domingo, 30 de novembro de 2014

Mais um passo no caminho do ecumenismo!

O Papa Francisco procedeu a uma viagem apostólica à Turquia entre os dias 28 e 30 de novembro. É óbvio que, para lá da vertente apostólica, ela reveste também uma natureza política no sentido que o dado político tem de mais interessante: a relação entre Estados e o esforço para minorar as tensões provocadas pelas lutas hegemónicas e de interesses.
Mesmo que a visita papal, no aspeto político, se resumisse à cerimónia de boas-vindas no palácio presidencial e à visita de cortesia ao Presidente da República, tal facto já por si marcaria a perspetiva de Igreja em saída em que aposta o Bispo de Roma. Todavia, o pequeno e breve périplo decorre num país maioritariamente muçulmano, mas que professa oficialmente a laicidade, a qual, se for entendida corretamente e obstaculizar fechamentos culturais e fundamentalismos de qualquer espécie, facilita o diálogo entre etnias, povos, culturas e religiões.
Porém, não se pode passar em silêncio o facto de a Turquia estar próxima da Síria, fustigada por um demolidor conflito interno, do Iraque, assolado pelas inusitadas investidas do recentemente denominado Estado Islâmico, e da Arábia Saudita, com mostras de repulsa alastrante de pessoas e práticas cristãs e yazidis. Demais, a Turquia recebe, como outros países do aro médio-oriental, um surto de refugiados que se escaparam em condições de fragilização e precariedade das zonas de conflito originárias. Por isso, a presença e a palavra do Papa não deixa de ser um apelo ao acolhimento e ao esforço pela resolução dos conflitos de exclusão e de guerra.
Assim, no encontro com as autoridades, a 28 de novembro, o Pontífice, evocando as belezas naturais e a história do território, acentuou o interesse que os cristãos nutrem por estas paragens:
Esta terra é amada por todo o cristão por ser o berço de São Paulo, que fundou aqui diversas comunidades cristãs; por ter acolhido os primeiros sete Concílios da Igreja e pela presença, perto de Éfeso, daquela que uma veneranda tradição considera a “casa de Maria”, o lugar onde a Mãe de Jesus viveu durante alguns anos, meta da devoção de muitos peregrinos vindos de todos os cantos do mundo, não só cristãos, mas também muçulmanos.

Entretanto, aludindo aos esforços de diálogo dos seus predecessores, salienta as virtualidades do presente desta grande nação. Por outro lado, acentua a necessidade do diálogo que valorize “as inúmeras coisas que temos em comum” e considere “com ânimo sábio e sereno as diferenças”, que podem ajudar a aprender. Depois, é preciso continuar “o compromisso de construir uma paz sólida”, no respeito pelos “direitos fundamentais e deveres ligados com a dignidade do homem”, superando “os preconceitos e falsos temores” e abrindo espaço “à estima, ao encontro, ao desenvolvimento das melhores energias em proveito de todos”.
Para tanto, torna-se fundamental o diálogo inter-religioso tanto nas disposições legais, como na sua efetiva atuação, em igualdade de direitos e de deveres. Assim, “irmãos e companheiros de viagem”, com “liberdade religiosa” e “liberdade de expressão”, eficazmente garantidas a todos, darão os homens um sinal eloquente de amizade e de paz – sinal ansiosamente aguardado pelo Médio Oriente (há demasiado tempo, teatro de guerras fratricidas), pela Europa, pelo mundo.
Os povos e Estados do Médio Oriente – para inverterem a tendência dominante e lograr um processo de pacificação bem-sucedido, pela rejeição da guerra e da violência e pela busca do diálogo, do direito, da justiça – têm necessidade de que “ao fanatismo e ao fundamentalismo, às fobias irracionais que incentivam incompreensões e discriminações”, se contraponha a “solidariedade de todos os crentes”. Esta solidariedade “tem como pilares o respeito pela vida humana, pela liberdade religiosa” – que é liberdade do culto e liberdade de viver segundo a ética religiosa – e “o esforço por garantir a todos o necessário para uma vida digna e o cuidado do meio ambiente”.
É também preciso – assegura Francisco – um forte compromisso comum baseado na confiança, que possibilite a paz duradoura e permita destinar os recursos, não aos armamentos, mas às verdadeiras lutas dignas do homem: contra a fome e doenças, pelo desenvolvimento sustentável e pela defesa da criação, em socorro de tantas formas de pobreza e marginalização.
À Turquia, pela sua história, posição geográfica e importância regional, cabe peculiar responsabilidade: suas decisões e seu exemplo possuem uma valia especial e podem constituir ajuda significativa no favorecimento de um encontro de civilização e na identificação das vias praticáveis de paz e de autêntico progresso.
Já, na visita ao Presidente dos Assuntos Religiosos no Diyanet, o Pontífice salientou as boas relações e a cooperação entre o Diyanet e o Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso. E, ao retomar o essencial dos temas aflorados no encontro com as autoridades, acentuou a perspetiva religiosa que dá uma mais-valia de razão aos esforços de debelação e resolução das situações de penúria e conflito, abjurando a violência em nome de Deus. Adverte o Papa, que lança o apelo a todos os homens e mulheres de boa vontade:
Como chefes religiosos, temos a obrigação de denunciar todas as violações da dignidade e dos direitos humanos. A vida humana, dom de Deus Criador, possui um caráter sagrado. Por isso, a violência que busca uma justificação religiosa merece a mais forte condenação, porque o Omnipotente é Deus da vida e da paz. O mundo espera, de todos aqueles que afirmam adorá-Lo, que sejam homens e mulheres de paz, capazes de viver como irmãos e irmãs, apesar das diferenças étnicas, religiosas, culturais ou ideológicas.
A denúncia deve ser acompanhada pelo trabalho comum para se encontrarem soluções adequadas. Isto requer a colaboração de todas as partes: governos, líderes políticos e religiosos, representantes da sociedade civil e todos os homens e mulheres de boa vontade.
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Mas Francisco veio com duas outras intenções: dar ânimo à pequena comunidade católica que ali vive e testemunha o empenho humano e apostólico em união plena com a Igreja de Roma; e contribuir para o reforço da aproximação ecuménica entre católicos e ortodoxos.
Para e com os católicos celebrou a Santa Missa na Catedral Católica do Espírito Santo, em Istambul, no dia 29. Na homilia que proferiu perante católicos de outros ritos, de autoridades do cristianismo ortodoxo e protestante, salientou o Espírito como dom de Deus, força e harmonia na Igreja e na comunidade. Depois, advertiu:
As nossas defesas podem manifestar-se com a excessiva fixação nas nossas ideias, nas nossas forças – mas assim resvalamos no pelagianismo – ou então com uma atitude de ambição e vaidade. Estes mecanismos defensivos impedem-nos de compreender verdadeiramente os outros e abrir-nos a um diálogo sincero com eles.

