Rui Rio diz esperar por movimentações de António
Costa, vendo o que ele propõe aos partidos em termos de governação, mas os
opositores do líder do PSD esperam pelo que Rio queira fazer e parece que com
muito pouca paciência
No discurso
da noite eleitoral, Rio furtou-se a responder aos jornalistas sobre uma
possível investida de críticos internos agora que o partido obteve um dos
piores resultados de sempre em eleições legislativas. E nem 12 horas tinham
passado quando os jornais, rádios e televisões publicavam as primeiras notícias
com críticas vindas diretamente do interior do partido.
Miguel
Relvas foi dos primeiros a falar. Em declarações à TSF, considerando que o partido deve ir para diretas rapidamente,
afirmou:
“Tem de se resolver com celeridade este processo. Que se marquem novas
eleições. Se Rui Rio achar que deve ir a votos, que vá e que explique que
expectativa e que alternativa quer construir para daqui a 4 anos, que não foi
capaz de construir nestas eleições. Precisamos de uma lufada de ar fresco, de novos protagonistas, de novas
políticas e de reconstruir o espaço político.”.
A ideia foi repetida
diversas, quer por autarcas, quer por dirigentes e ex-dirigentes do partido. O
presidente da distrital do PSD de Setúbal, Bruno Vitorino, crítico da atual
direção, pediu uma “clarificação interna”. E, antes de pedir que o partido
entre numa fase de clarificação de estratégia, disse:
“Infelizmente o resultado não foi uma grande surpresa. O PSD teve um
resultado que não é honroso e tive
uma certa vergonha de ouvir o presidente do meu partido fazer um discurso de
uma quase vitória.”.
O dirigente socialdemocrata
deixa um repto ao líder:
“Rui Rio devia ter coragem de avançar. Sou crítico desta estratégia, mas
se toda a gente que o rodeia acha que é a estratégia correta, o presidente do
meu partido deve avançar”.
E Vitorino considera
que, se Rio não o fizer, “será por
cobardia política”.
Outro crítico
que se evidenciou foi o presidente da Câmara Municipal de Viseu, Almeida Henriques,
que apoiou Santana Lopes na corrida interna em janeiro de 2017 e que tem sido
um crítico do caminho seguido. Considerando que os resultados das eleições têm
de ter consequências, frisou que “o PSD tem de retirar daqui as suas ilações” e
que não viu o partido a tirá-las. Na sua ótica, o “partido teria tudo a ganhar se houvesse clarificação interna: todos os que acham que têm ideias novas devem
vir a jogo”. Apontou responsabilidades diretas a Rio e criticou o seu
discurso na noite eleitoral, dizendo:
“Não faz sentido empurrar
responsabilidades para todos e mais alguns. Não fez um mea culpa. A mensagem não passou. Estas
eleições provaram que era possível ganhar a António Costa se o caminho fosse o
correto. Agora, é importante olhar para o futuro.”.
Até disse
que “não houve líder do PSD com resultado abaixo de 30% nas legislativas que
não tivesse colocado o seu lugar à disposição”. Mas está enganado, porquanto em
1975, nas eleições para a Constituinte, obteve 26,39% e, nas legislativas de
1976, obteve 24,35% e o líder continuou de pedra e cal. Também nas legislativas
de 1983, obteve 27, 24% e Mota Pinto foi vice-Primeiro-Ministro. E, em 1985, o
partido ganhou as eleições com 29,87% e Cavaco Silva foi o Primeiro-Ministro. Ganhou,
mas teve menos de 30% e governou de Credo
na boca.
Já Ângelo
Correia, reconhecendo que o resultado obtido pelo PSD permite que Rio se
mantenha de pé, entende que, para isso, o líder não deve perder tempo em assumir
que quer continuar no cargo. E adiantou:
“Deve dizer esta semana, e
rapidamente, que é o líder e quer continuar a sê-lo. Não é na próxima semana, tem de ser já nesta. E tem de concorrer já
em janeiro. Se o fizer, terá o meu voto.”.
