A 24 de novembro de 2013, solenidade
de Nosso Jesus Cristo Rei do Universo, Francisco presidiu à celebração do
enceramento do Ano da Fé, que, de
acordo com a sua convocação pela carta apostólica “Porta Fidei”, de Bento XVI, teve início oficial no dia 11 de
outubro de 2012, data que celebrava os 50 anos da abertura do Concílio Vaticano
II.
Porém, haverá quem não se recorde de que,
já depois do encerramento do Concílio Vaticano II, a Igreja celebrara outro Ano da Fé, iniciativa de Paulo VI, para assinalar
a celebração do XIX centenário do martírio, em Roma, dos apóstolos Pedro e Paulo
– os dois maiores dos Apóstolos, considerados colunas da verdade e alicerces da fé católica – que
ocorreu cerca do ano 67 de nossa era. Daí, a data daquele “Ano da Fé”, colocado entre as festas de São Pedro e São Paulo,
entre 29 de junho de 1967 e 29 de junho de 1968.
Daquele primeiro “Ano da fé” pós-conciliar a Igreja
recebeu uma herança preciosa: o “Credo do
Povo de Deus”, assumido por Paulo VI, não só pessoalmente, mas também como humilde
detentor do exercício do ministério Petrino e professado por si no dia do
encerramento do Ano da Fé, a 30 de junho de 1968.
A génese da sua elaboração que, a
seguir, se sintetiza, vem no livro “Correspondence”
(vol. VII), entre o teólogo e cardeal suíço Charles Journet e o filósofo francês
Jacques Maritain, ou seja, as 303 cartas que os dois trocaram entre 1965 e 1973,
publicado em França. Entretanto, o cardeal Georges Cottier – discípulo de Journet e teólogo emérito da casa pontifícia –
antecipara informações sobre o Credo ao
mensário internacional 30 Dias, que lhe dedicou a
capa de um dos seus números.
Em
1967, Maritain, de 85 anos, a morar em Toulouse com os Irmãos de Charles de
Foucauld, acabava de publicar Le Paysan de la
Garonne (Desclée
de Brouwer, 1966), crítica contundente à Igreja pós-Conciliar, a seu ver,
“ajoelhada aos pés do mundo”. A 12 de janeiro, Journet escreve a Maritain que se vai encontrar com o Papa, em
Roma. Não sabem ambos que Paulo
VI tenciona
iniciar o Ano da Fé.
Porém, Maritain respondeu a Journet confiando-lhe que, nos dias anteriores,
lhe viera à mente a ideia de o Pontífice redigir uma profissão de fé completa e
detalhada, na qual explicitasse tudo o que está realmente contido no Símbolo de
Niceia. Esta seria, na história da Igreja, a profissão de fé de Paulo
VI.
Sem
que Maritain o tenha pedido, Journet fotocopia
a carta do filósofo e entrega-a ao Papa, quando se reúne com ele a 18 de
janeiro. Então, Paulo
VI pede ao
teólogo opinião sobre o estado da Igreja, que Journet definiu como “trágico”. Tanto ele como o Papa
estão impressionados com a publicação ocorrida no ano anterior na Holanda, com
o aval dos bispos, do Novo Catecismo, com o escopo de substituir na Igreja a ortodoxia
tradicional pela moderna, na expressão da Comissão Cardinalícia nomeada por
Paulo VI, de que Journet fazia parte, para analisar o predito
catecismo.
Entretanto,
a 22 de fevereiro de 1967, festa da
Cátedra de São Pedro, Paulo VI, pela
exortação apostólica Petrum et Paulum,
determina a celebração do Ano da Fé. E, dois dias depois, Maritain anota no seu diário: “É acaso a
preparação para uma profissão de fé que ele mesmo proclamará?”.
No mesmo ano, de 29 de setembro a 29 de
outubro, reúne-se em Roma o primeiro Sínodo
dos Bispos, em cujo relatório final a Comissão Doutrinal submete ao Papa a proposta de uma
declaração sobre os pontos essenciais da fé. E, a 14 de dezembro, Paulo VI recebe
novamente Journet, que lhe reapresenta a ideia de Maritain, ao que Paulo VI
responde que lhe haviam sugerido a promulgação dum novo símbolo da fé no final
do Concílio Vaticano II.
O próprio Papa havia pedido ao teólogo dominicano Yves Congar a preparação do texto, mas que, não
lhe parecendo satisfatório, foi arquivado. Depois, subitamente, Paulo VI solicitou a Journet
que preparassem um esquema daquilo que pensavam que devia ser feito. Retornado
à Suíça, Jornet refere a solicitude do Papa a Maritain,
o qual, no começo do novo ano, enquanto está em Paris, redige um esquema de profissão
de fé, que, terminado a 11 de janeiro de 1968, o envia a Journet,
no dia 20. Este, por sua vez, no dia seguinte, remete-o a Paulo VI.
