olímpica contou que, em 2018, foi chamada à Câmara para se reunir com Rui Moreira e que no encontro o edil garantiu ser o seu nome intocável. “Sabendo do meu constrangimento em que o meu nome esteja ligado a uma bebida alcoólica e até da legalidade discutível desta situação”, Rui Moreira terá respondido: “Mas se a Rosa pudesse aceitar a bebida alcoólica a cidade beneficiaria muito”. Em reunião posterior com a vereadora Catarina Araújo, Rosa Mota concordou “com a designação Pavilhão Rosa Mota/Super Bock Arena, rejeitando a proposta Super Bock Arena/Pavilhão Rosa Mota”. E esclareceu ainda: “Foi em função do primeiro logótipo que dei a minha anuência à proposta que a senhora vereadora levou à reunião camarária de 27 de novembro”.
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Do meu ponto de vista, Rui Moreira não tem razão em enfatizar, no caso do Pavilhão, a ligação da Cidade ao vinho para justificar tudo, pois também há a ligação ao desporto e é válido também para o Porto o aforismo “mens sana e corpore sano”. E não tem razão em dizer que não houve mudança toponímica, porque ela existe e é inegável. Não se trata aqui da propriedade comutativa da adição ou da multiplicação segundo a qual a ordem das parcelas ou dos fatores, respetivamente, é arbitrária para o resultado. Porém, tem razão ao afirmar que, agora o nome da atleta consta da fachada e do logótipo, o que antes não acontecia, e que é melhor o Pavilhão estar recuperado e utilizável do que manter-se com a designação, mas degradado. É pena que o concessionário e o grupo interessado não tenham mantido a designação como fora acordado. Havia tanta forma de fazer marketing e promoção em torno do “Pavilhão Rosa Mota” e dos seus eventos e atividades…
Por outro lado, pergunto-me: Valerá a pena a atleta bater-se por uma insignificância destas? Será isso que a fará feliz e não a consciência de que fez carreira esforçada e brilhante com o nome de Portugal e com merecido reconhecimento e aplauso? E a Câmara e os locatários não deveriam respeitar as decisões históricas ou o dinheiro pode impor os seus caprichos?
2019.10.30 – Louro de Carvalho

Centeno fora do debate do Programa de Governo


Sobre o debate parlamentar
O Executivo divulgou os nomes dos ministros que intervirão no debate do Programa de Governo, que foi aprovado no Conselho de Ministros do passado dia 26, logo após a tomada de posse do Governo, e que está a ser discutido nestes dias (30 e 31). Ora, após uma campanha eleitoral apoiada nas contas certas, Costa dá palco a outras apostas programáticas, designadamente o Ambiente, a Presidência e a Economia. Assim, em vez de Mário Centeno – um dos governantes mais presentes no espaço mediático nos últimos 4 anos –, os holofotes vão para João Matos Fernandes, Mariana Vieira da Silva e Pedro Siza Vieira.
Depois da abertura do debate pelo Primeiro-Ministro, no período de debate estão os três ministros coordenadores das áreas transversais do Governo: as alterações climáticas, a demografia, as desigualdades e a transição digital. E o encerramento, que ocorrerá amanhã, dia 31, ficará a cargo de Augusto Santos Silva, Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Assim, de todos os ministros de Estado (ao todo são 4) apenas um não intervém no debate do Programa de Governo, o documento que serve de guião para as medidas e políticas a adotar na XIV Legislatura. E Centeno foi um dos ministros que mais participou nos debates relevantes na legislatura passada. Em 2015, foi o Ministro das Finanças que fechou o debate do Programa de Governo, tendo falado sobre o impacto das medidas negociadas à esquerda para a formação do Governo. E, em 2019, foi também Centeno que fez o encerramento do debate do Estado da Nação, tendo deixado uma mensagem que acabou por ditar toda a campanha eleitoral, ao apelar aos partidos a que não entrassem em leilões eleitorais. Também durante a campanha eleitoral assumiu protagonismo ao desafiar o líder do PSD para um debate sobre contas públicas. E  uma sondagem sobre intenções de voto colocava-o ao lado dos líderes dos maiores partidos.
O Programa de Governo, com 191 páginas, tem estrutura semelhante à do programa eleitoral do PS, mas difere da usual organização temática por ministérios que caraterizou os documentos de outros executivos. Após um capítulo com 4 objetivos de curto e médio prazo – denominado “Boa Governação: contas certas e convergência, investimento nos serviços públicos, melhoria da qualidade da democracia e valorização das funções de soberania” – vêm 4 áreas temáticas: alterações climáticas, demografia, desigualdades, e sociedade digital. E, no âmbito das contas públicas, mantém na agenda a redução da dívida pública, a criação de saldos primários e a contenção da despesa pública.
O deputado do IL (Iniciativa Liberal), que não pode colocar o programa a votação, desafiou o PSD e o CDS a apresentarem uma moção de rejeição ao Governo minoritário do PS e a esclarecerem de forma inequívoca se o aprovam. E apontou os sociais-democratas e centristas, se não o fizerem, como estarem a ajudar a desresponsabilização dos partidos que apoiam o programa.
Porém, na conferência de líderes, do dia 28, que preparou o debate, nenhum dos partidos representados com assento parlamentar, incluindo o PSD e o CDS, anunciou qualquer iniciativa como uma moção de rejeição do programa, que, regimentalmente, só pode ser apresentada por grupos parlamentares e não por deputados únicos, como sucede com Cotrim Figueiredo. Numa entrevista à Lusa, a 13 de outubro, o deputado afirmou votar contra o programa do Governo. De resto, os partidos aproveitam para criticar o PS e o seu líder, que chefia mais um Executivo.
