Em Setúbal, o seu prelado emérito, recentemente falecido, foi homenageado
pela e a partir da Escola Secundária de que é patrono o homenageado, sita
naquela cidade, sede da diocese de que foi o primeiro Bispo.
Assim, a Escola Secundária Dom Manuel Martins
assinalou a memória do nascimento do seu patrono com a homenagem intitulada “Olhares da sua Escola”. Do programa do
tributo, que decorreu entre os dias 20 e 25 de janeiro, destacou-se, a rota solidária,
a inauguração dum busto do primeiro prelado diocesano de Setúbal, um selo, uma
exposição e uma sessão solene.
***
No dia 20 de janeiro, data em que se evoca a memória
do nascimento do Bispo que faria então 91 anos, teve lugar, a partir das 9,30
foras, uma “Rota Cicloturística Solidária”, inspirada no gosto do prelado de andar de bicicleta
pela cidade. A participação implicava a entrega, no local de concentração – parque de estacionamento da escola, de um bem alimentar não
perecível, que reverteu a favor das famílias carenciadas daquela comunidade
escolar.
Para esta atividade, a Direção da Escola dirigiu uma
carta-convite aos professores, funcionários, alunos, encarregados de educação e
parceiros, apelando à participação, mediante inscrição prévia, dispondo de
bicicleta e capacete, mas esclarecia que, se alguém não pudesse ou não quisesse
participar na rota cicloturística, poderia igualmente contribuir com o donativo
referenciado fazendo a sua entrega no lugar e hora dos participante na
atividade ciclista.
Considerando o sucesso da iniciativa,
Clemência Funenga, diretora da Escola, afirmou “possível e desejável que todos
os anos se faça, a 20 de janeiro, um evento desportivo em homenagem a Dom
Manuel Martins, e solidário de apoio do Centro Social Paroquial Dom Manuel
Martins, que tanto tem feito pelas pessoas com mais necessidades desta zona da
cidade de Setúbal”.
De facto, aquela comunidade
educativa sente que o prelado era “presença amiga e inspiradora” e tinha uma
“visão clara e iluminada da realidade” sendo reconhecida a “dedicação pastoral
aos mais necessitados”.
No dia 25, a homenagem constou da inauguração,
pelas 10,30 horas, do busto do primeiro Bispo de Setúbal, obra do professor Amílcar
Souza, no átrio da escola, a que se seguiu, na biblioteca, a o lançamento da
emissão dum selo comemorativo
de Dom Manuel Martins, espaço onde está patente uma exposição interativa de
fotografias, obras e manuscritos do primeiro Bispo de Setúbal, subordinada ao
tema “Quero Que Sejas Tu”. Depois, decorreu, no auditório da Escola, a sessão
solene, com a presença um painel de debate intitulado
“O Legado Social de D. Manuel Martins”,
sob a moderação de António Sousa Duarte, seu biógrafo.
Compunham o painel de convidados, além de João Costa,
Secretário de Estado da Educação, Ricardo Oliveira, Vereador da Educação, Nuno
Costa, Presidente da Junta de Freguesia de São Sebastião: Eugénio Fonseca, Presidente
da Cáritas Portuguesa; Maria Odete Marques, professora aposentada, que
colaborou com a Diocese de Setúbal na Pastoral Familiar; e o Padre Constantino
Alves, pároco de Nossa Senhora da Conceição – personalidades para quem o
prelado sadino fora um mestre e um pai. E o atual Bispo de Setúbal, Dom José
Ornelas, encerrou o painel.
O Secretário de Estado da Educação abriu o painel
congratulando-se pela comemoração dupla dos 35 anos da Escola Secundária Dom
Manuel Martins, “que não trabalha para os rankings
nem para as notas, mas para todos, sem discriminar ou segregar” e da homenagem
ao falecido prelado emérito. Segundo este membro do executivo de António Costa,
o então Bispo de Setúbal cumpre os requisitos do perfil do aluno, definido pelo
Ministério da Educação como “aquele que sabe muitas coisas, mas é capaz de
acolher esse conhecimento e pensar crítica e ativamente sobre o mundo,
relevando-se um cidadão inquieto”.
Maria Odete Costa, por sua vez, frisou que teve o
privilégio de trabalhar com o Bispo, na Pastoral da Família, nascendo a partir
daí uma relação de amizade. E disse:
“No Dom Manuel
encontrei um pastor e um verdadeiro mestre. Ele sabia estar tão próximo da
juventude a quem reconhecia o seu valor. O legado social de Dom Manuel Martins
dá a sua atenção aos jovens, que dizia pertencerem a uma faixa etária ágil, mas
muito frágil.”.
