Sobre o debate parlamentar
O Executivo divulgou os nomes dos ministros que
intervirão no debate do Programa de Governo, que foi aprovado no Conselho de
Ministros do passado dia 26, logo após a tomada de posse do Governo, e que está
a ser discutido nestes dias (30 e 31). Ora, após uma campanha eleitoral
apoiada nas contas certas, Costa dá palco a
outras apostas programáticas, designadamente o Ambiente, a Presidência e a Economia. Assim, em vez de Mário Centeno – um dos governantes
mais presentes no espaço mediático nos últimos 4 anos –, os
holofotes vão para João Matos Fernandes, Mariana Vieira da Silva e Pedro Siza
Vieira.
Depois da abertura do debate pelo Primeiro-Ministro, no período de debate
estão os três ministros coordenadores das áreas transversais do Governo: as
alterações climáticas, a demografia, as desigualdades e a transição digital. E
o encerramento, que ocorrerá amanhã, dia 31, ficará a cargo de Augusto
Santos Silva, Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Assim, de todos os ministros de Estado (ao todo são 4) apenas um não intervém no debate do Programa de
Governo, o documento que serve de guião para as medidas e políticas a adotar
na XIV Legislatura. E Centeno foi um dos ministros que mais participou
nos debates relevantes na legislatura passada. Em 2015, foi o Ministro das
Finanças que fechou o debate do Programa de Governo, tendo falado sobre o
impacto das medidas negociadas à esquerda para a formação do Governo. E, em
2019, foi também Centeno que fez o encerramento do debate do Estado da
Nação, tendo deixado uma mensagem que acabou por ditar toda a campanha
eleitoral, ao apelar aos partidos a que não entrassem em leilões eleitorais.
Também durante a campanha eleitoral assumiu protagonismo ao desafiar o líder do
PSD para um debate sobre contas públicas. E uma sondagem sobre intenções
de voto colocava-o ao lado dos líderes dos maiores partidos.
O
Programa de Governo, com 191 páginas, tem estrutura semelhante à do programa
eleitoral do PS, mas difere da usual organização temática por ministérios que
caraterizou os documentos de outros executivos. Após um capítulo com 4
objetivos de curto e médio prazo – denominado “Boa Governação: contas
certas e convergência, investimento nos serviços públicos, melhoria da qualidade
da democracia e valorização das funções de soberania” – vêm 4 áreas temáticas: alterações
climáticas, demografia, desigualdades, e sociedade digital. E, no âmbito
das contas públicas, mantém
na agenda a redução da dívida pública, a criação de saldos primários e a
contenção da despesa pública.
O deputado do IL (Iniciativa
Liberal), que não pode colocar o programa a
votação, desafiou o PSD e o CDS a apresentarem uma moção de rejeição ao Governo
minoritário do PS e a esclarecerem de forma inequívoca se o aprovam. E apontou
os sociais-democratas e centristas, se não o fizerem, como estarem a ajudar a
desresponsabilização dos partidos que apoiam o programa.
Porém, na
conferência de líderes, do dia 28, que preparou o debate, nenhum dos partidos
representados com assento parlamentar, incluindo o PSD e o CDS, anunciou
qualquer iniciativa como uma moção de rejeição do programa, que,
regimentalmente, só pode ser apresentada por grupos parlamentares e não por
deputados únicos, como sucede com Cotrim Figueiredo. Numa entrevista à Lusa, a 13 de outubro, o deputado afirmou votar contra o programa
do Governo. De resto, os partidos aproveitam para criticar o PS e o seu líder,
que chefia mais um Executivo.
***
Sobre o
Programa do Governo
Um provedor do animal, um complemento-creche a partir do segundo filho,
colocações de professores estáveis e fim dos chumbos no básico são 4 das medidas
do Programa, que tem como objetivos estratégicos a consolidação do rumo e dos
resultados alcançados desde 2015 e a sustentabilidade de longo prazo das
políticas seguidas.
