O Banco resultante da resolução do BES apresentou
perdas de 1395,4 milhões de euros em 2017. E este é o pior registo desde que o
banco de transição foi criado, em agosto de 2014. E é um banco bom, do ponto de
vista técnico, tendo ficado como mau banco e com os ativos tóxicos o banco mau,
que manteve a designação de BES (Banco
Espírito Santo). Vamos lá nós entender as categorias financeiras! Como o segundo
Governo de Sócrates queria que as leis fossem todas redigidas em linguagem
simples, clara e acessível ao cidadão comum, o que não conseguiu fazer, também
o sistema financeiro devia usar perante o seu público linguagem acessível e,
tanto quanto possível, sem margem para dúvidas graves. Todavia, parece que os
políticos, os juristas e os economistas têm prazer em jogar com a ignorância
dos cidadãos comuns, como se aqueles fossem os sumos-sacerdotes, assumidos de
entre os comuns mortais para a função sacrificial e a elaboração hierática das
normas. E nós temos prazer em reverenciar os senhores doutores que falam
linguagens caras e herméticas.
Confirma-se mais um trimestre de perdas para a organização financeira
liderada por António Ramalho, alegadamente pelo facto de as imparidades superarem
os dois mil milhões e a saída de trabalhadores e encerramento de balcões
custarem 134 milhões. Tudo isto leva o Fundo de Resolução a injetar no banco,
que já vendeu, a módica soma de cerca de 792 milhões e o banco a querer
rescindir contrato com 440 mil trabalhadores ou induzir reformas antecipadas
até final do ano e a suprimir 30 balcões.
E dizem os observadores que 13 trimestres de prejuízos não são obra do
azar, mas das imparidades. Por outro lado, o Fundo Pimco quer ser reconhecido
como lesado no caso de suspeita de insider
trading no Novo Banco. Aliás os lesados do BES/GES têm vindo a fazer valer
os seus direitos. Tão grande descalabro e os responsáveis estão todos bem!
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A informação sobre os prejuízos do Novo Banco e as medidas de perspetivação
estratégica foi submetida, segundo reza um comunicado atempadamente difundido,
à CMVM, onde o Novo Banco refere que “o resultado do exercício foi de
1.395,4 milhões de euros” – valor recorde que levou a instituição a acionar
o Mecanismo de Capital Contingente no valor de cerca de 792 milhões de euros e
se compara com os 788,3 milhões de euros de prejuízos registados em 2016.
São 13 trimestres – dos 14 que o Novo Banco tem de vida – de resultados
negativos para a instituição. Este desempenho é justificado
pelas elevadas imparidades que têm sido registadas no processo de limpeza de
balanço e que atingiram o valor de 2.057 milhões de euros.
Excluindo as imparidades, o Novo Banco registou, em 2017, um resultado
operacional positivo de 341,7 milhões de euros, mesmo assim inferior em
44,9 milhões de euros ao do exercício anterior. O Novo Banco refere que “o produto bancário foi de 890,9 milhões de euros (-8,9%
em termos homólogos), não
considerando a ativação do Mecanismo de Capital Contingente” e sublinha que “o resultado financeiro, em
função do deleverage realizado, apresentou uma redução de
23,3% enquanto a evolução das comissões se saldou pelo crescimento de 17,2%”.
Isto, quando os resultados de operações financeiras (aumentaram
45,2%) refletiram “os ganhos apurados com
os resultados da operação LME (209,7 milhões)”. No aludido
comunicado, o Banco frisa:
“Em linha com estas condicionantes e com o processo de delevarage em curso, o resultado
financeiro apresentou uma redução de 23,3% em termos homólogos, situando-se em
394,6 milhões de euros. De referir que o efeito positivo da redução do
custo dos passivos em 34 pontos base (de 1,39% em dezembro de 2016 para 1,05%
em dezembro de 2017) não foi suficiente para compensar a redução verificada na
taxa ativa (-55 pontos base), pelo que a margem financeira apresenta um
decréscimo de 21 pontos base, face a dezembro de 2016, evoluindo de 1,10% para
0,89%.”.
Por outro lado, a instituição resume:
“De destacar o contributo
dos depósitos para a redução da taxa dos passivos, cuja taxa média de
remuneração evoluiu de 0,91% em dezembro de 2016 para 0,86% no final de 2017.
Do lado dos ativos, para além da redução dos proveitos com origem no crédito a
clientes, assistiu-se também à descida da remuneração dos restantes ativos
financeiros.”.