O Padre Constantino Alves iniciou a sua intervenção,
relembrando o momento particular e delicado que se vivia quando aquele Bispo de
Setúbal foi ordenado. O caldeirão revolucionário de 1975, seguido da grande
depressão, os salários em atraso, a fome e as lutas sociais atiravam o distrito
de Setúbal para as manchetes da comunicação social nacional, europeia e
internacional pelas piores razões. Para o primeiro sacerdote ordenado pelo
bispo emérito, no respeitante ao seu legado, “o mais importante é incorporar em
nossas vidas as suas experiências, ensinamentos e os desafios que nos levantou
e continua a levantar ainda hoje”. O sacerdote referiu ainda:
“O Bispo
exercia o carisma da profecia, acolhia trabalhadores, sindicatos e comissão de
trabalhadores. Com uma voz forte anunciava a fome e a injustiça e exploração
dos trabalhadores. Não tinha uma linguagem politicamente correta, embora
dialogasse educadamente com as autarquias e com o poder.”.
E Eugénio Fonseca sustentou que “nasceu de novo” ao
conhecer Dom Manuel, porque “a visão que tinha do meu compromisso cristão era
muito normativa, intimista e não só pela palavra, mas pelas suas atitudes,
percebi o que era ser cristão, que é muito mais exigente que ser católico”.
Dom José Ornelas, em breves palavras, ao encerrar o
painel, sublinhou que a dignidade, liberdade e respeito, valores pelos quais o
homenageado sempre pautou toda a sua vida, só foram possíveis porque era um
homem verdadeiramente livre, com uma vida totalmente configurada com a vida de
Jesus. E confessou:
“Dom Manuel
disse-me várias vezes: ‘de joelhos, só diante de Deus’. Foi assim que ele viveu
toda a vida e assim trilhou um caminho de liberdade e coragem, denunciando as
injustiças sociais.”.
A exposição interativa referenciada integra também a
bicicleta que o primeiro Bispo de Setúbal usou até 2017 (gentileza da família), a par da campanha de
recolha de bens alimentares para o Centro Social Paroquial Dom Manuel Martins.
Depois de inaugurar, em parceria com o Bispo de
Setúbal Dom José Ornelas, o busto acima referido, obra de um professor da
escola, a Diretora daquele estabelecimento de ensino, Clemência Funenga, disse
que aquele busto pretende dar a conhecer o patrono e a sua obra a todos os que
ali entrarem. E explicitou:
“Esta obra era
uma ambição da nossa comunidade educativa. Já há muito que o queríamos fazer,
mas agora só foi possível, e com o apoio, desde a primeira hora, do Senhor
Bispo de Setúbal, D. José Ornelas, a quem agradecemos. Esta é uma forma de manter
viva a memória de D. Manuel Martins e continuar a dar a conhecer a sua vida e
obra.”.
***
No Porto, no dia 20 de janeiro, a homenagem, que
constou de uma sessão solene evocativa, foi promovida pela Fundação Spes, de
que Dom Manuel foi o primeiro Presidente e decorreu na Paróquia de Cedofeita,
comunidade onde o prelado foi pároco entre 1960 e 1969, e constituiu um tempo
de memória e de testemunho sobre a personalidade e a ação pastoral deste Bispo que
faleceu no dia 24 de setembro de 2017.
No painel que preencheu a sessão de homenagem, usaram
da palavra: Dom Carlos Azevedo, Delegado do Conselho Pontifício para a Cultura
no Vaticano; o Dr. Silva Peneda, ex-Ministro do Emprego e da Segurança Social e
ex-Presidente do Conselho de Concertação Social; Luís Morgado, operário e
sindicalista em Setúbal; o Padre José Aires Lobato, vigário geral da diocese de
Setúbal; e Dom António Taipa, Administrador Diocesano do Porto.
Para este painel de oradores foi também convidado
o General Ramalho Eanes, ex-Presidente da República que, por motivos de saúde,
não pôde estar presente. No entanto, a esposa, Dra. Manuela Eanes, esteve
presente testemunhando a profunda amizade que unia o casal Eanes ao falecido Bispo
de Setúbal.
Em declarações à Voz Portucalense, José Ferreira Gomes, Presidente da Fundação Spes
e anfitrião da homenagem, salientou a grandeza da personalidade de Dom
Manuel tendo afirmado que o Bispo de Setúbal “tinha uma presença muito aguda na leitura dos acontecimentos do dia a dia”
sempre muito preocupado com os “problemas
dos mais fracos”.
