quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Estes dias têm sido pródigos em casos de anomalias escolares


Ocorreram duas manifestações opostas contra violência em Valença.
Um cordão humano de repúdio a agressões a profissionais de educação, convocado pela comunidade escolar, com o apoio da Câmara Municipal e do SPN (Sindicato de Professores do Norte), e uma manifestação da comunidade cigana (uma contramanifestação) decorreram, na manha do dia 22, em simultâneo, junto à Escola Básica e Secundária de Valença.
A manifestação da comunidade escolar surge após a agressão do pai duma aluna a dois professores e dois assistentes operacionais (auxiliares de ação educativa) na tarde do passado dia 17.
O clima à porta da escola foi de constante tensão.
Os manifestantes da comunidade escolar afirmam que “esta é uma manifestação contra a violência e não uma manifestação contra a comunidade de etnia cigana”.
Ameaças frequentes, agressões e furtos são alguns dos problemas apontados pela comunidade escolar. Já do outro lado, a comunidade de etnia cigana fala em racismo.
O SPN considera “intolerável a violência de que os profissionais da educação são alvo no exercício da sua atividade e reafirma que urge tomar medidas que garantam a imprescindível segurança” nas escolas.
Como se disse, o episódio que motivou a manifestação da comum idade escolar ocorreu na tarde do dia 17 e deu origem a queixas na GNR de 4 agredidos. Do lado do pai, a comunidade defende que a filha deste foi agredida primeiro por uma funcionária, e do outro a versão é contrária. Os protestos decorreram sob vigilância da GNR, que teve de intervir várias vezes porque os ânimos se exaltaram. As manifestações desmobilizaram ao fim de cerca de uma hora.
***
No dia 21, um aluno do 8.º ano da Escola Secundária Rainha Dona Leonor, em Alvalade, Lisboa, terá sido agredido por um professor na sala de aula. Segundo o relato da APEE/Rainha (Associação de Pais e Encarregados de Educação) da escola, um professor de TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação), contratado para um horário de 6 horas e cujo primeiro dia de aulas na escola ocorreu naquele dia, “agrediu física e verbalmente um aluno no decorrer de uma aula, com enorme violência, de acordo com o testemunho da vítima e dos seus colegas”.
Foi detido pela PSP para ser presente a tribunal no dia 22, indiciado pelos crimes de ofensa à integridade física e maus tratos a menor. O ME (Ministério da Educação) informou que lhe foi instaurado um processo disciplinar, tendo sido suspenso de imediato do exercício de funções. Refere o comunicado: 
“Foi instaurado um processo disciplinar a este professor contratado, que foi de imediato suspenso do exercício de funções, em todos os estabelecimentos de ensino onde lecionava”.
E o ME afirma que “já disponibilizou todo o apoio necessário a esta comunidade educativa” e que o “caso está entregue às autoridades”.
Por seu turno, a APEE/Rainha afirma que a PSP foi chamada a intervir e tomou conta da ocorrência no local. Os agentes ouviram o aluno alvo das agressões e, posteriormente, três colegas como testemunhas. Uma segunda unidade de polícia foi à escola para registar as lesões do aluno. O docente foi identificado pela diretora do agrupamento e terá sido ouvido pela PSP. O aluno foi acompanhado pela mãe ao hospital, encontrando-se livre de perigo. Por outro lado, a APEE/Rainha afirma que, confrontada com as notícias do episódio de agressão, reuniu com a diretora do agrupamento para esclarecimento da situação, sublinhando que repudia a atuação do professor e que não existe “nenhum argumento que justifique o uso de violência física e verbal por parte de um docente em sala de aula”. E apela ao afastamento do professor da escola caso “os factos de confirmem” e afirma que irá continuar a acompanhar a situação, referindo:
Numa escola onde a violência tem estado ausente, é com grande preocupação que a associação de pais vê um episódio violento e inadmissível acontecer dentro de uma sala de aula. Ao aluno vítima da agressão e à família, a APEE/Rainha manifesta a sua solidariedade”.
Se a direção da escola afirmou não prestar qualquer declaração sobre o sucedido, a APEE diz que o SPO (Serviço de Psicologia e Orientação) da escola está a acompanhar o aluno e a turma.
O n.º 1 do art.º 117.º do ECD (Estatuto da Carreia Docente) estabelece:
A aplicação de pena disciplinar de suspensão a docentes não pertencentes aos quadros determina a não renovação do contrato, podendo implicar a imediata cessação do contrato se o período de afastamento da função docente for igual ou superior ao período durante o qual, no âmbito desse contrato, prestou funções”. 
E o n.º 2 do mesmo artigo esclarece: 
A aplicação de penas disciplinares expulsivas a docentes não pertencentes aos quadros determina a incompatibilidade para o exercício de funções docentes nos estabelecimentos de educação ou de ensino públicos”.
Foi dito que o professor fora notificado para comparecer no dia 22, no Campus de Justiça para ser presente a um juiz, mas que o processo aberto pelo MP (Ministério Público) “baixou a inquérito”, por decisão do DIAP (Departamento de Investigação e Ação Penal) respetivo, segundo declarações de fonte da PSP à Lusa, o que desobrigou o docente de comparecer em Tribunal. 
Porém, fonte do MP desmentiu a ausência do professor, afirmando que foi ouvido em Tribunal, na manhã do dia 22 e que a magistrada decidiu que o processo “carecia do aprofundamento de diligências de investigação e que, como tal, não deveria ser julgado em processo sumário”, mas remetido ao DIAP para prosseguir como inquérito. Assim, o arguido ficou sujeito à medida de coação de TIR (termo de identidade e residência).
