sábado, 19 de outubro de 2019

Proposta de um rito amazónico neste Sínodo


Foram ontem, dia 18, apresentados na Sala de Imprensa da Santa Sé os relatórios dos Círculos Menores no âmbito da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Região Pan-amazónica em torno do tema “Amazónia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”.
Entre os participantes estavam Dom Mário António da Silva, Bispo de Roraima (Brasil), Dom Rino Fisichella, Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização, Mauricio Lopez, secretário executivo REPAM (Rede Eclesial Pan-amazónica), e irmã Daniela Adriana Cannavina, secretária-geral da CLAR (Colômbia).
Padre Giacomo Costa, secretário da Comissão de Informação, abriu a conferência de imprensa com a seguinte premissa:
Os relatórios dos Círculos Menores não são textos definitivos, mas são um primeiro passo de um tecido nascido da escuta e orientado pelo discernimento. Em alguns grupos, o debate e o confronto são abertos. As posições dos padres sinodais nem sempre coincidem, mas cada um oferece a sua própria contribuição.”.
Na convicção de que o Sínodo é também uma exortação, a Irmã Daniela Adriana Cannavina, reiterou que o convite é pensar na Amazónia e abrir novos caminhos para a Igreja. É necessário torná-los possíveis e praticáveis, ultrapassando e vencendo os medos. E a secretária-geral da CLAR lembrou que, durante o trabalho sinodal, foi dado espaço às contribuições das mulheres. Referindo-se à vida consagrada, indicou uma prioridade: a de continuar a promover uma vida centrada no Evangelho. Acrescentou que, nesse sentido, devemos resistir à indiferença, porque a vida consagrada é um ícone da aceitação da vida. E, a este propósito, indicou quatro chaves fundamentais, sendo a primeira a inculturalidade e a segunda a itinerância, que assegura a presença de uma Igreja em saída. As outras duas chaves para abrir novos caminhos são o fortalecimento da presença missionária, a partir dos carismas, e a promoção do diálogo entre pastores e leigos em ambiente de corresponsabilidade. Enfim, impõe-se a renovação e o fortalecimento da vida consagrada como uma mais-valia para a ação naquela região, aliás como em toda a Igreja e no mundo.
Dom Rino Fisichella, por seu turno, salientando que a experiência do caminho sinodal é única e que cada Sínodo é uma emoção intelectual cada vez mais profunda, sublinhou que este Sínodo nos exorta a refletir também sobre o significado da universalidade da Igreja, pois, como acentuou, a Igreja é uma só, mas é composta por muitos povos, um diferente do outro. Por conseguinte, vincando que todos os povos devem ser respeitados, o Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização frisou que este pressuposto implica o reconhecimento da complementaridade entrosada na universalidade. Assim, cada povo, cada cultura e cada tradição têm algo a dizer para que o património comum possa ser compreendido e iluminado. Nestes termos, o Arcebispo entende que cada uma das culturas da Amazónia expressa algum elemento que nos permite compreender a grandeza da fé cristã. Com efeito, em minha opinião, somente se pode intervir localmente com eficácia se pensarmos globalmente e só pensamos globalmente se tivermos em conta as experiências que obtivermos do contacto com cada povo que nos é dado conhecer. A Igreja é universal. E o conceito clássico de universal refere-se àquilo que se aplica a todos e a cada um “singulariter et divisim”.  
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Dom Rino Fisichella lembrou também que foi feita uma proposta para seguir o caminho de um “rito amazónico” que permita desenvolver sob o aspeto espiritual, teológico, litúrgico e disciplinar, a singular riqueza da Igreja Católica na Amazónia. Na verdade, como explicou, os ritos são a expressão da evangelização. E, quando o anúncio do Evangelho atinge uma cultura, é inculturado através das formas mais coerentes para expressar o mistério. Na época contemporânea, foi concedido para o caminho neocatecumenal um rito, limitado apenas à liturgia. No caso do rito amazónico, especificou Dom Fisichella, “estamos diante de uma proposta que diz respeito ao rito na sua totalidade”. Venha daí o rito novo e adequado!
Dom Mário António da Silva observou que “este Sínodo é uma oportunidade que temos para nos colocarmos em contacto com a vida, com o ambiente, mas sobretudo com a vida das comunidades” e frisou que a assembleia sinodal é uma oportunidade de escuta da voz da Amazónia, uma oportunidade de reconhecimento dos caminhos já traçados pelos mártires e uma oportunidade de abertura de novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral. Recordando a realidade da sua diocese, identificou a migração como um dos principais desafios, nomeadamente o que decorre da atual crise humanitária, por via da qual o Papa Francisco, como o Bispo de Roraima explicou, nos convida “a sermos capazes, como Igreja, de acolher, proteger, promover e integrar os migrantes”. Por outro lado, vincou a necessidade de novos colaboradores para chegar até mesmo às pequenas comunidades, longe das pequenas cidades. Entre as propostas há também a da ordenação sacerdotal dos “viri probati”, isto é, a ordenação de adultos casados. Vincando que o celibato é um dom da Igreja e que deve ser considerado como algo muito precioso, o prelado advertiu para a necessidade de oferecer respostas prontas e diversificadas às necessidades da Igreja presente nos povos mais longínquos e mais necessitados de estímulos à vivência da fé e à multiplicação de situações da sua vivência. Por outro lado, Dom Mário António da Silva recordou que o Papa Francisco nos pede que prestemos atenção a toda a Criação, pois a ecologia integral leva-nos a pensar também nas gerações futuras.
