quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Mistérios do rosário semana a semana na caminhada do Natal

A caminhada do Natal deste ano na diocese do Porto integra o ideário do seu ano pastoral para 2016/2017, sob uma inspiração mariana, “Com Maria, renovai-vos nas fontes da alegria.
Ora, como escreveram os mentores da organização do ano pastoral (cuja diretriz seguirei), “entre estas fontes, de que brota o encontro com Cristo, está a oração”, “uma das principais fontes da alegria, em que se renova a fé, na luz, guia e companhia de Maria”. Neste contexto espiritual, propuseram parte da oração do rosário para fomento da vivência do mistério do Natal, agradecendo a “visita da Imagem da Virgem Peregrina” e evocando a “celebração do centenário das aparições de Fátima”, onde pontifica a paciência, a pedagogia e a espiritualidade do rosário.
Na verdade, a recitação do rosário pode suscitar a aproximação ao reino de Deus, dado ser uma presentificação da palavra bíblica do anúncio da encarnação com vista à redenção santificadora.
Sendo assim, o crente através da saudação e prece a Maria, encaminhante para o mistério do Pai em Jesus, coloca-se “no princípio da salvação e da criação do mundo”. Ao repetir a saudação do Anjo e de Isabel, o cristão entra progressivamente no âmago da fé, “onde a eficácia da criação e da salvação se torna real”.
Mais do que repetição mecânica, a reiteração insistente, observada a obediência ao Espírito Santo, torna o coração invadido pela respiração da Vida do Pai, criador e aglutinador de inteligências e de vontades segundo o seu coração de simplicidade e misericórdia, e conforma-o, e molda-o fazendo-o tomar “as qualidades que evoca”.   
Rezar implica mudar-se em mentalidade, postura e comportamento, comprometendo-se, à palavra que escuta de Deus e que, por sua vez, profere com fé e confiança, a sério na relação com Deus, consigo próprio, com o próximo e com o mundo enquanto casa comum que importa dominar sem destruir, mas cuidar conservando-a e rentabilizando-a de forma sustentável.    
A septenária meditação rezada de mistérios do rosário proposta pela competente autoridade diocesana (um mistério em cada uma das sete semanas) “é apenas uma sugestão contextualizada no espírito e objetivos da caminhada do Natal. Propõe-se “um mistério do rosário, rezado diariamente, ou uma vez por semana, ou noutro ritmo, de acordo com as sensibilidades e possibilidades de cada família”. Não se observa o esquema tradicional, mas selecionaram-se temas e textos atinentes aos mistérios gozosos em torno duma brevíssima leitura bíblica, por vezes bipartida dando à recitação a configuração de liturgia da Palavra.
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O esquema oracional é o seguinte: invocação da Santíssima Trindade (P. Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. / R. Amém!); convite à oração e resposta (P. Com Maria e José, oremos ao Senhor! / R. Neste Natal, Ele nos dê a alegria do Seu amor!); uma admonição da parte de quem preside, a enquadrar o tema da semana; a brevíssima e condicente leitura bíblica; o convite à recitação do mistério; a recitação do Pai-Nosso, 10 Ave-marias e Glória; invocação a Maria, a José ou à Sagrada Família (variável); e termo (P. Bendigamos ao Senhor! / R. Neste Natal, Ele nos dê a alegria do Seu amor!).
Na 1.ª semana do Advento,
- A admonição releva a advertência da Palavra de Deus à atitude de atenção a “não deixarmos arrombar a nossa casa”, ou seja, a afastar a ameaça de tristeza, divisão e violência. No espaço de casa orante, Deus fala e transforma. Quando Deus chamou Maria, surpreendeu-a em casa. A casa do Jesus do presépio é a gruta, a significar pobreza e abandono, mas também aconchego, intimidade e proteção, a trilogia que temos de pedir para todos e a que todos têm direito.
 - A Leitura bíblica é:
“Ao entrar em casa de Maria, o anjo disse-lhe: Salve, ó cheia de graça, o Senhor está contigo (Lc 1,28).
- Pede-se, em família, que “a nossa casa esteja sempre bem guardada pelo amor de Deus, entre todos os seus filhos”.
- Recita-se o Pai-Nosso, as 10 Ave-marias, o Glória e a seguinte invocação: P. Maria, digna morada de Jesus! / R. Rogai por nós!
Na 2.ª semana do Advento,
- A admonição compara a família a uma árvore que deve dar fruto (a árvore de Natal está associada ao Natal e ao presépio, pela esperança e vida que sugere). Os filhos como o “rebento” mais esperado são “o fruto” mais bendito do casal e da família. Porém, o casal que não recebe esse fruto encontrará formas de realização na ajuda a pessoas e instituições.
- A Leitura bíblica, desta vez é bipartida, de Lucas e de Mateus:
Isabel exclamou:
“Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre” (Lc 1,42).
E quando foi anunciado a José o nascimento do Menino, também lhe foi dito:
“Não temas receber Maria, pois o que ela concebeu é fruto do Espírito Santo” (Mt 1,20).
- Roga-se pelas grávidas e pelas crianças nascidas ao longo deste ano de 2016, para que as mães sejam apreciadas como espaço gerador de vida e as crianças acolhidas como fruto bendito e para que as famílias sem filhos encontrem vias de generosidade efetiva e afetiva.