Na introdução do documento, o executivo defende que, até 2023, estaremos
perante “um ciclo de consolidação da recuperação económica”. E o texto
introdutório adverte:
“É um ciclo em que temos de garantir a
sustentabilidade no longo prazo do trajeto virtuoso que construímos. Virada a
página da austeridade, será neste novo ciclo que se devem reforçar as condições
para que Portugal vença os desafios estratégicos da próxima década. É para este
desígnio que concorrem quatro desafios estratégicos: combater as alterações
climáticas; responder ao desafio demográfico; construir a sociedade digital; e
reduzir as desigualdades.”.
Considera-se que, para Portugal ter sucesso a enfrentar estes 4 desafios
estratégicos, tem de garantir um conjunto de regras de boas de governação, tais
como “contas certas para a convergência com a União Europeia, melhoria da
qualidade da democracia, investimento na qualidade dos serviços públicos e valorizar
as funções de soberania”.
Será executado na sequência duma legislatura de recuperação da confiança e da
dinamização da procura interna que induziram relançar o relançamento do crescimento
económico, registando em 2017 e 2018, os únicos anos de convergência com a Zona
Euro desde a adesão de Portugal à moeda única. E além disso, o Executivo frisa
que se verificou “a maior série de criação de emprego de que há registo, com redução
para metade do desemprego”, e se assistiu a “uma redução significativa da
privação material e a saída de mais de 180 mil pessoas da pobreza, com a
desigualdade a atingir os mais baixos valores de sempre”. E o Programa
acrescenta:
“Portugal apresenta contas públicas
equilibradas pela primeira vez na sua história democrática, registando-se há
três anos os défices mais baixos da nossa democracia, e tendo a dívida sido
reduzida para 118% do Produto Interno Bruto. Depois de cumprido com êxito o
programa de recuperação de rendimentos e da confiança, da economia e do
emprego, bem como das finanças públicas e da credibilidade internacional do
país, abre-se agora um novo ciclo na sociedade portuguesa.”.
***
O detalhe em
poucas páginas segundo tópicos selecionados
Na educação, ensino e ação social
O Governo criará um complemento-creche, atribuindo aos cidadãos com filhos
nas creches “um valor garantido e universal” como comparticipação no preço que
as famílias pagam pela creche a partir do segundo filho, com vista a oferecer
melhores condições para a decisão dos pais em terem mais filhos, pois lembra o
executivo:
“Em Portugal, o número de horas de trabalho
semanais é dos mais elevados e persistem ainda desigualdades significativas
entre homens e mulheres na repartição do trabalho não pago e na conciliação
entre trabalho e família”.
Por outro lado, o Governo quer incentivar os empregadores, com estruturas
intensivas em mão-de-obra, a disponibilizar equipamentos ou serviços de apoio à
infância; e quer promover um programa de alargamento das respostas de apoio à
família, alargando a rede de creches e fomentando a universalização da educação
pré-escolar e a garantia de que, neste nível etário, é dada a possibilidade a
todas as crianças até aos 3 anos de dormirem a sesta.
O Governo quer mudar os concursos de professores para dar mais estabilidade
aos docentes e diminuir as áreas geográficas em que podem ser colocados, bem
como lançar um plano para acabar com as retenções e reprovações no ensino
básico. E quer estudar o modelo de recrutamento e colocação de professores com
vista à introdução de “melhorias que garantam maior estabilidade do corpo
docente, diminuindo a dimensão dos quadros de zona pedagógica”, o que pode
significar que os professores lecionem mais perto de casa.
Consta a intenção de elaborar diagnóstico a curto e médio prazo (5 a 10 anos) da necessidade de professores nas escolas, “que
tenha em conta as mudanças em curso e as tendências da evolução na estrutura
etária da sociedade e, em particular, o envelhecimento da classe docente”. Consta
também a necessidade de professores nas regiões do país onde há escassez, da melhoria
da formação contínua e de as escolas serem mais digitais e com melhor ligação à
Internet. Por outro lado, o Governo quer mais autonomia para as escolas,
dando-lhes poder de decisão em matérias como o número de alunos por turma, “mediante
um sistema de gestão da rede”. E, ao nível da gestão, quer o modelo de
administração escolar mais adequado ao processo de descentralização para as
autarquias, com mais meios técnicos, permitindo que as escolas recorram a “bolsas
de técnicos no quadro da descentralização”.