E Mauricio Lopez, secretário da REPAM, depois de perguntar “qual é o olhar de Deus sobre a realidade amazónica”, propôs um momento de silêncio e reflexão na conferência de imprensa, que durou 30 segundos. E este interveniente disse que “é necessário observar a realidade com o olhar de Deus”. E, sustentando querer voltar ao lugar onde trabalham todos os dias, quer dizer ao povo da Amazónia que “honramos as suas vidas” e que “as suas vozes foram ouvidas”. E acrescentou esclarecedoramente:
As periferias não querem roubar o lugar do centro: trata-se de iluminar o centro a partir das periferias. E não se deve perder de vista o que é realmente importante: as pessoas.”.
Seguindo o itinerário proposto pelo Papa Francisco, disse Mauricio López, devemos promover uma autêntica conversão pastoral, ecológica e sinodal, a conversão ecológica. E esta conversão leva-nos necessariamente a ver a realidade com o olhar de Deus.
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Em seguida, surgiram as perguntas dos jornalistas, e os participantes da conferência de imprensa focaram-se no tema dos pecados ecológicos.
A Irmã Daniela Adriana Cannavina contou como pecados a exclusão dos irmãos indígenas e a pobreza por causa das atividades de mineração. E disse que tudo isso, que aproxima a vida da morte é pecado.
Dom Rino Fisichella explicou que o pecado é o fechamento do homem em si mesmo: quem vive neste fechamento corre o risco de morrer de asfixia. O pecado fundamental é o comportamento do homem que se fecha diante de Deus. A criação, observou Dom Fisichella, é uma manifestação de Deus. Quando alguém não reconhece Deus na criação, não há desculpa e incorre-se numa dimensão de pecado.
Dom Mário António da Silva pediu uma conversão sincera: tudo isso, explicou ele, que nos leva ao uso necessário e sensato dos bens da Criação é virtuoso. Tudo o que, pelo contrário, nos leva a utilizar os bens da criação para o lucro não só “fede”, mas traz consigo a injustiça.
Uma jornalista recordou que a Fundação Ford, que não é contrária ao aborto, conseguiu fundos para a REPAM. Mas o Bispo de Roraima reiterou que a Igreja defende a vida desde a conceção até ao fim natural. Disse que os fundos devem ser utilizados para promover a vida das crianças, das mulheres e das famílias. E sublinhou que a REPAM usa as doações feitas por fundações para promover a vida, independentemente do cariz de tais fundações.
Por sua vez, o Prefeito do Dicastério para a Comunicação, Paolo Ruffini, disse que considera uma coisa boa que o dinheiro seja usado para promover obras de caridade.
E a conferência de imprensa terminou com um breve retrato da situação atual dos trabalhos sinodais. Dom Mário António da Silva disse que as propostas feitas até agora são, até ao momento, discussões que estão em andamento, pois esta é ainda uma fase de recolha das propostas que serão depois confiadas ao discernimento. A próxima fase, concluiu, será a do documento final a ser confiado ao Papa e ao seu discernimento.
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Para que se entenda como sensato o estabelecimento de um rito amazónico que enquadre e exprima as demais inovações que o Sínodo proponha, segue-se uma resenha histórica sobre a diversificação de ritos na Igreja Católica em conformidade com as diversas tradições e culturas sem que a unidade da Igreja seja prejudicada segundo o aforismo augustiniano: in essentia unitas, in caeteris libertas.
No âmbito da Igreja Católica e Apostólica, a liturgia é a mesma e é única a soberania da Cátedra de Pedro. Entretanto, há diferentes formas de celebração da Missa e da realização das demais cerimónias litúrgicas católicas, todas autênticas e aprovadas formalmente pela Igreja. A origem destas diferenças é histórica: desde os primórdios dos Atos dos Apóstolos, cada comunidade cristã se desenvolveu, de forma independente e adaptada à cultura e aos costumes locais. 
No Ocidente, o rito latino foi dominante desde o princípio, mas, no Oriente, com o surgimento dos grandes patriarcados como Jerusalém, Constantinopla, Alexandria e Antioquia, estes ritos assumiram um caráter regional e específico:  o rito bizantino teve origem em Bizâncio, capital do Império romano do Oriente, e dominou a região da Ásia Menor (greco-melquita, eslavo, ucraniano e outros); o antioqueno (siríaco, antioqueno, maronita e malancar na Índia), o caldeu (na Índia) e o alexandrino (copta e etíope), tornado preponderante, por exemplo, em certas regiões da África. 
Assim, a Igreja Católica comporta atualmente 23 Igrejas autónomas (chamadas sui juris), todas mantendo a integridade da Fé e a obediência ao Sumo Pontífice, simultaneamente Papa, Bispo de Roma e Chefe de toda a Igreja Católica. Destas, a Igreja Católica Latina que segue o Rito Latino é a maior, contando com cerca de 98% dos fiéis católicos do mundo inteiro.
