segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Factos ocorridos a que a escola é alheia!

Hoje, dia 29 de janeiro, por volta das 10 horas, uma rixa entre familiares de dois alunos da Escola Básica e Secundária Amadeu Gaudêncio na Nazaré levou a uma cena de agressão, que envolveu tiros e uma arma branca no pátio, no interior daquele estabelecimento de ensino, de que resultou uma vítima mortal.
A vítima, um homem de 67 anos, ainda foi transportada para o Hospital de Alcobaça, pois apresentava ferimentos graves, tendo sido mais tarde transferida para o Hospital de Santo André, em Leiria, onde morreu na sequência dos ferimentos.
Segundo o comissário Bruno Soares, do Comando distrital da PSP de Leiria, o agressor, um homem de 40 anos, acabou por ser “controlado e detido no local” por elementos da Escola Segura, que lhe apreenderam a arma. O homem encontra-se à guarda da PSP e a investigação foi entregue à Polícia Judiciária.
A escola foi encerrada devido ao pânico gerado – e por precaução. Os alunos, à vista do que viam, começavam a telefonar aos pais, que chegaram e acolheram os filhos dentro do estabelecimento escolar. Alguns dos alunos receberam acompanhamento psicológico.
O referido comissário da Polícia de Segurança Pública disse ao Expresso que “houve disparos”, embora não se possa “falar em tiroteio, que pressupõe troca de tiros”. De facto, “um indivíduo do sexo masculino recorreu a uma arma de fogo para agredir outro indivíduo”. E “há também referência à utilização prévia de uma arma branca”.
Por sua vez, fonte do comando Distrital de Operações de Socorro (CDOS) de Leiria contou que o desentendimento ocorreu às 10,22 horas, “no pátio da escola”, onde se encontravam os alunos, alguns dos quais ficaram “em estado de choque”, mas “nenhum sofreu ferimentos”.
A agência Lusa confirmou com o vereador da Educação da Câmara Municipal da Nazaré que “a escola foi encerrada”. No local estiveram três ambulâncias, uma viatura de comando e sete operacionais dos bombeiros da Nazaré e, obviamente, elementos da PSP.
De acordo com o Hospital de Santo André, em Leiria, o homem, de 67 anos de idade, foi “admitido na emergência em manobras de Suporte Avançado de Vida, efetuadas pela equipa da VMER”, e foram tentadas manobras de reanimação "sem sucesso, sendo verificado o óbito".
Ainda segundo aquela unidade hospitalar, a vítima apresentava “lesões provocadas por arma de fogo e por arma branca”.
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Pode dizer-se que se trata de um caso isolado e até inusitado. Porém, o ambiente de segurança nas escolas, embora não registe casos tão expostos como em alguns países e não seja igual por todo o país, é já bastante problemático. Os casos de insolência e indisciplina, por vezes disfarçados de hiperatividade, desconcentração, indiferença e desmotivação, abundam e são crescentes, ainda que o registo de crimes tenha diminuído um pouco.
O Programa Escola Segura, que tem a sua origem num protocolo celebrado, em 1992, entre o Ministério da Administração Interna e o Ministério da Educação, ganhou novo vigor no tempo de António Guterres com a entrega, desde 1996, de veículos automóveis à PSP e À GNR e à criação de equipas especializadas com vista à garantia da segurança e vigilância das áreas escolares. Agora precisa de novo impulso e de reforço de competências.  
Do seu lado, a GNR está a realizar campanhas de sensibilização em escolas para prevenir ocorrências indesejáveis.
Na verdade, os crimes mais registados em ambiente escolar pela GNR no ano letivo de 2016/2017 foram ofensas à integridade física, injúrias ou ameaças e furtos.
Em comunicado, a Guarda Nacional Republicana adianta que realiza, entre hoje e quarta-feira, várias ações de sensibilização junto da comunidade escolar, no âmbito do Dia Internacional da Não Violência e da Paz nas Escolas, que se assinala na terça-feira, com “o objetivo de alertar para a necessidade de prevenir comportamentos violentos”.
Segundo esta força policial, as ofensas à integridade física, as injúrias/ameaças e os furtos foram os crimes mais registados nos 5.097 estabelecimentos de ensino policiados por esta força de segurança.
Os dados enviados à agência Lusa indicam que a GNR registou, no último ano letivo, 268 crimes de ofensas à integridade física em ambiente escolar (menos 81 do que no ano letivo 2015/2016), 108 crimes de injúrias/ameaças (menos 33) e 125 furtos (menos 42).
