sábado, 14 de abril de 2018

Punição pelo alegado uso de armas químicas


Alegadamente na Síria foram utilizadas armas químicas de incómodo e destruição massiva que obviamente não sabem distinguir culpados de inocentes, armados e inermes. Como retaliação alguns países do Ocidente, hipocritamente para fazerem a paz, concertaram-se para a destruição de unidades de fabrico e armazenamento das ditas armas. Talvez tenham cometido erro similar do dos putativos utilizadores das mesmas armas. É claro que, segundo os atacantes, há certezas: os outros destruíram massivamente populações e bens, mas nós somente fizemos intervenções cirúrgicas, não matando civis, muto menos inocentes como fizeram os outros.
É por certo verdade que os “Aliados” já deviam ter percebido que se enganam. O Iraque sofreu uma invasão multinacional com base na informação de que havia armas de destruição massiva e que tinham sido utilizadas pelo ditador Saddam. Veio a provar-se que essa informação era falsa. Desculpam-se os “Aliados” que intervieram ou apoiaram a intervenção que, sendo provável a predita utilização, era legítimo intervir para contrariar, punir ou prevenir tal comportamento.
Ora se a justiça funcionasse com base em supostas provas, teríamos meio mundo nas prisões. E não se faz a guerra para prevenir seja o que for. O que deve fazer-se é ter um dispositivo de segurança para suster e anular uma eventual e hipotética invasão externa. De resto, não há guerras boas.
Theresa May, crendo e fazendo crer que um ex-espião e a filha foram envenenados pela utilização dum produto russo, expulsou 23 diplomatas russos e induziu a UE e outros países amigos a semelhante postura (anti)diplomática, o que provocou reação simétrica. Uma autoridade técnica interna veio a terreiro dizer que não se conseguira provar que o produto tenha sido fabricado pela Rússia; e recentemente a competente autoridade sediada na Suíça confirmou que o dito produto não foi fabricado na Rússia. Entretanto, a batalha diplomática fez estragos!    
Não estaremos, de momento, perante situação similar das referenciadas?
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A Primeira-Ministra britânica, em reação à notícia do uso da utilização de armas químicas na Síria – na região de Douma, provocando a morte de 70 pessoas –, convocou para o dia 12 uma reunião de emergência com ministros para discutir participação em ação militar contra o regime sírio, quando a Casa Branca dizia que havia outras opções.
A reunião do chamado “gabinete de guerra” – expressão usada pela Sky News – teria de aprovar a participação do Reino Unido numa ação militar contra o regime do Presidente Bashar Al-Assad, liderada pelos Estados Unidos e pela França. Sem consultar o Parlamento (os deputados estavam de férias), o que motivou algumas críticas, ordenou às forças navais a colocação de submarinos em águas próximas da Síria preparados para qualquer eventualidade. Será de crer que pretende marcar a história como Margaret Thatcher? Quererá mostrar que, apesar do Brexit, o Reino Unido sobrevive? Estará picada pelo protagonismo de Macron?  
Também o Presidente norte-americano se encontrou, no dia 11, com o Secretário da Defesa, Jim Mattis, para discutir a possível resposta ao conflito na Síria. Não obstante, a Casa Branca não confirmara a iminência de ataque contra o Governo do Presidente sírio e insistia que o Chefe de Estado norte-americano, Donald Trump, estava a analisar outras opções disponíveis.
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A Síria nega categoricamente qualquer utilização de armas químicas, assim como a Rússia, principal aliado do regime sírio, que afirmou que eventuais ataques ocidentais teriam graves consequências, vindo Moscovo a advertir contra qualquer ação na Síria que desestabilize a situação já frágil na região.
No dia 9, Trump afirmara que levaria entre 24 e 48 horas a decidir sobre uma possível resposta militar à Síria. Mas, apesar de o prazo ter passado, Sanders, porta-voz da Casa Branca, assegurou que o Presidente não estabelecera uma janela de tempo concreta e sublinhou que, pela manhã, Trump se reunira com os conselheiros de Segurança para estudar todas as “possibilidades”. São declarações que surgiram depois de Trump ter ameaçado pelo Twitter, tanto a Síria como a Rússia, com um ataque de mísseis “suaves e novos e inteligentes”.
Sanders insistiu em apontar a Rússia como responsável pelo ataque em Douma, por não ter conseguido evitar que o regime sírio executasse este “atroz” ataque.
Questionada sobre se a Casa Branca considera que o Kremlin se tornou inimigo dos Estados Unidos, Sanders limitou-se a afirmar: “Isso é algo onde a Rússia tem um papel a desempenhar”.
