sábado, 21 de abril de 2018

Dia Mundial da Terra 2018: clamor da Terra e clamor dos pobres


Todos os anos se celebra o Dia Mundial da Terra22 de abril. E cada vez mais há razão para celebrar a efeméride: são tantos os transtornos por que passa o planeta – desde os cataclismos naturais aos provocados pela força humana. Quanto de terrestre não se degrada e destrói com as guerras, com um “ordenamento” do território desregrado, a exploração desenfreada de recursos, o entupimento com lixos tóxicos e plásticos não biodegradáveis e contaminação de águas, ar e solos com pesticidas, herbicidas, fungicidas, dendricidas, o abuso de antibióticos…!
Investigadores e associações ambientalistas alertam para o perigo e consequências do aquecimento global da Terra, nomeadamente: aumento da temperatura global da Terra; extinção de espécies animais; aumento do nível dos oceanos; escassez de água potável; e maior número de catástrofes naturais, como tempestades, secas e ondas de calor.
A data foi criada em 1970, pelo senador norte-americano Gaylord Nelson, que resolveu realizar um protesto contra a poluição da Terra, depois de verificar as consequências do desastre petrolífero de Santa Barbara, na Califórnia, ocorrido em 1969.
Inspirado pelos protestos dos jovens norte-americanos que contestavam a guerra, Gaylord Nelson, envidou esforços para conseguir colocar o tema da preservação da Terra na agenda política norte-americana.
A população aderiu em força à manifestação e mais de 20 milhões de americanos manifestaram-se a favor da preservação da terra e do ambiente.
Todos os anos, no dia 22 de abril, milhões de cidadãos em todo o mundo manifestam o seu compromisso com a preservação do ambiente e da sustentabilidade da Terra. Neste dia de cariz educativo, ou a propósito deste dia, escrevem-se frases e poemas sobre a importância do planeta Terra nas escolas e em grupos de reflexão, entre outras atividades.
É possível juntar-se a atividades existentes, criar eventos próprios, por exemplo, doar dinheiro ou tomar simples atos como plantar uma árvore ou separar os lixos.
O Dia Mundial da Terra conta já com mais de mil milhões de atos realizados em prol do ambiente ao longo da história. É o maior dia do ano para o planeta Terra, desejando que todos os habitantes do mundo realizem algum ato que o proteja. Este ato será uma espécie de semente para regar durante o resto do ano.
Assim, para o ano de 2017, o tema das atividades foi “Instrução ambiental e climática” (Environmental and Climate Literacy).
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Em 12 de abril de 1961, o jovem cosmonauta russo Yuri Gagarin (1934-1968), a bordo da nave Vostok-1, o primeiro humano a viajar pelo Espaço (numa missão, uma volta em torno da Terra numa órbita a 315 km de altitude, durou 1 hora e 48 minutos) comentou, fascinado: “A Terra é azul!”.
A partir dessa primeira missão espacial, muitas outras se têm sucedido. Em 1990, a pedido do astrofísico e escritor Carl Sagan, a sonda Voyager 1 foi programada para obter várias fotografias do Sistema Solar. Uma delas mostra a Terra vista à distância de 6 mil milhões de km (vd em http://www.ecocidades.com/2011/01/09/palido-ponto-azul-nossa-casano-espaco/).
A propósito da referida foto Carl Sagan escreveu:
A Terra é um palco muito pequeno em uma imensa arena cósmica. [...] é um espécime solitário na grande e envolvente escuridão cósmica [...]  um pálido ponto azul. [...] Gostemos ou não, por enquanto, a Terra é o único lugar onde podemos viver [...].”.
Para lá de ser o nosso lar, o nosso planeta é extremamente belo. Quem nunca se extasiou perante a beleza de um pôr do sol? A este respeito, Antoine de Saint-Exupéry escreve em “O Principezinho”:
Gosto muito do pôr do sol. Vamos ver um... Um dia eu vi o pôr do sol quarenta e três vezes!”.
Para além da beleza do pôr do sol, do arco-íris, do céu, dos glaciares, temos uma natureza pródiga na sua diversidade animal, vegetal e mineral, em montes e planícies, em rios e mares... Somos uns privilegiados. Por isso, não podemos alijar a nossa grande responsabilidade de preservar e estimar o único lar que conhecemos, este pálido ponto azul.