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Sobre o Programa do Governo
Um provedor do animal, um complemento-creche a partir do segundo filho, colocações de professores estáveis e fim dos chumbos no básico são 4 das medidas do Programa, que tem como objetivos estratégicos a consolidação do rumo e dos resultados alcançados desde 2015 e a sustentabilidade de longo prazo das políticas seguidas.
Na introdução do documento, o executivo defende que, até 2023, estaremos perante “um ciclo de consolidação da recuperação económica”. E o texto introdutório adverte:  
É um ciclo em que temos de garantir a sustentabilidade no longo prazo do trajeto virtuoso que construímos. Virada a página da austeridade, será neste novo ciclo que se devem reforçar as condições para que Portugal vença os desafios estratégicos da próxima década. É para este desígnio que concorrem quatro desafios estratégicos: combater as alterações climáticas; responder ao desafio demográfico; construir a sociedade digital; e reduzir as desigualdades.”.
Considera-se que, para Portugal ter sucesso a enfrentar estes 4 desafios estratégicos, tem de garantir um conjunto de regras de boas de governação, tais como “contas certas para a convergência com a União Europeia, melhoria da qualidade da democracia, investimento na qualidade dos serviços públicos e valorizar as funções de soberania”.
Será executado na sequência duma legislatura de recuperação da confiança e da dinamização da procura interna que induziram relançar o relançamento do crescimento económico, registando em 2017 e 2018, os únicos anos de convergência com a Zona Euro desde a adesão de Portugal à moeda única. E além disso, o Executivo frisa que se verificou “a maior série de criação de emprego de que há registo, com redução para metade do desemprego”, e se assistiu a “uma redução significativa da privação material e a saída de mais de 180 mil pessoas da pobreza, com a desigualdade a atingir os mais baixos valores de sempre”. E o Programa acrescenta:
Portugal apresenta contas públicas equilibradas pela primeira vez na sua história democrática, registando-se há três anos os défices mais baixos da nossa democracia, e tendo a dívida sido reduzida para 118% do Produto Interno Bruto. Depois de cumprido com êxito o programa de recuperação de rendimentos e da confiança, da economia e do emprego, bem como das finanças públicas e da credibilidade internacional do país, abre-se agora um novo ciclo na sociedade portuguesa.”.
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O detalhe em poucas páginas segundo tópicos selecionados
Na educação, ensino e ação social
O Governo criará um complemento-creche, atribuindo aos cidadãos com filhos nas creches “um valor garantido e universal” como comparticipação no preço que as famílias pagam pela creche a partir do segundo filho, com vista a oferecer melhores condições para a decisão dos pais em terem mais filhos, pois lembra o executivo:
Em Portugal, o número de horas de trabalho semanais é dos mais elevados e persistem ainda desigualdades significativas entre homens e mulheres na repartição do trabalho não pago e na conciliação entre trabalho e família”.
Por outro lado, o Governo quer incentivar os empregadores, com estruturas intensivas em mão-de-obra, a disponibilizar equipamentos ou serviços de apoio à infância; e quer promover um programa de alargamento das respostas de apoio à família, alargando a rede de creches e fomentando a universalização da educação pré-escolar e a garantia de que, neste nível etário, é dada a possibilidade a todas as crianças até aos 3 anos de dormirem a sesta.
O Governo quer mudar os concursos de professores para dar mais estabilidade aos docentes e diminuir as áreas geográficas em que podem ser colocados, bem como lançar um plano para acabar com as retenções e reprovações no ensino básico. E quer estudar o modelo de recrutamento e colocação de professores com vista à introdução de “melhorias que garantam maior estabilidade do corpo docente, diminuindo a dimensão dos quadros de zona pedagógica”, o que pode significar que os professores lecionem mais perto de casa.
Consta a intenção de elaborar diagnóstico a curto e médio prazo (5 a 10 anos) da necessidade de professores nas escolas, “que tenha em conta as mudanças em curso e as tendências da evolução na estrutura etária da sociedade e, em particular, o envelhecimento da classe docente”. Consta também a necessidade de professores nas regiões do país onde há escassez, da melhoria da formação contínua e de as escolas serem mais digitais e com melhor ligação à Internet. Por outro lado, o Governo quer mais autonomia para as escolas, dando-lhes poder de decisão em matérias como o número de alunos por turma, “mediante um sistema de gestão da rede”. E, ao nível da gestão, quer o modelo de administração escolar mais adequado ao processo de descentralização para as autarquias, com mais meios técnicos, permitindo que as escolas recorram a “bolsas de técnicos no quadro da descentralização”.
Do ponto de vista dos alunos, o executivo assume ter de eliminar os chumbos no ensino básico, trabalhando de forma intensiva e diferenciada com os alunos que revelam mais dificuldades, bem como ter de reforçar o combate ao abandono e insucesso escolar, sobretudo do ensino secundário. Também as escolas com piores resultados devem ter autonomia reforçada, adequando a oferta curricular ao seu público específico e reforçando, por exemplo, o ensino das línguas, artes ou desporto, os programas de mentoria entre alunos, para “estimular a cooperação entre pares”, e uma aposta clara no ensino da matemática, a disciplina com mais insucesso.
O Governo quer também copiar o modelo de muitos colégios privados ao pretender “promover programas de enriquecimento e diversificação curricular nas escolas públicas, nomeadamente assentes na formação artística, na introdução de diferentes línguas estrangeiras e de elementos como o ensino da programação, permitindo que as escolas especializem a sua oferta educativa”.