***
Uma professora, de 32 anos, da Escola Básica e Secundária Amélia Rey Colaço, em Linda-a-Velha, na manhã de hoje, dia 23, agredida por um aluno de 14 anos com transtornos neurológicos. O alerta à Polícia de Segurança Pública foi dado por volta das 9 horas.
A professora foi transportada para o Hospital de São Francisco Xavier com ferimentos ligeiros. Ainda não foram divulgadas mais informações em relação ao aluno.
***
Um aluno de 11 anos terá agredido uma professora e uma funcionária causando ferimentos ligeiros. As vítimas foram levadas para o hospital Amadora-Sintra e a polícia foi ao local.
O episódio ocorreu na escola Maria Alberta Menéres, na Tapada das Mercês, em Sintra, avançou, como avançou hoje, dia 23, a CMTV. De acordo com a estação, o aluno agrediu primeiro a funcionária, por volta da hora de almoço, quando esta – após uma troca acesa de palavras – ameaçou o aluno com uma queixa disciplinar. Também terá sido agredida uma professora que tentou acabar com os desacatos.
A funcionária, uma mulher de 54 anos, foi transportada para o Hospital Amadora-Sintra, onde deu entrada com ferimentos ligeiros. A professora, de 63 anos, foi também assistida, mas na escola. A PSP foi chamada ao local e está a investigar o sucedido.
Este é o segundo caso de violência de um aluno perante um professor noticiado neste dia.
***
Não se pode sustentar, como é usual acontecer, que se trate de casos isolados. Quem trabalha nas escolas sabe que os casos de indisciplina são demasiado frequentes. E quem não trabalha lá, sobretudo os dirigentes do ME, só não sabe porque não quer: os dados da comunicação social e as conversas de café, bem como os diversos observatórios dão bem conta da situação. Mas como o Omo lava bem branquinho… E mais do que a indisciplina ressaltam os casos de agressão como os apontados e outros comportamentos desviantes. E isso decorre do facto de o contexto interno e o contexto externo os potenciarem.
Fala-se da perda de valores. Acusa-se o sistema. Isso é pouco.
Se faltam os valores, é porque a insensibilidade do Estado e da sociedade a eles é demasiado forte para originar a sua omissão na formação e supervisão dos profissionais, bem como, por consequência, na ação educativa. Todos se arvoram em paladinos dos direitos, mas esquecem os deveres, obrigações e responsabilidades.
O exemplo que vem de cima mostra mediocridade e, tantas vezes, chico-espertismo. Ilude-se a lei e a ética com enorme facilidade. Perante a prevaricação evidente, argumenta-se com a consciência tranquila.
A nível da escola, o mal radica no pueripetismo. Toda a teoria e toda a prática gravitam em torno dos alunos, das suas necessidades, dos seus gostos, dos seus interesses e, tantas vezes, dos seus caprichos (puericentrismo). Todo o esforço de escola, por conseguinte, se dirige para o aluno (pueripetismo). Esquece-se a importância do conhecimento teórico, prático e crítico, facilmente se mandam os programas às malvas (dantes eram os professores que tinham dificuldade em cumpri-los; agora é o ME que os reduz com o eufemismo das aprendizagens essenciais). E o professor, cujo papel é fundamental, passou de transmissor e provedor dos saberes a dinamizador das aprendizagens ao ritmo e gosto dos alunos. É preciso que se saiba que, sem conhecimento sólido, não há didática sustentável nem pedagogia que tenha utilidade. A escola é o triângulo saberes-professor-aluno.
Ora, como os alunos menores, embora tenham personalidade jurídica, não dispõem de capacidade jurídica, saltam para a arena os pais e encarregados de educação. E o professor passou de servidor da aprendizagem dos alunos a escravo dos pais e dos explicadores (já que no geral os pais não têm competências académicas ajustadas a estes níveis de ensino). E o ME cala-se ou assente.
Exigem-se testes que motivam o estudo e pouco mais, como se exigem as matrizes, quanto mais explícitas de conteúdos melhor, para que os explicadores tenham êxito e os alunos possam flanar nas aulas. No 11.º ano e no 12.º, trabalha-se para os exames. Idolatra-se o sistema!
Quanto à debelação de comportamentos anómalos, os professores não têm autoridade, como não a têm os dirigentes escolares, a polícia ou o próprio Estado, que não a confere aos seus agentes.
***
Assim, um profissional de educação passou-se dos carretos na aula, é detido e presente ao MP para julgamento sumário, o que não sucedeu graças ao bom senso do magistrado, que entendeu dever aprofundar o caso. Ninguém pergunta o que esteve por trás do alegado episódio. Só um telemóvel cujo uso é proibido por lei em sala de aula (Lei n.º 51/2012, de 5 de setembro)? Suspenso antes de se concluir o processo disciplinar? E ninguém pergunta por que motivo a professora titular de TIC está de baixa médica. Por amamentação/aleitação, como dizem? Não. Para isso, há a respetiva dispensa de 2 horas/dia. Por assistência à família, talvez. E porque não por não aguentar o burnout laboral? O aluno e a turma têm apoio psicológico? E os professores e funcionários nos outros casos evocados não carecem de apoio psicológico? Também o ME ordenou processos disciplinares e criminais aos agressores? Em Valença, só porque a funcionaria pretendeu corrigiu o comportamento duma aluna cigana, já é racista?
Assim, vão longe o ME e o Estado, com duplicidade de atuação!   
2019.10.23 – Louro de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário