quarta-feira, 4 de abril de 2018

A história de Noé é diferente, mas não prejudica o essencial


No passado dia 27 de março, o site do DN inseria uma local com a seguinte epígrafe: “A história de Noé é diferente, revelam os Manuscritos do Mar Morto”. A seguir, vinha a informação subliminar: “Uma parte do Génesis Apócrifo está em exibição no Museu de Israel”.

É, pois, verdade que os Manuscritos ou Rolos do Mar Morto, considerados a versão mais antiga do texto bíblico hebraico e guardados no Museu de Israel, estão em exibição pela primeira vez ao público, sendo possível, durante três meses, ver muito ao perto um fragmento do Génesis apócrifo. A este respeito, Adolfo Roitman, comissário da exposição, disse ao jornal El Mundo:
É uma parte de uma cópia do Génesis Apócrifo, o único testemunho físico deste documento no mundo inteiro”.
O trecho do manuscrito pode ser visto através duma pioneira inovação tecnológica israelita que consiste num vidro inteligente desenhado para proteger o documento e evitar a degradação, bem como para medir os níveis de humidade e a temperatura dentro da caixa.
Assim, de 30 em 30 segundos, as luzes que iluminam o documento acendem-se, permitindo ao visitante observar o pedaço de manuscrito, mas evitando que este sofra danos. Desta forma, e só desta forma, é possível que o público tenha acesso a este “tesouro” único – o que permite ao comissário afirmar que os Rolos do Mar Morto são “uma janela para o mundo antigo”.
Segundo o comissário, “o objetivo é expor o manuscrito original, mas tendo sempre em mente que o nosso dever é preservá-lo para as gerações futuras”.
O conteúdo da parte do manuscrito exposto diz respeito à coluna 10 do Apócrifo, que versa sobre o que aconteceu a Noé depois do dilúvio. E Roitman revela:
Na versão bíblica do Pentateuco, o Deus de Israel, Javé, ordena a Noé que deixe a arca com a sua família. Uma vez no exterior, o patriarca faz um sacrifício de gratidão, mas no fragmento do apócrifo de Génesis o que nos é dito é que o sacrifício não foi feito fora da arca, mas sim no seu interior.”.
É uma diferença não essencial, como tantas, que não põe em causa o conteúdo.
Os oito rolos de Manuscritos do Mar Morto foram alegadamente descobertos, em 1947, por pastores de cabras, nas cavernas de Qumran, no Mar Morto e datam dum período situado entre o terceiro século antes de Cristo e o primeiro século A.D. (Anno Domini ou depois de Cristo). A maior parte está escrita em hebraico, mas 15% estão em aramaico e a alguns em grego. Cerca de 230 contêm textos que fazem parte da Bíblia.
Muitos anos depois de descobertos e milhares de anos depois de escritos, os Manuscritos estão disponíveis online, por colaboração entre a Google e a Autoridade de Antiguidades de Israel. No total, são mais de 5000 os documentos e imagens disponíveis em alta resolução desde dezembro de 2012, à distância de um clique. Têm permanecido guardados no Museu de Israel, não tendo sido expostos ao público devido aos cuidados que o seu estado de conservação requer.
Na transposição dos documentos para a visualização online recorreu-se técnicas de especialistas da agência espacial norte-americana NASA. As imagens dos manuscritos têm uma definição 200 vezes superior à duma câmara fotográfica digital comum, tendo cada uma cerca de 1200 megapíxeis, o que permite uma melhor análise dos documentos e do seu próprio estado de conservação. Para Yossi Matias, responsável da Google em Israel,  a parceria com a Autoridade de Antiguidades é mais um passo em frente a permitir aos utilizadores de todo o mundo desfrutarem deste tipo de material cultural, pois desde que  foi encontrado, apenas um reduzido número de investigadores podia consultá-lo (apenas 5 conservadores em todo o mundo tinham acesso aos Manuscritos), o que vinha gerando  controvérsia ao longo dos anos. Ora, foi para fazer frente às críticas e tornar os manuscritos acessíveis a um maior número de pessoas que as autoridades israelitas avançaram com este projeto online e agora possível de exibir.
