segunda-feira, 5 de março de 2018

“O Evangelho face a face” e o rosto materno da Igreja


O Evangelho face a face” é o título do livro da jornalista Paola Bergamini que conta a vida do Padre Stefano Pernet (em francês, Étienne PERNET), fundador da Congregação das Pequenas Irmãs da Assunção e declarado “venerável” pelo Papa São João Paulo II, em 1983.
E a expressão “rosto materno da Igreja” é referida por Francisco, entres outros contextos, para caraterizar a postura e a ação da Congregação das Pequenas Irmãs da Assunção no prefácio que redigiu para o livro “ágil, mas cheio de histórias de vida”, que dá a conhecer o Padre Pernet.
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Claude-Étienne Pernet é de origem franco-contesa. Nasceu em Vellexon, na Haute-Saône, a 23 de julho de 1824, numa família modesta. O pai, Claude-Louis Pernet, era ora ferrador de cavalos ora, trabalhador agrícola, ora mineiro; a mãe era parteira. A educação escolar de Claude-Étienne foi assegurada pelo pároco da aldeia. O pai morreu, tinha ele 14 anos, pelo que o adolescente se tornou então o chefe de família, O desejo de ser sacerdote levou-o a deixar a aldeia para estudar na escola de Membrey. A seguir, entra no seminário de Luxeuil, em 1840, e no de Vesoul, em 1842, para a filosofia, e no de Besançon, em 1843, para a teologia. Porém, com 19 anos de idade, acossado pelo medo face ao desafio do sacerdócio, deixa o seminário.
Torna-se então preceptor num orfanato e, depois, professor junto de famílias abastadas. Em 1849, parte para Paris à procura de um emprego mais estável. Ali, reza todos os dias em Nossa Senhora das Vitórias e uma religiosa aconselha-o a encontrar-se com o Padre Emmanuel d’Alzon, que tem vaga para professores. Então, Étienne Permet ensina no colégio de Nîmes e, depois, torna-se um dos Agostinhos Assuncionistas. Emite os votos religiosos a 25 de dezembro de 1850 e os votos perpétuos no dia homólogo do ano seguinte.
Continua a ensinar e a desempenhar o múnus de prefeito em diversos colégios e prepara-se para o sacerdócio. Foi ordenado de presbítero a 3 de abril de 1858, continuando com as funções de prefeito e de professor. Porém, enviado para Paris para ajudar o Padre Ricardo, sente-se mais à vontade no ministério sacerdotal que no colégio. E, encontrando Marie Maire e Antoinette Fage em maio de 1864, formula o projeto de criar uma congregação religiosa de enfermeiras ao serviço dos pobres, ao domicílio. Instala-se sucessivamente em diferentes alojamentos provisórios antes de se estabelecer em abril de 1870, no 15.º bairro, no n.º 57 da rua Violet, que se torna a casa-mãe da nova congregação. Entretanto, as primeiras religiosas emitiram os votos em 1866. O objetivo era cuidar gratuitamente dos doentes em sua casa.
Porém, o Padre Pernet foi chamado para o concílio Vaticano I como perito em teologia. E, depois, durante a guerra de 1870, empenha-se como capelão militar. Tomado em Metz por espião, foi preso pelos Alemães. Uma vez libertado, partiu para Mayence com os outros militares franceses e, depois, voltou para Paris, aonde chegou em março de 1871 no começo dos acontecimentos da Comuna de Paris. Preso pelos partidários da Comuna, escapou à execução graças a um amigo que o mandou libertar e partiu para Arras para se ocupar dum orfanato.
De volta a Paris depois daqueles acontecimentos, o Padre Pernet dedica-se plenamente à sua fundação. Multiplica a criação de outros estabelecimentos, primeiro em Paris e arredores e depois, em 1878, na província de Perpignan. E, em junho de 1880, instala um estabelecimento em Inglaterra, a leste de Londres – o seu primeiro estabelecimento no estrangeiro.  