No combate ao insucesso, há medidas de reforço de ação social e apoio a famílias vulneráveis, mas também a aposta na deteção precoce de dificuldades, com maior atenção na educação pré-escolar a dificuldades de linguagem e numeracia. E compromete-se com um alargamento sistemático da rede pública da educação pré-escolar, com a produção de orientações para a creche e com a revisão do modelo das AEC (atividades de enriquecimento curricular).
Para o ensino superior inclui-se o reforço da ação social, mais camas em residências públicas, um acesso mais barato a mestrados e uma diversificação de públicos a partir das diversas formações do ensino secundário, a fim de promover a universidade ao alcance de todos. Sobre custos deste ensino enuncia-se a partilha de custos” entre o Estado e as famílias, sem especificar medidas. E, entre os objetivos está a criação dum automatismo de continuidade na atribuição de bolsas de ação social no ensino superior a quem já beneficiava delas no ensino secundário.
Na qualificação de adultos, manter-se-á a aposta no programa “Qualifica” e promete-se “um período sabático garantido para os adultos se poderem requalificar. E o Estado dará o exemplo enquanto empregador e aprofundará o “Qualifica” na administração pública, contribuindo para o “esforço de qualificação dos portugueses”.
Na cultura
No conjunto de propostas para a Cultura, pretende-se “aumentar, de forma progressiva, a despesa do Estado em Cultura, com o objetivo de atingir 2% da despesa discricionária prevista no Orçamento do Estado”, reforçando a Conta Satélite da Cultura, o Plano Nacional das Artes 2024, o papel dos teatros nacionais. E define-se como objetivo, no setor, a criação do Museu Nacional da Fotografia (com dois núcleos no país) e do Museu Nacional de Arte Contemporânea.
No campo do Património, visa-se lançar medidas para promover o envolvimento de todos na missão nacional de reabilitação do património cultural, nomeadamente criar a ‘Lotaria do Património’ e a campanha ‘Um Cidadão, Um Euro’, para o património cultural, repensar os incentivos ao mecenato cultural, programar artes performativas nos hospitais e estabelecimentos prisionais e criar uma bienal cultural infantil para promover a inclusão pela arte.
Para a Cinemateca é defendida uma “estratégia integrada” que passa pela modernização do modelo de gestão, de modo a reforçar a sua missão central de preservação do cinema e divulgação descentralizada, em rede e em cooperação com parceiros, bem como do laboratório, adequando-o às melhores práticas de arquivo, preservação e digitalização do património, reforçando o posicionamento do Arquivo Nacional da Imagem em Movimento nos planos internacional, de cooperação institucional e facilitação dos filmes para exibição pública.
O Programa inclui uma medida para aumentar a idade mínima para acesso a espetáculos tauromáquicos (que atualmente está nos 12 anos) eventualmente para os 16 anos.
Nas forças armadas
O Governo compromete-se a reforçar a participação das mulheres nas Forças Armadas, “dignificar e apoiar os antigos combatentes” e melhorar “a reinserção profissional dos militares em regime de contrato”. Foi criada a Secretaria de Estado dos Recursos Humanos e Antigos Combatentes, que prevê “dignificar e apoiar os antigos combatentes, incluindo os deficientes das Forças Armadas”, procurando “soluções para o acompanhamento da nova geração de militares sujeitos a riscos físicos e psicológicos”.
Pretende-se, igualmente, continuar a adequar os “mecanismos de recrutamento e retenção” nas Forças Armadas às necessidades do país com “novos mecanismos de gestão de carreiras”, para dar resposta às necessidades dos militares, bem como promover a reinserção profissional dos militares em regime de contrato e dos que optem pela passagem à reserva em idade ativa.
            Na proteção civil
O Governo adquirirá meios aéreos próprios para combater incêndios rurais de acordo com as prioridades definidas pela Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil e Força Aérea.
Na proteção civil, o Programa quer a definição dum modelo de resposta profissional permanente com a participação da Força Especial de Proteção Civil, da GNR, das Forças Armadas, dos bombeiros sapadores, municipais e das equipas de intervenção permanente das associações de bombeiros voluntários, bem como a definição dos requisitos tecnológicos e do modelo de gestão da rede de comunicações de emergência do Estado após o final da concessão à SIRESP.
Será implementado o novo modelo territorial de resposta de emergência e proteção civil, baseado em estruturas regionais e sub-regionais, em articulação com as entidades competentes e com a participação dos bombeiros voluntários e das autarquias locais. E aprovar-se-á o Programa de Proteção Civil Preventiva de 2020 até 2030 (integrando todas as áreas de gestão de risco de catástrofe com um plano de financiamento associado e utilizando recursos nacionais e europeus) e concretizar-se-á o Plano de Gestão Integrada de Fogos Rurais (designadamente o programa “aldeia segura”) e salvaguardar-se-á o funcionamento dos serviços públicos e das infraestruturas críticas.
No ambiente e ecologia
O Governo quer abolir os plásticos não reutilizáveis e pretende definir um horizonte próximo, que não concretiza ainda, para a abolição progressiva de outras utilizações do plástico. E quer estimular as empresas a assumirem compromissos voluntários de eliminação ou redução do plástico utilizado nas embalagens de produtos de grande consumo.
Quer ainda tornar obrigatória a separação de resíduos em todos os serviços da Administração Pública e empresas do Estado. E, no âmbito da prevenção de produção de resíduos, pretende lançar um programa nacional, incluindo um plano de comunicação que tenha em consideração diferentes faixas etárias da população. O objetivo é garantir “a reintrodução e a substituição de matérias-primas, numa lógica circular”.
Referindo que Portugal possui um património de flora e fauna bastante rico e diverso, associado a uma grande variedade de ecossistemas, habitats e paisagens, o Programa refere que as alterações climáticas e a atividade humana são fatores que podem desequilibrar este sistema.