- Recita-se o Pai-Nosso, as 10 Ave-marias, o Glória e a seguinte invocação: P. Maria, Mãe bendita e Imaculada! R. Rogai por nós!
Na 3.ª semana do Advento,
- A admonição recorda-nos a nossa condição de mensageiros do sonho de Deus. Como à casa de Maria e de José, Deus envia os anjos do Natal e do presépio a nossa casa para comunicar bênção. E esses anjos hoje têm o rosto de pessoas que ajudam, confortam e orientam.
- A Leitura bíblica é:
“O anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um homem chamado José, da casa de David; e o nome da virgem era Maria” (Lc 1,26-27).
- Suplica-se que os primeiros anunciadores, mensageiros de Deus, sejam os e as que vivem em nossas casas.
- Recita-se o Pai-Nosso, as 10 Ave-marias, o Glória e a seguinte invocação: P. Maria, Mãe do Evangelho vivo! / R. Rogai por nós!
Na 4.ª semana do Advento,
- A admonição transporta-nos o nosso pensamento para Belém, a Casa do Pão – referência do nascimento de Jesus. E é à luz da condição da família de Nazaré, que se prepara para o nascimento do Menino, que nós pensamos nas famílias pobres e nas dificuldades dos casais no início de vida familiar.
- A Leitura bíblica é bipartida, de dois passos de Mateus:
“Eis que o Anjo do Senhor lhe apareceu em sonhos e lhe disse: José, filho de David, não temas receber Maria, tua esposa’ (Mt 1,20).
E, quando Herodes pretendia matar o Menino, o Anjo apareceu em sonhos a José e disse-lhe:
“Levanta-te e foge para o Egito e fica lá até que eu te avise” (Mt 2,13).
- Reza-se a São José que leve as nossas famílias a sonhar e a enfrentar com coragem as dificuldades, que os refugiados encontrem países e famílias que os acolham e que as famílias se tornem berços de esperança para o mundo.
- Recita-se o Pai-Nosso, as 10 Ave-marias, o Glória e a seguinte invocação: P. São José, Esposo de Maria! / R. Rogai por nós!
Na Oitava do Natal,
- A admonição centra-nos na celebração alegre do nascimento de Jesus, cujo anúncio foi, pelos anjos, feito em primeira mão aos pastores, que vigiavam atentos ao rebanho e aos sinais do Céu.
- A Leitura bíblica é:
“Hoje, na cidade de David, nasceu-vos um Salvador, que é o Messias, Senhor. Isto vos servirá de sinal: encontrareis um menino envolto em panos e deitado numa manjedoura” (Lc 2,11-12).
- Pedimos que todos nós, como os pastores, guardemos o sonho natalino, para fazermos de “toda a vida da família um ‘pastoreio’ misericordioso” (AL 322).
- Recita-se o Pai-Nosso, as 10 Ave-marias, o Glória e a seguinte invocação: P. Sagrada Família de Nazaré! R. Rogai por nós!
Na semana de um de janeiro à Epifania,
- A admonição convoca-nos para o início de um novo ano civil e, para, sob a égide de Santa Maria, Mãe de Deus, agradecermos a vida e a fé e trabalharmos pela paz.  
- A Leitura bíblica é meditativa e a meditação do mistério é fonte de ação sustentável:  
“Maria conservava todas estas palavras, meditando-as em seu coração” (Lc 2,19).
- Ora-se à Mãe de Deus para que nos ajude a guardar as três palavras da boa convivência – por favor, desculpa e obrigado/a, de modo que haja Paz em casa e a Paz chegue a todos os filhos de Deus, a todos os filhos da Paz, dispersos pelo mundo.
- Recita-se o Pai-Nosso, as 10 Ave-marias, o Glória e a seguinte invocação: P. Maria, Rainha da Paz! / R. Rogai por nós!
Na semana entre a Epifania e o início do Tempo Comum,
- A admonição leva-nos a considerar o sonho de Isaías para uma “humanidade reconciliada no amor e na paz”. O presépio, como Casa dos sonhos, faz-nos aprender com Maria e José a espera pelo sonho, abrindo-nos às surpresas de Deus.
- A Leitura bíblica é a conclusão da manifestação dos Magos, os reis da visão e do sonho:
Avisados em sonhos, os Magos regressaram à sua terra por outro caminho” (Mt 2,12).
- Ora-se pelas famílias, abertas às surpresas de Deus e cresçam com as dificuldades do caminho.
- Recita-se o Pai-Nosso, as 10 Ave-marias, o Glória e a seguinte invocação: P. Maria, Estrela da evangelização! R. Rogai por nós!
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Um ótimo itinerário orante – familiar, grupal ou pessoal – aderente ao Natal. Laus Deo!

2016.11.30 – Louro de Carvalho

O árbitro que o é e não o é

A pretexto da declaração de que não tem de promover ou travar líderes partidários ou de que não deve “imiscuir-se na vida dos partidos”, Marcelo Rebelo de Sousa reivindica para si, na qualidade de Presidente da República, o papel de árbitro. Porém, só árbitro é que Marcelo não é. 