Do ponto de vista dos alunos, o executivo assume ter de eliminar os chumbos
no ensino básico, trabalhando de forma intensiva e diferenciada com os alunos
que revelam mais dificuldades, bem como ter de reforçar o combate ao abandono e
insucesso escolar, sobretudo do ensino secundário. Também as escolas com piores
resultados devem ter autonomia reforçada, adequando a oferta curricular ao seu
público específico e reforçando, por exemplo, o ensino das línguas, artes ou
desporto, os programas de mentoria entre alunos, para “estimular a cooperação
entre pares”, e uma aposta clara no ensino da matemática, a disciplina com mais
insucesso.
O Governo quer também copiar o modelo de muitos colégios privados ao
pretender “promover programas de enriquecimento e diversificação curricular nas
escolas públicas, nomeadamente assentes na formação artística, na introdução de
diferentes línguas estrangeiras e de elementos como o ensino da programação,
permitindo que as escolas especializem a sua oferta educativa”.
No combate ao insucesso, há medidas de reforço de ação social e apoio a famílias
vulneráveis, mas também a aposta na deteção precoce de dificuldades, com maior
atenção na educação pré-escolar a dificuldades de linguagem e numeracia. E
compromete-se com um alargamento sistemático da rede pública da educação
pré-escolar, com a produção de orientações para a creche e com a revisão do
modelo das AEC (atividades de enriquecimento curricular).
Para o ensino superior inclui-se o reforço da ação social, mais camas em
residências públicas, um acesso mais barato a mestrados e uma diversificação de
públicos a partir das diversas formações do ensino secundário, a fim de promover a universidade ao
alcance de todos. Sobre custos deste ensino enuncia-se a partilha de custos”
entre o Estado e as famílias, sem especificar medidas. E, entre os objetivos
está a criação dum automatismo de continuidade na atribuição de bolsas de ação
social no ensino superior a quem já beneficiava delas no ensino secundário.
Na qualificação de adultos, manter-se-á a aposta no programa “Qualifica” e
promete-se “um período sabático garantido para os adultos se poderem
requalificar. E o Estado dará o exemplo enquanto empregador e aprofundará o “Qualifica”
na administração pública, contribuindo para o “esforço de qualificação dos
portugueses”.
Na cultura
No conjunto de propostas para a Cultura, pretende-se “aumentar, de forma
progressiva, a despesa do Estado em Cultura, com o objetivo de atingir 2% da
despesa discricionária prevista no Orçamento do Estado”, reforçando a Conta Satélite da Cultura, o Plano Nacional das Artes 2024, o papel
dos teatros nacionais. E define-se como objetivo, no setor, a criação do Museu
Nacional da Fotografia (com dois núcleos no país) e do Museu Nacional de Arte Contemporânea.
No campo do Património, visa-se lançar medidas para promover o envolvimento
de todos na missão nacional de reabilitação do património cultural,
nomeadamente criar a ‘Lotaria do Património’ e a campanha ‘Um Cidadão, Um
Euro’, para o património cultural, repensar os incentivos ao mecenato cultural,
programar artes performativas nos hospitais e estabelecimentos prisionais e criar
uma bienal cultural infantil para promover a inclusão pela arte.
Para a Cinemateca é defendida uma “estratégia integrada” que passa pela modernização
do modelo de gestão, de modo a reforçar a sua missão central de preservação do
cinema e divulgação descentralizada, em rede e em cooperação com parceiros, bem
como do laboratório, adequando-o às melhores práticas de arquivo, preservação e
digitalização do património, reforçando o posicionamento do Arquivo Nacional da
Imagem em Movimento nos planos internacional, de cooperação institucional e
facilitação dos filmes para exibição pública.
O Programa inclui uma medida para aumentar a idade mínima para acesso a
espetáculos tauromáquicos (que atualmente está nos 12 anos) eventualmente para os 16 anos.