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Um dia depois de ter posto a Rússia e a Síria sob alerta para um eminente ataque com mísseis naquele país, o Presidente dos EUA admitiu que a intervenção norte-americana podia não estar tão perto, mas também que poderia acontecer a qualquer momento.
No entanto, afirmando que, durante a sua administração, os EUA fizeram um excelente trabalho ao livrar o Estado Islâmico da região, lamenta não ter havido um agradecimento à América.
Dois dias depois de ter dado um prazo de “24 a 48 horas” para reagir ao alegado ataque químico atribuído à Rússia e ao Irão, Trump escreveu um tweet onde ameaçou a Rússia e a Síria com ataques com mísseis:
A Rússia prometeu abater todo e qualquer míssil disparado contra a Síria. Prepara-te, Rússia, porque eles vão chegar, bonitos, novos e ‘inteligentes’! Vocês não deviam ser amigos de um animal que gosta de matar o seu povo com gás!”.
O anúncio de Trump surgiu poucas horas depois duma alta patente militar ter garantido que a região de Ghouta Oriental voltou a estar totalmente sob controlo das tropas de Bashar al-Assad e aliados, tendo sido ali formado, em 2012, um dos mais fortes bastiões dos rebeldes sírios.
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O Presidente Macron (que se opôs a intervenções militares como a da Líbia e queria ser intermediário na guerra da Síria) preparava a ordenação de ataques aéreos ao regime de Damasco. Algo mudou.
É de recordar, a este respeito, o que se passou em agosto de 2012 com Obama, que dizia:
Temos sido muito claros para o regime de Assad de que uma linha vermelha para nós é quando começarmos a ver muitas armas químicas a serem movimentadas ou utilizadas. Isso alteraria o meu cálculo. Isso mudaria a minha equação.”.
Porém, recuaria em agosto de 2013, após um ataque com gás sarin em Ghouta, que matou centenas de pessoas. O Presidente Hollande estava pronto para a ofensiva militar quando, segundo o Le Monde, recebeu uma chamada de Obama a mudar de agulha porque não havia coligação internacional para a intervenção, nem maioria no Conselho de Segurança, nem apoio na opinião pública, nem apoio no Congresso norte-americano.
Ora, Emmanuel Macron, em junho de 2017, dizia:
Tenho duas linhas vermelhas: armas químicas e acesso humanitário. Já disse claramente a Vladimir Putin que serei intratável nestas matérias. E que a utilização de armas químicas provocará réplicas, e estas incluirão a França.”.
No passado dia 8, um ataque com armas químicas em Douma matou dezenas de pessoas, Macron ficou confrontado com a sua linha vermelha, como Obama também o foi em tempos. Só que, ao contrário do antigo Presidente americano, parece disponível para cumprir a sua palavra. E a pergunta impõe-se: O que leva um Presidente que criticou a estratégia intervencionista dos seus antecessores a mergulhar de cabeça num ataque à Síria? Macron prometera uma decisão “nos próximos dias” sobre o que iria fazer relativamente à Síria. Garantia não querer uma escalada  de violência, mas iria continuar “a troca de informações técnicas e estratégicas” com os parceiros. Nos Estados Unidos, Donald Trump prometera mísseis. E, a provar-se que ocorreu ataque químico e foi realizado pelas tropas de Bashar al-Assad, Macron não teria alternativa a não ser avançar com uma intervenção militar.
Querendo cumprir a sua palavra, “ele não tem escolha”, explicou ao Observador Nicolas Tenzer, presidente do Centro de Estudos e Reflexões para Ação Política e professor de Políticas Públicas na Sciences Po. E, nas Nações Unidas, no dia 9, o embaixador francês afirmou que só o regime sírio teria meios e um motivo para levar a cabo um ataque químico na região. A esse respeito, François Delattre disse não haver dúvidas “sobre quem são os autores”.
O Governo de Macron estava cada vez mais disponível para uma estratégia de ataque ao território sírio com os EUA, mesmo sem apoio na ONU (a Rússia tem vetado repetidas vezes reações a ataques químicos, por não ser possível provar que aconteceram nem quem os levou a cabo). Mas este não parecia ser o caminho desde que o Presidente centrista tomou posse. Porém, Macron, crítico da postura intervencionista dos antecessores, chegando a usar palavras duras relativamente à ação francesa e internacional na Líbia, relativamente à Síria, não quis seguir as pisadas de Hollande, que se opunha abertamente a Assad. Depois da sua eleição, tem tentado que a França seja um parceiro credível na crise síria. Recebeu visitas oficiais de Trump e de Putin, enquanto construía um discurso de intermediário: a política da França não deveria ser nem a luta contra Assad, nem a sua reabilitação”, resumiu ao Observador Mannon-Nour Tannous, investigadora da Fundação para a Pesquisa Estratégica. Entretanto, a questão do uso de armas químicas tornou-se uma questão de princípio, já que a França é depositária do protocolo de 1925 de Genebra contra as armas químicas – isto a par da posição conhecida de Macron contra o uso deste tipo de armamento e a “linha vermelha” que invocou como Obama.