Já em tempos tentei demonstrar que o nosso ordenamento constitucional confere ao Chefe de Estado funções bem diferentes das do árbitro, dado o seu poder efetivo, embora não como agente operacional da produção legislativa ou da atividade executiva, nem mesmo da função judicial, a não ser na concessão de indultos sob proposta do membro do Governo responsável pela área da Justiça.
Por outro lado, o árbitro tem o papel da avaliação das condições para que se efetue o jogo, manda iniciar e finalizar o jogo. Acompanha o jogo, mas não intervém nele. Limita-se a assinalar falta ou golo, canto ou saída da linha e a determinar punições no imediato e a fazer relatório para eventuais sanções a posteriori.  
O Presidente não consegue suficiência para colocar por si um Governo na plenitude de funções nem é totalmente livre para nomear o Primeiro-Ministro e obviamente os ministros e secretários de Estado. Pode demitir o Primeiro-Ministro apenas quando estiver em causa o regular funcionamento das instituições democráticas, moldura situacional demasiado mal definida (Quem sabe dizer o que é isso?). No entanto, dispõe do poder de dissolução do Parlamento, exceto em determinadas circunstâncias claramente delimitadas no texto constitucional. De resto, goza de múltiplos e enormes poderes. A questão reside na interpretação que possa ou não fazer da sua amplitude.
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Ora, a interpretação que o atual Presidente faz dos poderes não é a de que são de árbitro, mas de quem intervém assiduamente no jogo de Estado, de quem o comenta e de quem se comenta a si mesmo. Isso não é de árbitro. Ademais, não se limita a representar o Estado e a garantir a sua unidade, mas quer ser o seu porta-voz.
Fala a propósito dos diversos acontecimentos por mais comezinhos que sejam: basta que cheguem ao seu conhecimento. Explica as razões dum veto político lançado sobre um decreto, como explica as razões por que faz a promulgação de muitos decretos do Parlamento e do Governo. Adianta-se a soluções legislativas, “prevendo” o sentido do desfecho do debate ou avisando que falará depois. Não se tornou neutral na questão da restrição dos contratos de associação entre o Ministério da Educação e as escolas privadas e forçou um regime transitório no decreto de avaliação dos alunos do ensino básico. Comentou com bastante amplitude o orçamento para 2016 e faz bom augúrio do orçamento que vem aí.
E agora acabou por destacar a “boa” estabilidade política, social e rigor financeiro vividos em 2016, admitindo mesmo que uma solução governativa baseada no centrão político não seria clarificadora.
Chegou a dizer que o Primeiro-Ministro era irritantemente otimista; e agora confessa que é “inevitável” que existam momentos de discórdia com o Chefe do Governo, porque o Presidente da República está acima dos partidos e acima dos debates entre governo e oposição, e garante:
“Para o país é bom que o governo seja forte, mas também é muito bom que a oposição seja forte, agora quem vai liderar qualquer dos partidos no futuro é uma decisão dos partidos, a pior coisa que o Presidente da República pode fazer é estar a imiscuir-se na vida dos partidos, tem de ter uma posição arbitral”.
Acha um disparate discutir o comando da oposição antes das eleições legislativas, referindo que seria um erro o PSD abrir uma guerra de sucessão neste momento.
Como porta-voz e comentador do Estado afirmou:
“É bom que haja na área do governo uma estabilidade que permita aos portugueses acreditar que aquilo que lhes é prometido vai ser cumprido e é bom que haja da parte da oposição uma estabilização de propostas políticas”.
E, frisou que é “bom” para o país que, nos próximos tempos, haja sinais que permitam converter em crescimento económico o que foi até agora o cumprimento dos compromissos europeus, o rigor financeiro e a compensação dos setores sociais que haviam sido sacrificados – está visto que mostra acreditar na solução governativa encontrada e crê na sua durabilidade. E defende que “temos de criar mais crescimento para que esta fórmula económica seja mais sustentável”.
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Não esqueceremos que o Presidente se empenhou nas questões da Banca, nomeadamente no caso do BPI, no verão passado, e na problemática atinente à CGD. A propósito do banco público, teve uma postura contraditória, visto que promulgou o decreto-lei n.º 39/2016, de 28 de julho, com a declaração de alguma acrimónia sobre vencimentos, mas, a 4 de novembro, proclamou Urbi et Orbi a obrigação de os administradores entregarem ao TC as declarações de rendimentos e de património, com base na alegada não revogação da lei de 1983 sobre a matéria. Não se limitou a um juízo político, mas vestiu a toga de jurisconsulto e de supremo doutor do Estado, o que veio a congraçar a benevolência de todos os partidos com assento parlamentar e do próprio TC, que até ao momento não se sentia estimulado.
Mais recentemente, assegurou que a tarefa mais importante dum sistema financeiro que se quer de boa saúde e solidez sistémica no país é a capitalização da Caixa Geral de Depósitos, mas acusou as sucessivas dificuldades que surgem mesmo quando menos se espera, o que a posteriori parece que significava a leitura que já fazia da crise levantada pelos administradores da CGD que eclodiu a seguir. Todavia, Marcelo não é inocente nesta matéria, pois, na sua clara declaração do princípio de novembro, refere:
“…considera-se que a obrigação de declaração vincula a administração da Caixa Geral de Depósitos. Compete, porém, ao Tribunal Constitucional decidir sobre a questão em causa. Caso uma sua interpretação, diversa da enunciada, vier a prevalecer, sempre poderá a Assembleia da República clarificar o sentido legal também por via legislativa.”