No
texto elaborado por Maritain como simples rascunho, Journet
encontrava resposta às dúvidas suscitadas pelo Catecismo Holandês
e por outros teólogos sobre dogmas como o pecado original, a missa como
sacrifício, a presença real de Cristo na Eucaristia, a criação a partir do
nada, o primado de Pedro, a virgindade de Maria, a Imaculada conceição, a
assunção – pelo que o envia ao Papa sem nada acrescentar.
A 6 de abril, chega uma carta de Roma, do
teólogo dominicano Benoît Duroux, consultor da Congregação da Doutrina da Fé, a
elogiar o texto e a correlacioná-lo com alguns comentários tidos por Journet
como provenientes de Paulo VI, que, por seu turno, envia ao cardeal um cartão
de agradecimento.
Assim,
no dia 30 de junho de 1968, Paulo
VI pronuncia
solenemente na Praça de São Pedro, o Credo do Povo de Deus. Maritain vem a saber disso apenas a 2 de julho
por leitura de um jornal. Pelas citações, intui que o Credo proferido
pelo Papa coincide amplamente com o rascunho que escrevera. Entre as poucas
variações, há uma que se refere aos judeus e muçulmanos. Maritain citara explicitamente o testemunho comum
de que judeus e muçulmanos louvam o único Deus juntamente com os cristãos. Paulo VI, do seu
lado, dá graças à
bondade divina pelos muitos crentes que compartilham com os cristãos a fé no
único Deus, mas sem citar explicitamente o judaísmo e o islamismo.
O
texto deste Credo recalca o formulado no Concílio de Niceia,
que se recita habitualmente na celebração da missa de domingos e solenidades,
acrescido de importantes complementos e desenvolvimentos.
É louvável o
esforço do Papa de enquadrar numa sequência harmoniosa as verdades reveladas
por Deus, colocadas para o nosso conhecimento e propostas para o nosso
consentimento. Assim, através de uma profissão clara e detalhada, Paulo VI, que
lembrara aos bispos a necessidade de proclamar pública e assiduamente o símbolo
da fé, formulou a crença cristã em Deus Trindade, destacando as verdades ao
alcance da Igreja sobre Jesus Cristo e o Espírito Santo. Mas compendiou
explicitamente também as verdades sobre Maria, a Igreja, a nossa realidade de
pecadores envoltos nas consequências do pecado humano, mas chamados à santificação
pela ação da graça divina, revelada em Jesus Cristo e levada por diante pelo
ministério da Igreja.
Com o título de “Credo do Povo de Deus” retoma-se a afirmação central do Concílio
sobre a Igreja, que identificou a sua realidade e missão em termos de “povo de
Deus”, no contexto da visão bíblica que é sintetizada nas palavras do Profeta
Jeremias: “Eu serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo” (Jr 32,38), sem
esquecer as dimensões de esposa de Cristo, Corpo de Cristo e rebanho de Deus.
Será certamente útil conferir este
“Credo do Povo de Deus”, que termina em doxologia triságica, na sequência que
ele próprio destaca, para percebermos a riqueza de verdades que Deus nos
revelou, e o desafio de as conhecer bem e as professar de maneira consciente e
comprometida.
O arrazoado diacronicamente exposto mostra
como Paulo VI se socorria da colaboração de qualquer pessoa que de boa vontade
lhe mostrasse a situação da Igreja e sugerisse o contributo singelo para a melhoria.
O exemplo de Maritain é apenas um dos muitos de que Paulo VI se fazia
assessorar informalmente. O contexto dramático da redação da profissão de fé de
Montini é a outra face da visão (essa mais otimista) da Igreja do Vaticano II (a
lufada de ar fresco), da Ecclesiam Suam (a
encíclica do diálogo) ou da Evangelii
Nuntiandi (a exortação mobilizadora do apostolado transformador do mundo).
O esforço de síntese do Credo, que vem
a seguir, não é mais do que um esforço que visa abrir o apetite para a leitura
da Profissão de Fé de Paulo VI, explanada, elucidativa, de resposta a dúvidas,
desmandos e esforços de equilíbrio. Constitui um bom farol de orientação da
barca de Pedro, não condicente, apesar de tudo, com a visão catastrofista de
Maritain e de Journet.