Assim, é fundamental atuar na sua proteção ativa, promovendo atividades sociais e económicas cujo objetivo explícito seja a recuperação e regeneração da biodiversidade e, nesse sentido, propõe-se criar um “Provedor do Animal”, promover a cogestão das áreas protegidas, facilitar a visita das áreas protegidas pelos cidadãos, nomeadamente através da “eliminação de restrições excessivas e desproporcionadas que a dificultem” e “promover a fixação das populações residentes em áreas protegidas”, bem como reforçar a prevenção e controlo de espécies exóticas invasoras e de doenças e pragas agrícolas e florestais, em particular nas áreas protegidas e intervir na conservação e de recuperação de espécies (de flora e fauna) e habitats, desenvolvendo programas de apoio ao restauro de serviços dos ecossistemas em risco, assim como de restauro de biodiversidade funcional (como por exemplo polinizadores, plantas medicinais, habitats aquáticos).
            Na violência e discriminação
O Executivo quer “travar o flagelo da violência doméstica”, do namoro e de género e propõe-se “desenvolver um sistema integrado de sinalização de potenciais vítimas e agressores”. Para isso, promove a atuação integrada dos sistemas educativo, de saúde, policial e judiciário e de outros agentes e apostar na prevenção primária. Assim, promete “alargar a Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica, de modo a garantir a cobertura integral do território nacional, oferecendo simultaneamente respostas cada mais especializadas para os vários casos de violência”. E quer “criar um ponto único de contacto para vítimas de violência doméstica, onde seja possível tratar de todas as questões, com garantias de privacidade e assegurando o acompanhamento e a proteção das vítimas”. E o Programa dedica um capítulo ao combate a todas as formas de discriminação e ao reforço do combate ao racismo e xenofobia, incluindo a criação dum observatório do racismo e da xenofobia, bem como a autonomização institucional do combate à discriminação racial do tratamento das questões migratórias.
Na justiça
Uma justiça eficiente, ao serviço do desenvolvimento económico-social, mais próxima dos cidadãos, célere, moderna e acessível é o objetivo do Programa, que recupera várias propostas do anterior executivo socialista e insiste na desmaterialização.
Pretende-se aumentar a transparência e a prestação de contas do serviço público de justiça e contribuir para melhorar a sua qualidade e a eficiência, o que exige celeridade das decisões e um modelo de funcionamento simplificado, bem como a revisão do sistema de custas processuais.
Almeja-se melhor formação dos magistrados, com especial atenção aos crimes de violência doméstica, aos direitos fundamentais, ao direito europeu e à gestão processual.
Pretende-se implementar modelos alternativos ao cumprimento de pena de prisão, reforçar a resposta e o apoio às vítimas de crimes e investir na requalificação e modernização das infraestruturas prisionais e de reinserção social, bem como no acesso a cuidados de saúde dos reclusos, designadamente ao nível da saúde mental. Também se quer a agilizar o tempo de resposta em matéria de perícias forenses, incentivar a composição por acordo entre a vítima e o arguido, aumentar o leque de crimes em que o ofendido pode desistir da queixa e permitir a suspensão provisória do processo para um número mais alargado de crimes.
Defende-se, no cível, a introdução de soluções de constatação de factos por peritos, para evitar o recurso excessivo à prova testemunhal ou a peritagens. Aumentar-se-á o número de julgados de paz e alargar-se-ão as suas competências, nomeadamente para questões de regulação do poder paternal, condomínio e vizinhança.
O aumento da capacidade de resposta dos tribunais administrativos e tributários é outras das medidas, tal como o desenvolvimento de mecanismos de simplificação e agilização processual.
Nos registos públicos é para continuar o reforço da qualidade e da celeridade do serviço, apostando-se na simplificação de procedimentos, balcões únicos e serviços online.
Na gestão e organização de tribunais, aponta-se o reforço das competências de gestão processual e a simplificação da comunicação entre tribunais e outras entidades públicas e com os cidadãos.
Na saúde e 3.ª idade
O Governo criará um mecanismo de reforma a tempo parcial, como forma de promoção do envelhecimento ativo e permanência no mercado laboral, com desagravamento das horas de trabalho e definição de áreas para contratação de cidadãos seniores na Administração Pública, tal como promoverá programas de voluntariado sénior e apoiará iniciativas da sociedade civil.
Também criará formas de atendimento personalizado para cidadãos seniores na prestação de serviços públicos, bem como “aprovar uma estratégia nacional de combate à solidão, prevendo um conjunto diversificado de medidas, ajustadas aos diferentes contextos demográficos e meios socioeconómicos, para atenuar o flagelo social que afeta sobretudo os mais idosos”.
Na saúde para a 3.ª idade, promoverá uma maior integração de cuidados, centrada nas pessoas, através de um plano individual de cuidados que permita o acompanhamento das suas múltiplas patologias de cada paciente e a tomada de decisões partilhadas.
Outro objetivo é dinamizar o ‘cluster’ da saúde, estimulando a inovação e criando condições para alavancar soluções de assistência à autonomia no domicílio, em ligação com a Segurança Social e melhorar as respostas públicas de cuidados domiciliários, designadamente “através da modernização e reforço dos meios ao dispor dos profissionais de saúde que os asseguram”.