Apesar de
reconhecer que o resultado não é bom, afirma que foi melhor do que chegou a
temer-se – “em relação às expectativas subiu muito”, disse – e que isso é
suficiente para que não haja uma demissão do líder ou uma antecipação das
eleições internas.
Certo é que Rio
deve manter-se atento aos próximos passos de Costa para decidir que posição
assumirá. Pelo seu discurso na noite de domingo não é possível antever qual o
passo que prefere dar no curto prazo. E, enquanto
espera por Costa, os protocandidatos esperam por Rio. Um passo em falso pode
ser visto como precipitação e todas as jogadas merecem ponderação.
***
Entretanto, ficou
a saber-se que Luís Montenegro, antigo líder do grupo parlamentar do PSD vai reunir,
no próximo sábado, centenas de apoiantes num jantar em Espinho.
O presidente da câmara de Vila Nova de Famalicão considerou que Rui Rio
teve uma “derrota estrondosa” e que devia ter sido “humilde” na aceitação dos
resultados, apontando Montenegro como o futuro líder do partido. Em declarações à Lusa, Paulo Cunha, o mais votado autarca do PSD em exercício,
mostrou-se “surpreendido” com a reação do líder dizendo que Rio o que fez foi “encontrar
bodes expiatórios” dentro e fora do partido para os resultados “muito maus” que
os sociais-democratas tiveram nas urnas.
Verificando que Rio “está fragilizado” e que devia “habituar-se
à democracia”, tendo perdido “demasiada energia” com as críticas internas aos seus
“sucessivos insucessos”, observou:
“De facto e à semelhança do que já fez nas
europeias, onde endossou a Paulo Rangel uma culpa maior na responsabilidade
pela derrota, ontem a única coisa que [Rui Rio] fez foi encontrar dentro e fora
do partido bodes expiatórios para a derrota”.
Clamando que a reação de Rio aos resultados do partido foi
surpreendente, vincou:
“A reação do presidente do partido
surpreendeu-me, estava à espera de um presidente do partido humilde, que
interpretasse o resultado como uma derrota e que a assumisse como sua, como
sendo o principal responsável”.
Paulo Cunha entende que os resultados do PSD foram “muito
maus” porque o “no PSD não se perde por
muito ou por pouco, ou se perde, ou se ganha”.
Quanto ao futuro, apontou um possível líder para os
sociais-democratas, lembrando:
“No congresso em fevereiro de 2018, houve um
militante que se notou ao afirmar aquilo que pretenderia fazer num futuro
próximo quando a circunstância se proporcionasse e que não pediria autorização,
que foi o Dr. Luís Montenegro. (…) Acho que ele tem toda a legitimidade para se
candidatar à presidência do PSD e, ao longo de todo este percurso, tem dado
sinais claros de que está concentrado na construção de condições para que o PSD volte a ser protagonista em Portugal.”.
Sobre se Rui Rio se deve recandidatar à liderança do PSD,
Paulo Cunha afirmou:
“Ele é um homem livre e tem todo o direito
de se recandidatar, mas tem que ver que está fragilizado depois destas duas
derrotas e da avaliação que faz das mesmas. (…) Não tem condições para voltar a liderar o partido.”.
***
Também Pedro Duarte, antigo líder da JSD disse que não é candidato à
presidência do PSD e que Montenegro tem condições para congregar apoios para um
novo projeto político no partido. Em
declarações aos jornalistas à margem de um pequeno-almoço organizado pela
Câmara de Comércio Americana em Portugal, em Lisboa, o fundador do movimento
cívico Manifesto X defendeu que o
partido deve manifestar “apreço pelo empenho” do atual líder, de quem não pediu
a demissão, mas considerou que o PSD precisa de “novos protagonistas”. E afirmou:
“Estou e estarei empenhado em ajudar o meu
país por via de uma grande renovação dentro do PSD e estou disponível para
apoiar e poder participar nesse processo de mudança, mas isso não passa por
qualquer ambição ou projeto pessoal da minha parte. Neste cenário, não coloco a
hipótese de me candidatar à liderança do PSD.”.