Como é que agora administradores do banco público vêm acusar o Parlamento, ao qual Marcelo deu uma força inequívoca, de haver tomado uma postura demagógica e populista ao determinar, com efeitos já neste mandato, que os administradores da CGD são obrigados à prestação das preditas declarações? É óbvio que o Parlamento é soberano e só o Presidente da República o pode contrariar posteriormente pelo mecanismo do veto político ou pelo da submissão do diploma à fiscalização abstrata da constitucionalidade. É certo que, por norma, a lei não tem efeitos retroativos, mas, quando o legislador o estabelece claramente, esses tornam-se incontornáveis.   
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Salva-se, no entanto, a declaração muito curta de Marcelo sobre a Caixa Geral de Depósitos, em que não mostrou preocupação com a saída de António Domingues, no sentido de que “as pessoas mudam, mas as instituições fortes permanecem”. Resta saber se a CGD é e está mesmo forte quando uma agência de rating está a querer classificá-la num patamar de lixo. Porém, Marcelo sublinhou a existência de “um plano”, de “um projeto que vai ser executado”. E, nesse aspeto, foi acompanhado pelo Primeiro-Ministro, que garantiu que o novo presidente da administração da Caixa será conhecido ainda esta semana.
Ora, o Presidente da República, em vez do fardamento de árbitro, veio agora revestir o de vate da Pátria e de animador da causa. Neste sentido, ao advertir que responsáveis da ‘troika’ se encontram neste momento em Portugal, pediu que se pense estruturalmente, a médio prazo, em vez de conjunturalmente, declarando:
“Vivemos, não direi o dia a dia, ou a semana a semana, mas certamente o mês a mês, com dois orçamentos aprovados em menos de um ano, com o acompanhamento constante por parte da União Europeia, quando não mesmo da ‘troika’ – que já se encontra novamente em Portugal”.
Já no domingo, dia 27, ao falar do sistema financeiro, defendeu que é uma “prioridade nacional” estabilizá-lo e consolidá-lo, apelando à determinação para que a economia possa mesmo garantir crescimento e emprego. Declarou-o no seu discurso no Palácio da Bolsa, no Porto, onde presidiu à entrega do Prémio Manuel António da Mota, que este ano distinguiu a “Raríssimas – Associação Nacional de Deficiências Mentais e Raras”.
No entanto, assumiu que a criação dessa estabilização e consolidação do sistema financeiro português era um processo complicado. E reconheceu que “é difícil”, apontando que quando menos se espera, “surgem obstáculos”. Porém, avisou que o importa é que no dia seguinte é preciso “acordar e continuar o caminho, com determinação, sabendo exatamente que é uma prioridade nacional”, porque “não há economia que possa garantir crescimento e emprego e, por isso, justiça social, senão tiver uma capacidade de financiamento que sustente esses imperativos e que passa pelo sistema financeiro”.
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Um político que faz este tipo tão intenso e diversificado de discurso e que intervém tantas vezes e de muitos modos será árbitro, mas não é só árbitro. Aliás, não me parece que se sujeitasse à condição de árbitro neutral como eles têm de tentar ser. A sua postura neutral é bem mais política e ideológica do que aparenta. Árbitro, sim, mas não como qualquer árbitro, árbitro que pretende controlar o jogo e falar dele antes que outros falem.

2016.11.29 – Louro de Carvalho  

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

De vez em quando os trabalhos para/de casa andam na berlinda

A sigla é TPC porque se diz que os professores marcam trabalhos para casa aos alunos, mas, quando estas vítimas inocentes chegam à sala de aula com os trabalhos de casa por fazer, semifeitos ou feitos, a sigla deveria ser TDC.
Os professores, convictos de que a abordagem dos conteúdos e os exercícios em aula são insuficientes e/ou no pressuposto verificado de que os programas são extensos e, sobretudo, certos de que as crianças, adolescentes e jovens têm de criar hábitos de estudo por si mesmos, marcam, como forma de estudo e para efeitos de verificação e consolidação das aprendizagens, exercícios para casa. E os alunos, nesta matéria, como noutras, distribuem-se por grupos diferentes: os que fazem tudo, os que só tem TPC e não TDC, os que fazem parte e aqueles que os utilizam para alimento da explicação particular devidamente paga.
Dos pais, há os que entendem que os professores nem ensinam nem mandam fazer trabalhos, porque não querem ter o trabalho de os verificar e corrigir; há os que pensam que os filhinhos ficam sobrecarregados, sem hipótese de brincar, que é aquilo de que eles precisam; há os que se orientam pelas tarefas que os professores marcam para ajudarem os educandos no seu processo de aprendizagem; e há os que sabem tudo e não querem que nada mude para poderem eles próprios dar a sua orientação aos filhos e dizerem o que os professores devem ensinar.   
As crianças e adolescentes precisam de brincar. Porém, sobrecarregam-nas com os jogos de computador, TV, tablet, telemóvel e equivalentes. A par das aulas, inventam-lhes as horas de ginásio, natação, explicações, futebol, academias, etc. Confunde-se exploração do trabalho infantil com trabalho infantil e rejeita-se a educação pelo trabalho. Chamamos hiperatividade à má educação de tantos. Atrofiamo-los com atividades e com a inércia.