O texto de Paulo VI está distribuído
por 30 pontos. Só que os primeiros sete refletem o conteúdo da homilia
antecedente deste Credo, atinente ao contexto
da celebração do Ano da Fé, cujos
frutos resultam da vivência esforçada de todos e ao contexto que levou a esta
proclamação da fé da Igreja, não deixando de relevar, ao lado do visível dramatismo,
as notas que permitem o otimismo da esperança.
Leia-se em
http://www.vatican.va/holy_father/paul_vi/motu_proprio/documents/hf_p-vi_motu-proprio_19680630_credo_po.html,
ac. 2014.06.29.
– Síntese/condensação
do texto do Credo do Povo de Deus,
de Paulo VI, 30 de junho de 1968 –
1. Cremos num só Deus – Pai, Filho
e Espírito Santo – Criador das coisas visíveis, o mundo onde decorre nossa vida
passageira; e invisíveis, como os puros espíritos e a alma espiritual e imortal
em cada homem.
2. Cremos que o
Deus único é uno na essência e demais perfeições: omnipotência, ciência,
providência, vontade e amor. É Aquele que
é, como Se revelou a Moisés; é Amor,
como garante o Apóstolo João. Só Ele pode dar-nos conhecimento exato e pleno de
Si, revelando-Se como Pai, Filho e Espírito Santo, de cuja vida nos é dado
participar aqui na obscuridade da fé e, depois, na luz sempiterna. A
mutualidade das relações, constitutiva da unicidade das Três Divinas Pessoas,
perfaz a bem-aventurada vida íntima do Deus Santíssimo – facto que os crentes testemunham
connosco ante os homens, mesmo não conhecendo o mistério da Trindade. Cremos
no Pai,
que desde a eternidade gera o Filho; no Filho, Verbo de Deus eternamente
gerado; e no Espírito Santo, Pessoa incriada, que procede do Pai e do Filho
como Amor sempiterno de ambos. Cremos nas Pessoas Divinas, eternas e iguais, em
que a vida e a felicidade superabundam e se consumam na superexcelência e
glória da Essência incriada, devendo venerar-se a Unidade na Trindade e a
Trindade na Unidade.
4. Cremos em Nosso Senhor Jesus Cristo,
Filho de Deus, Verbo eterno, nascido do Pai antes de todos os séculos,
consubstancial ao Pai, por quem tudo foi feito; Encarnado pelo Espírito Santo,
de Maria Virgem, e feito homem; igual ao Pai, na divindade, mas inferior a Ele,
pela humanidade; uno, não por confusão de naturezas, mas pela unidade de pessoa.
5. Habitou entre nós, cheio de graça
e verdade; anunciou e fundou o Reino de Deus, revelando em Si o Pai; deu o
mandamento novo de nos amarmos uns aos outros como Ele nos amou; ensinou a via das
bem-aventuranças – pobreza e mansidão, paciência no sofrimento, sede de
justiça, misericórdia, pureza de coração e pacificidade, aceitação da perseguição
por mor da virtude; sob Pôncio Pilatos padeceu, Cordeiro de Deus que carregou o
pecado do mundo e morreu crucificado por nós, trazendo-nos a salvação no Sangue
redentor; sepultado, ressuscitou ao terceiro dia por seu poder, elevando-nos à
participação na vida divina, a graça; subiu ao céu, donde virá de novo, mas em
glória, a julgar os vivos e os mortos, segundo o mérito de cada um: quem seguir
o Amor e a Misericórdia terá a vida eterna; porém, quem os recusar em
definitivo terá por destino o fogo incessante. E o seu reino não terá fim.
6. Cremos no Espírito Santo, Senhor e fonte de
vida, adorado e glorificado com o Pai e o Filho; que falou pelos
profetas e foi enviado por Jesus, depois da ressurreição e ascensão ao Pai; que
ilumina, vivifica, protege e governa a Igreja, purificando seus membros, que
não rejeitam a graça; que penetra no íntimo da alma, tornando, com Sua ação, o
homem capaz de observar o preceito de Cristo: sede perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste.
7. Cremos que Maria Santíssima, sempre Virgem, se
tornou Mãe do Verbo Encarnado, nosso Deus e Salvador, Jesus Cristo; que,
por esta eleição singular, em consideração dos méritos do Filho, foi, de modo
mais sublime, remida e preservada imune do pecado original, superando
as demais criaturas pelo dom de uma graça insigne.