E, contrapondo, explicou a aliança entre Espírito e a Igreja, que torna eficaz a ação desta:
Mas a Igreja, nascida do Pentecostes, recebe em herança o fogo do Espírito Santo, que não enche tanto a mente de ideias, como sobretudo faz arder o coração; é investida pelo vento do Espírito, que não transmite um poder, mas habilita para um serviço de amor, uma linguagem que cada um é capaz de compreender. Em nosso caminho de fé e de vida fraterna, quanto mais nos deixarmos guiar humildemente pelo Espírito do Senhor, tanto mais superaremos as incompreensões, as divisões e as controvérsias, tornando-nos sinal credível de unidade e de paz; sinal credível de que o Senhor nosso ressuscitou, está vivo.
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Porém, o ápice da jornada, para cujo êxito, em audiência geral na Praça de São Pedro, no passado dia 26, Francisco solicitara oração para que a viagem “produza frutos de paz, de diálogo sincero entre as religiões e de concórdia na Nação turca”, é constituído pelos momentos de encontro como o Patriarca Ecuménico Bartolomeu I.
O primeiro momento ocorre no âmbito da Oração Ecuménica na Igreja Patriarcal de São Jorge em torno da festa de Santo André, apóstolo fundador da Igreja de Istambul e irmão de Pedro. Fora André o primeiro a ser vocacionado ao apostolado e a dizer ao seu irmão que vira o Senhor. Foi ele quem topou que havia um rapaz com cinco pães e dois peixes, o que deu azo ao milagre da multiplicação para saciar a fome da multidão de milhares de pessoas, após a catequese recebida de Cristo. Foi ele quem intercedeu, a instâncias de Filipe, para que o Mestre recebesse um grupo de estrangeiros. E, por fim, depois de intensa missionação apostólica, teve sorte parecida (o martírio na cruz) com a de Pedro, o fundador da Igreja de Roma.
Também Francisco, o romano Pedro do tempo atual, dirigindo-se ao irmão bem-amado irmão André constantinoplitano, que dá pelo nome de Bartolomeu, disserta:
Pelas palavras do profeta Zacarias, o Senhor deu-nos, nesta oração vespertina, o fundamento que está na base da nossa tensão entre um hoje e um amanhã, a rocha firme sobre a qual movemos juntos os nossos passos com alegria e esperança; este alicerce rochoso é a promessa do Senhor: Eis que eu salvo o meu povo do Oriente e do Ocidente (...) na fidelidade e justiça (Zc 8,7.8).

Crendo mais no poder de Deus, mas não desprezando a necessidade do esforço humano de aproximação, o Papa esclarece onde está a fonte da nossa alegria:
Está mais além, não está em nós, não está no nosso compromisso e nos nossos esforços – que existem, como de dever –, mas na comum entrega à fidelidade de Deus, que lança as bases para a reconstrução do seu templo que é a Igreja (cf. Zc 8,9). «Está aqui a semente da paz» (Zc 8,12); está aqui a semente da alegria. Aquela paz e aquela alegria que o mundo não pode dar, mas que o Senhor Jesus prometeu aos seus discípulos e lha deu como Ressuscitado, no poder do Espírito.

E o gesto marcante desta jornada foi o pedido de Francisco a Bartolomeu para que o abençoasse a si e à Igreja de Roma, a que o Patriarca Ecuménico correspondeu com um visível ósculo na cabeça do pontífice romano.
Já no dia 30, no quadro da Divina Liturgia de São João Crisóstomo na Igreja patriarcal de São Jorge, o Papa Francisco entende que encontrarem-se os dois irmãos face a face, trocarem o abraço da paz e rezarem um pelo outro “são dimensões essenciais do caminho para o restabelecimento da plena comunhão para a qual tendemos”. Estas, entretanto, precedem e acompanham constantemente a outra dimensão essencial daquele caminho, o do “diálogo teológico”, que não é “apenas um confronto de ideias”, mas sempre “um encontro entre pessoas com um nome, um rosto, uma história”.
Francisco acredita que foi à semelhança das cumplicidades entre André e Pedro que “o caminho de reconciliação e de paz entre católicos e ortodoxos” fora “inaugurado por um encontro, por um abraço” entre o Patriarca Ecuménico Atenágoras e o Papa Paulo VI, há cinquenta anos, em Jerusalém – evento comemorado recentemente com um encontro entre estes dois chefes, na atualidade, de Igrejas Irmãs “na cidade onde o Senhor Jesus Cristo morreu e ressuscitou”.
Aludindo ao decreto conciliar Unitatis redintegratio, sobre a busca da unidade de todos os cristãos – “documento fundamental com que foi aberta uma nova estrada para o encontro entre os católicos e os irmãos de outras Igrejas e Comunidades eclesiais” – recorda que a Igreja católica passou a reconhecer que as Igrejas ortodoxas “têm verdadeiros sacramentos e principalmente, em virtude da sucessão apostólica, o sacerdócio e a Eucaristia, por meio dos quais permanecem ainda unidas connosco por vínculos muito íntimos (UR n.º 15).
E Francisco enuncia o escopo a que pretende chegar, e não mais:
A Igreja católica não tenciona impor qualquer exigência, exceto a da profissão da fé comum, e que estamos prontos a buscar juntos, à luz do ensinamento da Escritura e da experiência do primeiro milénio, as modalidades pelas quais se garanta a necessária unidade da Igreja nas circunstâncias atuais: a única coisa que a Igreja católica deseja e que eu procuro como Bispo de Roma, “a Igreja que preside na caridade”, é a comunhão com as Igrejas ortodoxas. Esta comunhão será sempre fruto do amor “que foi derramado nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5, 5), amor fraterno que dá expressão ao vínculo espiritual e transcendente que nos une como discípulos do Senhor.

Depois, o Papa faz o levantamento das vozes que importa escutar e que apelam “às nossas Igrejas que vivam plenamente como discípulos do Senhor Jesus Cristo”. A primeira é a voz dos pobres, a das mulheres e homens que sofrem por desnutrição grave, pelo desemprego crescente, pela alta percentagem de jovens sem trabalho e pelo aumento da exclusão social, indutor de atividades criminosas e recrutamento de terroristas. A segunda é a voz das vítimas dos conflitos em muitas partes do mundo. Ora, esta voz das vítimas dos conflitos impele-nos a avançar pressurosamente no caminho de reconciliação e comunhão entre católicos e ortodoxos. Aliás, teremos dificuldade em anunciar o Evangelho de paz que vem de Cristo, se entre nós continuarem a existir rivalidades e contendas (cf. Paulo VI, Ex. ap. Evangelium nuntiandi, 77).
Mas uma terceira voz nos interpela: a dos jovens, a dos jovens que “vivem sem esperança, dominados pelo desânimo e pela resignação” ou “influenciados pela cultura dominante”, muitos dos quais “buscam a alegria apenas na posse de bens materiais e na satisfação das emoções do momento”.
São precisamente os jovens – multidões de jovens ortodoxos, católicos e protestantes se reúnem nos encontros internacionais organizados pela comunidade de Taizé – são eles que hoje nos pedem para avançar rumo à plena comunhão. E isto, não porque eles ignorem o significado das diferenças que ainda nos separam, mas porque sabem ver mais além, são capazes de captar o essencial que já nos une.