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Os Trabalhos de casa fazem mesmo sentido ou, antes, roubam tempo às brincadeiras e convívio de crianças, adolescentes e jovens? Ajudam à consolidação das aprendizagens, suscitam dúvidas e são ocasião de progressão escolar?  
Se se marcam, sobrecarregam-se os alunos, não os deixando respirar; se se abandona este recurso educativo, corre-se o risco de fazer das aulas um passatempo despiciendo.
Em Espanha, a Confederação Espanhola de Associações de Pais e Mães de Alunos, que representa cerca de 12 mil associações, “declarou greve” aos TPC quando, invocando um dos artigos da Convenção dos Direitos da Criança, incentivou as famílias a não deixarem os filhos fazer trabalhos da escola aos fins de semanas durante o mês de novembro. Aduziu como argumentos: que os TPC “invadem o tempo das famílias”; e que “violam o direito ao recreio, à brincadeira e a participar nas atividades artísticas e culturais”.
Só me pergunto se a predita Confederação está, desta forma, a zelar o “superior interesse da criança, do adolescente ou do jovem. Não virá a suceder que os futuros cidadãos a percorrer as sinuosas estradas da vida se voltem contra os educadores de hoje que os terão enganado com a facilidade da vida, a laxidão e a fuga à responsabilidade pelos atos e perante o dever de trabalhar na justa medida das capacidades pessoais conforme o avanço etário – físico e psicológico?
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Em Portugal, alguns professores defendem um recurso moderado aos TPC no pressuposto de que o tempo, a moderação e a metodologia são fatores a considerar nesta matéria.
Evidentemente que estão inteiramente contra os exercícios que se limitem a transcrever páginas de manuais para o caderno ou atividades similares. A este propósito, Paulo Guinote sustenta:
“Os trabalhos para casa são importantes para consolidar aprendizagens em algumas disciplinas e conteúdos e não como forma de ‘apresentar serviço’ inconsequente. Deve ter um objetivo significativo para os alunos e devem ser integrados no trabalho em sala de aula e não como tarefa mecânica e destinada apenas a verificar se estão feitos ou não.”.
Como professor de História, o predito professor recorre aos TPC numa “perspetiva de pesquisa a médio prazo”. Segundo o Educare. pt, pede aos alunos pesquisas sobre um determinado tema e elaboração de pequenos trabalhos num horizonte de duas a três semanas. Já como professor de Português, solicita a leitura de textos a trabalhar em sala de aula ou a completar “algum exercício que ficou por fazer na aula”.
Note-se que um professor simultaneamente de Português e de História (História e Geografia de Portugal) dá aulas a alunos do 5.º ano e do 6.º Assim, parece que a sua visão se mostra contida, equilibrada e adequada a este nível etário e escolar. Noutras disciplinas os alunos podem fazer exercícios fora da aula e, depois, colocar dúvidas aos professores sobre o que não entenderam ou não conseguiram fazer. E, em idades mais avançadas, podem muito bem fazer pesquisas e exercício de maior monta e extensão. Nem têm de ser em casa. Hoje as escolas dispõem de tempos e espaços adequados a trabalhos fora das aulas. Normalmente não será necessário frequentar centros de estudos. Porém, dá a impressão de que alguns pais preferem encarcerar os filhos num centro de estudos a tê-los mais tempo na escola ou a vê-los estudar em casa.
Uma coisa é certa. Os latinos tinham razão quando sentenciavam o “exercendo disces” (pelo exercício aprenderás), que os portugueses assumiram por “usa e serás mestre”.
Algumas vezes e nalgumas disciplinas, Guinote pensa que, “por vezes, se exagera no pedido de tarefas que deveriam ser desenvolvidas em sala de aula”, mas, segundo afirma:
“O tempo para brincar pode sempre existir e não é uma hora por dia que o inviabilizará. Preocupa-me mais que muitos pais não tenham horários que lhes permitam ajudar os seus filhos e acompanhá-los nas tarefas escolares, algo que também pode ser encarado como ‘tempo de qualidade’”.
Por outro lado, os professores têm de justificar o não cumprimento de programas extensos como dantes, o que se torna difícil com a redução de tempo letivo que o desenho curricular empresta a algumas disciplinas, já no segundo ciclo, mas altamente agravada no 3.º. Este é, porém, um problema que não se resolve com mais TPC, mas com a solução a encontrar pelo Ministério da Educação e pela escola. E, se é para cortar nos conteúdos, isso que seja feito por opção programática ou por entrega do ónus de seleção à escola, responsabilizando-a não pelo cumprimento dos programas, mas pela sua gestão. Contudo, tal não é possível a manter-se a gestão das aprendizagens com o objetivo cego da avaliação. O ensino devia voltar a ser ministrado a partir das necessidades de cada turma ou grupo de alunos e com base num trabalho consequente de projeto. E a prova final ou exame, a existir, deveria ter em conta este percurso.  