Questionado
se apoiará uma provável candidatura do antigo líder parlamentar, o antigo Secretário
de Estado da Juventude considerou a questão ainda prematura, mas acabou por
manifestar a sua posição, declarando:
“É importante que se diga que era bom que se
gerasse dentro do PSD um consenso suficiente em torno de uma equipa e de um
líder que pudesse ter essas condições e hoje parece-me absolutamente inequívoco
que Luís Montenegro, tendo essa vontade, tem condições para congregar esse novo
projeto político dentro do PSD”.
Em junho, Montenegro
esteve na apresentação da plataforma cívica Manifesto
X, fundada por Pedro Duarte – que no verão do ano passado admitira uma
candidatura à liderança do PSD, que agora afastou. E Pedro Duarte, questionado
sobre os resultados do PSD nestas eleições, em que obteve 27,9% dos votos, considerou
que o problema do partido “não é apenas desta eleição” e defendeu que, mais do
que fazer “uma caça às bruxas ou apontar responsabilidades”, os
sociais-democratas deverão “olhar para o futuro”.
Ainda assim,
o antigo líder da Juventude Social Democrata considerou que “olhar para o futuro implica construir um
novo projeto político que seja mais próximo das pessoas, de falar dos novos
temas, o que implica novas ideias e novos protagonistas”. Porém,
ao contrário do que exigem alguns, escusou-se a dizer se a direção do partido
deve acelerar o calendário interno (se tal não for feito, as diretas
deverão realizar-se em janeiro e o congresso em fevereiro do próximo ano). E vincou:
“Acho que devemos respeitar a decisão e os ‘timings’ do presidente do PSD (…). O Dr.
Rui Rio, mesmo que não continue como presidente, é uma figura que tem um papel
a desempenhar na vida política portuguesa e pode ser um auxílio muito grande
para a vida do partido e do país.”.
Interpelado
se o PSD pode ajudar na estabilidade política na próxima legislatura, considerou
que o PS “tem todas as condições de
encontrar apoios para governar” e recordou situações em que os
sociais-democratas viabilizaram governações socialistas e seus orçamentos. E disse:
“Num caso acabámos num pântano e com uma
entrada na moeda única para a qual não nos preparámos adequadamente e no outro
acabámos com a pré-bancarrota com o engenheiro Sócrates”.
Sustentando
que o PSD deve ter “um enorme sentido de responsabilidade e olhar para o
interesse do país sempre em primeiro lugar”, o antigo governante considerou
que, por vezes, tal “não passa por dar cheques em branco a governações
socialistas”.
Por seu turno,
na segunda-feira à noite, em entrevista à SIC-Notícias,
o antigo assessor político do ex-líder Passos Coelho, Miguel Morgado, apenas se
comprometeu a apresentar uma moção de estratégia global ao Congresso, dizendo
que irá “ponderar” se avançará para uma candidatura à liderança. O fundador do
movimento cívico 5.7 considerou que o essencial é fazer do resultado de domingo
– que qualificou de “desastroso” – “uma oportunidade” para o PSD reencontrar a
sua vocação de “grande partido nacional”.
Em silêncio,
mantêm-se, por enquanto, outros dois potenciais candidatos à liderança: o
antigo ‘vice’ de Passos Coelho, Jorge Moreira da Silva, que esta semana se
encontra em Paris ao serviço da OCDE, mas que promete pronunciar-se sobre a
situação do partido “oportunamente”, bem como o vice-presidente da Câmara
Municipal de Cascais, Miguel Pinto Luz.
E Luís
Montenegro deverá quebrar o silêncio, que mantém desde as europeias de maio,
ainda esta semana, precisamente no dia 9, mas sem ter sido revelado em que
moldes o fará.
***
Estranho foi
o aparecimento de Cavaco Silva a pronunciar-se sobre os resultados das eleições
legislativas para o PSD e a insinuar um nome para a liderança. É certo que o
Professor foi líder do partido, presidiu a três governos, dois de maioria
absoluta do partido, mas um (o primeiro) foi o mais
minoritário dos governos constitucionais. Foi Primeiro-Ministro durante 10 anos
e protagonizou o famoso tabu estando muitos meses sem dizer se se recandidataria
a líder do partido e a Primeiro-Ministro. Esperou 10 anos e exerceu o cargo de Presidente
da República durante 10 anos, no que foi sucedido por Marcelo Rebelo de Sousa. Compreendo
que se tenha manifestado “triste” com o resultado do PSD e que defenda a
urgência de mobilizar os militantes que se afastaram ou foram afastados. Já não
me parece curial que tenha avançado com um nome para a liderança e, em concreto,
o nome da ex-ministra Maria Luís Albuquerque.