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O jornal italiano “La Stampa” antecipou a publicação do prefácio do Papa Francisco ao livro “O Evangelho face a face”, que estará nas livrarias a partir do próximo dia 6 de março e será apresentado no próximo dia 8, na feira “Tempo de livros”, em Milão. Mostra a face do Padre Pernet na dedicação da sua vida ao apoio às famílias mais pobres nos bairros mais degradados de Paris, na França pós-revolucionária em meados do século XIX. O padre sofria com a desintegração das famílias proletárias de meados do século XIX e fazia tudo para as ajudar. A operária Antoinnete Fage foi a resposta ao seu sonho de fundar uma congregação que a isso se dedicasse inteiramente.
Como escreve o Papa, antes de perfazer um dia após o nascimento de Bergoglio, Antónia, uma noviça da congregação fundada pelo Padre Pernet, chegou à casa dos pais no bairro Flores, em Buenos Aires, e pegou-lhe ao colo. Desde então manteve o contacto com a religiosa durante toda a vida até à sua morte, há alguns anos atrás.
Considera aquelas religiosas como “anjos silenciosos nas casas de quem precisa”, a trabalhar com paciência, a ajudar e, depois, a voltar silenciosamente para o convento. Seguem a regra, “rezam e saem para as casas de quem se encontra em dificuldade, fazendo de enfermeiras e governantes, acompanhando as crianças à escola e preparando o que comer para elas”.
Vários colegas de trabalho do pai de Bergoglio, anticlericais, voltaram para a Argentina após a Guerra Civil Espanhola. Um dia, um deles ficou muito doente. Tinha três filhos e a mulher, que tinha de trabalhar, ficava fora de casa muitas horas por dia. Sabendo do caso, “as Pequenas Irmãs da Assunção mandaram uma delas à casa dele”. E, como se tratava de caso difícil, “a superiora foi lá”. O doente era um anticlerical convicto e não olhava com bons olhos nenhuma túnica. E disse-lhe os piores palavrões, mas ela fazia o seu trabalho com tranquilidade, “cuidava das feridas, levava as crianças para a escola, preparava o almoço e limpava a casa”. Passado mais de um mês, o homem “voltou à vida normal.
Ora, “alguns dias depois, saindo do trabalho junto com outros colegas anticlericais como ele, passavam na rua duas religiosas. E um disse palavrões contra elas. Então, o que estivera doente deu-lhe um soco e advertiu-o que dissesse o que quisesse “sobre os sacerdotes e sobre Deus”, mas nada “contra Nossa Senhora e contra as religiosas”. E é aqui que Francisco introduz a dimensão materna da Igreja:
Ele era ateu, um anticlerical, e mesmo assim defendeu as religiosas. Por que o fez? Simplesmente porque tinha conhecido o rosto materno da Igreja, tinha visto o sorriso de Nossa Senhora no rosto daquela superiora, aquela religiosa paciente que ia curá-lo não obstante as suas maldições. Aquela mulher consagrada que curava as suas chagas, fazia de empregada em sua casa, levava as crianças à escola e depois ia buscá-las.”.
É óbvio que recorrentemente se chama à Igreja “mãe” porque gera para a Vida da Graça inúmeros filhos, mas o Papa argentino aborda a ideia num caso concreto e, em certa medida, desconcertante, pelo menos na parte em que eclipsa Deus, para sobrelevar a Virgem, e os sacerdotes, para fazer sobressair o papel das religiosas que espelham nos gestos a maternidade da Igreja e o rosto materno de Deus.
Do livro Francisco diz que “é uma história composta de rostos, dedicação, gestos de caridade e gratuitidade pura”, que “não perdeu o seu frescor e a sua atualidade”. Frisando que vivemos um tempo de evangelização pelo “testemunho da proximidade e da caridade”, pelo “testemunho do rosto misericordioso de Deus”, acentua que “evangelizar nos leva também a apoiar a nossa face na face de quem sofre, no corpo e no espírito”.