Além disso, numa guerra onde os interesses geoestratégicos determinam alianças militares inusitadas, não era de admirar que uma decisão francesa de se envolver no conflito – aliada aos EUA – tivesse outro tipo de repercussões. Mohammed bin Salman, o príncipe saudita que visitou o Eliseu, mostrou-se disponível para apoiar Macron em possíveis ataques aéreos.
É claro que a ação saudita não é desinteressada. Não foi por acaso que, na mesma conferência de imprensa com o Presidente francês ao lado, o príncipe falou na necessidade de combater o “expansionismo iraniano”. De facto, o Irão é aliado da Síria e adversário dos sauditas.
Outra repercussão numa destas decisões pode relacionar-se com o próprio peso da aliança franco-americana. Macron tem pressionado Trump a intervir, ao contrário do que o norte-americano preferia. E o Presidente dos EUA acabou por abraçar os desejos do homólogo francês, prometendo enviar mísseis para combater um “animal que mata com gás”.
O facto de a França estar a assumir a dianteira nesta questão pode fortalecer o eixo Paris-Washington, como previu Jacob Heilbrunn, da revista National Interest, dizendo que os britânicos estão “desaparecidos em combate nesta matéria” e que os franceses podem ocupar esse lugar na relação com os EUA.
Ora, “Theresa May nunca conseguiu conquistar a afeição de Trump. Por exemplo, não logrou transmitir “a pompa militar que impressionou tanto Trump no Dia da Bastilha”, aquando da sua visita a Paris, escrevia Heilbrunn, que esperava que os britânicos se viessem a juntar aos ataques aéreos ao ‘animal Assad’, como Trump lhe chamou, para punir o déspota sírio pela sua última atrocidade; mas seria Macron quem, sem dúvida, seguiria no lugar do condutor.
Ao assumir-se como o arquiteto duma série de ataques aéreos que provam ao mundo que a França não tolerará o uso de armas químicas, Macron poderá provar que é um ator de peso na cena internacional. Mas o Presidente francês também pode ser arrastado para uma guerra pela qual ainda pode vir a pagar um alto preço político.
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Segundo os especialistas, há três categorias entre os que defendem a ação militar: os que pensam que se deve restringir às questões das armas químicas; os que consideram que é preciso combater militarmente Assad e seus aliados noutras áreas; e os que defendem que, para lá das ações militares, é preciso pôr um ponto final à ação do regime sírio e pensar num plano a longo prazo que “não deixe a Rússia, a Turquia e o Irão como donos do jogo, como são hoje.
Macron faz parte da primeira categoria e talvez da segunda, mas não da terceira. Trump parece estar a aproximar-se da terceira, mas não tem qualquer plano para a Síria.
Ora, os ataques foram feitos. Trump diz que a missão está cumprida, pois eliminaram as fábricas e os armazéns das ditas armas químicas. Mas ironicamente promete reatacar se for preciso. A Rússia classifica de grave a decisão bélica, quer uma reunião urgente do Conselho de Segurança doa ONU e dá indicações de como as populações e podem proteger em caso de guerra nuclear. A NATO corrobora a intervenção militar como não havendo alternativa. May diz que teve de ser já que a diplomacia falhou. E Portugal, pela voz do Ministro dos Negócios Estrangeiros, secundado pelo Presidente da República, diz compreender a posição dos países amigos, no que não é acompanhado pelo PCP nem pelo Bloco de Esquerda, que acusam a intervenção de ingerência e de desrespeito pelo direito internacional  
O secretário-geral das Nações Unidas afirmou que está “preocupado com o impasse” e exortou os cincos membros permanentes do Conselho de Segurança a “evitarem uma situação fora de controlo” na Síria, chegando a dizer que voltou a “Guerra Fria”.
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Enfim, o que move os “Aliados” será mesmo a utilização das armas químicas? E as provas? Que diz a isto a jurista Paula Teixeira da Cruz, que bem se posicionou sobre o envenenamento do ex-espião russo e filha? Não será, antes, a sede de predomínio na cena mundial e, em concreto, o domínio regional do Medio Oriente? Não será a sede de sangue humano? Não será o negócio do petróleo? Não será, como deixa entrever por hipótese o Bispo do Porto, a visão pessoal de quem lidera em detrimento do interesse global?  
É caso para concitar um debate sério! A guerra não se legitima de qualquer modo e por qualquer razão.
2018.04.14 – Louro de Carvalho

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