sexta-feira, 6 de abril de 2018

Dizer a humanidade com voz de mulher / Repensar o humanismo


São dois temas a abordar nos próximos dias 10 e 11 de abril, no Auditório Padre José Bacelar e Oliveira, na Universidade Católica (UCP), em Lisboa (Edifício Antigo), numa conferência em italiano e português com tradução simultânea, com entrada livre.
É uma iniciativa do CITER (Centro de Investigação em Teologia e Estudos de Religião), da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, em parceria com o Instituto Italiano de Cultura, a corresponder ao desígnio da Comissão Episcopal da Educação Cristã e Doutrina da Fé. E integra o programa “Lições sobre os Estudos de Religião”, que, segundo o CITER, procura promover a disciplina académica dos Estudos de Religião enquanto Estudos de Cultura, investigadores reconhecidos nesta área que apresentam os seus estudos recorrentes.
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A iniciativa traz a Lisboa Lucetta Scaraffia, professora de História Contemporânea da Universidade de Roma La Sapienza, para nova lição sobre os “Estudos da Religião”.
A “lição” realizar-se-á a 10 de abril, pelas 16,30 horas, na sede da UCP em Lisboa. Segundo o comunicado da UCP oportunamente divulgado, Lucetta Scaraffia vai destacar o modo como “entre os humanismos a construir num diálogo entre vozes diferentes e não necessariamente reconciliáveis, não pode faltar a voz da mulher, como uma forma de expressão de subjetividades que, na história milenar da humanidade, foram confinadas à mera funcionalidade biológica e a uma condição de subordinação e mutismo social, na radical remoção e mortificação da sua autonomia simbólica, ética e antropológica”. Com efeito, “nenhum humanismo pode renascer no nosso tempo se não for nele audível uma inconfundível voz de mulher”.
Neste sentido, a também ensaísta e coordenadora do suplemento mensal “Donne Chiesa Mondo” do “L’Osservatore Romano” vem desenvolver o tema “Dizer a humanidade com voz de mulher. Instâncias antigas, novas respostas”. Luísa Almendra, a moderadora da sessão, abrirá o debate em tempo oportuno.
A investigadora da história das mulheres e da história religiosa, dois campos de pesquisa que convergem numa série de trabalhos sobre a religiosidade feminina, nos últimos anos dedicou-se intensamente à reflexão histórica e teológica sobre o papel da mulher na sociedade e, em particular, na Igreja. Tornando-se porta-voz da necessidade de pensar e implementar novos espaços e modalidades de participação feminina na vida eclesial, Scaraffia destaca, em escritos como o seu diário de participação no Sínodo sobre a família, o facto de que “a Igreja estará dramaticamente atrasada em relação à história e ao Evangelho enquanto a diversidade de carismas que derivam da diferença de género permanecerem conjugados como exclusão e subordinação e não como igualdade efetiva.
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No dia 11 de abril, no mesmo local e à mesma hora, o teólogo Enzo Bianchi e o filósofo Massimo Cacciari conversarão sobre “O humanismo trágico da razão e o humanismo redimido da cruz. Diálogo ou ‘disputatio’?”. E o Padre José Tolentino Mendonça, que moderará a sessão, abrirá o debate em tempo oportuno.  
Massimo Cacciari é professor emérito da Faculdade de Filosofia da Universidade Vita-Salute San Raffaele de Milão, de que foi cofundador e primeiro presidente. Exerceu os cargos de professor de Estética na Faculdade de Arquitetura da Universidade de Veneza e de diretor do Departamento de Filosofia da Academia de Arquitetura de Lugano de 1998 a 2005. Foi cofundador e codiretor de algumas das revistas que marcaram a vida política, cultural e filosófica italiana entre os anos ‘60 e ‘90, de Angelus Novus a Contropiano, de Laboratorio Politico a Centauro e Paradosso.
Conhecido internacionalmente, ensina em várias universidades europeias e as suas obras estão traduzidas em muitas línguas. Combinou sempre as atividades científicas e culturais com um forte compromisso civil e político que o levou a ocupar o cargo de Parlamentar Europeu e de Presidente da Câmara Municipal de Veneza.
Enzo Bianchi nasceu em Castel Boglione, em Itália, a 3 de março de 1943. É o fundador e prior da Comunidade Monástica de Bose. É um monge secular, teólogo e ensaísta. A sua comunidade propõe uma escolha de vida cristã orientada para a radicalidade evangélica, que conjuga a tradição monástica em chave ecuménica, acolhendo monges católicos, protestantes e ortodoxos.