8. Associada por vínculo estreito e
indissolúvel aos mistérios da Encarnação e Redenção, a Virgem Imaculada, após o
curso de sua vida terrestre, foi elevada em corpo e alma à glória celestial;
e, tornada semelhante ao Filho, ressuscitado dentre os mortos, participou, por
antecipação, da sorte dos justos. Cremos que a Mãe de Deus, nova Eva e Mãe
da Igreja, desempenha lá do céu o ofício materno para com os membros de
Cristo, cooperando para gerar e desenvolver a vida divina em cada um dos
remidos.
9. Cremos que todos pecaram em Adão,
o que significa que a culpa original fez que a natureza, comum aos homens,
caísse num estado em que sofre as consequências dessa culpa. É, pois, a natureza
decaída, despojada do dom gratuito que a adornava, ferida em suas forças
naturais e submetidas ao domínio da morte, que é transmitida a todos os homens.
10. Cremos que Nosso Senhor Jesus
Cristo, pelo Sacrifício da Cruz, nos remiu do pecado original e dos nossos
pecados pessoais, de sorte que se impõe como verdadeira a sentença do Apóstolo:
onde abundou o delito, superabundou a
graça.
11. Cremos professando um só
Batismo, instituído por Cristo para a remissão dos pecados, que deve
ser ministrado também às crianças que não cometeram pecado algum, para que,
nascidas sem a graça sobrenatural, renasçam da água e do Espírito para a vida
divina.
12. Cremos na Igreja una, santa, católica e apostólica,
edificada por Cristo sobre a pedra, que é Pedro. É o Corpo de Cristo, sociedade
visível, estruturada hierarquicamente e comunidade espiritual. Igreja
terrestre, Povo de Deus peregrinando na terra, e Igreja enriquecida de bens
celestes, germe e começo do Reino de Deus, por meio do qual a obra e os sofrimentos
da Redenção continuam, ao longo da história humana, aspirando com todas as
forças à consumação perfeita, que se conseguirá na glória celestial, no fim dos
tempos. Formada, no decurso do tempo, por Jesus com os Sacramentos que emanam
de sua plenitude, a Igreja faz, por eles, com que seus membros participem do
mistério da Morte e Ressurreição do Senhor, pela graça do Espírito Santo que a
vivifica e move. É santa, apesar de incluir pecadores no seu seio, pois em si
mesma não goza de outra vida senão a da graça. Se realmente seus membros se
alimentam dessa vida, santificam-se; se dela se afastam, contraem pecado e
impureza espiritual, que impedem o brilho e a difusão da santidade. Por isso,
ela faz penitência por esses pecados, tendo o poder de livrar deles seus filhos
pelo Sangue de Cristo e pelo dom do Espírito.
13. Herdeira das promessas divinas e
filha de Abraão no Espírito, por meio do povo de Israel, cujos livros guarda e
cujos Patriarcas e Profetas venera; edificada sobre o fundamento dos Apóstolos,
cuja
palavra sempre viva e cujos poderes pastorais vem transmitindo de geração em
geração, no sucessor de Pedro e nos Bispos em comunhão com ele; gozando,
enfim, da perpétua assistência do Espírito Santo, tem o encargo de conservar,
ensinar, explicar e difundir a Verdade por Deus revelada aos homens, de modo velado,
pelos Profetas e, plenamente, por Jesus. Cremos em todo o conteúdo da Palavra de Deus,
por escrito e por tradição, proposto pela Igreja, em declaração solene
e no Magistério ordinário e universal; e na infalibilidade do Sucessor de
Pedro, quando fala ex cathedra, como Pastor e Doutor dos
cristãos, e do Colégio dos Bispos, quando com o Papa exerce o Magistério
supremo.
14. Cremos que a Igreja, fundada por
Cristo, que por ela orou, é una, na fé, no culto e no liame da
comunhão hierárquica, em cujo seio, a variedade ritual e a diversidade do
património teológico e espiritual ou disciplinar declaram a sua unicidade.
15. Reconhecendo que fora
da estrutura eclesial há elementos de santificação e verdade, que como
dons próprios da Igreja impelem à unidade, e crendo na ação do Espírito que
suscita em todos os discípulos o desejo da unidade, esperamos que os cristãos,
ainda não em plena comunhão com a Igreja, se unam num só rebanho sob o único Pastor.
16. Cremos que a Igreja é necessária à Salvação,
pois só Cristo é o Mediador e caminho da salvação, e Ele se nos torna presente no
seu Corpo, que é a Igreja. Mas o desígnio divino abrange todos os homens, e
mesmo os que, ignorando sem culpa o Evangelho e a Igreja, procuram a Deus com
sincero coração e se esforçam, sob o influxo da graça, por cumprir com obras a
sua vontade, conhecida pela consciência, obtêm a salvação eterna.