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Outros docentes revelam-se contra os TPC que designam por trabalhos para os pais das crianças. Por exemplo, Rosário Gama, ex-diretora da Escola Secundária Infanta Dona Maria, em Coimbra, ora presidente da Direção da APRE (Associação dos Aposentados, Pensionistas e Reformados), “partilha a sua experiência como professora, mãe e aluna” do século XX e conclui: “Fim dos TPC”. Ao Educare.pt referiu:
“Tinha a firme convicção que eram poucos os alunos que o faziam sem apoio dos pais ou dos explicadores, o que colocava em desvantagem todos os que não tinham pais em condições de os ajudar e/ou não podiam pagar a explicadores”.
E opinou que é no horário e dentro da escola que as matérias devem ser consolidadas, ficando o resto do tempo libertado para outras tarefas que “completem o crescimento das crianças e jovens”. 
Diz que a sua experiência como mãe a fez perceber que muitos dos TPC “eram feitos quase mecanicamente”, no desejo de que “a tarefa terminasse rapidamente”; e, como aluna, sentiu o peso das tarefas, quando a pressa era para “ir saltar à corda ou passear de bicicleta”. 
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Já Lurdes Figueiral, presidente da APM (Associação dos Professores de Matemática), considera os TPC não podem constituir uma forma de compensar a falta de tempo dos professores para gerir programas desadequados. Mas – e muito bem, do meu ponto de vista – sentencia:
“Os TPC devem gradualmente contribuir para um trabalho autónomo e personalizado do aluno, colmatando lacunas, abrindo novas perspetivas, consolidando aprendizagens”.
Opina que os TPC não poderão ser “mais do mesmo” porque “mais do mesmo” é sempre “contraproducente e não desenvolve capacidades cognitivas mais complexas nem é eficiente no ultrapassar de dificuldades”. No pressuposto de que o trabalho de sala de aula “deveria ser suficiente para os alunos apreenderem os conteúdos mais significativos e os processos mais relevantes”, anota: 
“No entanto, fora da escola, os alunos devem ser incentivados, sobretudo, a perceber diversas abordagens e aplicações daquilo que foi trabalhado na escola. Nesse sentido, pequenas investigações, jogos, propostas de atividades que os alunos possam executar em contextos familiares e, muitas vezes, com carácter lúdico – mas sempre desafiadoras e exequíveis para eles – podem desenvolver capacidades importantes e necessárias para aprendizagens mais significativas”. 
Por seu turno, Filinto Lima, presidente da ANDAEP (Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos de Escolas Públicas), é por um meio-termo. Assim, no ensino básico, recomenda comedimento; no secundário, quer os TPC focados no estudo, até porque os estudantes dispõem de mais tempo e autonomia. De qualquer modo, estes trabalhos, segundo ele, “não podem dar lugar a tortura para casa, sob pena de perderem todas as suas potencialidades no processo ensino-aprendizagem”. Por isso, sugere:
“Deve existir boa coordenação entre os professores dos conselhos de turma para que não existam exageros em relação à quantidade de TPC para o dia seguinte e ao número de disciplinas a que o aluno tem de fazer trabalhos de casa”.
Perspetiva muito similar é o do diretor do Agrupamento de Escolas Costa Matos, em Vila Nova de Gaia, que diz fazer sentido marcar “TPC quanto baste para consolidação da matéria lecionada”, sobretudo no Ensino Básico, “em que os alunos são menos autónomos e necessitam de mais orientação”. Porém, “no Ensino Secundário, os TPC devem dar lugar a uma orientação no estudo, pois os alunos têm outra maturidade e autonomia”. 
Para Jorge Ascensão, presidente da CONFAP “Confederação Nacional das Associações de Pais), os TPC ajudarão a consolidar aprendizagens, mas não devem ser marcados indiscriminadamente, pois “não faz sentido prolongar a sala de aula em casa”. Com efeito, a escola tem o seu tempo e família tem o seu.
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Apraz-me concordar com o comedimento e moderação, mas também com a orientação progressiva para o trabalho autónomo, valorizando mais a razão que a experiência pessoal quiçá negativa. Se nos limitássemos a repercutir a nossa experiência nos outros, a nossa ação seria demasiado pobre. E o mundo precisa de bem mais, que nós podemos dar.

2016.11.28 – Louro de Carvalho 

domingo, 27 de novembro de 2016

Inauguração do Ano Jubilar de Fátima – 2016-2017

Como consta de documento do Santuário de Fátima, com o logótipo do centenário das Aparições de Fátima (1917-2017), foi estabelecido, com a inerente indulgência plenária, “a fim de dignamente celebrar o 100.º aniversário das Aparições de Fátima”, por mandato do Papa Francisco, um Ano Jubilar, de 27 de novembro de 2016 até 26 de novembro de 2017.
Segundo Dom António Marto, Bispo de Leiria-Fátima este ano jubilar coroa 6 anos de comemorações do centenário e convoca-nos a todos, como Igreja, à vivência este tempo favorável (Kairós, no grego bíblico) com três objetivos: “ação de graças, experiência de misericórdia e de compromisso com a paz. Na verdade, em finais de 2010, acolhendo o explícito desafio do Papa Bento XVI, o Santuário iniciou um itinerário celebrativo do centenário das Aparições de 7 anos. Chega-se agora, ao 7.º ciclo, que corresponde ao auge da celebração do Centenário, o Ano Jubilar, que hoje, dia 27 de novembro, foi solenemente inaugurado.
