Segundo o ECO
e a agência Lusa, Joana Marques Vidal,
a anterior Procuradora-Geral da República, diz que o combate à corrupção “não é uma prioridade” para os políticos na hora de desenhar um orçamento do Estado, criticando a falta de
apetrechamento das instituições que fazem investigação contra a corrupção.
Com efeito, num encontro
organizado na Universidade de Évora, a 10 de dezembro, Dia Internacional Contra a Corrupção, a ex-Procuradora-Geral da República criticou a falta de
“capacitação das instituições que fazem investigação criminal”, sobretudo no
atinente ao “apetrechamento para a luta contra a corrupção e a criminalidade
conexa”.
Dizer que o combate contra a corrupção não é uma
prioridade para os decisores políticos parece contradizer o mandato de seis
anos em que Joana Marques Vidal registou na sua folha de serviço, ainda que de
forma excessiva, um extenso
rol de processos mediáticos contra altas figuras políticas, sendo o caso mais
flagrante o do ex-Primeiro-Ministro José Sócrates, sendo que muitos já vinham de
anteriores mandatos. Mesmo assim, a magistrada atirou:
“Francamente e com toda a clareza, eu
considero que, apesar das medidas que têm feito, isso não
está no centro da preocupação dos decisores políticos quando pensam e quando
concebem um Orçamento Geral do Estado”.
É caso para nos questionarmos como, sem esse
pensamento e essa preocupação orçamental por parte dos decisores políticos (governantes e deputados, quiçá também o Presidente da República), Marques Vida conseguiu
que o MP (Ministério Público) e a PJ (Polícia
Judiciária), no
consulado da insigne magistrada, registassem tão grande marca anticorrupção. Terá
sido fruto do milagre ou do génio? Será flop dos que a queriam reconduzir em
andor a um segundo longo mandato?
As instituições que fazem investigação contra a
corrupção têm falta de apetrechamento. Admite-se como verdadeira a crítica. Mas
qual é o departamento estatal, e até empresarial, que não sente a falta de
meios? Provavelmente só um consultório de dentista!
***
Ao mesmo tempo, a nova Procuradora-Geral da
República Lucília Gago destaca o aumento de inquéritos instaurados por
corrupção. Com efeito, Lucília
Gago, revelou no passado dia 10, que houve um “aumento percentual de cerca
de 57,7%” no número de inquéritos instaurados por crime de corrupção, entre 1
de novembro de 2017 e 31 de outubro deste ano” de 2018, face ao período entre
2016/2017. E disse-o na sessão de encerramento do aludido encontro na
Universidade de Évora em que Marques Vidal tinha intervindo.
Na sua intervenção, Lucília Gago revelou alguns dos dados que constam do
Relatório Síntese “Crimes de Corrupção e
Criminalidade Complexa”, de 1 de novembro de 2017 a 31 de outubro deste ano ,
tornado público precisamente no referido dia 10. Entre esses crimes, o relatório
revela que houve um aumento do crime económico em Portugal nesse período.
***
Segundo o predito relatório, aumenta a corrupção
e o crime económico, tendo o MP aberto um total de 3.423 inquéritos no período
em referência e tendo sido deduzidas 24 acusações
por corrupção. Foi nas comarcas de Braga, Porto e Aveiro que se registou um
maior volume de entradas relacionadas com o crime de corrupção.
Os crimes de corrupção (1.358) correspondem a 38,7% do total, no que é o aumento de
57,7% face aos inquéritos
instaurados no período de 2016/2017, como referiu Lucília Gago e se pode ler
no Público (acesso
condicionado) e no Correio da Manhã. Os crimes analisados incluem abuso de poder, peculato,
branqueamento, tráfico de influência e gestão danosa. Na maioria destes a
tendência também é de crescimento, exceto no crime de tráfico de influência, de
acordo com a Procuradoria-Geral da República. Os crimes de peculato cresceram
61,5% para 685, relativamente ao ano anterior.
As operações de prevenção de branqueamento de capital na banca também foram
mais avolumadas. De 1 de janeiro a 31 de outubro deste ano foram suspensas operações bancárias no valor de 126 milhões de euros,
contrastando com os 9 milhões de 2017.
***
Nos últimos dias, além das buscas no Ministério
da Defesa Nacional, na Inspeção-Geral de Finanças e na Cruz Vermelha Portuguesa
– a que noutra peça escrita fiz referência – sobressai a investigação da PJ
junto de 8 funcionários do IAPMEI por corrupção com fundos europeus, referida
pelo Expresso, do dia 8, e pelo ECO, do dia 9.
Esta investigação surgiu depois de
o gestor de uma consultora ter denunciado que funcionários do IAPMEI exigiram
dinheiro para aprovar candidaturas a fundos comunitários. Por isso, o DCIAP (Departamento
Central de Investigação e Ação Penal) e a PJ desencadearam uma ação investigativa a oito funcionários do IAPMEI –
Agência para a Competitividade e Inovação, por suspeitas de que estes
funcionários terão exigido dinheiro em troca da atribuição de fundos
comunitários a empresas.
A notícia foi avançada publicamente, este domingo, pelo Correio da Manhã na sequência da
informação adiantada antes pelo Expresso
(acesso pago), que deu conta de que as denúncias foram feitas pelo
gestor da consultora. De facto, as investigações
começaram, precisamente, após a denúncia apresentada por António Cabrita,
gestor da Gorin, uma consultora que presa apoio a empresas nas candidaturas dos
seus projetos de investimento aos incentivos europeus de vários quadros
comunitários, como o QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional) e o Portugal 2020.