Formou-se em Economia na Universidade de Turim e é autor de um grande número de livros sobre espiritualidade e tradição de diálogo da Igreja com o mundo cristão contemporâneo. Colaborador regular de inúmeros jornais e revistas, em Itália, escreve para La Stampa e, em França, para La Croix, sendo os seus livros editados pela conceituada Einaudi. Fé, esperança, ética e perdão são alguns dos seus temas fundamentais. O Papa Francisco nomeou-o consultor pontifício do Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos.
Enzo Bianchi é uma das figuras de referência do catolicismo italiano: a nova humanidade que nasce do encontro com Cristo encarna-se na sua vida e na sua palavra num luminoso testemunho de fé em Cristo e de fidelidade ao homem e à Igreja.
O trabalho, a oração, a meditação da Palavra na lectio divina e a pregação catequética são os principais carismas desta Regra monástica. Porém, a comunidade de Bose não é uma ordem religiosa, mas uma associação de fiéis que vinculam a sua vida comunitária às regras da fidelidade ao Evangelho, da comunhão de bens e do celibato.
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Os intervenientes dos dois dias vão falar da “humanidade trágica e humanidade crucificada, perguntando-se o quão ‘sustentável’ seja uma humanidade desprovida de futuro, que desespera, ao reconhecer a própria condição trágica, e quão o seja uma humanidade que escandalosamente afirma poder esperar precisamente a partir da cruz, dando-se um futuro a partir da morte”.
A este respeito, a organização do evento assinala:
Se for verdade que a categoria do humanismo caracteriza o “nascimento” da sociedade moderna como um ‘renascimento’, no qual recuperar a continuidade com o passado constitui a condição para criar algo de radicalmente novo, reatar com a grande tradição do humanismo italiano é um passo indispensável para começar esta jornada para o futuro”.
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A filologia é dimensão essencial de um pensamento que se reconhece como dialógico, processual, nascido do encontro crítico com o passado para produzir propostas de interpretação do presente.
No projeto do CITER, a focalização desta passagem está confiada ao contributo do professor Cacciari, autor de um estudo fundamental sobre os humanistas italianos, que se apresenta como uma introdução histórico-filológica a um pensamento humanista do presente. Nesta reconstrução, o professor Cacciari mostra como a natureza dialógica da reflexão humanista não interessa apenas a interlocução com os autores do passado, mas também com o homem do futuro, numa radicalidade trágica (por encarar um desafio impossível) que obriga a razão a questionar as razões da fé, numa confrontação não pacífica, mas inquieta e dolorosa, num diálogo que é também disputa irreconciliável e sem fim. Tendo isto em conta, esta complexidade será transmitida de forma mais efetiva, se não for formulada apenas em termos de conteúdos, mas for explicada na forma da sua partilha, de modo que a intervenção do professor Cacciari será concebida na modalidade de diálogo-disputa em que se confrontam, colidem e se encontram duas tradições, duas imagens do futuro, dois recursos de humanidade – a razão e a fé.
O filósofo Massimo Cacciari e o monge leigo Enzo Bianchi são convidados a falar-nos de humanidade trágica e humanidade crucificada, perguntando-se o quão ‘sustentável’ seja uma humanidade desprovida de futuro, que “des-espera”, ao reconhecer a própria condição trágica, e quão o seja uma humanidade que escandalosamente afirma poder esperar precisamente a partir da cruz, dando-se um futuro a partir da morte.
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Criado em 2017, o CITER tem por objetivo a organização, promoção e divulgação, numa perspetiva multi e interdisciplinar, das investigações em Teologia e Estudos de Religião, favorecendo um intercâmbio ativo entre estas áreas científicas, bem como as ligações de cada uma delas com outros campos do saber. Ao tentar estabelecer uma ponte entre ciência e sociedade, o Centro favorece um debate público tanto em relação a questões centrais da atualidade sociocultural bem como aos fundamentos espirituais do ocidente.
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Uma grande oportunidade de debate e de repensamento da partilha de vida e de intervenção da parte de homens e mulheres, mais igualitária, e da reassunção do verdadeiro humanismo atento ao imanente e aberto ao transcendente!
2018.04.06 – Louro de Carvalho

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