17. Cremos que a Missa,
celebrada pelo sacerdote, na pessoa de Cristo, mercê do poder do sacramento da
Ordem, e oferecida em nome de Cristo e dos membros do seu Corpo Místico, é o real
Sacrifício do Calvário, tornado presente em nossos altares. Cremos que, como o
Pão e o Vinho consagrados pelo Senhor na última ceia se converteram no seu
Corpo e Sangue, que iam ser oferecidos por nós na Cruz, assim o Pão e o Vinho
consagrados pelo sacerdote se convertem no Corpo e Sangue de Cristo que assiste
gloriosamente do céu. Cremos que a presença do Senhor, sob as espécies que
aparecem aos sentidos como dantes, é presença verdadeira, real e substancial.
18. Neste sacramento, Cristo, para se
nos dar em alimento e nos associar pela unidade do seu Corpo Místico, como foi
vontade sua, está presente pela mudança de toda a substância do pão e do vinho no
seu Corpo e Sangue, permanecendo apenas inalteradas as propriedades de pão e vinho,
que percebemos pelos sentidos – mudança misteriosa que a Igreja chama com total
exatidão e conveniência transubstanciação.
19. A única e indivisível existência
de Cristo nosso Senhor, glorioso no céu, não se multiplica, mas torna-se
presente pelo Sacramento nos vários lugares da terra onde o Sacrifício
Eucarístico se celebra. E, depois da celebração, a mesma existência permanece
presente no Santíssimo Sacramento, que permanece no sacrário do altar como o coração
vivo de nossas igrejas. Por isso, somos obrigados, por dever
suavíssimo, a honrar e adorar, na Sagrada Hóstia que os nossos olhos veem, o
próprio Verbo Encarnado que eles não podem ver e que, sem ter deixado o céu, se
tornou presente diante de nós.
20. Confessamos que o Reino
de Deus, começado aqui na terra na Igreja de Cristo, não é deste mundo, cuja figura passa, e cujo crescimento não pode ser confundido com o
progresso da cultura humana ou das ciências e artes técnicas, mas consiste em
conhecer cada vez mais as riquezas insondáveis de Cristo, em esperar sempre com
maior firmeza os bens eternos, em responder mais ardentemente ao amor de Deus,
enfim, em difundir-se cada vez mais largamente a graça e a santidade entre os
homens. Mas com o mesmo amor, a Igreja é impelida a interessar-se continuamente
pelo verdadeiro bem temporal dos homens, pois, não cessando de advertir todos
os seus filhos de que não possuem aqui na
terra morada permanente, estimula-os a que contribuam, segundo as condições
e os recursos de cada um, para o desenvolvimento da sociedade humana; promovam a
justiça, a paz e a união fraterna entre os homens; e prestem ajuda aos
irmãos, sobretudo aos mais pobres e infelizes. Destarte, a grande solicitude
com que a Igreja, Esposa de Cristo, acompanha as necessidades dos homens, suas
alegrias e esperanças, dores e trabalhos, não é outra coisa senão o ardente
desejo que a impele com força a estar presente junto deles, tencionando
iluminá-los com a luz de Cristo, congregar e unir a todos naquele que é o único
Salvador – solicitude que não significa acomodação às coisas do mundo ou
diminuição do fervor com que esperamos o Senhor e seu Reino eterno.
21. Cremos na vida eterna e em que as
almas dos que morrem na graça de Cristo – quer as que ainda se purificam no
Purgatório, quer as que são recebidas por Jesus no Paraíso, logo que se separam
do corpo, como sucedeu ao Bom Ladrão – formam o Povo de Deus para além da
morte, que será totalmente vencida na Ressurreição, em que as almas se reunirão
aos corpos.
22. Cremos que as almas, reunidas com
Jesus e Maria no Paraíso, constituem a Igreja celeste, onde, gozando da
felicidade eterna, veem a Deus como Ele é e participam com os santos Anjos, em
grau e modo diversos, do governo divino exercido por Cristo glorioso, já que intercedem
por nós e ajudam nossa fraqueza com a sua solicitude fraterna.
23. Cremos na comunhão de todos os fiéis:
dos que peregrinam sobre a terra, dos defuntos que ainda se purificam e dos que
gozam da bem-aventurança do céu, formando todos uma só Igreja. E cremos que
nesta comunhão dispomos do amor misericordioso de Deus e dos Santos, atentos a nossas
orações, como Jesus garantiu: pedi e
recebereis. Professando a fé e apoiados na esperança, aguardamos a
ressurreição dos mortos e a vida do século futuro.
Bendito seja Deus: Santo, Santo,
Santo! Amém.
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