Assim, em 2009, a ONU reconheceu a iniciativa tomada, a 22 de abril de 1970, pelo senador norte-americano Gaylord Nelson, e instituiu este como o Dia Internacional da Terra.
O objetivo principal deste dia é consciencializar todas as pessoas e todos os povos sobre a importância e a necessidade de conservar os recursos naturais do planeta e defender a harmonia entre todos os seres vivos. Só assim será possível assegurar às gerações presentes e futuras qualidade de vida ambiental, social, económica, cultural, estética.
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Das atividades sugeridas para a efeméride, destaco:
- As do programa do MUHNAC (Museus da Universidade de Lisboa) preparadas para toda a família: À Descoberta dos Animais”, 11,30 horas (diversidade animal nativa do nosso país e importância da sua conservação – atividade na Sala da Baleia); “Praças, Jardins e Água”, 15 horas (história associada à água e jardins na sétima colina: com início no átrio do MUHNAC para abordagem à história do Jardim Botânico de Lisboa, continua no jardim do Príncipe Real para entrada na galeria subterrânea do Loreto – Museu da Água – e término no Jardim de São Pedro de Alcântara); Compreender a Terra para compreender a Vida”, 16,30 horas (para explorar a exposição “Aventura da Terra: um planeta em evolução”, refletir sobre as evoluções do planeta e da Vida e compreender como a Terra, enquanto sistema, condiciona a forma como se vive o dia a dia).
Em parceria com o Museu de São-Roque, ainda no dia 22 de abril é realizada a atividade “Se eu fosse… Paleontólogo” – uma expedição que parte do Museu Nacional de História Natural e da Ciência, em busca de fósseis, com destino ao Convento de São Pedro de Alcântara e à Igreja de São Roque. Munidos de cadernos de campo, lápis, réguas, os visitantes registarão os vestígios de seres de outros tempos, presentes nas paredes à sua volta ou no chão que pisam.
- Do “catholic climate movement”, a propor que, neste Dia Mundial da Terra, ergamos juntos as nossas vozes, pois estamos unidos no enorme esforço global para pedir que as nossas dioceses reduzam a emissão de gases de efeito estufa, participando numa missa pela criação e, após a missa, escrevendo cartas para a respetiva diocese com o objetivo de incentivar a diocese a colocar a Doutrina da Igreja em prática pela redução da sua própria emissão de gases de efeito estufa, podendo mesmo criar uma comissão/pastoral dedicada ao cuidado da criação.
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Com efeito, os últimos Sumos Pontífices chamam a atenção para o cuidado do planeta. Assim, João Paulo II fala da crise ecológica como um problema moral:
Alguns elementos da crise ecológica atual revelam de maneira evidente o seu caráter moral. Entre esses elementos tem de se enumerar, em primeiro lugar, a aplicação sem discernimento dos progressos científicos e tecnológicos. Muitas descobertas recentes têm trazido inegavelmente benefícios para a humanidade; mais ainda, elas manifestam quanto é nobre a vocação do homem para participar de modo responsável na ação criadora de Deus no mundo. Já se verificou, porém, que a aplicação de algumas dessas descobertas no campo industrial e agrícola, a longo prazo produzem efeitos negativos. Isto pôs cruamente em evidência que toda e qualquer intervenção numa área determinada do’ ecossistema’ não pode prescindir da considerarão das suas consequências noutras áreas e, em geral, das consequências no bem-estar das futuras gerações.
O gradual esgotamento do estrato do ozónio e o consequente ‘efeito de estufa’ que ele provoca já atingiram dimensões críticas, por causa da crescente difusão das indústrias, das grandes concentrações urbanas e dos consumos de energia. Escórias industriais, gases produzidos pela combustão de carburantes fósseis, desflorestação imoderada, uso de alguns tipos de herbicidas, refrigerantes e propelentes, tudo isto, como se sabe, é nocivo para a atmosfera e para o ambiente. Daí resultam múltiplas mudanças meteorológicas e atmosféricas, cujos efeitos vão desde os prejuízos para a saúde até à possível submersão, no futuro, de terras baixas.