Nas forças armadas
O Governo compromete-se a reforçar a participação das mulheres nas Forças
Armadas, “dignificar e apoiar os antigos combatentes” e melhorar “a reinserção
profissional dos militares em regime de contrato”. Foi criada a Secretaria de
Estado dos Recursos Humanos e Antigos Combatentes, que prevê “dignificar e
apoiar os antigos combatentes, incluindo os deficientes das Forças Armadas”,
procurando “soluções para o acompanhamento da nova geração de militares
sujeitos a riscos físicos e psicológicos”.
Pretende-se, igualmente, continuar a adequar os “mecanismos de recrutamento
e retenção” nas Forças Armadas às necessidades do país com “novos mecanismos de
gestão de carreiras”, para dar resposta às necessidades dos militares, bem como
promover a reinserção profissional dos militares em regime de contrato e dos
que optem pela passagem à reserva em idade ativa.
Na proteção civil
O Governo adquirirá meios aéreos próprios para combater incêndios rurais de
acordo com as prioridades definidas pela Autoridade Nacional de Emergência e
Proteção Civil e Força Aérea.
Na proteção civil, o Programa quer a definição dum modelo de resposta
profissional permanente com a participação da Força Especial de Proteção Civil,
da GNR, das Forças Armadas, dos bombeiros sapadores, municipais e das equipas
de intervenção permanente das associações de bombeiros voluntários, bem como a
definição dos requisitos tecnológicos e do modelo de gestão da rede de
comunicações de emergência do Estado após o final da concessão à SIRESP.
Será implementado o novo modelo territorial de resposta de emergência e
proteção civil, baseado em estruturas regionais e sub-regionais, em articulação
com as entidades competentes e com a participação dos bombeiros voluntários e
das autarquias locais. E aprovar-se-á o Programa de Proteção Civil Preventiva
de 2020 até 2030 (integrando todas as áreas de gestão de risco de
catástrofe com um plano de financiamento associado e utilizando recursos
nacionais e europeus) e
concretizar-se-á o Plano de Gestão Integrada de Fogos Rurais (designadamente
o programa “aldeia segura”) e salvaguardar-se-á
o funcionamento dos serviços públicos e das infraestruturas críticas.
No ambiente e ecologia
O Governo quer abolir os plásticos não reutilizáveis e pretende definir um
horizonte próximo, que não concretiza ainda, para a abolição progressiva de outras
utilizações do plástico. E quer estimular as empresas a assumirem compromissos
voluntários de eliminação ou redução do plástico utilizado nas embalagens de
produtos de grande consumo.
Quer ainda tornar obrigatória a separação de resíduos em todos os serviços
da Administração Pública e empresas do Estado. E, no âmbito da prevenção de
produção de resíduos, pretende lançar um programa nacional, incluindo um plano
de comunicação que tenha em consideração diferentes faixas etárias da população.
O objetivo é garantir “a reintrodução e a substituição de matérias-primas, numa
lógica circular”.
Referindo que Portugal possui um património de flora e fauna bastante rico
e diverso, associado a uma grande variedade de ecossistemas, habitats e
paisagens, o Programa refere que as alterações climáticas e a atividade humana
são fatores que podem desequilibrar este sistema.
Assim, é fundamental atuar na sua proteção ativa, promovendo atividades
sociais e económicas cujo objetivo explícito seja a recuperação e regeneração
da biodiversidade e, nesse sentido, propõe-se criar um “Provedor do Animal”, promover
a cogestão das áreas protegidas, facilitar a visita das áreas protegidas pelos
cidadãos, nomeadamente através da “eliminação de restrições excessivas e desproporcionadas
que a dificultem” e “promover a fixação das populações residentes em áreas
protegidas”, bem como reforçar a prevenção e controlo de espécies exóticas
invasoras e de doenças e pragas agrícolas e florestais, em particular nas áreas
protegidas e intervir na conservação e de recuperação de espécies (de flora e
fauna) e habitats, desenvolvendo
programas de apoio ao restauro de serviços dos ecossistemas em risco, assim
como de restauro de biodiversidade funcional (como por exemplo polinizadores,
plantas medicinais, habitats aquáticos).