E o Papa, reconhecendo que estamos a caminho para a plena comunhão, confia que os apóstolos irmãos, Pedro e André, apoiem a prossecução sustentável desta caminhada conjunta.
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Finalmente, o Papa Francisco I e o Patriarca Ecuménico Bartolomeu I procederam à Bênção Ecuménica e Assinatura da Declaração Comum. Nela, se revigora o desejo de continuarem “a caminhar juntos a fim de superarmos, com amor e confiança, os obstáculos que nos dividem”. Nela, os insignes declarantes reafirmam as intenções e preocupações comuns, expressam a “intenção sincera e firme de, em obediência à vontade de nosso Senhor Jesus Cristo”, intensificarem os “esforços pela promoção da unidade plena entre todos os cristãos, e sobretudo entre católicos e ortodoxos” e apoiam o diálogo teológico promovido pela Comissão Mista Internacional – instituída, há trinta e cinco anos, pelo Patriarca Ecuménico Dimitrios e o Papa João Paulo II, no Fanar –, a qual se encontra a tratar das questões mais difíceis que marcaram a história da divisão e que postulam um estudo cuidadoso e profundo.
E terminam exprimindo a comum preocupação pela situação no Iraque, na Síria e em todo o Médio Oriente, bem como a união no desejo de paz e estabilidade e na vontade de promover a resolução dos conflitos através do diálogo e da reconciliação e a atenção a todos os problemas que afligem a humanidade.

São fortes propósitos, preocupações e desejos a que juntam a súplica de intercessão aos apóstolos, a ação de graças ao Senhor da História pelos progressos efetuados e a inabalável confiança n’ Aquele que rezou “que todos sejam um só, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que Tu me enviaste” (Jo 17,21).

Dobraram os sinos há 25 anos!

Sim, no dia 29 de novembro de 1989, dobraram os sinos da minha terra. Tinha ruído há poucos dias o muro que separara os dois lados de Berlim, as duas partes da Alemanha e os dois blocos geopolíticos da Europa, a marcar a guerra fria, que assim passou ao degelo. As pessoas festejaram, alegraram-se. A Europa encaminhava-se para ser mais una.
A 29, o muro que separa terra e céu, desmoronou-se. Minha mãe entrou na alegria do Senhor da Vida e da morte. Os sinos dobraram. Anjos e santos alegraram-se. Nós, que temos muito caminho para percorrer, nesta nossa rebeldia, rumo à santidade, ainda que chamados a este dever e dom, ensarilhámo-nos entre a saudade e a fé, entre o sentido da perda e a certeza da vida do mundo que há de vir, daquela vida que não conhecerá fim. Perto de quem partiam sentíamo-nos, mesmo assim, como que do lado de cá da barreira!
Por isso, rezámos e cantámos durante uns magros três dias. Senti bem a consonância da solidariedade fraterna e a sintonia dos cantares da fé da parte de todos os que acreditam (eram muitos): dos sacerdotes e do povo, dos conterrâneos e dos que nos visitaram, dos familiares e dos amigos – sobretudo a um de dezembro, no momento exequial. A todos respondi então publicamente com a expressão da minha fé e esperança, embora com a manifesta sensação limitativa da tristeza por quem nos dizia um adeus sereno, o mesmo que um “até breve”. A todos signifiquei o apreço pela vinda de perto ou de longe, pela presença e pela oração.
Por alguns dos que estiveram presentes também os sinos já dobraram a assinalar a sua resposta ao chamamento à vida eterna. Também por eles rezo e deixo o meu preito de gratidão. E recordo, em especial, o pai José, com outros familiares e amigos, e os padres António Clara Ângelo, Artur Antunes, Delfim a Silva Pedro, Lucas Ribeiro e Joaquim Fernandes da Fonseca.
Minha mãe, como tantas mulheres e mães, cumpriu a vida de modo discreto, sereno, dedicado – entre momentos de sofrimento e de alegria, trabalho e conforto. Os últimos dias tinham sido de esperança sofredora no leito da enfermidade, com tranquilidade e edificação. Merece, pois, a paz de Deus, reclama as nossas preces, insta a que sejamos gratos para com Deus e com os que partiram antes de nós, apela ao cultivo dos valores humanos e ao compromisso da fé em Jesus Cristo, bem como todo o possível trabalho apostólico.
***
Se, como dizia, há anos, Jorge Coelho, cada um celebra o que pode, devo dizer que antes quero celebrar o que vale a pena – que é a memória de quem nos é querido, a vida que nos legou a mãe, o exemplo que ela nos incutiu, o espírito de luta contra os escolhos da vida, a certeza da fé, a audácia da esperança, a obrigação da caridade justa, o encontro tranquilo como o sofrimento e a legitimidade da alegria. Comemorar toda esta herança, este património imaterial torna-se dever, mostra de gratidão, motivo de satisfação por dever cumprido. E vale a pena celebrar a memória da mãe, se possível, com o mesmo sentimento que a mãe teria pelos filhos!  
Hoje fomos em romagem discreta, mas sem ocultação, em jeito de passeio, ao cemitério onde, como que em minissantuário de humanidade, colada à terra e ao seu pó, e de respiração calada do espírito, se venera a memória do pai e da mãe, agora na coabitação com o Senhor dos crentes, nas asas da sua proteção. Deixámos hoje, minha mulher e eu, não as flores que murcham ou a lâmpada que se apaga com a menor das aragens, mas uma oração nossa, quase silenciosa, mas crente e também solidária, filial.
25 anos não são muito tempo. Todavia, dão que pensar, refletir e tomar a vida nas mãos, na parte em que isso nos é possível. Que o Deus de nossos pais nos abra caminhos de futuro em que os nossos descendentes se sintam mais irmãos, mais senhores de si próprios, sem serem ou se sentirem senhores de outrem e sem se tornarem servos de interesses menos nobres, mas apenas da verdade que liberta e constrói.
Carlos Drummond de Andrade escreveu:
“Para Sempre”

Por que Deus permite 
que as mães vão-se embora? 
Mãe não tem limite, 
é tempo sem hora, 
luz que não apaga 
quando sopra o vento 
e chuva desaba, 
veludo escondido 
na pele enrugada, 
água pura, ar puro, 
puro pensamento. 
Morrer acontece 
com o que é breve e passa 
sem deixar vestígio. 
Mãe, na sua graça, 
é eternidade.
 
Por que Deus se lembra 
— mistério profundo — 
de tirá-la um dia? 
Fosse eu Rei do Mundo, 
baixava uma lei: 
Mãe não morre nunca, 
mãe ficará sempre 
junto de seu filho 
e ele, velho embora, 
será pequenino 
feito grão de milho.