No Rito Romano, convivem desde 2007 a liturgia tridentina (menor expressão) e a do Vaticano II.
Em função dos diferentes ritos litúrgicos adotados, são estas as seguintes igrejas que compõem a Igreja Católica (a data entre parênteses, logo após a denominação das igrejas orientais, refere-se ao momento em que as mesmas retornaram à plena comunhão com a Igreja Católica):
1. Ritos Ocidentais – Igreja Católica Latina: rito romano (missa tridentina, de São Pio V, e nova missa, de São Paulo VI); rito ambrosiano; rito bracarense; rito galicano; rito moçárabe; uso anglicano (para absorver os convertidos do anglicanismo); e rito dos cartuxos.
2. Rito Bizantino – adotado pelas Igrejas: Igreja Greco-Católica Melquita (1726); Igreja Católica Bizantina Grega (1829); Igreja Greco-Católica Ucraniana (1595); Igreja Católica Bizantina Rutena (1646); Igreja Católica Bizantina Eslovaca (1646); Igreja Católica Búlgara (1861); Igreja Greco-Católica Croata (1611); Igreja Greco-Católica Macedónica (1918); Igreja Católica Bizantina Húngara (1646); Igreja Greco-Católica Romena unida a Roma (1697); Igreja Católica Ítalo-Albanesa (sempre em comunhão com a Igreja Católica); Igreja Católica Bizantina Russa (1905); Igreja Católica Bizantina Albanesa (1628); e Igreja Católica Bizantina Bielorrussa (1596).
3. Rito de Antioquia – adotado pelas Igrejas: Igreja Maronita (união oficial reafirmada em 1182); Igreja Católica Siro-Malancar (1930); e Igreja Católica Siríaca (1781);
4. Rito Siríaco – adotado pelas Igrejas: Igreja Caldeia (1692); e Igreja Católica Siro-Malabar (1599).
5. Rito Arménio adotado pela Igreja Católica Arménia (1742).
6. Rito de Alexandria – adotado pelas Igrejas: Igreja Católica Copta (1741); e Igreja Católica Etíope (1846).
Os fiéis pertencentes a estas igrejas orientais católicas (não confundir com as igrejas orientais não-católicas, chamadas ortodoxas, separadas de Roma, que, muitas vezes, adotam os mesmos ritos litúrgicos) são tão católicos quanto os pertencentes à Igreja Latina, mas, de acordo com o Direito Canónico, só podem mudar de rito sob autorização da Santa Sé. Embora conservem tradições litúrgicas e devocionais próprias há séculos e apresentem abordagens teológicas, ritos litúrgicos e regras canónicas específicas (os católicos bizantinos ou greco-católicos constituem cerca de 50% dos católicos orientais e professam o rito bizantino), têm em comum com a Igreja Latina o primado pela unidade da fé e a submissão ao poder do Papa, reconhecido em sua suprema autoridade e infalibilidade magisterial. Em função de suas particularidades histórico-geográficas, as igrejas orientais católicas apresentam estruturas e organização distinta da Igreja Católica Latina,  sendo dirigidas por um hierarca e o respetivo Sínodo (Concílio de Hierarcas), do seguinte modo: 6 Igrejas – Igreja Católica Copta, Igreja Católica Siríaca, Igreja Greco-Católica Melquita, Igreja Maronita, Igreja Católica Caldeia e Igreja Católica Arménia – governadas por Patriarcas, eleitos pelos seus Sínodos e depois somente reconhecidos pelo Papa; 4 Igrejas – Igreja Greco-Católica Ucraniana, Igreja Católica Siro-Malabar, Igreja Católica Siro-Malancar e Igreja Greco-Católica Romena unida à Roma – governadas por Arcebispos Maiores, eleitos pelos Sínodos e depois, ao invés dos Patriarcas, aprovados formalmente pelo Papa; 3 Igrejas – Igreja Católica Etíope, Igreja Católica Bizantina Eslovaca e Igreja Católica Bizantina Rutena – governadas por Arcebispos Metropolitas, indicados em lista tríplice pelos Concílios de Hierarcas, sendo um deles escolhido e nomeado pelo Papa; e mais 9 Igrejas, governadas por um ou mais hierarcas, diretamente nomeados e supervisionados pelo Papa, por não existirem sínodos nem concílios de hierarcas.
Recorde-se que Patriarca era o título dado antigamente ao bispo de uma diocese onde vivera e governara um dos Apóstolos ou discípulos de Jesus Cristo. Assim, havia o Patriarca de Jerusalém, cidade da qual fora primeiro Bispo o Apóstolo São Tiago; Antioquia, onde São Pedro fora Bispo; Alexandria, regida por São Marcos e Roma, onde São Pedro foi Bispo. Mais tarde, o título de Patriarca foi concedido honorificamente aos arcebispos de algumas cidades, por exemplo, Constantinopla, Veneza e Lisboa.
2019.10.19 – Louro de Carvalho

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