Outra promessa é reforçar as respostas de cuidados continuados, em articulação com o setor social e promover respostas de saúde e bem-estar integradas e inteligentes, através da aposta na cooperação entre o SNS (Serviço Nacional de Saúde) e a Segurança Social, bem como reforçar as soluções de transporte de doentes, promovendo parcerias estratégicas entre os serviços centrais e locais de saúde, autarquias e setor social e “investir numa maior literacia em saúde por parte da população com mais de 65 anos de idade, capacitando-a para a gestão da sua saúde e para a utilização efetiva dos recursos e respostas existentes no SNS”. E promete-se proteger os idosos em dependência ou isolamento”, criando um sistema de identificação e sinalização das pessoas vulneráveis e envelhecidas (para vigilância em cuidados de saúde primário). O documento fala em
Desenvolver um sistema integrado de sinalização de idosos isolados, associado a uma garantia de contacto regular, em parceria e estimulando o voluntariado social (…), desenvolver, no âmbito do apoio à dependência, modelos de assistência ambulatória e ao domicílio, em parceria com a saúde”.
Para tanto, propõe-se “criar um novo serviço no SNS, nomeadamente através da utilização de novas tecnologias para a monitorização do estado de saúde de idosos para, numa base estritamente voluntária e com proteção da privacidade, assegurar um acompanhamento de proximidade e de emissão de alertas de urgência à saúde de idosos isolados.
O Governo compromete-se a não fazer nenhuma PPP na gestão clínica dos estabelecimentos de saúde onde ela não exista. E assume que, na saúde, o recurso à contratação de entidades terceiras (privado ou social) é condicionado “à avaliação de necessidade”, em linha com o que defendeu na discussão da Lei Bases da Saúde, diploma em vigor, mas que precisa de ser complementado por diplomas de desenvolvimento e de regulamentação para que se cumpra o desígnio humanista e constitucional de saúde de qualidade para todos. 
Na defesa do consumidor
O Programa integra várias medidas de proteção do consumidor. E é nesta linha que se enquadra a promessa de avaliação do “quadro regulatório das comissões bancárias, assegurando os princípios da transparência ao consumidor e da proporcionalidade face aos serviços efetivamente prestados”. Seguindo esta linha, o Programa promete medidas para “garantir a inexistência de comissões associadas ao levantamento de dinheiro e outros serviços disponibilizados nas Caixas Multibanco”, bem como para prevenir e punir técnicas “agressivas e inapropriadas de vendas e publicidade” potencialmente encorajadoras do sobre-endividamento dos consumidores, tendo em especial atenção os consumidores mais vulneráveis.
Entre as medidas que integram o Programa inclui-se ainda o lançamento de uma plataforma eletrónica que permita a resolução de contratos de telecomunicações, sem necessidade de interação física entre os consumidores e os operadores do setor.
No turismo
O Governo pretende que Portugal seja um destino turístico “sustentável e inteligente” e promete digitalizar a oferta nacional, nas suas diferentes dimensões, das empresas aos serviços, passando pelas “experiências e recursos” e desenvolver um programa de turismo ferroviário. Para tanto, o Programa apresenta uma lista de tarefas para “continuar a apostar no turismo” como forma de aumentar as exportações, incluindo a concretização de uma Estratégia Turismo 2030.
Outra proposta é posicionar Portugal como “país de caminhos cénicos, trilhos e percursos cicláveis”, através dum modelo de gestão de rotas para dar visibilidade aos destinos, bem como da criação duma plataforma nacional para a partilha de conteúdos e de roteiros, realçando a diversidade da oferta, nomeadamente quanto à natureza, património, cultura, tradições, gastronomia, vinhos e realização de eventos.
Serão alargados a imóveis públicos devolutos os programas ‘Revive Património’ e ‘Revive Natura’. Na área da mobilidade dos turistas que visitam o país, o objetivo é implementar o “Passe Portugal”, com ‘seamless experience’, incluindo bilhética e compra.
O Executivo criará um programa nacional de promoção de Portugal como destino LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgénero e Intersexo), incluir o alemão, o francês e o mandarim nos ‘curricula’ das escolas de turismo e reforçar condições de competitividade de Portugal como destino de filmagens internacionais. E, na lista dos projetos está ainda a concretização de ‘one stop shops’ dedicada às ‘startups’ e empresas do setor para “assegurar uma resposta rápida por parte da Administração Pública a novas realidades”.
O Programa recorda que o turismo é líder no crescimento de exportações, com a subida de 45% das receitas turísticas nos últimos 4 anos, e tem sido poderoso instrumento de posicionamento internacional e de coesão económica, social e territorial. Assim pode ler-se no documento:
Esta aposta e este esforço têm de ser continuados, por públicos e privados, para garantir que Portugal continua a liderar como o destino turístico mais sustentável, autêntico e inovador para viver, investir, trabalhar, estudar e filmar – além do melhor destino para visitar”.
No SEF e imigração
Far-se-ão alterações no SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) para haver separação clara entre as funções policiais e administrativas de documentação de imigrantes. E, além da atuação no combate às redes de tráfico humano na prevenção do terrorismo, diz o Programa:
 Há que reconfigurar a forma como os serviços públicos lidam com o fenómeno da imigração, adotando uma abordagem mais humanista e menos burocrática, em consonância com o objetivo de atração regular e ordenada de mão-de-obra para o desempenho de funções em diferentes setores de atividade. Para este efeito, o Governo irá estabelecer uma separação orgânica muito clara entre as funções policiais e as funções administrativas de autorização e documentação de imigrantes.”.
Assumindo que Portugal precisa do “contributo da imigração” para o seu desenvolvimento económico e demográfico, o Programa apresenta várias medidas para atrair estrangeiros ao país e simplificação de procedimentos, pretendendo criar “canais formais de migração”, desde os países de origem e garantir que os imigrantes “não se transformem em indocumentados ou à margem do sistema”. Neste sentido, é preciso agilizar e simplificar os processos de entrada, eliminar o regime de contingentação do emprego, antecipar um título temporário de curta duração que permita a entrada legal em Portugal de imigrantes com o objetivo de procura de emprego, promover e modernizar convenções de segurança social e simplificar e agilizar os mecanismos de regularização do estatuto de residente, além da concretização de programas de regularização de cidadãos estrangeiros, designadamente através de ações de proximidade junto da comunidade escolar e aprofundando o programa SEF em Movimento.
O Governo reverá o regime de autorização de residência para investimento (vistos Gold), que “passará a ser dirigido preferencialmente às regiões de baixa densidade, ao investimento na criação de emprego e na requalificação urbana e do património cultural”.
O Executivo estudará “a implementação de um cartão de cidadão estrangeiro equiparado ao cartão de cidadão, dispensando as duplicações na apresentação de documentos emitidos por entidades públicas”. E criará um serviço móvel de informação e regularização de imigrantes na área metropolitana de Lisboa e em regiões com elevado número de trabalhadores estrangeiros, simplificando e encurtando os procedimentos de renovação de títulos de residência em Portugal.
No plano da imigração, o Governo criará uma zona de mobilidade e de liberdade de fixação de residência entre os países da CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa), lançará programas de apoio à captação de quadros qualificados e de empreendedores nas áreas tecnológicas e de alto valor acrescentado e promoverá programas de apoio à captação de estudantes e investigadores estrangeiros pelas instituições de ensino superior portuguesas.
O Programa do XXII Governo Constitucional balança entre a excessiva cautela (não compromisso) e um arrojo que dificilmente será credível. E, sobretudo subvaloriza taticamente “as contas certas”. Mas é o programa com que o Governo se apresenta ao país sem contestação de fundo!
2019.10.30 – Louro de Carvalho

segunda-feira, 28 de outubro de 2019

A Educação no programa do XXII Governo Constitucional


É um dos parâmetros do que foi definido como o 3.º desafio do programa: Mais e melhores oportunidades para todos, sem discriminações – e a que se responde com 6 grandes objetivos: Apostar na escola pública como elemento de combate às desigualdades; Combater as desigualdades à entrada e à saída da escola; Investir no futuro coletivo, reforçando o investimento no ensino superior; Estimular a entrada e combater o abandono; Promover o acesso à formação e qualificação ao longo da vida; e Aprofundar o programa Qualifica como chave para a elevação de qualificações da população adulta. (vd Programa, pgs 141-146).   
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Apostar na escola pública como elemento de combate às desigualdades
O direito a uma Educação que responda aos desígnios dos cidadãos e da sociedade é pilar fundamental do desenvolvimento e um aspeto fundacional da nossa democracia portuguesa. E, fomentando o exercício deste direito, promove-se o desenvolvimento dos indivíduos e alcança-se a sociedade justa e esclarecida. Para tanto, há que ter em conta a função social da escola pública, que só estará inteiramente cumprida quando a origem de cada um não for relevante para o sucesso ou insucesso escolar.
O Governo, satisfeito com as políticas públicas adotadas na Educação, com os resultados e com o reconhecimento internacional, mas sabendo que se trata dum desafio permanente e tarefa nunca acabada, propõe-se prosseguir sem deixar ninguém para trás, pelo que julga “necessária uma aposta segura na escola pública” enquanto “elemento transformador da vida do indivíduo e da sociedade” e “fator de superação dos constrangimentos do contexto de cada um”.
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Combater as desigualdades à entrada e à saída da escola
Implica a consolidação do acesso à escolaridade universal desde os 3 anos de idade e o ensino obrigatório de 12 anos para que todos acedam a um sistema que responda às necessidades de cada um e se lhes garanta o desejável sucesso. Assim, o Governo:   
- Implementará um sistema de deteção precoce (ao longo da educação pré-escolar) de problemas da linguagem e da numeracia, com programa de estimulação da competência linguística;
- Reforçará a resposta do sistema público na rede da educação pré-escolar, nomeadamente através do desenvolvimento dum estudo global de rede para alargamento sistemático da rede pública;
- Produzirá orientações pedagógicas para a creche;
- Avaliará o modelo das AEC (atividades de enriquecimento curricular);
- Estimulará a fixação de equipas docentes estáveis nos TEIP (territórios educativos de intervenção prioritária);
- Desenvolverá projetos de autonomia reforçada para as escolas com piores resultados, que apostem na gestão curricular especializada, criando ofertas dedicadas às necessidades de públicos específicos (com reforço de línguas, investimento nas artes ou no desporto);
- Criará um plano de não retenção no ensino básico, trabalhando de forma intensiva e diferenciada com os alunos que revelam mais dificuldades;
- Promoverá programas de enriquecimento e diversificação curricular na escola pública, assentes na formação artística, na introdução de diferentes línguas estrangeiras e de elementos como o ensino da programação, com vista à concretização do princípio de educação a tempo inteiro, ao longo da escolaridade básica;
- Reforçará o PNPSE (Plano Nacional de Promoção do Sucesso Escolar), sobretudo no ensino secundário, onde se encontra o principal foco de insucesso;
- Definirá uma estratégia integrada de ação sobre a aprendizagem da matemática, visto que se trata da disciplina com mais insucesso;
- Diversificará medidas que assegurem o cumprimento dos 12 anos de escolaridade obrigatória, garantindo o desenvolvimento pleno do Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória;
- Dinamizará programas de combate ao abandono para alunos com deficiência, apostando na transição entre a escolaridade obrigatória e a vida ativa, pela implementação efetiva de PIT (Planos Individuais de Transição);
- Fomentará programas de mentorado entre alunos para estimular o relacionamento interpessoal e a cooperação entre pares no processo de aprendizagem;
- Melhorará a eficácia dos sistemas de aferição do sistema ensino/aprendizagem;
- Reforçará a orientação vocacional dos alunos;
- Implementará um programa de apoio a famílias vulneráveis, desenvolvendo redes permanentes de apoio à infância e juventude, de base local, que articulem e tornem eficaz a ação da escola, da família e dos serviços da segurança social no terreno;
- Reforçará as políticas de ação social escolar enquanto ferramentas fundamentais de combate às desigualdades e ao insucesso escolar;
- Reforçará os meios de desenvolvimento de programas (nacionais e internacionais) de intercâmbio, envolvendo alunos e professores.
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Investir no futuro coletivo, reforçando o investimento no ensino superior
O caminho percorrido no ensino básico e secundário, nos últimos 4 anos, de consolidação da democratização do acesso à escola pública e sua frequência precisa de ser estendido ao ensino superior. Contrariando a ideia de parte da sociedade portuguesa de que o ensino superior é inacessível, é preciso, em nome das necessidades do país, implantar medidas políticas efetivas. Assim, o aumento do número de diplomados é desígnio fulcral no combate às desigualdades, que só pode ser bem-sucedido mediante o desenvolvimento de um país qualificado, preparado para responder aos desafios de um mundo mais complexo e em constante renovação.  
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Estimular a entrada e combater o abandono
A redução do abandono no ensino superior e o combate às condições que o motivam devem ser coletivamente assumidos como um grande desígnio nacional. Assim, o Governo:
- Aumentará os apoios sociais aos estudantes, em especial no âmbito das bolsas, das residências e do programa Erasmus;
- Incentivará o acesso ao ensino superior dos estudantes do ensino secundário profissional;
- Aumentará o investimento do ensino superior nos adultos, diversificando e adequando ofertas;
- Criará um número de vagas de mestrado acessíveis por mérito a preços controlados, a fim de promover uma Universidade ao alcance de todos;
- Garantirá o acesso automático às bolsas de ação social do ensino superior quando o aluno tenha beneficiado de bolsa de ação social no ensino secundário, sem aguardar pelo processamento administrativo por parte da respetiva instituição de ensino superior;
- Lançará, todos os anos, novas fases do plano de intervenção para a requalificação e a construção de residências de estudantes, para reforçar o alojamento disponível para estudantes do ensino superior, a custos acessíveis, em 12.000 camas até ao final da legislatura, atingindo um total de 27.000 camas;
- Fomentará a qualificação de profissionais a 4 níveis: o Licenciados em áreas de menor empregabilidade, ativos ou inativos, com cursos curtos (1 ano) seguidos de estágios profissionais; o Não licenciados no ativo, pela colaboração intensa entre empresas, associações empresariais e instituições de ensino superior; o Mestrados profissionalizantes; o Cursos curtos, não conducentes a grau (equivalentes, nas áreas tecnológicas, aos MBA Executivos).
- Lançará o programa de combate ao insucesso e ao abandono, assente na figura do tutor e do mentor;
- Promoverá a entrada e frequência de trabalhadores estudantes, com especial incidência nos horários pós-laborais, promovendo o regresso às universidades e aos politécnicos;
- Estimulará a diversificação do acesso ao ensino superior, considerando os diferentes perfis dos candidatos, e aprofundando em particular, no quadro de autonomia das instituições, o acesso dos estudantes oriundos de trajetórias profissionais de nível secundário, de ofertas profissionais de pós-secundário, incluindo os cursos TESP (técnicos superiores profissionais) e os CET (cursos de especialização tecnológica), e de adultos, para a reforçar a equidade e a justiça social no acesso e a aposta na recuperação de gerações em que as oportunidades de acesso eram menores;
- Premiará as instituições de ensino superior que promovam a diversidade;
- Incentivará o alargamento do número de vagas em horário pós-laboral nas universidades e politécnicos, diferenciando positivamente as instituições do ensino superior que apostem nesta estratégia;
- Promoverá, em articulação com as instituições do ensino superior, o aumento de alunos com deficiência, pela melhoria das respetivas condições de acolhimento e o devido apetrechamento físico e tecnológico, designadamente através da criação de estruturas de apoio a estes estudantes;
- Promoverá a expansão do ensino superior público, democratizando-lhe o acesso tanto no plano da oferta de vagas como no da partilha de custos entre as famílias e o Estado.
Promover o acesso à formação e qualificação ao longo da vida
Reforçar a rede e o trabalho em parceria em torno do desígnio da qualificação das pessoas e, em particular, das que não completaram a escolaridade mínima de hoje (o 12.º ano) é o meio mais poderoso para elevar a base de qualificações da população adulta e combater as desigualdades de qualificações, democratizando o acesso à aprendizagem ao longo da vida.