Carlos Drummond de Andrade, in Lição das Coisas
Ora, Carlos Drummond de Andrade, não é preciso baixar a lei. Com efeito, “mãe não morre nunca”. E, se não parece ficar sempre junto de seu filho, dali donde o espreita continua a jogar com ele o té-té da vida, a elogiá-lo nas boas ações, a repreendê-lo pelas traquinices, a chamá-lo a bom porto, a reclamar a fé, a confiança, o amor. Isto, porque o filho, embora velho, continua sempre a ser o menino de sua mãe!
Por mim, apetece-me seguir o salmista, não sei se tenho muito direito a isso, mas lá vai confiadamente:
SENHOR, o meu coração não é orgulhoso,
Nem os meus olhos são altivos;
Não corro atrás de grandezas
Ou de coisas superiores a mim.
Pelo contrário, estou sossegado e tranquilo,
Como criança saciada ao colo da mãe;
A minha alma é como uma criança saciada!
Israel, espera no Senhor,
Desde agora e para sempre!
(Sl 131,1-3)
Efetivamente, assim como Israel espera pelo Senhor, o salmista renuncia aos sonhos de grandeza e empreendimentos superiores às suas forças, a viver acima das suas possibilidades, não por força da lei ou da inevitabilidade, mas pela consciência da sua condição de ser limitado. Assim, em rede com os irmãos, manifesta a sua confiança e tranquilidade perante o seu Deus tal como a criança se sente segura e afagada ao colo da mãe (bela expressão sálmica esta do rosto materno de Deus), sem obsessão pelo futuro ou pela sorte.
Estão inscritos no céu – diz Agostinho de Hipona – os nomes dos fiéis que amam a Cristo e andam pelo caminho que Ele ensinou, que n’ Ele creem e amam a sua paz. Por outro lado, o salmo enaltece a atitude de quem tem olhos simples e puros que levam a que as coisas mais simples sejam apreciadas pelas almas simples e os pequenos gestos constituam a identidade dos homens grandes.
Esta é também a “lição das coisas”, esta é a lição das mães intuitivas e generosas!

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

A dimensão social da atividade e da empresa

O n.º 1134 da revista Visão, de 27 de novembro, insere dois trabalhos que me levam à reflexão sobre o tema referenciado em epígrafe. O primeiro vem subordinado ao título “Ricos (pouco) solidários”; e o segundo glosa o tema “Ganhar a vida a ajudar os outros”.
Não é novidade a assunção da função social da propriedade em consonância com a essencialidade da dimensão social do homem – sempre ele e as suas circunstâncias, o ser relacional, o ser num presente conexo com uma tradição constructa (decorrente de um passado acumulador de valores e prenhe de promissor futuro), o ser eminentemente cultural – e com o destino universal dos bens. Por outro lado, por motivos vários, a maior parte dos empresários inscreve nos seus orçamentos e/ou no das coletividades que tutelam e/ou administram, o bolo social e cultural. Não sei se o que dita esta vertente orçamental é a racionalidade gestionária, a convicção humanista ou a imagem do empresário e da organização. O certo é que hoje não há praticamente empresa nenhuma de larga dimensão que não tenha como anexa uma instituição ou um departamento de pendor social e/ou cultural. Recordo a, título de exemplo, a fundação de vocação social e humanitária da Microsoft, a Fundação EDP, a Fundação Manuel dos Santos (ligada ao Grupo Jerónimo Martins) ou a Culturgest (ligada à CGD).
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A mencionada revista Visão, em relação ao primeiro dos aludidos trabalhos, traz a indicação de que, segundo um estudo da Sair da Casca e da Informa DB, “uma em cada cinco empresas portuguesas fez, pelo menos, um donativo de cariz social. O predito estudo analisou os relatórios de 294 mil sociedades. E os números referentes a 2012 cifram-se em 112,6 milhões euros de donativos, ou seja, 1,9% dos lucros antes de impostos. De acordo com o mesmo documento, entre 2010 e 2012, regista-se um decréscimo de 11% no número de empresas que procederam a contribuições de índole social e uma redução de 15% no respetivo valor.
Também é verdade que aqueles que mais gastam na vertente social são os homens mais ricos em Portugal, mas os valores despendidos em filantropia não são diretamente proporcionais aos seus valores de fortuna. Os três maiores filantropos são, nominalmente e por esta ordem, Belmiro de Azevedo (Missão Sorriso, Instituto de Imunologia Molecular da Universidade do Porto e JAP/empreendedorismo escolar), Alexandre Soares dos Santos (Alimentação) e Américo Amorim (bolsas de estudo para jovens licenciados). É certo que as ações de filantropia empresarial estendem-se a muitas outras entidades, como a Mota Engil e as já referidas CGD e EDP. Todavia, embora pareça contradição, os portugueses com maiores habilitações e mais rendimentos são aqueles que dão menos importância às questões de solidariedade – conclui um estudo desenvolvido pela Universidade Católica em parceria com o Instituto Luso-Ilírio para o Desenvolvimento Humano, que mostra, ainda, que, não obstante a existência de maior tolerância a grupos discriminados pela sociedade, o individualismo cresceu cerca de 10% nos últimos dez anos em Portugal.
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Mas, no atinente ao segundo trabalho, é reconfortante saber que, neste mundo de egoísmo, “há empreendedores que avaliam o sucesso dos seus negócios mais pelo impacto social que provocam do que pela maximização do lucro”. No entanto, sabem que a sustentabilidade é necessária como garantia da eficácia da sua missão, que se perspetiva na possibilidade de ganhar dinheiro a mudar o mundo (negócios com alma e coração), contrariamente a muitos que, pela ganância, querem ganhar dinheiro a destruir o mundo da natureza e o do homem.
Sem falarmos na plêiade de voluntários e de profissionais que trabalham nos mais diversos setores em desgaste pela vida dos outros – Igrejas, Banco Alimentar, Cáritas, Cruz Vermelha, Bombeiros, instituições particulares de solidariedade social, instituições públicas e privadas de saúde e educação, forças policiais e forças armadas, autarquias e tantas outras modalidades de projeto e ação (muitas e excelentes muitas delas) – a revista faz uma pequena súmula de projetos e empresas que avançam na linha dos ditos negócios com alma e coração.
Destaca-se, logo de início, a empresa Vitaminos, criada por Ana Quintas, professora de Geografia em Cascais, depois de ler a Carta Europeia da Luta Contra a Obesidade, que promove a atividade física e a alimentação saudável e se financia através dum serviço de cafetaria e organização de eventos pagos, promovendo ainda companhas de sensibilização nas escolas.
Por seu turno, Joana Santiago criou uma IPSS, designada por Banco de Informação de Pais para Pais (BIPP), que se destina a dar formação, em parceria com o Instituto Superior de Agronomia de Lisboa, onde se realizam os cursos do projeto “Semear”, e promover a inserção dos formandos (com deficiência) no mercado de trabalho, garantindo desde já 15 empregos. Para tanto, dispõem da exploração de uma quinta com 20 hectares e de uma exploração com o Grupo Jerónimo Martins, que garante o escoamento dos produtos agrícolas, a ajuda no pagamento de salários e a continuidade dos cursos de formação, nomeadamente em operadores agrícolas, com recurso a ferramentas manuais e à maquinaria agrícola.
Depois, alinhado na dinâmica do “negócio social”, expressão inventada pelo Nobel da Paz Muhammad Yumus, criador do microcrédito, Miguel Alves, docente de empreendedorismo social na Nova SBE, em Lisboa, e no Instituto de Empreendedorismo Social (IES), de que é cofundador, acredita, apesar de ainda não dispormos do figurino de empresa social (mas já de significativa dimensão social em algumas empresas) que, no futuro próximo, teremos líderes dotados de uma consciência mais afinada sobre a importância e o potencial deste setor, o que redundará num aumento do PIB pelo lado da economia social (que hoje se cifra apenas em 3%, ocupando 5% da população ativa), a qual tem uma representação de cerca de 25% do PIB em países como a França e o Reino Unido. Com o fito de conseguir a captação de investimento nesta área, criaram, em parceria com a EDP, a partir de Leiria, o Speak, a escola de línguas que combate a exclusão social de imigrantes.
Convém advertir que nem todas as respostas sociais têm de ser negócio e que, apesar de algumas empresas manifestarem grande ceticismo na existência de profissionalismo na economia social (mais atreita a estilos assistencialistas), muitos deixaram empregos marcados pela estabilidade e lucro de mercado (de efeito imediato) e voltaram-se para o trabalho social, encarando o negócio social como espaço de deteção de problemas e encontro de soluções sustentáveis com impacto social. Passa isto pela utilização dos mecanismos de mercado para operar mudanças sociais.
Ressalta também o papel da Comunicação para a Economia Social (CES), uma agência de comunicação especializada no terceiro setor, com escritório no Porto. A sua equipa tenta adaptar os preços às possibilidades de cada cliente, esbarrando com a dificuldade em sensibilizar as organizações para a questão, mas recebendo apoios vários.
Salienta-se ainda o papel da Ajuda sem Fronteiras, com equipas de voluntários, em Lisboa, que recebeu turistas da Impact TRIP e se dedica a várias atividades, nomeadamente a distribuição de refeições, roupas e conversação aos sem-abrigo, bem como o projeto Marias, cofundado pela Fundação EDP e que funciona como uma agência de empregadas domésticas, recrutando pessoas de contextos sociais vulneráveis, sobretudo do mundo imigrante.
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A leitura dos trabalhos da Visão permite-nos concluir que iniciativas destas tiveram origem em contactos com literatura social elaborada e aprovada a nível internacional, em experiência da vida pessoal, por vezes, aflitiva e a apresentar a necessidade de superação, a premência social, o exemplo de outrem e naturalmente a crise sistémica de enorme impacto social que se instalou também entre nós, a causar os seus estragos e de forma bem caprichosa.