Enquanto nalguns casos a danificação já é talvez irreversível, em muitos outros casos ela pode ser ainda entravada. É um dever, portanto, que se impõe à inteira família humana – indivíduos, Estados e Organismos internacionais – assumir cada um seriamente as próprias responsabilidades (Mensagem para o Dia Mundial da Paz, n.º 6 – 1990).
Por seu turno, Bento XVI escrevia sobre a moralidade das decisões económicas e ambientais:
Temos de constatar que um grande número de pessoas, em vários países e regiões da terra, experimenta dificuldades cada vez maiores, porque muitos se descuidam ou se recusam a exercer sobre o ambiente um governo responsável. O Concílio Ecuménico Vaticano II lembrou que ‘Deus destinou a terra com tudo o que ela contém para uso de todos os homens e povos’. Por isso, a herança da criação pertence à humanidade inteira. Entretanto o ritmo atual de exploração põe seriamente em perigo a disponibilidade de alguns recursos naturais não só para a geração atual, mas sobretudo para as gerações futuras. Ora não é difícil constatar como a degradação ambiental é muitas vezes o resultado da falta de projetos políticos clarividentes ou da persecução de míopes interesses económicos, que se transformam, infelizmente, numa séria ameaça para a criação. Para contrastar tal fenómeno, na certeza de que ‘cada decisão económica tem consequências de caráter moral’, é necessário também que a atividade económica seja mais respeitadora do ambiente. Quando se lança mão dos recursos naturais, é preciso preocupar-se com a sua preservação prevendo também os seus custos em termos ambientais e sociais, que se devem contabilizar como uma parcela essencial da atividade económica. Compete à comunidade internacional e aos governos nacionais dar os justos sinais para contrastar de modo eficaz, no uso do ambiente, as modalidades que resultem danosas para o mesmo. Para proteger o ambiente e tutelar os recursos e o clima é preciso, por um lado, agir no respeito de normas bem definidas mesmo do ponto de vista jurídico e económico e, por outro, ter em conta a solidariedade devida a quantos habitam nas regiões mais pobres da terra e às gerações futuras.(Mensagem para o Dia Mundial da Paz, n.º 7 – 2010).
E Francisco coloca em sistema de paridade e complementaridade o clamor da terra e o clamor dos pobres, no quadro da abordagem ecológica em função da abordagem social e económica, numa ordem ética em prol do homem, seu beneficiário e seu responsável:
O clima é um bem comum, um bem de todos e para todos. A nível global, é um sistema complexo, que tem a ver com muitas condições essenciais para a vida humana. Há um consenso científico muito consistente, indicando que estamos perante um preocupante aquecimento do sistema climático. […] Se reconhecermos o valor e a fragilidade da natureza e, ao mesmo tempo, as capacidades que o Criador nos deu, isto permite-nos acabar hoje com o mito moderno do progresso material ilimitado. Um mundo frágil, com um ser humano a quem Deus confia o cuidado do mesmo, interpela a nossa inteligência para reconhecer como deveremos orientar, cultivar e limitar o nosso poder. […] Hoje, não podemos deixar de reconhecer que uma verdadeira abordagem ecológica sempre se torna uma abordagem social, que deve integrar a justiça nos debates sobre o meio ambiente, para ouvir tanto o clamor da terra como o clamor dos pobres.” (Encíclica Laudato Si’, n.os 23.78.49 - 2016).
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Por fim, é de recordar que, a 25 de setembro de 2015, os líderes políticos mundiais adotaram um conjunto de objetivos globais para erradicar a pobreza, proteger o planeta e assegurar a prosperidade, através da implementação da nova AGDS (Agenda Global de Desenvolvimento Sustentável). Cada objetivo é composto por metas específicas que devem ser alcançadas até 2030. Para se atingirem os objetivos definidos, todos temos que fazer a nossa parte: os governos, o setor privado, a sociedade civil e pessoas. Todos e cada um de nós, até os mais indiferentes e acomodados, somos parte da solução – para nosso benefício e para benefício dos outros, nomeadamente das gerações vindouras.
2018.04.21 – Louro de Carvalho

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