sexta-feira, 6 de junho de 2014

O Dia D

Passa, neste ano de 2014, o 70.º aniversário do designado por Dia D, que mais não é que o dos momentos do desembarque da Normandia no quadro da invasão e subsequente batalha nesta região francesa. Tratou-se de uma ação das tropas aliadas conhecida por Operação Overlod e Operação Neptuno, no penúltimo ano da Segunda Guerra Mundial, que visava libertar a França do domínio Nazi, que nela se exercia desde o ano de 1940. Esta megaoperação foi secundada pelas operações de engodo – sob os nomes de código: Operação Glimmer e Operação Tributável – para distrair as forças alemãs e as levar a deslocar-se para alhures.
A ação de desembarque teve o seu início na noite de 5 para 6 de junho: no Canal da Mancha movimentava-se uma vasta armada, constituída por 2727 navios mercantes, que levavam a reboque 2500 lanchas de desembarque, e 700 navios de guerra. Esta megaoperação decorreu em duas fases. A primeira, com a duração de 20 minutos, aconteceu quando faltavam cinco minutos para a meia-noite, com o começo da travessia por várias centenas de soldados de infantaria britânicos em planadores e consequente captura de duas pontes no flanco leste da zona de desembarque. A segunda começou ao alvorecer do dia 6 de junho, com a descida de 18000 paraquedistas britânicos e americanos. E às 6 horas e 30 minutos, desembarcavam a primeiras tropas – tropas americanas com tanques anfíbios, que desembarcaram debaixo de fogo. Menos de uma hora depois, desembarcaram tropas britânicas e canadianas. Apesar de Hitler haver ordenado a Rommel que empurrasse os neoinvasores “para dentro do mar” até à meia-noite, a essa hora já estariam em terra 155000 soldados aliados, a que se vieram juntar muitos elementos das forças militares da Resistência Francesa, que vinham sabotando pontes e linhas férreas.
As tropas desembarcadas distribuíram-se ao longo de um trecho de 80 quilómetros na costa normanda e organizaram-se em cinco setores: Utah, Omaha, Golg, Juno e Sword. Considerada a maior batalha anfíbia de todos os tempos, envolveu o desembarque de cerca de duas centenas de milhares de militares aliados e a cooperação das respetivas marinhas mercante e de guerra. O transporte de militares e material foi efetuado a partir do Reino Unido por inúmeros aviões e navios, e foram colocados ao serviço da estratégia definida desembarques de assalto, suporte aéreo, interdição naval do Canal Inglês e fogo naval e de apoio – uma retaguarda de milhares e milhares de homens e uma enorme multiplicidade de meios.
Entre os mais de 150 mil soldados que chegaram por mar ou por ar às costas francesas a 6 de junho de 1944 (e cujo número foi aumentando em conformidade com a evolução da guerra), encontrava-se o paraquedista Ernest Stringer, ferido no joelho por tiros de metralhadora antes de chegar à Pegasus Bridge.
A batalha foi longa (O objetivo de libertação da França só foi conseguido em 25 de agosto!) e capitalizou, para os dois lados em beligerância, largos milhares de vítimas, a maior parte delas mortais, mas foi um dos fatores determinantes da inversão da sorte da Guerra, que até ali parecia estar a favor das forças do Eixo.
(cf Gilbert, M. História do Século XX –Ed D. Quixote, 2009; Carrel, P. Invasão 44- Editora Flamboyant, 1965)
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Sete décadas depois, organizaram-se em França cerimónias de homenagem às vítimas dos bombardeamentos, atos de recolhimento nos cemitérios de todas as nações que perderam homens em solo francês e discurso de alguns dos líderes mundiais. As cerimónias dos 70 anos do desembarque na Normandia ficaram marcadas pela emoção em torno dos sobreviventes do Dia D, ali presentes.
À meia-noite de 5 para 6 de junho de 2014, os céus da Normandia foram iluminados por fogos-de-artifício, tal como os bombardeamentos aliados os iluminaram na noite de 5 para 6 de junho de 1944, iniciando a libertação da Europa do domínio nazi e, mais tarde, o fim da II Guerra Mundial. E os heróis do Dia D voltaram neste dia à Normandia de uniforme e medalhas ao peito, para as comemorações dos 70 anos do desembarque aliado na costa francesa.
O Presidente francês, François Hollande, recebeu um a um os representantes dos 19 países convidados para a cerimónia internacional organizada na praia de Ouistreham, a mais oriental de todas aquelas em que se deram as ações de desembarque.
Antes de um espetáculo de 45 minutos a evocar os acontecimentos do Dia D, Hollande homenageou as “testemunhas vivas do que aconteceu aqui em 1944” e evocou “todas as vítimas do nazismo”, inclusive “as vítimas alemãs”. “Obrigado, por terdes estado aqui no verão de 1944!”, disse Hollande aos milhares de antigos combatentes do Dia D presentes, alguns dos quais tinham sido cumprimentados por Barack Obama e pela Rainha Isabel II.
Estes dois Chefes de Estado tinham almoçado no castelo de Bénouville, símbolo da Resistência francesa contra os nazis, na companhia de outros seus homólogos – refeição que deu azo a vários encontros diplomáticos e ao esperado aperto de mão entre os presidentes russo, Vladimir Putin, e ucraniano, Petro Porochenko.
