sábado, 31 de março de 2018

Empresa Pública de Desenvolvimento e Gestão Florestal


Os relatórios elaborados na sequência dos incêndios florestais dos meses de junho e outubro de 2017 tinham de produzir consequências na ação do Estado a concretizar na legislação, na tomada de medidas de prevenção e de combate aos incêndios e na gestão da floresta.
Segundo algumas das conclusões do relatório da Comissão Técnica Independente sobre os fogos de outubro, a legislação produzida não está suficientemente fundamentada do ponto de vista técnico-científico. A ser verdade, ela terá de ser melhorada. E o Primeiro-Ministro, no contexto das contradições com que o dito relatório foi acolhido, prometeu lê-lo com humildade e tirar as necessárias consequências. Por seu turno, Marcelo Rebelo de Sousa já veio prometer apoio no quadro da melhoria da legislação, se for o caso. E os partidos já procederam ao debate premonitório no Parlamento, salientando-se que uns, esquecidos de que a legislação anterior não foi observada pelos governantes em exercício, agora atiram-se ao Governo pelo lado da sua suposta incompetência. E este parece esquecer-se de que, ao longo dos anos, não esteve fora da cena política, pois a governação tem-se repartido, como tem convindo, entre PS e PSD/CDS.
Por outro lado, sabe-se que não basta atacar o problema apenas do lado da prevenção e do combate aos incêndios. Mesmo que haja uma entidade unificada com a responsabilidade da prevenção e combate aos incêndios, de pouco vale se não conseguir alocar os meios suficientes e adequados à tarefa e provocar a partilha do conhecimento pelo diálogo entre a profissionalização crescente dos seus agentes e a experiência acumulada dos amadores e dos elementos sabedores das populações. A título de exemplo, recordo que há uns anos, técnicos devidamente credenciados estavam a laborar no terreno com vista ao projeto da retificação e alargamento duma estrada municipal. Chamei à atenção para o facto de estarem a lidar com um terreno muito esponjoso. Nada ligaram porque supostamente eram eles que sabiam. Todavia, estando a obra prestes a ser dada por concluída, verificaram a verdade do que lhes dissera; e houve aumento de trabalhos e de aquisição de mais materiais e também mais perda de tempo. E tudo se paga!
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Entretanto, o Governo, pela voz do Ministro da Agricultura, Capoulas Santos (que entende que a União Europeia não deve mexer na PAC), anunciou, no passado dia 28 de março, no Parlamento, a criação da “Empresa Pública de Desenvolvimento e Gestão Florestal”, que entrará em funcionamento dentro de semanas em Figueiró dos Vinhos, um dos concelhos afetados pelos incêndios de 2017.
Diz o governante que empresa a constituir, que está em fase final de organização, “tem como objetivo fundamental demonstrar como é possível gerir de forma rentável a floresta, particularmente nas zonas de minifúndio”.
A intervenção de Capoulas Santos concluiu o debate que decorreu na Assembleia da República sobre o relatório da comissão técnica independente para a análise dos incêndios de 14 a 16 de outubro do ano passado, que provocaram 49 mortes.
Em declarações aos jornalistas, o Ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural explicou que o objetivo desta empresa de gestão florestal “visa demonstrar como pode ser profissionalmente gerida a floresta, como pode dar rendimento e como se pode prevenir os incêndios”.
Segundo o Ministro, esta empresa vai procurar identificar os prédios rústicos. Sublinhando que a empresa pública florestal vai entrar em funcionamento a “muito curto prazo”, sendo “uma questão de semanas”, disse que “eventualmente nas pessoas mais idosas esses prédios são objeto de arrendamento, o que garantirá um rendimento anual aos proprietários”.
Na sua intervenção no plenário da Assembleia da República, Capoulas Santos anunciou também que foi concluído “há poucos dias o pagamento integral dos apoios a 23.746 agricultores”, num montante superior a 62 milhões de euros, sendo estes fundos “exclusivamente nacionais”. O governante avançou também que “estão em pagamento, contra a apresentação dos respetivos comprovativos, outros cerca de 30 milhões”, 25 dos quais de fundos comunitários, no âmbito do “Programa de Desenvolvimento Rural 2020”, e 5,5 milhões para apoio à recuperação das vinhas ardidas, o que perfaz um apoio público superior a 92 milhões de euros.
Capoulas Santos também revelou que foram assinados, no final da semana anterior, os contratos, envolvendo autarquias e diversas organizações e empresas da fileira florestal, que permitiram a criação de 26 parques de receção e armazenamento de madeira queimada.
