Decorreu, pela
primeira vez em Lisboa (após
as 7 edições em Dublin),
de 7 a 10 de novembro, a Web Summit.
Não sendo o maior evento de tecnologia da Europa, é indubitavelmente uma das
feiras mais importantes da área, principalmente no que diz respeito às startups (definíveis como como empresas iniciantes de
tecnologia) e ao
empreendedorismo. Estiveram presentes mais de 53 mil pessoas, das quais cerca
de 42% eram mulheres.
A Web Summit dividiu-se entre o MEO Arena
e a FIL e serviu essencialmente para startups
de várias partes do mundo mostrarem os seus produtos, fazerem novos
contactos e encontrarem investidores ou parceiros. Participaram a Y Combinator,
Intel Capital, Silver Lake, Google Ventures, Sherpa Capital, Union Squares
Ventures, Portugal Ventures, Salesforce Ventures, 500 Startups… em
suma, empresas com muito dinheiro para investir.
Além da
componente de exposição, a Web
Summit contou com uma série de conferências (21) a cargo de alguns dos maiores nomes da indústria, incluindo: Sean Rad, cofundador e CEO do Tinder; Mike Schroepfer, diretor de
tecnologia do Facebook;
Takeshi Idezawa, CEO do Line, uma das
aplicações de mensagens mais populares no Japão; Mike Quigley, diretor de marketing da Niantic, empresa
que desenvolveu o Pokémon Go; Werner Vogels, diretor de tecnologia da Amazon; Ryan Hoover, fundador do Product
Hunt; Eric Friedman, cofundador
do Fitbit; Gillian Tans, CEO do site de reservas hoteleiras Booking.com; Eric Wahlforss, cofundador e diretor de
tecnologia do SoundCloud; Corinne Vigreux, cofundadora da TomTom; Alexis Ohanian, cofundador do Reddit; Blackstock, cofundador e CEO do Bitmoji; Nicolas Brusson, cofundador e CEO
do BlaBlaCar, um dos serviços de partilha de carro mais
populares; Robert Scoble,
um dos bloggers de tecnologia mais influentes; David Marcus, diretor do Messenger no Facebook; Alan Schaaf, fundador do Imgur; Michael Pryor, CEO do Trello; Till Faida, fundador e CEO do Adblock Plus; Justin Smith, CEO da Bloomberg Media… e
muitos mais.
Temas atuais
como a inteligência artificial, o ad-blocking,
a condução autónoma, a realidade virtual, o open-source
ou a utilização de cannabis medicinal não ficaram de fora do debate e da
mostra. Também estiveram presentes políticos como Durão Barroso (que foi vaiado), Paulo Portas ou Tiago Brandão Rodrigues,
bem como pessoas ligadas ao mundo do desporto como Patrícia Mamona, Luís Figo,
Rui Costa ou Bruno de Carvalho. Ao Primeiro-Ministro coube participar na sessão
inaugural e visitar a feira, visita onde chegou a ser confundido com um
investidor. Também Fernando Medina, presidente do município lisboeta, deu as
boas-vindas.
À semelhança
do que acontecia em Dublin, a Web Summit
não ficou restrita à zona oriental da capital, mas espalhou-se pela cidade, a
coberto de diversos eventos paralelos, entre eles, visitas culturais a Lisboa e saídas noturnas com os oradores
e investidores que houveram por bem participar. O Turismo de Portugal
organizou eventos complementares da Web
Summit: durante os dias 8 e 9, houve música (a editora Mano a Mano, o brilhante Benjamin, o campeão
DJ Ride e outros mais), gastronomia e produtos regionais, bem como uma sessão videomapping. Já no dia 5, Paddy
Cosgrave, fundador do evento, deu o pontapé de saída ao Surf Summit na Foz do
Lizandro, na Ericeira, onde cerca de 200 participantes aproveitaram as ondas,
após uma breve aula de surf.
***
Embora a Web Summit seja um evento mais pequeno
que qualquer um dos festivais de verão que se realizam em Portugal, tem gozado
de um mediatismo excecional, não só pelas vozes oficiais do Governo, como pela
comunicação social, que lhe tem dedicado páginas inteiras em jornais
e rubricas em noticiários.
O evento
chegou a Lisboa numa altura em que a cidade está na moda como nunca esteve. Com
efeito, assistiu-se a um aumento substancial do turismo na capital e o
ecossistema empreendedor da cidade ganhou relevância no panorama europeu e
global. Lisboa tem centenas de startups,
incubadoras, fablabs, espaços de
coworking e investidores. António
Costa, Primeiro-ministro e anterior Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, e
João Vasconcelos, Secretário de Estado da Indústria e fundador da incubadora Startup Lisboa, foram os principais
rostos desta transformação de Lisboa numa “cidade startup”. E o empreendedorismo, abordado na recente Cimeira
Ibero-americana, é, na senda do que se passou com governos anteriores, um dos
principais pilares de ação do atual Governo, que, vendo nesta economia um forte
potencial e rica oportunidade de crescimento e de valorização competitiva,
lançou iniciativas como o Startup
Portugal, com vista a ajudar quem pretende
começar o próprio negócio.
Se os
festivais de música como o NOS Alive
colocaram Portugal na rota dos grandes eventos de música a nível europeu, a Web Summit pode ter o mesmo impacto no
âmbito da tecnologia e das startups; e
as startups nacionais tiveram aqui
uma oportunidade para alcançarem o mercado internacional, sem terem de se
deslocar.
***
O que ficou do evento?