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A preceder a solene inauguração do Ano Jubilar de Fátima, realizou-se a 26, no Salão do Bom Pastor, no Centro Pastoral de Paulo VI, em Fátima, a Jornada de Abertura do Ano jubilar e do Ano Pastoral da diocese de Leiria-Fátima, em que o conferencista convidado foi Dom António Couto, Bispo de Lamego, que proferiu uma conferência em torno do título “O Senhor fez maravilhas: Maria na história da Salvação”, no quadro do tema do Ano Jubilar, “O Meu Imaculado Coração será o teu refúgio e o caminho que te conduzirá até Deus”.
O bispo-conferente precisou que “para quem tem olhos para ver, Fátima entrega a este mundo insensato e violento uma mão cheia de luz e de bom senso”. Sublinhou mesmo “a luz nova e mansa” que a Senhora deixou aos pastorinhos e que se reveste hoje duma enorme atualidade já que “em Fátima encontramos Maria, as crianças, as ovelhas mansas, a oração, a conversão, as contas do rosário, os segredos profundos da guerra e da paz”.
Para revelar a contemporaneidade da mensagem deixada pela Senhora do Rosário, o prelado lamecense estabeleceu um paralelo entre o mundo de 1917 e o mundo de hoje. Com efeito, à semelhança do que sucedeu há cem anos, “nunca se abriram tantas valas comuns nem se produziu tanto sofrimento” fazendo ressurgir Deus “com uma violência inaudita”. E referiu:
“Não deixa de ser paradoxal que o Deus que a razão iluminada aniquilou tenha ressurgido desta forma tão violenta porque é em nome de Deus que se têm produzido as maiores crueldades e as decisões mais insensatas desde os trágicos acontecimentos de 11 de setembro de 2001”.
O prelado lembrou que, tal como há cem anos, de Fátima “continua a elevar-se um grito, que desvenda a história escura e o coração empedernido e esclerosado dos homens e deixa entrever um novo sol no meio dos grãos de chuva que ao mesmo tempo turvam e lavam o olhar”. “É uma Luz nova e mansa, vinda de Deus e a única que pode alimentar a nossa luz reflexa” pois “o caminho da humanidade não é a autorreferencialidade, mas sim a luz que vem de Deus”.
Na verdade, “em Fátima encontramos Jesus, o filho de Maria, verbo de Deus abreviado neste pão novo” que se afigura como a salvação para a “humanidade ferida e faminta”. De facto, “Fátima pode ser o lugar de encontro e recitação à volta de Maria e deste pão”.
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Também o reitor do Santuário de Fátima, Padre Carlos Cabecinhas participou nesta jornada, salientando que o Ano Jubilar é “um ano de graça e de compromisso”. O reitor convida todos os peregrinos que, durante este período, visitarem o Santuário ao “compromisso com Deus e com os irmãos, acolhendo os desafios da mensagem de Fátima e do exemplo de vida dos pastorinhos”. Acentuou que aqueles e aquelas que ali “participarem em alguma celebração ou rezarem, poderão receber a Indulgência de Deus, expressão da Sua misericórdia para connosco”. E sublinhou que, por se tratar de um ano particularmente festivo, “serão as celebrações a marcar o ritmo da vivência deste jubileu do primeiro Centenário das Aparições”.

O Padre Cabecinhas disse também que, “ao celebrarmos o grande acontecimento de Fátima, damos graças a Deus por todas as bênçãos que Ele derrama sobre nós em Fátima, através da mensagem transmitida neste lugar e dos seus protagonistas.
Explicou que, para assinalar e destacar o caráter festivo do Ano Jubilar, o Santuário propõe alguns sinais e gestos aos peregrinos nomeadamente: o Pórtico Jubilar, inspirado no arco festivo que, em 1917, assinalou o lugar das aparições e sob o qual foram fotografados os pastorinhos Francisco, Jacinta e Lúcia; o Itinerário Jubilar do Peregrino, com uma proposta orante a todos os peregrinos que se deslocam ao Santuário neste ano; e a Oração Jubilar de Consagração, de entrega a Maria para, com ela, nos consagrarmos a Deus.
Referiu o sentido do tema escolhido para este ano pastoral, “O Meu Imaculado Coração será o teu refúgio e o caminho que te conduzirá até Deus”, que tem como ponto de partida a aparição de outubro de 1017. Depois, salientando que a devoção ao Coração Imaculado de Maria é “alma da mensagem de Fátima” e o elemento que une as suas diversas dimensões, afirmou que, “partindo desta frase inspiradora [a do tema do ano], somos convidados, ao longo deste ano pastoral, a refletir sobre o lugar de Maria na história da salvação, a reconhecer que “o Senhor fez maravilhas” em Maria e através dela, a deixarmo-nos conduzir por ela até Deus e a darmos graças a Deus pelo dom das aparições de Nossa Senhora em Fátima”.
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Por sua vez, Dom António Marto, o Bispo diocesano, que encerrou a jornada, sustenta que estes “convites e interpelações de Deus” neste Ano Jubilar significam “um maior compromisso com Deus, mas também com os irmãos respondendo aos apelos feitos por Nossa Senhora à conversão”. Porém, segundo o prelado, isso só se alcança “através de uma mudança de vida” que tenha por base “a justiça e a paz, tal como a Senhora pediu”.