***
Em termos de crédito e depósitos, o Novo Banco viu, em 2017, o crédito a clientes registar uma queda de 2,3 mil milhões
de euros. Nesta queda, sobressai o crédito atribuído a empresas, que caiu
10,5%. Não obstante, o Banco salienta a “estabilidade do crédito a
particulares”, que cresceu 0,3% para 11.330 milhões de euros. Em particular,
esta evolução é justificada com um “aumento de 25 milhões de euros no crédito à
habitação”.
Ao mesmo tempo, o Novo Banco registava a 31 de dezembro de
2017 depósitos na ordem dos 29,7 mil milhões de euros. Trata-se de um aumento
de 16,1% face a 2016.
“Esta evolução evidencia, por um lado, a
consolidação da relação com os clientes no âmbito da retoma da normalidade
operacional e da recuperação do funding; e, por
outro, os efeitos da operação de LME concretizada no último trimestre do ano
(novos depósitos no montante de 1,8 mil milhões de euros)”.
Ou seja, isto sucede porque a maior parte dos credores optou
por converter as obrigações por depósitos no âmbito da operação de troca de
dívida que ocorreu em meados de 2017.
***
No âmbito do corte nas despesas e na redução de trabalhadores, é de ter em
conta que a empresa reduziu os custos operativos em 7,1% no ano passado, para
549,2 milhões de euros, “reflexo das medidas de reestruturação
associadas a um redimensionamento da rede de distribuição e à
simplificação/redução da estrutura organizacional e dos processos, com a
consequente redução do número de colaboradores”. E, em especial no
concernente à redução de trabalhadores, o Novo Banco fechou 2017
com menos 608 funcionários do que em 2016, ficando, apesar de tudo, com
uma força de trabalho de 5.488 pessoas.
Mas o Banco não cortou só em despesas com pessoal (queda de 9,1%
face a 2016, para 275,7 milhões) mas também
nas despesas gerais administrativas (diminuíram 6,9% para 215,4 milhões). Segundo o Novo Banco, “a evolução apresentada pelos
custos operativos está também relacionada com o redimensionamento da rede de
distribuição face à nova realidade do negócio”, pois a empresa viu-se obrigada
a reduzir o número de balcões. Em concreto, o Novo Banco encerrou 64
balcões em 2017, mantendo, ao fim do ano, 473 balcões no país.
***
Foram, como se disse, imparidades no valor de
2.057 milhões de euros que levaram o Banco a registar prejuízos históricos em
2017. Por causa da dimensão das perdas, o
Mecanismo de Capital Contingente foi ativado no final do ano passado,
conduzindo ao registo de uma compensação de 791,7 milhões de euros. Este foi o
montante que o Fundo de Resolução, que conta com a ajuda dum
empréstimo do Estado, teve de injetar na instituição para manter a
robustez financeira do banco. O rácio de capital está em 12,8%.
Com a venda do Novo Banco ao Lone Star, foi criado o mecanismo de
capitalização contingente, uma espécie de proteção sobre um conjunto de ativos
e cuja gestão ficou a cargo do Fundo de Resolução – que tem receitas próprias
através do financiamento dos bancos do sistema. Neste contexto, ficou decidido
que o Novo Banco pode ser compensado pelo Fundo de Resolução até ao limite de
3,9 mil milhões de euros, por perdas que venham a ser reconhecidas com alguns
dos ativos problemáticos e que ponham em risco a força financeira da instituição,
que a isto diz:
“O mecanismo acima referido foi
ativado conduzindo ao registo de uma compensação de 791,7 milhões, para
que o banco se mantenha uma instituição financeiramente sólida e bem
capitalizada, com rácios de capital e níveis de rentabilidade potenciadores da
sua atividade”.
Mais adianta que “o capital que está a ser gerido corresponde a um
perímetro de ativos previamente definido, com um valor líquido contabilístico
inicial (junho de
2016) de cerca de 7,9 mil milhões”. Mas,
em 31 de dezembro de 2017, estes ativos apresentavam “um valor líquido de 5,4
mil milhões de euros”. E, explicando os prejuízos históricos
no ano passado, refere que eles decorreram, “fundamentalmente, do reconhecimento de montantes elevados de imparidades, de
acordo com as exigências das autoridades europeias, por forma a que as
instituições bancárias tenham condições recuperar a rentabilidade de uma forma
mais rápida e consistente”.