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Peter Colón, em seu artigo “O Verdadeiro Tesouro dos Manuscritos do Mar Morto”, conta a história da descoberta do achado – relato que se condensa a seguir e se completa com outra informação relevante.
Muhammad andava agitado e inquieto por a cabra travessa ter desaparecido. Ao vaguear longe do rebanho e dos amigos, o beduíno topou uma caverna que ficava em posição elevada e dava frente para a costa noroeste do mar. Pensando que o animal se perdera na caverna, começou a lançar pedras pela entrada da gruta para o fazer sair. Porém, sentindo que o ruído das pedras batia em peças cerâmicas, ficou intrigado e correu até a entrada da caverna. Porém, no seu interior, apenas encontrou jarros grandes e antigos ao longo das paredes, os quais continham rolos de pergaminhos despedaçados. Aí pensou: “pelo menos os pergaminhos de couro vão servir para fazer correias e tiras de sandálias”. O beduíno não percebeu a real importância do momento. A teimosia da cabra levara-o à que pode ser considerada, nos tempos modernos, a maior descoberta de manuscritos.
Os beduínos não marcam o tempo como os ocidentais: assemelham-se aos seus antepassados; a sua conceção de tempo e momento está relacionada com outros eventos. Assim, não se pode datar a descoberta com precisão. Após uma revisão, a data da descoberta do primeiro rolo de manuscritos será 1935 ou 1936 e não 1947, como se propalou. A partir de então até 1956, muitos outros manuscritos foram achados. Crê-se que os manuscritos sejam de datas diferentes, que variam do século III a.C. até o século I d.C. A maior parte deles foi descoberta em cavernas de formação calcária em Wadi Qumran, sitas exatamente a noroeste do Mar Morto. A maioria é escrita em hebraico; o restante é escrito em aramaico e grego. Foram achados mais de 900 documentos, que correspondem a 350 obras distintas em suas múltiplas cópias. Muitos dos escritos bíblicos e extrabíblicos vêm em pequeníssimos fragmentos. Só numa caverna foram achados 520 textos, na forma de 15 mil fragmentos. Ora, juntar todos os pedaços de pergaminho na respetiva posição para fazer a tradução tem sido tarefa hercúlea.
O achado dos Manuscritos confirma o que as pessoas que creem na Bíblia sempre souberam, ou seja, que a Bíblia, tal qual a temos na atualidade, é texto que passa nos testes de fidedignidade. Apesar dos ataques contra a Bíblia, a Palavra de Deus permanece para sempre: 
O caminho de Deus é perfeito; a palavra do Senhor é provada; ele é escudo para todos os que nele se refugiam” (2Sm 22,31).
Sempre houve quem haja questionado a confiabilidade das Escrituras. Dado que o texto foi copiado e recopiado ao longo de séculos, os críticos alegam ser impossível saber-se com certeza o que os hagiógrafos escreveram ou queriam dizer. Os Manuscritos do Mar Morto invalidam tal hipótese ou suposição no que se refere ao Antigo Testamento (AT). Foram achadas entre 223 e 233 cópias das Escrituras Hebraicas, que foram comparadas com o texto atual. O único livro do AT que não foi encontrado nessa descoberta é o livro de Ester. Pode ser que esteja oculto em caverna ainda não identificada de algum lugar isolado.