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Coube efetivamente ao anfitrião a formulação das palavras de homenagem aos heróis e às vítimas dos dois lados (na Guerra todos perdem indubitavelmente), ditadas pelo sentido de justiça para com aqueles que derramaram o sangue por aquilo que entendiam ser causa justa, quiçá patriótica, mas também para avivar a memória dos circunstantes e do mundo inteiro. A História não pode ser apagada e os factos devem levar os homens à reflexão, ao menos para que tenham o juízo discernente que outrora não houve e enveredem por caminhos de coexistência e convivência como semelhantes e não como inimigos.
Entretanto, é de refletir nas palavras que a Comunicação Social respigou dos considerados (talvez mal) líderes do Mundo e da Europa, respetivamente Obama e Merkel.
Barack Obama, declarou que as praias da Normandia foram, em 1944, “a ponte para a democracia” e que a vitória dos Aliados na Segunda Guerra Mundial “proporcionou a segurança e o bem-estar” para o futuro.
A serem verdadeiras as suas palavras, ninguém poderia dizer que os países da Europa de Leste não viveram em democracia até 1991. Então, há que perguntar para que efeito se construiu o muro de Berlim, porque se limitavam as informações sobre o regime soviético ou como se justificam os tanques soviéticos na Hungria e na Checoslováquia? Depois, será de perguntar ao líder do mundo que raio de segurança é a americana, que tudo perscruta e induziu as ditaduras sul-americanas. Que segurança, que democracia? Como é que a dita ponte para a democracia não encontrou argumentos contra a perpetuação das ditaduras ibéricas? Mais: desgraçado de um mundo ou de um país, se para instaurar um regime democrático precisa de destruir milhares e milhares de vítimas!
Por seu turno, a chanceler alemã, Angela Merkel, ao evocar a questão da Ucrânia, escreveu no diário regional francês Ouest-France:
“As passadas semanas mostram-nos que os antigos e perigosos esquemas de pensamento não estão banidos dos livros de história. A paz e a liberdade podem ser postas em causa rapidamente, como demonstra o conflito na Ucrânia. É grande a preocupação de se ver novos fossos e linhas de partilha.”.
E adianta:
“Faço votos (...) de que asseguremos as nossas convicções e os nossos valores comuns. Pois estas convicções e estes valores unem-nos na Europa, são inconciliáveis com a guerra, a violência e os preconceitos. Possa o 6 de junho incentivar-nos a manter o nosso compromisso lado a lado pelo sucesso da Europa, uma Europa em que reina a primazia do direito e não a lei do mais forte.”.
É óbvio que a chanceler tem razão no seu reto discurso: a União Europeia, que visa a paz, assente no desenvolvimento e na solidariedade, com o rumo que está a percorrer, assombrada do perigo da eurodúvida ou da tentação antieuropeia (com movimentos crescentes de xenofobia e contra a circulação de pessoas, bens e trabalho), não constitui vacina válida contra conflitos e mesmo contra o espectro da guerra.
Porém, onde estava a Europa quando se cavaram novos fossos e se desenharam novas linhas de partilha? Em vez do apoio ao derrube de instituições democráticas, a Europa deveria ter oferecido a diplomacia, não? Em vez das sanções, não haveria que reforçar as negociações?
Por outro lado, os votos de Merkel por uma Europa em que reine “a primazia do direito e não a lei do mais forte”, tiremo-nos de distrações, cheiram a ironia, passados que estão três anos de exploração dos países do Sul em termos de austeridade sobre austeridade, a pagar o “erro” de terem seguido as linhas de orientação das entidades que deveriam estar a zelar o progresso da Europa, representadas por Merkel e Sarkozy.
Precisamos urgentemente da conversão de Merkel e de seus seguidores portugueses!
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Também, segundo a agência Ecclesia, o Papa Francisco assinalou, com uma mensagem, o 70.º aniversário do desembarque na Normandia, evocando todos os soldados que morreram em combate. Trata-se de um texto enviado através do secretário de Estado do Vaticano, cardeal Pietro Parolin, ao arcebispo de Paris, cardeal Andrè Vingt-Trois, a D. Jean Claude Boulanger, bispo de Bayeus-Lisieux e a todas as pessoas que se reúnem para as comemorações deste evento que ocasionou a reviravolta no rumo da II Guerra Mundial.
O texto refere expressamente que “o Papa Francisco presta homenagem aos soldados que partiram das suas próprias terras para desembarcarem nas praias da Normandia, com o objetivo de lutar contra a barbárie nazi, libertando assim a França ocupada”. E não deixa de evocar os soldados alemães “envolvidos neste drama”, bem como “todas as vítimas desta guerra”.
Mas importa que se tirem consequências da memória da Guerra:
“É oportuno que as gerações do presente expressem o seu pleno reconhecimento a todos os que fizeram um sacrifício tão forte. É por meio da transmissão da memória e mediante a educação das novas gerações no respeito de todos os homens criados à imagem e semelhança de Deus, que é possível levar em consideração, na esperança, um futuro melhor”.
O Papa deixa dois importantes recados: “a exclusão de Deus da vida das pessoas e da sociedade provoca mortes e sofrimentos”; e “as nações europeias podem encontrar no Evangelho de Cristo, Príncipe da Paz, a raiz da sua história e a fonte de inspiração para estabelecer relações cada vez mais fraternas e solidárias”.

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