A GNR refere também que as ações de sensibilização nas escolas pretendem prevenir este tipo de ocorrências, estando mobilizados para esta atividade mais de 600 militares das secções de prevenção criminal e policiamento comunitário da corporação, que vão abordar com os alunos temas como ‘bullying’, violência doméstica, violência no namoro e ofensas à integridade física.
Aquela força de segurança realizou, no ano letivo de 2016/2017, um total de 16.248 ações de sensibilização com crianças e jovens, tendo sido alcançados 925.329 alunos em 5.097 estabelecimentos.
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Entretanto, o Agrupamento de Escolas da Nazaré publicou um comunicado na sua página de Facebook, esclarecendo que “a situação está devidamente resolvida com a colaboração das autoridades, não tendo havido alunos, professores e funcionários envolvidos nos acontecimentos lamentáveis”.
Eis o teor do comunicado:
Informação à Comunidade
Depois de factos ocorridos a que a escola é alheia, informam-se todos os pais, encarregados de educação e demais Comunidade que a situação está devidamente resolvida com a colaboração das autoridades, não tendo havido alunos, professores e funcionários envolvidos nos acontecimentos lamentáveis. Todos os serviços na escola sede se mantêm em funcionamento retomando a normalidade a partir de amanhã. Apela-se à compreensão da Comunidade e à manutenção da tranquilidade necessária.
A Direção do Agrupamento de Escolas da Nazaré”.
É óbvio que Direção do Agrupamento não tem culpa do que sucedeu. E, se lhe sucede, como em muitas escolas, que não tem pessoal suficiente para assegurar o funcionamento da unidade orgânica por que é responsável, a responsabilidade passa por muitas entidades, nomeadamente por aquelas que tentam o controlo orçamental e o depauperamento das instituições públicas.
Porém, há que referir que as grandes causas estão a montante da escola. Entre elas, destacam-se: a falta de autoridade do Estado; a irresponsabilidade dos titulares dos cargos de topo, que vivem mais em função dos calendários eleitorais e do serventualismo a grupos de interesses; a convicção de que todos mandam em tudo; o hipercriticismo em relação aos serviços, sobretudo aos serviços públicos, que são constantemente desacreditados; a desvalorização da escola, do seu papel e do verdadeiro papel dos professores; os efeitos do contexto de crise global, sobretudo no atinente ao cultivo dos valores axiais; e a incapacidade de a educação formal atingir as suas finalidades em virtude dos constrangimentos que rodeiam a escola, a que se alia a cultura da preparação para o teste e para o exame, que algumas Escolas inscrevem nos seus planos de ação. Depois, a jusante é o que se vê: a falta de capacidade para combater o que não se foi capaz de prevenir.
Mesmo assim, é inadequado, do meu ponto de vista, vir a Direção do Agrupamento confessar que “é alheia” aos “factos ocorridos”. Não. O órgão de administração e gestão é responsável por tudo o que se passa no espaço escolar e suas imediações. Isto não quer dizer que seja culpado pelo que ali ocorre. Não se trata de responsabilidade criminal, civil ou mesmo disciplinar. Isso apenas aconteceria se, perante uma situação estranha, os responsáveis pelo Agrupamento não mobilizassem todos os meios ao seu alcance para neutralizar ou, pelo menos, minorar as consequências do ocorrido.
Ora, tudo leva a crer que, no caso, não houve negligência em chamar as autoridades e os meios de socorro. Ao invés, acolheram os alunos em pânico e os encarregados de educação que iam chegando, proporcionaram apoio psicológico aos alunos que dele necessitaram, encerraram o estabelecimento para serenar os ânimos e tranquilizaram a população dando conta de que tudo estava regularizado, prometendo a reabertura para amanhã.
Portanto, afirmar que a Direção do Agrupamento “é alheia” aos “factos ocorridos”, além de ser inadequado, vem descabido, até porque não corresponde ao esforço feito pela escola, esforço que é nosso dever saudar e aplaudir.   
Enfim, quem detém autoridade – e a Direção do Agrupamento é autoridade escolar – não é alheio aos factos de que tem conhecimento. Tanto assim é que intervém, se pode e se deve!

2018.01.29 – Louro de Carvalho

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