Na violência e discriminação
O Executivo quer “travar o flagelo da violência doméstica”, do namoro e de
género e propõe-se “desenvolver um sistema integrado de sinalização de potenciais
vítimas e agressores”. Para isso, promove a atuação integrada dos sistemas
educativo, de saúde, policial e judiciário e de outros agentes e apostar na
prevenção primária. Assim, promete “alargar a Rede Nacional de Apoio às Vítimas
de Violência Doméstica, de modo a garantir a cobertura integral do território
nacional, oferecendo simultaneamente respostas cada mais especializadas para os
vários casos de violência”. E quer “criar um ponto único de contacto para
vítimas de violência doméstica, onde seja possível tratar de todas as questões,
com garantias de privacidade e assegurando o acompanhamento e a proteção das
vítimas”. E o Programa dedica um capítulo ao combate a todas as formas de
discriminação e ao reforço do combate ao racismo e xenofobia, incluindo a
criação dum observatório do racismo e da xenofobia, bem como a autonomização
institucional do combate à discriminação racial do tratamento das questões
migratórias.
Na justiça
Uma justiça eficiente, ao serviço do desenvolvimento económico-social, mais
próxima dos cidadãos, célere, moderna e acessível é o objetivo do Programa, que
recupera várias propostas do anterior executivo socialista e insiste na
desmaterialização.
Pretende-se aumentar a transparência e a prestação de contas do serviço
público de justiça e contribuir para melhorar a sua qualidade e a eficiência, o
que exige celeridade das decisões e um modelo de funcionamento simplificado,
bem como a revisão do sistema de custas processuais.
Almeja-se melhor formação dos magistrados, com especial atenção aos crimes
de violência doméstica, aos direitos fundamentais, ao direito europeu e à
gestão processual.
Pretende-se implementar modelos alternativos ao cumprimento de pena de
prisão, reforçar a resposta e o apoio às vítimas de crimes e investir na requalificação
e modernização das infraestruturas prisionais e de reinserção social, bem como
no acesso a cuidados de saúde dos reclusos, designadamente ao nível da saúde
mental. Também se quer a agilizar o tempo de resposta em matéria de perícias
forenses, incentivar a composição por acordo entre a vítima e o arguido,
aumentar o leque de crimes em que o ofendido pode desistir da queixa e permitir
a suspensão provisória do processo para um número mais alargado de crimes.
Defende-se, no cível, a introdução de soluções de constatação de factos por
peritos, para evitar o recurso excessivo à prova testemunhal ou a peritagens. Aumentar-se-á
o número de julgados de paz e alargar-se-ão as suas competências, nomeadamente
para questões de regulação do poder paternal, condomínio e vizinhança.
O aumento da capacidade de resposta dos tribunais administrativos e
tributários é outras das medidas, tal como o desenvolvimento de mecanismos de
simplificação e agilização processual.
Nos registos públicos é para continuar o reforço da qualidade e da
celeridade do serviço, apostando-se na simplificação de procedimentos, balcões
únicos e serviços online.
Na gestão e organização de tribunais, aponta-se o reforço das competências
de gestão processual e a simplificação da comunicação entre tribunais e outras
entidades públicas e com os cidadãos.
Na saúde e 3.ª idade
O Governo criará um mecanismo de reforma a tempo parcial, como forma de
promoção do envelhecimento ativo e permanência no mercado laboral, com
desagravamento das horas de trabalho e definição de áreas para contratação de
cidadãos seniores na Administração Pública, tal como promoverá programas de
voluntariado sénior e apoiará iniciativas da sociedade civil.
Também criará formas de atendimento personalizado para cidadãos seniores na
prestação de serviços públicos, bem como “aprovar uma estratégia nacional de
combate à solidão, prevendo um conjunto diversificado de medidas, ajustadas aos
diferentes contextos demográficos e meios socioeconómicos, para atenuar o
flagelo social que afeta sobretudo os mais idosos”.
Na saúde para a 3.ª idade, promoverá uma maior integração de cuidados,
centrada nas pessoas, através de um plano individual de cuidados que permita o
acompanhamento das suas múltiplas patologias de cada paciente e a tomada de
decisões partilhadas.