António Cabrita refere, na denúncia, que, em 2016, um funcionário do IAPMEI lhe pedira 40 mil euros para resolver um
problema. Depois de ter recusado, soube que o IAPMEI recomendou a vários
clientes que não trabalhassem com a Gorin.
Perante estas acusações, para além da investigação do DCIAP e a da PJ, também o Governo já exigiu esclarecimentos. Segundo o Correio da Manhã, o Secretário de Estado da Economia,
João Correia Neves, determinou que o IAPMEI instaurasse um inquérito interno
para averiguar se existem, ou não, indícios de corrupção, tendo sido referido
ao dito jornal:
“Apesar de, até ao momento, o IAPMEI não ter
sido chamado a colaborar com as autoridades judiciais, existe total
disponibilidade para o efeito. Os procedimentos internos de segregação de
funções e de auditoria interna e externa constituem garante da transparência de
procedimentos, mas o relato incluído na notícia deve conduzir a agir de forma
implacável contra quaisquer comportamentos que possam ser identificados
contrários à Lei.”.
***
Igualmente a sobressair se apresenta o caso de 5 empresários detidos na “Operação Dennis” da PJ que desarticulou
uma “associação criminosa” por crimes de fraude fiscal, branqueamento, recebimento indevido de vantagem e participação económica em
negócio, entre outros, no Norte do país. A este respeito, revela a
PJ/Norte em comunicado:
“No
decurso de 35 buscas, realizadas nos
concelhos de Vila Nova de Famalicão, Santo Tirso, Guimarães, Maia, Braga e Vila
do Conde, foram detidos cinco indivíduos, todos empresários, quatro do sexo
masculino e um do sexo feminino, e com idades compreendidas entre os 38 e os 73
anos, fortemente indiciados pelos referidos crimes”.
Também
uma nota divulgada pela PGR (Procuradoria-Geral da República) adiantava, no dia 12, que, durante
a operação (a acima
designada), dirigida
pelo DCIAP, coadjuvada pela PJ e em articulação com a AT (Autoridade Tributária) – Direção de Finanças do Porto,
foram realizadas 35 buscas nos concelhos de Vila Nova de Famalicão, Santo
Tirso, Guimarães, Maia, Braga e Vila do Conde, estando em causa crimes
de associação criminosa, fraude na obtenção de subsídio, fraude fiscal
qualificada, branqueamento, recebimento indevido de vantagem e participação
económica em negócio.
Segundo
os investigadores, a associação criminosa criou e
geriu um conjunto de sociedades comerciais, com o recurso a “testas de ferro”, visando
ocultar os verdadeiros administradores e despistar eventuais fiscalizações por
parte das competentes entidades. Tal conduta teve como finalidade a emissão de
faturação fictícia entre essas sociedades comerciais, no intuito de aumentar de
forma substancial o valor do IVA a receber do Estado.
De
acordo com a investigação, o esquema montado permitia “evidenciar um volume de
negócios que não correspondia ao real, mas principalmente permitiu que outras
sociedades, dominadas pela associação criminosa, apresentassem candidaturas a
fundos comunitários, no âmbito do programa de apoio comunitário ‘Portugal 2020’,
candidaturas essas num valor total de cerca de 35 milhões de euros e valor
aprovado superior a 20 milhões de euros, tendo a associação criminosa recebido
já das entidades competentes subsídios no valor de cerca de 2,7 milhões de
euros. Em relação ao IVA e IRC, com o circuito fechado de faturação fictícia,
este grupo de sociedades terá obtido um crédito fiscal de cerca de 1,9 milhões
de euros.
Os
empresários detidos – cinco homens e uma mulher – têm entre os 38 e os 73 anos
e foram conduzidos ao TCIC (Tribunal Central de Instrução Criminal), em Lisboa, para primeiro interrogatório judicial e
aplicação das medidas de coação.
Durante a operação policial, foram apreendidas vários automóveis,
equipamentos informáticos e telemóveis, além de variada documentação de
natureza contabilística e fiscal.
A “Operação Dennis” envolveu cerca de 100
elementos, incluindo magistrados judiciais e do MP, investigadores da Diretoria
do Norte e do Departamento de Investigação Criminal de Braga da PJ e Inspetores
Tributários da Direção de Finanças do Porto da AT.
A PJ
esteve na Câmara Municipal de Santo Tirso a fazer buscas numa operação que fez
já 5 detidos e tornou arguidos o vice-presidente da autarquia e uma chefe de
divisão, com disse à agência Lusa
fonte da polícia, pois, na origem das buscas naquela autarquia do distrito do
Porto “está a aquisição de uma viatura
elétrica pela câmara, em que foi interveniente”, segundo a aludida fonte, “o vice-presidente Alberto Costa e ainda a
chefe de divisão Maria Cacilda de Sousa, tendo ambos sido constituídos arguidos”.
Em
comunicado, a Câmara Municipal de Santo Tirso confirmou ter sido alvo de
“diligências inspetivas por parte da Polícia Judiciária”, num processo
relacionado com a aquisição de uma viatura elétrica para os serviços urbanos do
município.
***
Enfim,
não se percebe como é que PGR, MP, PJ e AT conseguem tantos inquéritos, embora
com dedução de poucas acusações, sem que os decisores políticos tenham a preocupação,
mesmo em sede orçamental, do combate à corrupção e ao crime organizado, mesmo o
crime económico. Não acreditando que haja milagre nesta matéria nem que os agentes
investigativos ajam prevaricando em termos de desorçamentação, só vejo duas hipóteses
de falha: a falta de uma estratégia política de prevenção do crime ou o laxismo
judicial. Não esqueço que os tribunais também são decisores políticos!
2018.12.13 – Louro de
Carvalho
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