E, evocando o tema do ano, salientou que ele “sintetiza toda a mensagem de Fátima” pois “só o coração é capaz de falar ao coração” e o de Nossa Senhora “é um coração cheio de ternura que canta e conta as maravilhas do Senhor”.
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O Ano Jubilar foi solenemente inaugurado este domingo, início do Advento, com a passagem pelo Pórtico Jubilar e com a celebração da eucaristia dominical na Basílica da Santíssima Trindade. Presidiu o Bispo de Leiria-Fátima, que encara o Ano Jubilar “Hora de despertar”.
O prelado relembra que “o tempo do Advento é bem mais que a simples espera e preparação do dia do Natal”, porque o Natal “não se reduz à recordação romântica de um acontecimento longínquo do passado como é o nascimento do menino Jesus”. “O Advento” – disse Dom António Marto – “introduz-nos no coração do mistério cristão: a vinda de Deus à nossa vida, o mistério grande e fascinante de Deus connosco! É tempo de alegria porque Deus vem ao nosso encontro”. E afirmou aos peregrinos que a palavra de ordem do 1.º domingo do Advento é “vigiai, despertai do sono, para não deixar afogar a vida na banalidade dos dias como nos tempos de Noé”. Assim avisou:
“Também hoje podemos viver adormecidos, distraídos, anestesiados pelo ‘ramram’ do dia a dia: comemos, bebemos, trabalhamos, casamos, fazemos a nossa vida de família e a nossa atenção reduz-se a este horizonte estreito. Ficam de fora, na penumbra ou excluídas, outras realidades tão importantes e belas: a fé em Deus, o amor de Deus em nós, a vida espiritual, os valores morais. É hora de despertar!”.
O prelado, recordando que “foi esta advertência que Nossa Senhora fez ecoar aqui em Fátima, com uma urgência impressionante, para a humanidade que esquecera Deus, que vivia de costas voltadas para Ele e caminhava para a catástrofe da guerra e da destruição”, assegurou que “também hoje nos chama a uma vigilância interior, a despertar da indiferença, a voltarmo-nos para Deus, a abrir o nosso coração ao seu amor e a descobrir os sinais da sua vinda ao nosso mundo. Com Deus ou sem Ele a nossa vida e a vida do mundo serão diferentes!”.
E, considerando que a “outra palavra de ordem do Advento é ‘caminhemos à luz do Senhor’, porque à sua luz todos os povos podem caminhar para o Reino da justiça e da paz”, disse:
“Este caminho nunca está concluído. Há sempre necessidade de recomeçar, de se erguer de novo, de reencontrar e reavivar o sentido da meta, de renovar sempre o horizonte comum para o qual caminhamos, de transformar os instrumentos de guerra e de morte em instrumentos de progresso, de paz e de vida. É o horizonte da esperança que nos chama a fazer um bom caminho”.
O Bispo diocesano entende que o Advento “restitui-nos este horizonte da esperança que não desilude porque Deus é fiel” e, em Fátima, a Senhora trouxe “esta esperança firme de paz”, sendo “impressionante o seu apelo à oração e ao empenho pela paz e pela defesa da dignidade dos oprimidos e dos inocentes, vítimas de guerras e genocídios sem precedentes na história”.
Por consequência, “a terceira indicação do advento é um apelo a mudar de atitude de vida e a revestir-se das armas da luz, como que a um rearmamento espiritual e moral das consciências para viver a paz de Deus, a paz do coração, a paz com os outros”. E assegura o Bispo:
“Foi este apelo à conversão que Nossa Senhora fez em Fátima quando pedia penitência. O milagre mais importante de Fátima não é propriamente a dança do sol, mas antes a conversão do coração e da vida de tanta gente, que aqui acontece sem dar nas vistas, e que podemos chamar também a ‘dança da conversão’ ao ritmo da música de Deus que ressoa no Magnificat da Virgem e enche de alegria”.
O prelado deixou o desafio de vivência do ano Jubilar com “alegria e a esperança”, como “tempo favorável de ação de graças pelo dom da visita e da mensagem da Senhora e pelas graças recebidas”, “de experiência da ternura e da misericórdia de Deus, de devoção terna ao Imaculado Coração de Maria, de conversão e de compromisso com Deus e a favor dos outros e da paz no mundo, a exemplo dos pastorinhos”. E concluiu, dizendo:
“A passagem pelo Pórtico do Jubileu seja o sinal exterior de que entramos em peregrinação interior e queremos deixar-nos guiar pela Virgem Santa que é mãe e sabe como conduzir-nos até Deus. Deixemo-nos, pois, guiar por Ela neste tempo de perturbação e de esperança!”.
A celebração terminou com a bênção papal concedida pelo bispo da diocese de Leiria-Fátima, por mandato do Papa, cujo documento estabelece, para além do Pai-Nosso, o Credo e as orações em Fátima (ou perante uma venerável imagem da Virgem de Fátima e, para doentes uma simples imagem sua):
“Para obter a indulgência plenária, os fiéis, verdadeiramente penitentes e animados de caridade, devem cumprir ritualmente as seguintes condições: confissão sacramental, comunhão eucarística e oração pelas intenções do Santo Padre”.
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A Oração Jubilar de Consagração pode ver-se em:
Frutuoso Ano Jubilar!

2016.11.27 – Louro de Carvalho