O relatório fora entregue à Assembleia da República no dia 20. E nele concluiu-se que falhou a capacidade de “previsão e programação” para “minimizar a extensão” do fogo na região Centro (onde ocorreram as mortes), perante as previsões meteorológicas de temperaturas elevadas e vento.
Os peritos consideram que tem de haver “flexibilidade para ter meios de previsão e combate em qualquer época do ano” e defendem a criação de uma unidade de missão para reorganizar os bombeiros.
Os incêndios destruíram total ou parcialmente cerca de 800 habitações permanentes, quase 500 empresas e extensas áreas de floresta nos distritos de Aveiro, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria e Viseu.
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A criação de EGF fazia parte do pacote de medidas aprovadas no final do ano passado no Parlamento. E o Governo deu o primeiro passo com esta empresa pública que deverá servir de estímulo, abrindo o caminho para a criação de outras empresas do género noutras zonas do país e de iniciativa privada. Importa que a iniciativa privada surja e seja apoiada.
Capoulas Santos salientou, como antes já o fizera Eduardo Cabrita, que “o Governo analisa o segundo relatório e está disponível a acolher as suas sugestões e reclamações, quer sobre prevenção, ações ou organização dos serviços públicos”.
Recorde-se que o Ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, que interveio no debate, afirmou que o combate aos incêndios florestais em 2018 vai ser reforçado com mais 240 viaturas ligeiras e pesadas.
Assim, o Ministro referiu que 140 viaturas vão para o Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro (GIPS) e para o Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da GNR, 80 para os corpos de bombeiros e 20 para a Força Especial de Bombeiros (FEB).
Foi o esforço de mobilização do Governo que “permitiu, por ajuste direto, a adjudicação de 140 viaturas ligeiras e pesadas para as estruturas de combate inicial e de combate ampliado, tal como também a aquisição de 100 viaturas, quer para corporação de bombeiros, relativamente a 80 viaturas, quer para a Força Especial de Bombeiros”.
O Ministro destacou ainda medidas criadas para a próxima época de incêndios florestais, como a profissionalização nos bombeiros voluntários, e referiu que as corporações de bombeiros voluntários vão ter mais oito dezenas de equipas profissionais, o equivalente a mais 400 elementos com estatuto profissional.
Eduardo Cabrita afirmou que a Autoridade Nacional de Proteção Civil está a ser dotada com os meios adequados de apoio técnico para “garantir a estabilidade de resposta no próximo verão”.
O Ministro da Administração Interna referiu também que o Governo aproveitou o relatório da comissão técnica independente para tirar conclusões para “fazer de tudo para que o futuro seja diferente” em matéria de planeamento, combate, prevenção e respostas aos desafios estruturais.
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Tudo bem. Quanto mais e melhor o Governo fizer, melhor para o país. E as vozes críticas, devidamente fundamentadas e sustentadas, devem continuar a fazer-se ouvir para incremento e melhoria das medidas e sua implementação. Devem, no entanto, abster-se ou conter-se na crítica badalada e meramente demolidora.
Quanto a mim, penso que não basta a gestão do que temos em floresta, mas é preciso pensar o reordenamento da mancha florestal, abolindo o regime da monocultura e organizando o sistema de escoamento do combustível decorrente das operações de limpeza, que não devem ser feitas uma vez por ano, porque o matagal renasce e recresce.
O dinheiro não chega a tudo e os particulares não têm meios. Talvez haja chegado o tempo de as empresas beneficiárias das matérias-primas decorrentes da exploração florestal renunciarem a alguma margem de lucro e criarem um fundo de limpeza. Recordo que antigamente havia um regime que foi abolido: nalguns municípios, cada família dava um dia de trabalho para a freguesia ou o equivalente em dinheiro. Se isso acontecesse hoje, os municípios poderiam ser solicitados a efetuar a limpeza dos terrenos confrontantes com as vias públicas e com os aglomerados populacionais.  
Quanto ao Estado, talvez devesse colocar os seus agentes a cuidar assiduamente destas tarefas de arejamento e limpeza da sua floresta e dos seus parques e promover a punição das mãos criminosas incendiárias. Todos sabem que as há, mas, quando detetadas, vêm repousar dos trabalhos…  
2018.03.31 – Louro de Carvalho

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