Depois, cita as palavras do fundador da Congregação, que primam pelo “trabalho escondido e silencioso”, palavras que ele proferiu a 7 de março de 1867, no mosteiro de Auteuil:
“Os pobres, quando ficam doentes, são abandonados completamente, ninguém os ajuda. Para este fim, nos oferecemos ao Senhor para que os pobres tenham uma religiosa na cabeceira que preste assistência material. Mas isso não basta para as pequenas irmãs. Vejam, nos tempos em que vivemos, o homem do povo, os trabalhadores, os homens e as mulheres, muitas vezes são arruinados pela má companhia, pelas más leituras e depois afastam-se de Deus. Nesta situação, o sacerdote, mesmo quando quer levar alívio espiritual a quem está doente, é visto como um espantalho, um mensageiro da morte. Por outro lado, o que pode fazer a não ser confortar com as palavras? Mas eles não querem ouvir. Ao invés, as pequenas religiosas não têm medo. Com sua maneira educada de agir são olhadas com gratidão, confiam nelas. Através dos simples gestos de limpeza e medicação as religiosas pregam Jesus Cristo melhor do que qualquer sermão. A sua presença é suficiente. Com paciência, levam a oração e os costumes cristãos de volta a essas famílias.”.
Por isso, o Papa olha agora para Maria, nossa Mãe, que nos ensina: “a única força capaz de conquistar o coração dos homens é a ternura de Deus”. Com efeito “o que encanta e atrai, que abre e desfaz as correntes, não é a força dos instrumentos ou a dureza da lei, mas a fragilidade omnipotente do amor divino: a força irresistível de sua doçura e a promessa irreversível de sua misericórdia” – o que o Pernet testemunhou ao longo da vida e como as Irmãs fazem.
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A Congregação das Pequenas Irmãs da Assunção, fundada em Paris, a 17 de julho de 1865 pelo Padre Etienne PERNET (Assuncionista), e Antoinette FAGE (Madre Marie de Jésus), celebrou 150 anos em 2015 em contexto do Ano Jubilar.
Bem conhecida do Papa Francisco, que logo após o seu nascimento recebeu os primeiros cuidados duma Pequena Irmã, a Congregação está presente hoje em 20 países. As 688 religiosas realizam a sua missão, pela presença simples e próxima das famílias, dos pobres, nas periferias geográficas e existenciais, onde constroem relações de reciprocidade com os “sem voz, sem influência”, migrantes, marginalizados e excluídos, procurando possibilitar que cresçam em humanidade e descubram sua dignidade de filhos de Deus. A elas estão ligados muitos leigos na missão e na partilha da mesma espiritualidade agostiniana.
O seu caminho pessoal e comunitário é inspirado em “procurar a glória de Deus para a saúde dos pobres e dos pequenos”. Em cada país, o trabalho apostólico assume formas diversas, como trabalho com as famílias, atividades na área social e da saúde, ações em favor da promoção da mulher, formação humana e espiritual, aprofundamento da fé, acompanhamento das pessoas em todas as idades da vida.
Das 688 religiosas da Congregação, 267 vivem na França, onde estão presentes em 26 cidades. Possuem casas de missão em 20 países dos 5 continentes, estando ligadas a 23 redes de leigos em Fraternidade. Delas, 39 são leigas consagradas. O seu dinamismo missionário espalhou-se por todos os continentes, em resposta aos apelos da Igreja, tornando vivo o carisma específico de viver e anunciar o Evangelho do amor e ternura de Deus aos mais carenciados da sociedade. Assim chegaram a Portugal, em 1949, e à diocese de Leiria-Fátima, em 1957.
Durante vários anos, as irmãs da comunidade de Fátima exerceram a sua ação na catequese paroquial, nos serviços do Santuário e em visitas e assistência a doentes ao domicílio e em instituições de idosos e deficientes. Hoje, limitadas pela idade e pela saúde, assumem-se como “comunidade orante com um coração universal”, revela a superiora, irmã Anna Mertens, (nascida na Bélgica há 77 anos e religiosa há 52), que diz:
 A nossa casa, além de residência de irmãs de mais idade, é também o local onde nos reunimos para assembleias, retiros, tempos de descanso para as irmãs em atividades laborais missionárias e encontros com jovens”.
2018.03.05 – Louro de Carvalho

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