Outro objetivo é dinamizar o ‘cluster’
da saúde, estimulando a inovação e criando condições para alavancar soluções de
assistência à autonomia no domicílio, em ligação com a Segurança Social e
melhorar as respostas públicas de cuidados domiciliários, designadamente “através
da modernização e reforço dos meios ao dispor dos profissionais de saúde que os
asseguram”.
Outra promessa é reforçar as respostas de cuidados continuados, em articulação
com o setor social e promover respostas de saúde e bem-estar integradas e
inteligentes, através da aposta na cooperação entre o SNS (Serviço
Nacional de Saúde) e a
Segurança Social, bem como reforçar as soluções de transporte de doentes, promovendo
parcerias estratégicas entre os serviços centrais e locais de saúde, autarquias
e setor social e “investir numa maior literacia em saúde por parte da população
com mais de 65 anos de idade, capacitando-a para a gestão da sua saúde e para a
utilização efetiva dos recursos e respostas existentes no SNS”. E promete-se proteger
os idosos em dependência ou isolamento”, criando um sistema de identificação e
sinalização das pessoas vulneráveis e envelhecidas (para vigilância
em cuidados de saúde primário). O documento
fala em
“Desenvolver um sistema integrado de
sinalização de idosos isolados, associado a uma garantia de contacto regular,
em parceria e estimulando o voluntariado social (…), desenvolver, no âmbito do
apoio à dependência, modelos de assistência ambulatória e ao domicílio, em
parceria com a saúde”.
Para tanto, propõe-se “criar um novo serviço no SNS, nomeadamente através
da utilização de novas tecnologias para a monitorização do estado de saúde de
idosos para, numa base estritamente voluntária e com proteção da privacidade,
assegurar um acompanhamento de proximidade e de emissão de alertas de urgência à
saúde de idosos isolados.
O Governo compromete-se a não fazer nenhuma PPP na gestão clínica dos
estabelecimentos de saúde onde ela não exista. E assume que, na saúde, o
recurso à contratação de entidades terceiras (privado ou social) é condicionado “à avaliação de necessidade”, em
linha com o que defendeu na discussão da Lei
Bases da Saúde, diploma em vigor, mas que precisa de ser complementado por
diplomas de desenvolvimento e de regulamentação para que se cumpra o desígnio
humanista e constitucional de saúde de qualidade para todos.
Na defesa do consumidor
O Programa integra várias medidas de proteção do consumidor. E é nesta
linha que se enquadra a promessa de avaliação do “quadro regulatório das
comissões bancárias, assegurando os princípios da transparência ao consumidor e
da proporcionalidade face aos serviços efetivamente prestados”. Seguindo esta
linha, o Programa promete medidas para “garantir a inexistência de comissões
associadas ao levantamento de dinheiro e outros serviços disponibilizados nas Caixas
Multibanco”, bem como para prevenir e punir técnicas “agressivas e inapropriadas
de vendas e publicidade” potencialmente encorajadoras do sobre-endividamento
dos consumidores, tendo em especial atenção os consumidores mais vulneráveis.
Entre as medidas que integram o Programa inclui-se ainda o lançamento de
uma plataforma eletrónica que permita a resolução de contratos de telecomunicações,
sem necessidade de interação física entre os consumidores e os operadores do
setor.
No turismo
O Governo pretende que Portugal seja um destino turístico “sustentável e
inteligente” e promete digitalizar a oferta nacional, nas suas diferentes dimensões,
das empresas aos serviços, passando pelas “experiências e recursos” e
desenvolver um programa de turismo ferroviário. Para tanto, o Programa apresenta
uma lista de tarefas para “continuar a apostar no turismo” como forma de
aumentar as exportações, incluindo a concretização de uma Estratégia Turismo
2030.
Outra proposta é posicionar Portugal como “país de caminhos cénicos,
trilhos e percursos cicláveis”, através dum modelo de gestão de rotas para dar
visibilidade aos destinos, bem como da criação duma plataforma nacional para a
partilha de conteúdos e de roteiros, realçando a diversidade da oferta,
nomeadamente quanto à natureza, património, cultura, tradições, gastronomia,
vinhos e realização de eventos.
Serão alargados a imóveis públicos devolutos os programas ‘Revive
Património’ e ‘Revive Natura’. Na área da mobilidade dos turistas que visitam o
país, o objetivo é implementar o “Passe Portugal”, com ‘seamless experience’,
incluindo bilhética e compra.
