É o título
da homenagem promovida pela Reitoria e pela Faculdade de Letras da Universidade
Porto, que surge no seguimento dos eventos evocativos de personalidades
eméritas da Universidade do Porto realizados na última década e que se
desenvolve, ao longo do ano, através duma série de ações abertas à comunidade,
que, em vários meses e diferentes espaços, pretendem recordar, mas sobretudo
celebrar a vida e obra daquele que “foi um humanista e um sábio de muitos
saberes”. Deste modo, a Reitoria e a FLUP corporizam uma iniciativa notável que
“se propõe celebrar o legado desta personalidade ímpar da história da
Universidade e figura central da cultura portuguesa da segunda metade do século
XX e início do século XXI”.
Da página
web da Universidade do Porto e do site
da Fenprof respigo algumas notas sobre o ensaísta e professor que tive a oportunidade
de conhecer, ouvir e interpelar.
Segundo o site da Fenprof, “o Prof. Óscar Lopes não foi apenas um grande
professor e um grande investigador, o que já não seria pouco”, mas “também um
grande intelectual, no sentido mais nobre, militante e empenhado do termo”. Foi
“autor de uma obra vastíssima, como historiador da literatura, ensaísta,
crítico literário e linguista” e “uma personalidade muito marcada, até 1974,
pelo de silenciamento e mesmo pela repressão que lhe foi movida pelas
instâncias do poder vigente, o que limitou, até então, a projeção da sua
atividade como crítico, investigador e professor”. Já a UP
desataca-o como “ensaísta, linguista e crítico literário e, entre muitos
outros epítetos que cabem num percurso singular”, como “o primeiro diretor da
Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) no pós-25 de abril”.
Isabel Pires
de Lima e Fátima Oliveira, professoras da FLUP e comissárias da iniciativa “Óscar
Lopes é a Figura Eminente da Universidade do Porto 2018”, falam desta figura eminente que se
apresentou ao mundo académico e ao publico em geral com “uma formação
multifacetada, cobrindo simultaneamente os domínios da linguística, da música,
da história, das línguas clássicas e modernas, da filosofia e da literatura e
uma viva curiosidade intelectual” que a conduziram “ao constante diálogo
interdisciplinar, com múltiplos saberes (lógica, neurociência, física,
matemática)”.
São esses os
vários aspetos de “uma personalidade multifacetada” que vão ser lembrados e retratados
já a partir de 4 de abril,
em “Óscar Lopes, o Saber de
Muitos Saberes”, título da exposição evocativa que
estará patente até 27 de abril,
na Sala de Exposições Temporárias
da Reitoria, patente de segunda a sexta-feira, entre as 10 horas e as
13, e das 14 às 18 horas. Com entrada livre, esta exposição documental está
organizada em “seis núcleos, onde se poderão ver exemplares de muitos livros,
artigos, cartas, fotografias e outros documentos relativos às diferentes
facetas do Prof. Óscar Lopes, que foram cedidos em grande parte pela sua
família”. Associados a cada núcleo estarão excertos de textos ou de
entrevistas de Óscar Lopes, havendo ainda espaço para uma secção com
depoimentos gravados de antigos alunos seus.
Após este
momento inaugural, o programa da Figura
Eminente 2018 prossegue na noite de 3 de maio, pelas 21,30 horas, na Faculdade de Engenharia da
Universidade do Porto, com o concerto
pela Orquestra Sinfónica da FEUP. Um mês depois, a 7 de junho, pelas 16 horas, a FLUP
recebe a visita de Inês Duarte, professora da Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa e coautora da Gramática da Língua
Portuguesa, que ali dará uma conferência sobre “Óscar
Lopes e a Linguagem: O Olhar de um Cientista”.
É também na
Faculdade de Letras, alma mater de Óscar Lopes, que vai ter
lugar o se espera ser um dos momentos altos do programa de comemorações. A 2 de outubro e, durante todo o
dia – das 10,30 horas às 18 – juntará o filósofo e ensaísta Eduardo Lourenço a
vários outros ensaístas, escritores e professores universitários na área da
literatura para uma jornada de debate dedicada ao tema “Óscar
Lopes: o Poder Seminal da Palavra”.
O programa
encerra a 22 de novembro,
pelas 18 horas, na Reitoria da Universidade do Porto, palco escolhido para uma
conferência a duas vozes sobre “Óscar Lopes: Música e Literatura”.
A protagonizá-la estarão o musicólogo Mário Vieira de Carvalho e o maestro José
Luís Borges Coelho, Doutor Honoris
Causa da Universidade do Porto e fundador do Coral de Letras da
Universidade do Porto, que atuará no final da sessão.
***
Natural
de Leça da Palmeira, onde nasceu a 2 de outubro de 1917, Óscar
Lopes (1917-2013) licenciou-se em Filologia Clássica,
na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, e em Ciências Histórico-Filosóficas,
na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. A paixão pela história,
literatura e pedagogia encaminhou-o para a carreira de professor do ensino
secundário, que incluiu passagens pelo Liceu Nacional de Vila Real e pelos
liceus Alexandre Herculano e Rodrigues de Freitas, no Porto.
Num trajeto
onde o ensaísta e o professor caminhavam a par com o ativista político (militante do
Partido Comunista Português, tendo integrado o seu comité central), Óscar Lopes foi impedido, por motivos
políticos, de lecionar no ensino superior antes do 25 de abril. Após a
Revolução, ingressou na FLUP como professor catedrático (cabendo-lhe
liderar os destinos da instituição até 1976) até à jubilação, em outubro de 1987. Foi vice-reitor da Universidade (1974-1975) no reitorado de Ruy Luís Gomes e responsável pela
criação do Centro de Linguística da Universidade do Porto.