Não sei se a mesma crise não terá, por outro lado, inibido alguns de continuarem a prestação solidária e se não terá colocado algumas pessoas no bastião defensivo dos haveres considerados cada vez mais exíguos. No entanto, a solidariedade fraterna é a dimensão que melhor responde ao pré-requisito do destino universal dos bens, de modo a satisfazer as necessidades e as justas aspirações de cada um, ao ditame profundo da realização pessoal e ao desígnio da construção do tal mundo novo, que é urgente e em que todos caibam com a dignidade que lhes é devida por direito.

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Muita para pouca uva!

O adágio começou a bailar nos últimos dias, depois de ler no Público do dia 25 de novembro uma reportagem de Rosa Soares e Mariana de Oliveira no quadro da “Operação Marquês” e mais propriamente a informação que serve de título – “Só 2% dos alertas por suspeitas de branqueamento dão origem a inquéritos-crime”.
Sobretudo depois que entrou em vigor a Lei n.º 25/2008, de 5 de junho, é frequente termos notícias de investigação e detenção de diversas figuras de relevante posição política, social e administrativa sob a suspeita, alegadamente fundada em indícios, de branqueamento de capitais. Também não é raro um cidadão ser investigado, detido e levado a julgamento, indiciado e depois acusado por umas dezenas (às vezes centenas) de crimes, para, em sede de julgamento, a maior parte deles acabar por ter caído. Isto, para não falar dos casos em que nada fica provado ou em que a prova ficou reduzida à sua expressão mais simples. Mesmo agora, a propósito da espetacular detenção e interrogatório do político Sócrates, alguma informação trazida a público refere que o mandato de detenção continha também o indício do tráfico de influência, que terá caído pelo caminho no percurso aeroporto-DCIAP-Comando Metropolitano da PSP.
Dizem alguns que invocar o pretexto de branqueamento de capitais permite a mobilização de melhores condições para a investigação, mas também há quem suspeite de que esse indício será, algumas vezes, invocado propositadamente com o fito de dispor das tais condições mais propícias ao trabalho investigativo. É óbvio que não me pronuncio sobre a verdade de tal suspeição já que não me é dado conhecer das matérias processuais.
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A referida lei “estabelece medidas de natureza preventiva e repressiva de combate ao branqueamento de vantagens de proveniência ilícita e ao financiamento do terrorismo e transpõe para a ordem jurídica interna as diretivas n.os 2005/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de outubro, e 2006/70/CE, da Comissão, de 1 de agosto, relativas à prevenção da utilização do sistema financeiro e das atividades e profissões especialmente designadas para efeitos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo”. Por outro lado, determina que “o branqueamento e o financiamento do terrorismo são proibidos e punidos nos termos da legislação penal aplicável”.
E, quando ouvi o Dr. Mário Soares, furibundo e emocionado, a clamar pela infâmia inerente à detenção mediática do ex-Primeiro-Ministro e a reclamar a inocência do mesmo, pareceu-me que o ex-Presidente estava a exagerar, a passar das marcas, a ter assomos de senilidade. Porém, ao ouvi-lo contrapor a sua ciência jurídica à do juiz de instrução criminal, pensei – é certo – em arrogância, mas ficou-me a morder a dúvida. E fui ler.
O artigo 2.º, ao especificar os conceitos atinentes a esta lei, no seu apartado 6), define claramente como “pessoas politicamente expostas” as pessoas singulares que desempenham, ou desempenharam até há um ano, altos cargos de natureza política ou pública, bem como os membros próximos da sua família e pessoas que reconhecidamente tenham com elas estreitas relações de natureza societária ou comercial. Para os efeitos previstos no presente número, consideram-se: a) “Altos cargos de natureza política ou pública”: i) Chefes de Estado, chefes de Governo e membros do Governo, designadamente ministros, secretários e subsecretários de Estado (…).
Sendo assim, continuei a ler e, sem poder concluir mais nada de sério, devo dizer que pode haver muitos motivos para investigar, indiciar, deter, inquirir e, eventualmente, acusar Sócrates, todavia, à face desta lei de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, nunca por ter sido Primeiro-Ministro. O “até há um ano” já está mais que ultrapassado. Por isso, a insistência mediática na detenção de Sócrates enquanto ex-Primeiro-Ministro, embora compreensível, é importuna, como é insustentável aliar presumíveis desmandos socráticos às suas funções de governante – o que aliás fez Marcelo no seu mais recente discurso dominical (que afora esta circunstância, me pareceu bastante esclarecedor). Duvido, ainda, que Sócrates tenha andado a financiar o terrorismo.
Se, de facto, o cidadão enriquecera ilicitamente durante o tempo de governante, as autoridades fiscalizadoras e obrigadas à emissão de alertas, deveriam tê-lo feito há muito tempo. Que eu saiba, não é proibido, em Portugal, investigar governantes no ativo, embora, no caso do Presidente da República, do Presidente da Assembleia da República e do Primeiro-Ministro, a decisão e autorização de investigação caibam ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que, a meu ver, não pode deixar de atuar se o superior interesse nacional o postular.
Talvez fosse bom, a par de outros, ouvir também os velhos juristas como Mário Soares (mesmo com o desconto da idade), Artur Marques, Costa Andrade e outros. É que as leis não se baseiam em ciência exata e não sei se um juiz, por mais erudição de que seja dotado, é capaz de contornar todos os escaninhos do sistema criminal e penal.
Lei tão forte contra um cidadão, que foi ministro e chefe de governo ou indícios de três crimes (todos qualificados, diversificados e de incidência económica) e tanto mediatismo e espetáculo não serão mesmo muita parra, pouca uva? Vamos ver qual o desfecho deste processo, que Sócrates diz só agora ter começado!
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Mas voltemos às questões da invocação do indício de branqueamento de capitais. Por mais que se diga em contrário, cabe ao autor a produção dos factos e não ao senhor arguido provar a sua inocência, como bem assegurou Costa Andrade no último programa Prós e Contras, da RTP, já que se goraram, na lei, todas as tentativas intentadas da inversão do ónus da prova no tocante ao presuntivo enriquecimento ilícito. No entanto, também se requer que o causídico que o representa em juízo e fora dele proceda a uma defesa ativa, que destrua a validade da argumentação da acusação e encontre todos os álibis que obstem à invocada veracidade de factos aduzidos pelo autor. Mais: em abono do possível “muita parra pouca uva”, devo reter alguns dados da aludida reportagem do Público.
Apesar de se contarem inúmeras investigações e umas tantas detenções sob o pretexto do crime de branqueamento de capitais, “a proporção de inquéritos-crime abertos na sequência de alertas feitos ao abrigo das medidas de prevenção de branqueamento de capitais é baixa” – refere o dito jornal. O mais recente relatório anual, com dados relativos a 2010, da Unidade de Informação Financeira (UIF) da Polícia Judiciária – uma das duas entidades no país que recebem estas comunicações (a outra é o Ministério Público) – regista a receção de 10.623 alertas nesse ano. Tal volume de alertas originou 703 averiguações, o que significa que, após uma primeira ponderação, os inspetores da UIF decidiram recolher informação adicional em menos de 7% dos casos. E, destes, apenas 240 deram azaram a inquéritos-crime, isto é, pouco mais do que 2% do mencionado volume de alertas emitidos. E resta saber quantos dos casos de inquérito-crime chegaram ou chegarão à fase de julgamento com a clara decisão condenatória ou absolutória.
Dados do ano de 2013 indicam que, nesse ano, “a Polícia Judiciária propôs a suspensão de cerca de 40 operações suspeitas, que envolviam, no total, cerca de 20 milhões de euros e 10 milhões de dólares”, quando, em 2010, a UIF pedira “a suspensão de apenas 14 operações que implicavam a movimentação de 20,6 milhões de euros e 6,5 milhões de dólares”.
Segundo o Público, estes dados ganharam novo realce com a informação, da parte da Procuradoria-Geral da República (PGR), de que fora um destes alertas que deu azo à demorada investigação em que o ex-líder do governo José Sócrates é visado. O ex-governante foi detido no passado dia 21, por indícios de branqueamento de capitais, fraude fiscal qualificada e corrupção, e soube no dia 24 que fica em prisão preventiva, alegadamente por constituir perigo de perturbação do processo. A PGR esclareceu, há dias, que o “inquérito teve origem numa comunicação bancária efectuada ao Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) em cumprimento da lei de prevenção e repressão de branqueamento de capitais, Lei n.º 25/2008, de 5 de junho, já citada, que transpôs diretivas da União Europeia”. E adiantou, não sei por que motivo, que este processo nada tinha a ver com o do “Monte Branco”, como hoje, dia 27, foi salientado que as buscas na sede do BES e nas casas de Salgado e familiares também nada têm a ver como o caso do “Monte Branco”. Já não bastava que se acentuasse intempestivamente a independência e separação dos poderes, como ainda se faça questão na independência de processos, como se a eventual conexão fosse um facto anormal ou danoso.
No entanto, os alertas da UIF terão atingido várias operações em que se destacam José Sócrates e mais três arguidos, bem como candidatos aos conhecidos vistos gold, apanhados na “Operação Labirinto”, nomeadamente um cidadão chinês detido em março, no âmbito de um mandado de captura internacional emitido pela Interpol a pedido das autoridades chinesas. Em final de março, o DCIAP – outra das entidades que recebem os comunicados de alerta – informava que até então tinham sido emitidos cerca de cem “casos de alerta para operações financeiras conexas com pedidos de autorização de residência para investimentos”. São processos diferentes. Serão, desconexos ou a sua independência será artificiosa?
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No caso Sócrates, tanto o próprio como o seu advogado e Mário Soares sustentavam o caráter ilegal da detenção e da prisão preventiva. De Sócrates, percebo que se sinta incomodado e que, como qualquer detido, se sinta injustiçado e que proteste a sua inocência até sentença ou acórdão transitado em julgado. De Mário Soares, além da postura de solidariedade e da sua ciência jurídica, retenho o seu passado de luta contra um regime em que o jurista criticava o facto de as pessoas serem presas sem julgamento prévio ou serem julgadas em processo sumário e sem defesa real e livre. Porém, o advogado de Sócrates levou-me a considerar o facto de Sócrates ter sido governante há muito mais de um ano, as concomitantes e subsequentes infrações ao segredo de justiça e de a sua detenção ter sido acompanhada por agentes da Autoridade Tributária e Aduaneira e não pela Polícia Judiciária (a competente para o efeito), já que alegadamente se invocava o indício de branqueamento de capitais. E, se depois de tudo, “a montanha vier a parir um rato”, que diremos da justiça?
Nem me conforta a fuga à discussão política destes casos quando se argumenta rapidamente “à política o que é da política e à justiça o que é da justiça”. Costa Andrade também criticou esta ligeireza, como se à economia o que é da economia e à política que é da política e assim noutros setores, como se – penso – os magistrados não tivessem também postura, agenda e ambição política. Por mim, entendo que a separação dos poderes e a sua independência não podem servir de pretexto para fugir à discussão. Primeiro, a separação não impede, antes pressupõe a interdependência e o mútuo escrutínio (o próprio Primeiro-Ministro disse, no passado domingo, que por enquanto não iria comentar estes casos da justiça); segundo, os poderes diversos, na área do poderio do Estado, têm de funcionar segundo a originária lógica dos contrapesos, como instrumentos de mútua limitação; e terceiro, porque, por um lado, o poder político reside no povo e a justiça é administrada em nome do povo, e, por outro, quando a Constituição trata da organização do poder político, enumera como órgãos do poder político soberano: o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais. E ainda temos como órgãos de poder político, embora não soberano, os órgãos regionais e os do poder local.
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Também a “muita parra e pouca uva” se poderá aplicar no caso da procura do investimento no âmbito da diplomacia económica e da agência do investimento estrangeiro e comércio externo, quando não se tem a noção dos limites. A informação de hoje dá conta de que o Vice-Primeiro-Ministro e o Presidente da República achariam que a candidatura dos magnatas do Dubai à compra da TAP seria “um bom negócio”, como se um setor empresarial estratégico para o país se satisfizesse com “um bom negócio” e não o superior interesse público.
Mas não é difícil perder o sentido da decência. Veja-se, além do caso dos vistos Gold, o da preocupação do Presidente de propagandear o país: um país paradisíaco, com sol, mulheres bonitas, cavalos e aviões… Ainda que este género de promoção desse como resultado um muito grande êxito na captação de investimento estrangeiro, não se justificava pôr em paralelo aqueles elementos discursivos. E, se também aqui a parra asfixiar a uva? 