Ficaram 500
“estrelas de rock” portuguesas, os afetos do Presidente Marcelo, um robô que
almeja destronar Donald Trump e outro que visa pôr crianças a programar, 1.200
milhões de euros para startups,
reuniões e 53.056 QR Codes. Em três dias e meio, o evento abarcou 53.056 pessoas, 4 pavilhões da
FIL para 1.490 startups,
o MEO Arena cheio, mais de 4
milhões de visualizações de vídeo em direto do Facebook, 1.835 milhões de mensagens
trocadas na app, 97.000 pastéis
de nata, 37.000 quilómetros
de cabos, 1.300 investidores.
A Web Summit foi uma conferência de 21
conferências, com 663 oradores
e 2.000 jornalistas.
500 engenheiros portugueses
asseguraram a internet de banda larga no evento (embora com críticas, algumas
merecidas por cá e lá fora). Várias
intervenções em palco abordaram a segurança nas redes sociais, a música, o
amor, o empreendedorismo, o investimento, os meios de comunicação social, a
inteligência artificial e, obviamente, as eleições norte-americanas (cujos resultados
foram saudados por uns e vaiados por outros).
Dos 1.200 milhões de euros, acima referenciados, 1.000 milhões são da
Comissão Europeia para apoiar startups europeias
e mais 200 milhões que
o Estado português lançou para poder coinvestir em empresas, com mais 200
milhões dos privados. Ficou relevada – segundo Andrus Ansip, vice-presidente da
Comissão Europeia e responsável pelo projeto do Mercado Único Digital – a
vontade de acabar com uma certa Europa que tem “28 tipos de regras de mercado diferentes”,
onde é “praticamente impossível” para as startups crescer, e
que obriga “os cidadãos a usarem métodos ilegais para acederem a conteúdos
digitais”.
Ficou também
a imagem de Sophia, um dos robôs mais avançados do mundo, a propor-se como
candidata à presidência dos EUA para que o país se visse livre de Trump; e a de
Dave McClure, sócio fundador da aceleradora norte-americana 500 Startups a pedir aos milhares de
pessoas sentadas no MEO Arena que se levantassem contra o novo presidente dos
EUA. Antes, já o empresário norte-americano Bradley Tusk confessara sentir-se
“envergonhado por estar no meio dos europeus com isto a acontecer” nos EUA.
Foi alertada
a tecnologia, os políticos e os legisladores. Paddy Cosgrave disse, na última
conferência de imprensa da Web Summit,
que “a tecnologia também está a ter um
impacto negativo no mundo e é importante que as pessoas que tomam
decisões estejam aqui e conheçam as pessoas que estão a desenvolver estas
tecnologias”. O orador pretende que haja diversidade de pessoas nesta que é a
maior conferência de empreendedorismo e tecnologia da Europa, para que as startups
interajam com empresas maiores, investidores, potenciais clientes, parceiros. E
disse que “é um erro achar que toda a
tecnologia é boa, na melhor das hipóteses é neutra”, pois, há
“tecnologias que podem destruir o mundo inteiro”.
Pairou o
medo do futuro. Segundo um inquérito feito, no evento, aos investidores, cerca
de 1.300 (53%) creem que a inteligência artificial levará ao
desaparecimento de milhões de empregos no mundo e 93% consideram
que os governos não estão preparados para enfrentar essa realidade. Todavia, ficou
também a esperança no futuro: quando o cubo dinamarquês que venceu os “óscares
das startups portuguesas”, como lhes chamou Jaime Jorge, líder
da Codacy, em 2014. Duzentos pitches depois, foi a Kubo-Robot que
levou 100 mil euros da Portugal Ventures.
O líder Tommy Otzen explicou aos jornalistas que quiseram “tirar a programação drag and drop do ecrã e
passá-la para a vida real”, como se fossem legos. Construíram um robô em
forma de cubo dotado de um sistema de inteligência artificial, que as crianças
aprendem a controlar através da utilização das ordens certas, a base da
programação.
E ficou a
política. Ficaram os “afetos”, os beijinhos e as selfies de
Marcelo. O Presidente da República fez uma visita pelos stands dos pavilhões da FIL para conversar com empreendedores
portugueses, acompanhado pelo Ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, e
pelo Secretário de Estado da Indústria, João Vasconcelos. E disse: “Estamos prontos para explorar as novas
paisagens tecnológicas convosco”. Marcelo, num discurso marcado por três
palavras-chave “gratidão”, “felicidade” e “crença” no futuro, deixou um alerta:
“A tecnologia é apenas um instrumento”,
que “não pode excluir os mais carenciados”.
Ficaram as
chaves da cidade de Lisboa nas mãos de Paddy Cosgrave, depois de o Presidente
da Câmara Municipal lhas ter dado na cerimónia de abertura, dizendo-lhe: “Lisboa é a tua casa”. E ficaram “as estrelas de rock” de João
Vasconcelos: os engenheiros, programadores, empreendedores
portugueses; o talento português; e, do Primeiro-Ministro, ficou a certeza de
que “Portugal é o espaço ideal para tentar, falhar e voltar a tentar”.
E o que fica para as startups portuguesas?
Ficam
reuniões, contactos trocados, esperança no futuro, conhecimento. Não ficam
milhões, nem tanto mais investidores, mas fica a perspetiva e os olhos de
futuro.
E não ficou
o “adeus” ou o “até já” do criador da Web
Summit. Onde se realizará no próximo ano a feira da tecnologia e do empreendedorismo?
2016.11.11 – Louro de Carvalho
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