Paralelamente
à carreira académica, foi um intelectual marcante e interventivo, tendo
produzido vasta obra ensaística nos domínios da crítica e historiografia literárias
e no da Linguística. Com o historiador António José Saraiva, escreveu “A Busca do Sentido” e sobretudo a “História
da Literatura Portuguesa”, obra que se mantém como referência fundamental
no ensino daquela disciplina, pois conta com um
número invulgar de edições e reimpressões, ficando assim bem evidente o amplo
acolhimento que este manual conheceu, por parte de várias gerações de
estudantes e de professores, em Portugal e no Brasil.
Os
seus primeiros trabalhos foram sobre música e para um pequeno jornal de Sintra.
Era um amante de música e chegou mesmo a fazer o curso do Conservatório de
Música do Porto.
Autor
de vasta e importante obra no domínio da Linguística, em que se destaca a Gramática
Simbólica do Português – um esboço (projeto
financiado e publicado pela Fundação Calouste Gulbenkian, que parece carecer
ainda de um desenvolvimento que faça jus a esta proposta de Óscar Lopes), o ensaísta chegou tarde
à docência na Faculdade de Letras do Porto devido às suas políticas, tendo
mesmo chegado a ser preso duas vezes durante a ditadura. O valor da sua obra foi várias vezes
reconhecido, em vida, com algumas das mais importantes distinções nacionais no
campo da cultura. Pelos trabalhos de ensaio e crítica recebeu o Prémio Rodrigues
Sampaio da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto e o Prémio Jacinto
do Prado Coelho (1985). Em 1989 foi agraciado com a
Grã-Cruz da Ordem da Instrução Pública; e, em 2006, com a Ordem da
Liberdade. Faleceu a 22 de março de 2013 (95 anos de idade) o homem que marcou momentos da
história do pensamento português e que nunca poderá ser esquecido pela sua
cultura.
***
Já em
2017, ano do centenário do seu nascimento, o
Centro de Linguística da Universidade do Porto organizou o Colóquio
Internacional de homenagem ao Professor Óscar Lopes. Esta homenagem ao fundador
do CLUP e insigne linguista teve lugar nos dias 6 e 7 de junho de 2017, na
Faculdade de Letras da Universidade do Porto, tendo sido abordadas as seguintes
áreas científicas principais: Semântica, Pragmática, Discurso (áreas em que desenvolveu a sua investigação); e também
Fonologia, Linguística Histórica, Morfologia e Sintaxe. Foram bem-vindos vários trabalhos em outras áreas da Linguística
(teórica e aplicada).
***
M. Correia Fernandes, salientando, no dia 10, na Voz Portucalense, o eloquente título da predita
exposição, frisa que o homenageado se distinguiu “por uma formação em
campos de interesse diversificados, que iam desde as línguas clássicas da sua
formação original, às literaturas modernas e contemporâneas, com óbvio realce
para a literatura portuguesa, em que se tornou um dos mais notáveis
críticos da segunda metade do século XX e início do século XXI, passando pela
linguística, a história, a filosofia e mesmo a matemática e a astrofísica”. Recorda
“a disciplina que começou a lecionar após a reformulação dos cursos de Letras
da Universidade do Porto, que se designou por “Linguística matemática e computacional”, visando “abrir novas
orientações para a abordagem e o estudo” da disciplina. Refere, para lá da
referida ‘História da Literatura Portuguesa’, “ publicada
em colaboração com António José Saraiva, outra ‘História da Literatura Portuguesa’ (sobretudo de autores do século XX) publicada por “Estúdios
Cor” e conjuntos de críticas sobre autores do seu tempo, que reuniu com
os títulos “Ler e depois: Crítica e
Interpretação Literária”, 1 e 2, publicado por Inova, e ‘Álbum de Família’ também sobre
escritores portugueses, em que elegeu os mais relevantes, ‘Entre Fialho e Nemésio’, e ‘Cifras
do Tempo’, reunião de escritos seus em várias publicações literárias ou de
pensamento”. E salienta que “muitos dos artigos que escreveu nos domínios da
linguística foram reunidos no volume ‘Entre
a Palavra e o Discurso. Estudos de Linguística 1977-1993’, edição com a coordenação
de Fátima Oliveira e Ana Maria Brito, publicada por Campo das Letras”.
Na sua visão materialista, diz Fernandes, revelou
“uma abertura à visão espiritual dos outros”. Sendo “um materialista dialético,
membro reconhecido do Partido Comunista”, tinha “um estranho respeito pelas
ideias alheias”.
Recordando a dedicação à governança da Faculdade,
conta que, entre os visitantes, veio um dia o poeta João Cabral de Mello Neto,
que teceu rasgados elogios à capacidade e justeza crítica de Óscar Lopes no que
se refere à interpretação da poesia. Agradado pela referência, disse um dia:
“Eu sei que estas matérias
lhes parecem difíceis. Mas sigam o meu exemplo: eu fazia crítica
literária, e creio que não o fazia mal, segundo
este testemunho; vejam como agora me interesso por estas novas visões da
linguagem: deve ser porque merecem atenção”.
Com trabalho insigne e insano, debruçou-se sobre as
grandezas e misérias dos nossos melhores autores (Herculano, Camilo, Eça,
Régio, Vitorino Nemésio, David Mourão Ferreira, Urbano Tavares Rodrigues e outros), como Eugénio de
Andrade, sobre cuja poesia escreveu “Uma
espécie de música”.
2018.04.11 – Louro de Carvalho
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