Das imparidades de cerca de dois mil milhões, 1,2 mil milhões de euros
foram imparidades constituídas para crédito, 398 milhões para operações em
descontinuação e 134,3 milhões de provisões para a reestruturação.
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António Ramalho, que apresentou as contas em
conferência de imprensa e referiu os dados acima enunciados, disse que o Banco lançou um programa
de rescisões com vista a saída de 440 trabalhadores, que terão de comunicar a
sua intenção de adesão ao plano de saídas até ao dia 13 de abril, pagando o
Novo Banco um máximo de 35 vencimentos mensais aos funcionários.
Ramalho confirma que é “um processo de escada”, para criar
“condições de rejuvenescimento da instituição financeira”. De acordo com as condições que
foram anunciadas, a compensação é calculada de forma progressiva de acordo com
o número de anos de casa do trabalhador. Até 10 anos, o Novo Banco compensa os
funcionários com o pagamento de 75% do salário mensal por ano. A compensação
financeira sobe até aos três salários por cada ano acima dos 20 anos de
antiguidade. Isto pode custar 134 milhões!
Questionado
sobre o porquê de o Novo Banco só ter agora reconhecido imparidades adicionais,
Ramalho relembrou que a instituição foi um banco de transição até
18 de outubro de 2017. Com efeito, o banco como hoje é conhecido, ainda
que em processo de reestruturação, existe há pouco mais de seis meses.”
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O Novo Note Group acusou o Banco de Portugal (BdP) de responsável pelas perdas no Novo Banco. E
explicitou, segundo a Lusa:
“As perdas sem precedentes no novo Banco e a
necessidade dos contribuintes portugueses injetarem mais 800 milhões de euros
são exemplos de quão mal o Banco de Portugal tem gerido a resolução do Banco
Espirito Santo e a venda do Novo Banco”.
Para o grupo (composto por fundos de investimento como o Attestor
Capital, BlackRock, CQS e Pimico) o BdP
falhou no envolvimento com os 'stakeholders' [público estratégico], tomando decisões que impuseram custos indevidos aos
contribuintes e desestabilizaram o sistema. E concluiu:
“O Novo Note Group encoraja as autoridades
portuguesas a voltarem a interagir com o nosso grupo para encontrar uma
solução, mutuamente benéfica, que reforça a estabilidade financeira e mitigue
os custos contínuos para os contribuintes”.
Desde outubro, o Novo Banco (criado em agosto de 2014 para ficar
com os ativos considerados menos problemáticos do ex-BES) pertence em 75% ao fundo norte-americano Lone Star,
mantendo o Fundo de Resolução bancário os restantes 25%. Ou seja, acabou por
ser doado, faltando o Estado ou ao Fundo de Resolução por ele de ir
capitalizando o banco consoante as suas necessidades.
Assim, é natural que os partidos à esquerda do Governo venham criticar a atuação do Executivo de António Costa, afirmando ser uma intervenção desastrosa e até obscena.
Pela
voz da deputada Mariana Mortágua, que falava aos jornalistas na Assembleia da
República, o Bloco de Esquerda disse que o Governo “poderia contar com o Bloco
de Esquerda para uma solução como a nacionalização”, mas que “preferiu uma
solução que prevíamos ser um desastre”. E, segundo a mesma, assim foi.
Já o
Partido Comunista, pela voz de Miguel Tiago, criticou a intervenção do Estado
neste que é um banco privado, afirmando que foi um “processo de obscenidade”
para “limpar um banco em vez de ficar com ele”.
Ao
reiterar também a nacionalização da fatia “boa” do Banco Espírito Santo, Tiago
afirma que “não dizemos que esta injeção podia ser evitada, mas podíamos estar
a injetar num banco público”.
***
Enfim, quando acabará o desperdício dos dinheiros
públicos, dos contribuintes, por via direta ou indireta, na regeneração
teimosamente impossível? Para quê atirar-nos com poeira distinguindo um banco
de transição de um banco em reestruturação? O banco era de transição na designação
e no plano de saneamento. Não era de transição no sentido da mera gestão. Tanto
assim que encerrou balcões, dispensou trabalhadores, mas não conseguiu
sanear-se, vender-se ou desfazer-se ou doar-se totalmente. Mudou-se de
gestores, de proprietário maioritário nominal…
De todo, não precisamos de gestores como os do Novo
Banco!
2018.03.28 – Louro de Carvalho
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