O Executivo criará um programa nacional de promoção de Portugal como
destino LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgénero e Intersexo), incluir o alemão, o francês e o mandarim nos
‘curricula’ das escolas de turismo e reforçar condições de competitividade de
Portugal como destino de filmagens internacionais. E, na lista dos projetos
está ainda a concretização de ‘one stop shops’ dedicada às ‘startups’ e
empresas do setor para “assegurar uma resposta rápida por parte da
Administração Pública a novas realidades”.
O Programa recorda que o turismo é líder no crescimento de exportações, com
a subida de 45% das receitas turísticas nos últimos 4 anos, e tem sido poderoso
instrumento de posicionamento internacional e de coesão económica, social e territorial.
Assim pode ler-se no documento:
“Esta aposta e este esforço têm de ser
continuados, por públicos e privados, para garantir que Portugal continua a
liderar como o destino turístico mais sustentável, autêntico e inovador para
viver, investir, trabalhar, estudar e filmar – além do melhor destino para visitar”.
No SEF e imigração
Far-se-ão alterações no SEF (Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras) para haver
separação clara entre as funções policiais e administrativas de documentação de
imigrantes. E, além da atuação no combate às redes de tráfico humano na
prevenção do terrorismo, diz o Programa:
“Há que
reconfigurar a forma como os serviços públicos lidam com o fenómeno da imigração,
adotando uma abordagem mais humanista e menos burocrática, em consonância com o
objetivo de atração regular e ordenada de mão-de-obra para o desempenho de
funções em diferentes setores de atividade. Para este efeito, o Governo irá
estabelecer uma separação orgânica muito clara entre as funções policiais e as
funções administrativas de autorização e documentação de imigrantes.”.
Assumindo que Portugal precisa do “contributo da imigração” para o seu
desenvolvimento económico e demográfico, o Programa apresenta várias medidas
para atrair estrangeiros ao país e simplificação de procedimentos, pretendendo
criar “canais formais de migração”, desde os países de origem e garantir que os
imigrantes “não se transformem em indocumentados ou à margem do sistema”. Neste
sentido, é preciso agilizar e simplificar os processos de entrada, eliminar o
regime de contingentação do emprego, antecipar um título temporário de curta
duração que permita a entrada legal em Portugal de imigrantes com o objetivo de
procura de emprego, promover e modernizar convenções de segurança social e
simplificar e agilizar os mecanismos de regularização do estatuto de residente,
além da concretização de programas de regularização de cidadãos estrangeiros,
designadamente através de ações de proximidade junto da comunidade escolar e
aprofundando o programa SEF em Movimento.
O Governo reverá o regime de autorização de residência para investimento (vistos Gold), que “passará a ser dirigido preferencialmente às regiões de baixa
densidade, ao investimento na criação de emprego e na requalificação urbana e
do património cultural”.
O Executivo estudará “a implementação de um cartão de cidadão estrangeiro
equiparado ao cartão de cidadão, dispensando as duplicações na apresentação de
documentos emitidos por entidades públicas”. E criará um serviço móvel de
informação e regularização de imigrantes na área metropolitana de Lisboa e em
regiões com elevado número de trabalhadores estrangeiros, simplificando e
encurtando os procedimentos de renovação de títulos de residência em Portugal.
No plano da imigração, o Governo criará uma zona de mobilidade e de
liberdade de fixação de residência entre os países da CPLP (Comunidade de
Países de Língua Portuguesa), lançará
programas de apoio à captação de quadros qualificados e de empreendedores nas
áreas tecnológicas e de alto valor acrescentado e promoverá programas de apoio
à captação de estudantes e investigadores estrangeiros pelas instituições de
ensino superior portuguesas.
O Programa do XXII Governo Constitucional balança entre a excessiva cautela
(não
compromisso) e um
arrojo que dificilmente será credível. E, sobretudo subvaloriza taticamente “as
contas certas”. Mas é o programa com que o Governo se apresenta ao país sem contestação
de fundo!
2019.10.30 –
Louro de Carvalho
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