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

A Europa precisa de ouvir quem lhe fale!

Em reflexão anterior já dava conta do acontecimento: o Papa Falou ao Parlamento Europeu – instituição fundamental da vida da União Europeia – onde apontou o dedo ao drama da “solidão” e denunciou o “tecnicismo” das instituições comunitárias, mas também deixou uma mensagem de esperança e encorajamento.
Evocando a visita de João Paulo II há mais de 25 anos, o Pontífice assinalou a mudança substantiva da Europa, que deixou de estar repartida por dois blocos políticos e económicos contrapostos e que agora se encontra num contexto duma União Europeia institucionalmente mais ampla inserida num “mundo mais complexo e em intensa movimentação”. É um mundo crescentemente mais “interligado e global” e “menos eurocêntrico” e em que a “uma União mais alargada, mais influente,” se justapõe a “imagem duma Europa um pouco envelhecida e empachada”, talvez menos protagonista num mundo que a “olha com indiferença, desconfiança” e até com suspeita.
Ora, a dimensão de esperança da aludida mensagem radica na confiança de que as dificuldades se tornem promotoras de unidade e de superação dos medos que a Europa enfrenta e na confiança que depositamos “no Senhor que transforma o mal em bem e a morte em vida”. Já a dimensão do encorajamento leva à convicção da capacidade do trabalho conjunto para “superar as divisões e promover a paz e comunhão entre todos os povos do Continente”. Para tanto, precisa-se dum “ambicioso projeto político”, assente na “confiança no homem” – mais do que cidadão ou sujeito económico – como “pessoa dotada duma dignidade transcendente”.
O Papa assume a “dignidade” como palavra-chave que, caraterizando a recuperação do pós-guerra, marca a “inegável centralidade” da dignidade humana “contra as múltiplas violências e discriminações”, que não faltaram ao longo dos séculos, mesmo na Europa. Nesta perspetiva, surge, como resultado de longo caminho, a percepção da importância dos direitos humanos, que levou a formar a “consciência da preciosidade, unicidade e irrepetibilidade de cada pessoa”.
E é à luz do critério da dignidade que Francisco se interroga face ao tratamento dos homens como objetos, que se descartam quando se tornam frágeis, doentes ou velhos; perante o cerceamento da expressão livre do pensamento ou da fé religiosa; ante a inexistência dum “quadro jurídico claro, que limite o domínio da força e faça prevalecer a lei sobre a tirania do poder”; em face da coisificação e discriminação do homem e da mulher; ou perante a privação do alimento e do mínimo necessário para viver e do acesso ao trabalho dignificante.
Também neste areópago, o Bispo de Roma apela ao justo entendimento do conceito de direitos humanos, contra o pendor meramente reivindicativo e individualista, olvidando quem está ao lado e que detém exatamente os mesmo direitos, ao abrigo duma conceção de pessoa “separada de todo o contexto social e antropológico, quase como uma ‘mónada’ (μονάς) cada vez mais insensível às outras ‘mónadas’ ao seu redor”. Ao conceito de direito – lamenta – já não se associa a noção também essencial e complementar de dever, afirmando-se os direitos do indivíduo sem ter em conta que o ser humano está unido ao contexto social, onde os seus direitos e deveres estão ligados aos dos outros e ao bem comum da sociedade. Pelo que é cada vez mais necessário “aprofundar uma cultura dos direitos humanos” que articule a dimensão pessoal com a do bem comum, numa perspetiva holística, mas na atenção a cada um, de modo que o direito de cada um não venha a tornar-se fonte de conflitos e violências.
Por ouro lado, enunciar a dignidade transcendente do homem implica assumir a sua natureza e a capacidade inata de distinguir o bem do mal, aquela “bússola” gravada por Deus nos corações; e significa olhar o homem como um ser relacional – vertente negada por uma das doenças mais difusa na Europa – a solidão – típica de quem está privado de vínculos. Esta marca emerge particularmente nos idosos, tantas vezes abandonados à sua sorte; nos jovens privados de pontos de referência e de oportunidades para o futuro; nos numerosos pobres que povoam as nossas cidades; e no olhar perdido dos imigrantes que vieram à procura dum futuro melhor.
Esta solidão ficou agravada pela crise económica, de consequências dramáticas do ponto de vista social; e, apesar do alargamento da União, fez crescer a desconfiança dos cidadãos nas instituições consideradas distantes, ocupadas a estabelecer regras ao arrepio da sensibilidade dos povos. De vários lados – diz o Papa – se colhe uma impressão geral de cansaço e de envelhecimento, duma Europa-avó, não fecunda nem vivaz, em que os grandes ideais parecem ter perdido força de atracão, em favor do tecnicismo burocrático das instituições.
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A prevalência da absolutização da técnica gera a confusão entre fins e meios, de que resultam estilos de vida egoístas, caraterizados por uma opulência insustentável e indiferente ao mundo circundante, sobretudo o dos mais pobres. E, ao centrar o debate político nas questões técnicas e económicas, em detrimento duma autêntica orientação antropológica, o ser humano corre o risco de se ver reduzido a mera engrenagem dum mecanismo que o trata como se fosse um bem de consumo, objeto de descarte, quando deixa de ser funcional e útil, como é o caso dos doentes, sobretudo terminais, dos idosos abandonados e sem cuidados, ou das crianças mortas antes de nascer. É a viciosa «cultura do descarte» e o estilo do «consumismo exacerbado». Ao invés, valorizar a dignidade da pessoa significa reconhecer a preciosidade da vida humana, que nos é dada gratuitamente não podendo, por conseguinte, ser objecto de troca mercantil.
Assegura o Papa Francisco que, na sua vocação de parlamentares, os eurodeputados são missionados a “cuidar da fragilidade, da fragilidade dos povos e das pessoas” – o que significa “assumir o presente na sua situação mais marginal e angustiante e ser capaz de ungi-lo de dignidade”. Nestes termos, os eurocratas são confrontados com a seguinte questão:
Mas, então, como fazer para se devolver esperança ao futuro, de modo que, a partir das jovens gerações, se reencontre a confiança para perseguir o grande ideal de uma Europa unida e em paz, criativa e empreendedora, respeitadora dos direitos e consciente dos próprios deveres?