Antes dessa descoberta, os manuscritos mais antigos das Escrituras Hebraicas datavam do século IX d.C. ao século XI d.C. Tais manuscritos constituem o chamado Texto Massorético (TM) – expressão originada da palavra hebraica masorah a significa “tradição”. Os escribas judeus de Tiberíades, denominados massoretas, procuraram meticulosamente padronizar o texto hebraico e a sua pronúncia; a obra que realizaram é considerada uma referência confiável. Os manuscritos de Qumran são, no mínimo, mil anos mais antigos que o Texto Massorético. Na realidade, esses manuscritos são até mais antigos que a Septuaginta, a tradução grega do AT elaborada no Egito durante o período de 300 a 200 a.C. Têm-se feito comparações minuciosas entre o TM e os Manuscritos do Mar Morto. Encontraram-se diferenças insignificantes de ortografia e gramática. Os críticos e céticos em relação à Bíblia ficaram surpresos quanto ao modo por que o texto daqueles manuscritos se assemelha ao texto atual. Não encontraram objeção evidente às principais doutrinas das Escrituras. A parte bíblica da literatura descoberta em Qumran confirma o estilo de expressão e o significado do AT que hoje temos em mãos:
Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna, e são elas mesmas que testificam de mim” (Jo 5,39).
Além de cópias das Escrituras do AT, as cavernas do Mar Morto proporcionam-nos outras obras. Estes documentos descrevem o estilo de vida e as crenças da misteriosa comunidade que viveu na região de Qumran – os essénios – que terá organizado todos os manuscritos achados. Embora os atinentes à vida essénica não sejam escritos bíblicos, são registos valiosos que possibilitam a compreensão do contexto de vida e cultura na época do Novo Testamento (NT). Porém, os estudiosos dão mais atenção a essas obras de menor relevância que às Escrituras, quando os textos bíblicos sejam mais importantes para os problemas da vida, pois o legítimo plano de Deus para a redenção da humanidade só se encontra no texto da Bíblia.
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A cópia mais antiga das Escrituras do AT conhecida até agora foi descoberta em 1979. São dois minúsculos rolos de manuscritos feitos de prata, usados como talismãs, que foram descobertos dentro dum túmulo em Jerusalém. O texto da sua inscrição foi cunhado em hebraico antigo. O manuscrito, surpreendentemente, continha uma citação da bênção sacerdotal registada em Números 6,24-26:
O Senhor te abençoe e te guarde; o Senhor faça resplandecer o rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti; o Senhor sobre ti levante o rosto e te dê a paz”.
A inscrição data do século VII a.C., época do templo de Salomão e do profeta Jeremias. Portanto, esses versículos, provenientes do 4.º livro da Torah [ou Pentateuco, na versão grega], são mais antigos do que os Manuscritos do Mar Morto (cerca de 400 anos).
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O Rolo de Isaías achado na caverna 1 da região de Qumran oferece um exemplo da transmissão exata do texto na tradução. Crê-se que esse manuscrito date de cem anos antes do nascimento de Jesus Cristo. Foi um manuscrito semelhante a esse que Jesus utilizou na sinagoga de Nazaré, na leitura da passagem das Escrituras: O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar os pobres (Lc 4,18; Is 61,1). Ele continuou a leitura até determinado ponto. Em seguida, devolveu o rolo ao assistente da sinagoga e sentou-se. Todos tinham os olhos fitos em Jesus, que declarou que aquele passo das Escrituras acabara de se cumprir naquele momento. Assim, Jesus afirmou claramente ser Ele mesmo o Messias que veio ao mundo para oferecer a salvação a todo aquele que O receber.
A mesma passagem traduzida do Manuscrito do Livro de Isaías descoberto em Qumran (cerca de mil anos mais antigo do que o manuscrito hebraico [i.e., o Texto Massorético] em que se basearam as outras traduções) é praticamente idêntica: “O Espírito do Senhor Deus está sobre mim, porque YHVH [o tetragrama sagrado em hebraico que se refere ao nome supremo de Deus: Yahweh ou Javé] me ungiu para pregar as boas novas aos quebrantados”. A integridade da reivindicação de Cristo, conforme está escrita em nossas Bíblias, confirma-se.