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Aprofundar o programa Qualifica para a elevação de qualificações da população adulta
É decisivo o alargamento do acesso à formação para que a aprendizagem ao longo da vida seja realidade transversal. E este programa assumiu-se, nos últimos anos, como o regresso da aposta na qualificação de adultos: promove o investimento na aproximação das pessoas à qualificação e é um instrumento de promoção do reconhecimento de competências e aprendizagens e da adequação dos percursos formativos aos perfis e necessidades individuais. Por isso, o Governo:
- Garantirá um período sabático aos adultos que se queiram requalificar, criando um programa de licenças para formação que facilite períodos de elevação de qualificações e de requalificação ao longo da vida, em articulação com a possibilidade de substituição dos trabalhadores em formação;
- Lançará o Plano Nacional de Literacia de Adultos, com base no diagnóstico realizado com especialistas, organizações públicas e a sociedade civil, com o apoio da Comissão Europeia, no sentido de promover a alfabetização, a inclusão social e a qualificação;
- Lançará, no quadro do Qualifica, um programa nacional de incentivo às pessoas com percursos incompletos para os concluírem, utilizando diferentes vias, e verem concluída a sua formação;
- Alargará os pontos de contacto da rede de centros Qualifica com o público, na lógica de parcerias e na criação de balcões Qualifica em todos os concelhos, para reforço do acesso ao programa e diferenciação positiva dos territórios de baixa densidade;
- Apostará na criação e desenvolvimento de redes locais do Qualifica, reforçando a coordenação e concertação local entre municípios, empresas, agentes locais, Centros Qualifica e diferentes tipos de respostas, para aumentar a eficácia do programa;
- Aprofundará o Qualifica na Administração Pública, para assegurar o pleno envolvimento do Estado, enquanto empregador, no esforço de qualificação dos portugueses;
- Desenvolverá programas setoriais de aprofundamento do Qualifica, por exemplo no setor social ou junto dos empresários, focado em competências chave para estes públicos;
- Aprofundará as respostas de reconhecimento e validação de competências no Qualifica;
- Tornará a inscrição no Qualifica a regra da entrada no sistema de formação profissional e critério de valorização transversal nas práticas formativas, de modo a melhorar a monitorização integrada dos impactos da formação profissional e reforçar o papel dos centros e do programa no acompanhamento de adultos encaminhados para ofertas.
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O Programa está pejado de boas intenções. O Governo promete fazer muitas coisas, mas parece esquecer-se de que tem de criar condições para que as medidas anunciadas sejam exequíveis. Por um lado, a escola pública está asfixiada com o cansaço dos professores em resultado da burocracia pesada, dos arroubos do psicologismo e do pedagogismo, da falta de democracia, das imposições ministeriais e diretoriais, da falta de pessoal não docente, da indisciplina e demais comportamentos desviantes; subalterniza-se o conhecimento (as diversas modalidades do saber) aos pretensos interesses dos alunos (alguns desprovidos de quaisquer interesses), ao peso dos pais e encarregados de educação, aos interesses instalados que apostam no “rankeamento” de resultados; o ensino funciona em torno dos testes e dos exames/provas finais; há escolas públicas que sabem usar os mecanismos de escolha de alunos e de negação de vaga (Se o ensino é obrigatório, o aluno tem de obter vaga em escola pública ou equivalente na área da sua residência – dê por onde der!); as escolas privadas que não tenham os encargos do Estado podem obviamente selecionar os alunos e dispensá-los quando eles se lhes tornam incómodos; e, em geral, as escolas,ou por via da pressão das famílias ou para efeitos de acesso ao ensino superior, inflacionam as classificações internas, tal como os altos responsáveis por exames e provas finais mandam a aceitar como válidas respostas que não lembrariam ao careca.
Por outro lado, o contexto socioeconómico não favorece um sucesso escolar e educativo de excelência: aposta-se no consumismo nem sempre segundo as boas orientações; disseminam-se as agressões verbais e físicas; reivindicam-se em excesso direitos e menosprezam-se deveres; entra-se facilmente em ondas de hipercriticismo (bem diferente do espírito crítico); a escola reflete a pobreza do ambiente social; a cultura não é um bem a apreciar; a boa política não influencia a escola e a escola limita-se a cumprir os programas quando pode, mas não ensina as pessoas a pensar, talvez porque elas não o querem, e é permeável a fundamentalismos (alimentar, de género).
Parece que o Governo quer restabelecer pelo “Qualifica” os CNO e os RVCC de má memória: as pessoas viam muitas das suas histórias de vida equiparadas a conhecimento académico, terminavam o ensino secundário sem uma classificação final e até poderiam ingressar no ensino superior só com base na média do exame na(s) disciplina(s) de ingresso, ultrapassando os jovens estudantes do ensino secundário e os adultos com 23 anos de idade ou mais que se sujeitaram a exame especial. Parece insistir-se num PNPSE, que induziu um enorme volume de trabalho dos docentes, sob controlo apertado do ME e sem que o sucesso real tenha acontecido, a não ser pela maceração de resultados para a estatística. E, se a flexibilidade curricular mantém o rumo atual, a tentação será a escola cingir-se às aprendizagens essenciais e a concretização do perfil do aluno e os projetos locais e de acordo com as necessidades e apetências dos alunos ficam para as calendas gregas. Temos a palhaçada dumas disciplinas novas (Oficina de turma, Oficina de Expressões). De resto, o programa do Governo não diz nada sobre currículo escolar e programas.
Além disso, em torno da Educação enquanto parâmetro do 3.º desafio, há que tratar das políticas de rendimentos e erradicação da pobreza, de proteção dos consumidores e de coesão territorial. Só que a prioridade do Governo são as contas certas para a convergência, pelo que, através das políticas de cativação de verbas, o dinheiro que era necessário para a execução eficaz dos programas enunciados na era da Educação sofre os efeitos da provocada seca do úbere orçamental. E não haverá dinheiro para formação de docentes, para deslocações, para equipamentos, etc. (mas a banca pode estar descansada: se precisar, haverá dinheiro). E o Governo, que diz apostar na boa governação, interroga-se por que motivo há tantos docentes de baixa e porque muitos não são substituídos? Um professor contratado para uma dúzia de horas letivas não ganha para a deslocação para o trabalho ou para renda de casa nem dum quarto. Ora, mais do que o programa em educação, era precisa ação e é preciso ouvir os docentes.
2019.10.28 – Louro de Carvalho