Cavaco é um
senador do partido e um senador da República. Não lhe fica bem imiscuir-se na
gestão do partido. Não lhe é legítimo usar da sua posição para pôr ou tirar o
tapete a alguém.
Numa
declaração escrita, após questionado pela Lusa
sobre os resultados das eleições, frisou:
“Como socialdemocrata com fortes ligações à história do PSD, o resultado
obtido pelo partido não pode deixar de me entristecer”.
Para o
ex-chefe de Estado, “a tarefa mais
importante e urgente que o PSD tem agora à sua frente é a de reconstruir a
unidade do partido e de mobilizar os seus militantes” e trazer “ao debate das ideias e ao esclarecimento e
combate político os militantes que, por razões que agora não interessa
discutir, se afastaram ou foram afastados”. E apontou:
“Como é o caso de Maria Luís Albuquerque, uma das mulheres com maior
capacidade de intervenção, que conheci durante o meu tempo de Presidente, e
muitos outros”.
O antigo líder do PSD nunca se pronunciou sobre os processos de sucessão
no partido. Agora parece estar a tirar o tapete a Rio, de quem foi apoiante há
dois anos. É uma declaração incómoda para o atual líder, porque muitos dos seus
apoiantes ainda são da ala cavaquista.
Disse o ex-Chefe
de Estado:
“A história do PSD mostra que a pluralidade de opiniões, no quadro dos
valores básicos da socialdemocracia moderna – liberdade, democracia, dignidade
da pessoa humana, solidariedade e justiça social, igualdade de oportunidades e
livre iniciativa – é uma força estimulante e enriquecedora do partido”.
E considerou
necessário “fazer do PSD um partido verdadeiramente nacional, atento aos
anseios das populações” para “exercer a nobre tarefa de oposição firme ao
governo que vier a ser formado”. E adiantou:
“É fundamental que o partido fundado por Sá Carneiro se afirme pelo
papel reformista que sempre o distinguiu e que tão importante é para que
Portugal se aproxime do nível de desenvolvimento médio da União Europeia”.
Ainda sobre
os resultados do PSD – 27,9% e 77 deputados – Cavaco considerou que o número de
deputados eleitos “ficou muito aquém
daquele que as vicissitudes que o país conheceu durante os quatro anos do
governo da ‘geringonça’ justificavam para o maior partido da oposição”. Isto, disse, “apesar da dinâmica revelada durante a campanha eleitoral e da
indiscutível qualidade do programa económico proposto aos portugueses” pelo
PSD.
***
O PSD
teve, em eleições legislativas (e para a Constituinte) resultados piores que agora com
Rio: em 1975, obteve 26,39%; em 1976, obteve 24,35%; e, em 1983, obteve 27,24%.
E agora obteve menor percentagem de votos que em 2005, mas elegeu 77 deputados
(em
2005 elegeu 75 deputados).
Ainda falta apurar resultados em dois círculos eleitorais, de que resultarão 4
mandatos que podem calhar ao PSD.
Assim, no
quadro da de democracia interna, é lícito aos militantes do PSD quererem nova
liderança, mas não têm o direito de trucidar o líder e penalizá-lo pelos
resultados numa panóplia tão ampla de opções. E substituir Rio por Maria Luís
Albuquerque seria pior a emenda que o soneto, pela sua ligação direta ao tempo
da troika como Secretária de Estado do Tesouro
e como Ministra do Estado e das Finanças. De modo semelhante se deve apreciar
Montenegro enquanto líder do grupo parlamentar nesse tempo, sancionando toda a
política governativa de restrições.
Certamente
que não faltam militantes com outros perfis de líder.
2019.10.08 –
Louro de Carvalho
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