É importante registar que os manuscritos achados com mais frequência em Qumran, completos ou na forma de pequenos fragmentos, se referem aos mesmos livros da Bíblia geralmente citados no NT: Deuteronómio, Isaías e Salmos. Tal facto desperta um interesse ainda maior à luz das próprias palavras de Jesus concernentes às Escrituras Hebraicas:
A seguir, Jesus disse-lhes: São estas as palavras que eu vos falei, estando ainda convosco: importava se cumprisse tudo o que de mim está escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos” (Lc 24,44).
Muitos outros exemplos poderiam ser citados. O facto principal acerca da Bíblia e desses rolos resume-se no que um grande estudioso e paladino das Escrituras, o inglês G. Campbell Morgan (1863-1945) compartilhou certa vez:
Não existe vida nas Escrituras em si mesmas, porém, se seguirmos a direção para onde as Escrituras nos levam, elas nos conduzirão até Ele e assim encontraremos a vida, não nas Escrituras, mas n’Ele através delas”.
E comprova a sua tese com uma citação de Isaías:
Seca-se a erva, e cai a sua flor, mas a palavra de nosso Deus permanece eternamente” (Is 40,8).
Infindáveis argumentações e debates têm surgido acerca desses manuscritos, como trouxessem à fé cristã uma derrocada apocalíptica. Contudo, os crentes podem estar certos de que este material ratifica a Bíblia que temos hoje, a apoia e lhe dá credibilidade. A Palavra de Deus é a única fonte legítima da fé e da doutrina para todo aquele que busca recompensa eterna.
São mais desejáveis do que ouro, mais do que muito ouro depurado; e são mais doces que o mel e o destilar dos favos. Além disso, por eles se admoesta o teu servo; em os guardar, há grande recompensa.” (Sl 19,11-12).
Sendo assim, Muhammad terá ficado desiludido por ter momentaneamente alimentado a esperança de encontrar ali os tesouros deste mundo. Apenas achou pergaminhos despedaçados que só prestavam para fazer correias de sandálias. Lamentavelmente o lucro deste mundo é uma prioridade que absorve a pessoa completamente. O mundo considera as Escrituras Sagradas como algo sem valor; ou com alguma utilidade, de vez em quando, para serem citadas como “palavras da boca para fora”, mas nunca para serem aceitas pela fé e praticadas. Todavia, nós, os salvos em Cristo, temos um conhecimento mais apurado. Temos conhecimento suficiente para não desprezar o tesouro verdadeiro e incalculável que só pode ser descoberto quando se faz uma escavação no solo da Palavra de Deus:
E, se clamares por inteligência e por entendimento alçares a voz, se buscares a sabedoria como a prata e como a tesouros escondidos a procurares, então, entenderás o temor do Senhor e acharás o conhecimento de Deus” (Pr 2,3-5). 
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(cf Peter Colón, Israel My Glory, http://www.chamada.com.br). Cf ainda: GARCÍA, Florentino MARTÍNEZ – TREBOLLE, Julio (1993). Los hombres de Qumrán: literatura, estructura social y concepciones religiosas. Trotta, Madrid;POULLY, Jean (1980). Los manuscritos del mar muerto y la comunidad de Qumrán, Verbo divino, Estella. RIESNE, R. – BETZ, H. D. (1992). Jesús, Qumrán y el Vaticano, Herder, Barcelona.
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Assim, em vista das descobertas científico-bíblicas, o crente pode clamar como o salmista:
A lei do Senhor é perfeita e reconforta a alma; o testemunho do Senhor é fiel e dá sabedoria aos símples [...] são mais desejáveis do que ouro, [...] em os guardar há grande recompensa [...] Para mim vale mais a lei que procede de tua boca do que milhares em ouro ou prata (Sl 19,8.11-12; Sl 119,72).
2018.04.04 – Louro de Carvalho

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