Para a reposta, o sumo orador socorre-se do afresco de Rafael Escola de Atenas, em cujo centro se vê Platão apontando para o alto e Aristóteles a estender a mão para a frente, para a terra. O céu indica a abertura ao transcendente, a Deus, que sempre caraterizou o europeu; e a terra representa a sua capacidade prática e concreta de enfrentar situações e problemas. Ora, segundo Bergoglio, o futuro da Europa depende da redescoberta do nexo vital e inseparável entre estes dois elementos. E é a partir da necessidade da abertura ao transcendente que se afirma a centralidade da pessoa; caso contrário, fica à mercê das modas e dos poderes momentâneos. Neste aspeto, é fundamental o património que o cristianismo deixou no passado para a formação sociocultural do Continente e sobretudo a contribuição que pretende dar hoje e no futuro para o seu crescimento – contribuição que, longe de constituir perigo para a laicidade dos Estados e independência das instituições, significa um enriquecimento, uma mais-valia. Neste contexto se inserem os ideais que a formam desde o início: a paz, a subsidiariedade e a solidariedade mútua, um humanismo centrado no respeito pela dignidade da pessoa.
Ao serviço daquele enriquecimento, o Pontífice renova a disponibilidade da Santa Sé e da Igreja Católica, através da Comissão das Conferências Episcopais da Europa (COMECE), para o diálogo profícuo, aberto e transparente com as instituições da União Europeia.
E o campo deste diálogo é imenso. Destacam-se, aqui, as numerosas injustiças e perseguições às minorias religiosas: “comunidades e pessoas são objeto de bárbaras violências, expulsas de casas e pátrias; vendidas como escravas; mortas, decapitadas, crucificadas e queimadas vivas, sob o silêncio vergonhoso e cúmplice de muitos”. Por outro lado, sob o digno do lema da União Europeia, Unidade na diversidade, a Europa é uma família de povos, que sentirão próximas as instituições se estas souberem conjugar o ideal da unidade, por que se anseia, com a diversidade própria de cada um, valorizando as tradições individuais, tomando consciência da sua história e das suas raízes e libertando-se de quaisquer manipulações e fobias.
É também preciso ter sempre em mente a arquitetura da União Europeia, assente sobre os princípios de solidariedade e subsidiariedade, de tal modo que prevaleça a ajuda recíproca e seja possível caminhar nas vias da mútua confiança. É, pois, na dinâmica de unidade-particularidade que se coloca ante os eurodeputados a exigência do cuidado de manter viva a democracia dos povos da Europa. Mas esta exigência implica que se evitem as “maneiras globalizantes” de diluição da realidade: “purismos, totalitarismos do relativo, fundamentalismos a-históricos, eticismos sem bondade, intelectualismos sem sabedoria”; e que se faça cessar a preeminência do poderio financeiro ao “serviço de impérios desconhecidos”, provocados pela pressão de interesses das empresas multinacionais avessos ao interesse universal.
Além do reconhecimento da centralidade da pessoa humana, a esperança da Europa passa por investir nela e nos âmbitos onde os seus talentos são formados e dão fruto. O primeiro âmbito é indubitavelmente o da educação, a começar pela família (que se quer cada vez mais sólida), célula fundamental e elemento precioso de toda a sociedade, seguindo-se as instituições educativas: escolas e universidades. Porém, a educação não se limita a fornecer um conjunto de conhecimentos técnicos, mas favorece o processo mais complexo do crescimento integral da pessoa. São inúmeras as potencialidades criativas da Europa em vários campos da pesquisa científica, alguns dos quais não estão totalmente explorados, entre os quais se conta o das fontes alternativas de energia, cujo desenvolvimento muito beneficiaria a defesa do meio ambiente. De facto, esta nossa terra tem necessidade de cuidados e atenções contínuos e é responsabilidade de cada um preservar a criação, dom precioso que Deus colocou nas mãos dos homens, de que não somos senhores, mas guardiões. Pelo que, em vez de nos deixarmos levar pela soberba do domínio, da posse, da manipulação e da exploração, devemos amá-la e respeitá-la para bem e fruição de todos. Por exemplo, falando do setor agrícola, chamado a dar apoio e alimento ao homem, não se pode tolerar que milhões de pessoas no mundo morram de fome, enquanto toneladas de produtos alimentares são descartadas diariamente das nossas mesas. Além disso, respeitar a natureza faz-nos pensar que o homem é sua parte fundamental. Por isso, a par da ecologia ambiental, há que fomentar a ecologia humana e a economia ecológica, feitas do respeito pela pessoa entendido no sentido mais genuíno.
Outro âmbito em que florescem os talentos da pessoa é o trabalho. É, por isso, tempo de promover as políticas de emprego estável, para devolver dignidade ao trabalho e garantir as condições adequadas para a sua realização. De forma similar, é necessário enfrentar juntos a questão migratória, não se podendo “tolerar que o Mar Mediterrâneo se torne um grande cemitério”. 
Depois, a consciência da identidade europeia é necessária para dialogar de forma propositiva com os Estados que se candidataram à adesão à União Europeia no futuro, por exemplo, os da área balcânica, aos quais a entrada na União Europeia poderá dar resposta ao ideal de paz numa região que tem sofrido enormemente por causa dos conflitos do passado. E essa consciência é indispensável também nas relações com os outros países vizinhos, particularmente os que assomam ao Mediterrâneo, sobretudo os que sofrem em virtude dos conflitos internos e da “pressão do fundamentalismo religioso e do terrorismo internacional”.
Aos eurodeputados enquanto legisladores cabe a tarefa de preservar e fazer crescer a identidade europeia, para que os cidadãos recuperem a confiança nas instituições e no projeto de paz e amizade.
O Papa estriba a posição da Igreja ante estes problemas geopolíticos citando a carta a Diagoneto, de um epistológrafo anónimo do século II, que ensina que “os cristãos são no mundo o que a alma é para o corpo”. Ora, como tarefa da alma é sustentar o corpo, ser a sua consciência e memória histórica, também uma história já bimilenária liga a Europa e o cristianismo, não sem conflitos e erros ou mesmo pecados, mas sempre marcada pelo desejo de construir o bem. Trata-se de uma história espelhada “na beleza das nossas cidades e, mais ainda, na beleza das múltiplas obras de caridade e de construção humana comum que constelam o Continente” e que “ainda está, em grande parte, por escrever”, já que “ela é o nosso presente e também o nosso futuro”.
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Finalmente, o Servo dos Servos de Deus deixa aos Queridos Eurodeputados o repto explícito:
“Chegou a hora de construir juntos a Europa que gira, não em torno da economia, mas da sacralidade da pessoa humana, dos valores inalienáveis; a Europa que abraça com coragem o seu passado e olha com confiança o seu futuro, para viver plenamente e com esperança o seu presente.
“Chegou o momento de abandonar a ideia de uma Europa temerosa e fechada sobre si mesma para suscitar e promover a Europa protagonista, portadora de ciência, de arte, de música, de valores humanos e também de fé. A Europa que contempla o céu e persegue ideais; a Europa que assiste, defende e tutela o homem; a Europa que caminha na terra segura e firme, precioso ponto de referência para toda a humanidade!”

Afinal, o Papa falou à Europa, por mais que associações como a Associação República e Laicidade quisessem coarctar tal evento, num desviado e ultraconservador sentido da laicidade e num exclusivista significado de democracia. Falou às duas grandes assembleias da Europa. E os discursos, semelhantes, são pertinentes, uma vez que puxam pela identidade, pelas raízes, pelo ideal construído no passado, mas para almejar um futuro de paz, progresso e solidariedade, libertando o Continente do cansaço, da estagnação e da desconfiança e propondo o culto dos valores.

Se precisa de quem lhe fale, a Europa deve escutar quem lhe fala!