O Bispo Dom Carlos Azevedo evocou o finado
prelado sadino, salientando ter sido o “primeiro herdeiro do pensamento de Dom
António Ferreira Gomes” na sua presidência da Fundação Spes. Dom Carlos, que
sucedeu a Dom Manuel Martins como Presidente da Fundação Spes, assinalou
ainda que “foi a trabalhar na Fundação” que conheceu mais de perto o
homenageado, em que se revelou a “humanidade do seu trato, a capacidade de
gerar comunhão nos colaboradores, de os incentivar a dar o seu melhor”. O Delegado
do Conselho Pontifício para a Cultura também revelou que o Bispo de Setúbal era
sempre “a favor dos mais desfavorecidos da sociedade” tendo sido, por isso, um
“praticante existencial” dos valores que defendeu Dom António Ferreira Gomes, que
foi Bispo do Porto e figura inspiradora da Fundação Spes, instituição criada em
abril de 1989. Testemunho dessa preocupação com os mais carenciados, eram as
pessoas que o Bispo emérito recebia na Fundação “todas as sextas-feiras” e a
quem ajudava. Isto, segundo Dom Carlos Azevedo, “fazia-o ter contacto com a
realidade concreta das dificuldades das pessoas”.
Por sua vez, o Dr. Silva Peneda sublinhou que, no
tempo em que Dom Manuel foi Bispo de Setúbal, “a fome era uma realidade”
naquela região. O ex-Ministro do Emprego e da Segurança Social, que exerceu
funções ministeriais entre 1987 e 1993, assinalou que o prelado teve uma
“função política fundamental” na diocese de Setúbal. Era ação “política na
verdadeira aceção da palavra”. Sustentando que “era um homem muito corajoso”,
Silva Peneda realçou a importância da ação de Dom Manuel Martins na resolução
do “drama social muito grande” por que passou o distrito de Setúbal nos anos 80
e 90.
Justamente, sobre os aspetos da ação de Dom Manuel
na área social e na defesa dos trabalhadores, falou Luís Morgado, operário e
sindicalista, salientando o apoio que o Bispo deu, em particular, com
declarações à comunicação social, chamando, assim, a atenção da opinião pública
para os problemas por que passavam os trabalhadores em Setúbal. Mas o prelado
não foi apenas uma presença junto dos órgãos de informação; foi-o também junto
dos que mais sofriam o flagelo dos salários em atraso em Setúbal. Segundo Luís
Morgado, “a dinâmica gerada pela presença do Bispo não só ajudou à unidade de
todos os trabalhadores, como ajudou a que se esbatesse a violência que se
estava a desenhar”. E o sindicalista recordou mesmo a ação do prelado na
resolução concreta de uma situação difícil numa empresa.
Por seu turno, o Padre José Aires Lobato destacou
que Dom Manuel Martins foi tendo “um entrosamento progressivo com os
diocesanos” e salientou que foi falando da doutrina social da Igreja que o Bispo
de Setúbal revelou a sua perseverança na prática de “um cristianismo voltado
para o outro”. E comparou o estilo pastoral do prelado sadino com a ação do
Papa Francisco e recordou uma frase pronunciada em várias ocasiões pelo bispo
de Setúbal: “a Igreja se não serve, não
serve para nada”.
Por fim, o Bispo Dom António Taipa, Administrador
Diocesano do Porto, concluiu esta sessão de homenagem e afirmou que o bispo de
Setúbal se revelou “como um homem profundamente livre e profundamente pobre e
particularmente atento às necessidades e carências”. Sublinhou a liberdade do
homenageado, que “significava uma postura de esquecimento de si próprio por
amor dos outros que ia encontrando”. Como ele dizia, “a sua fé em Jesus vivia-a
na relação com os homens, nomeadamente com os homens que sofriam mais”. O
Administrador Diocesano do Porto referiu que o primeiro Bispo de Setúbal era um
homem de uma fé inabalável e confessou que via nele “um grande homem, um grande
Bispo e um grande cristão, apaixonado por Jesus Cristo e que em Jesus Cristo encontrou
a verdade que liberta”.
É ainda de destacar que, no âmbito desta homenagem
no Porto, foi lançado o livro “Nascemos
Livres”, da autoria de Dom Manuel Martins – uma edição da Fundação Spes,
que recolhe textos do homenageado, escritos entre setembro de 2016 e setembro
de 2017 e que foram publicados no ‘Jornal
de Matosinhos’.
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Os justos florescerão como a palmeira e
crescerão como os cedros do Líbano (Sl 92,12).
Sim. A Palmeira adapta-se bem a qualquer ambiente: zona rural,
urbana e interior. O seu tamanho varia de acordo com o seu aproveitamento e
condições ambientais. Pode crescer até 10 metros ou mais. Desta árvore
aproveita-se tudo e ela produz fibras, óleos, ceras, etc. São características
marcantes da palmeira o crescimento, a adaptação e a estabilidade.
A
resistência a ventos e tempestades é uma outra caraterística desta árvore. Balança,
perde folhas, mas não cai facilmente. É muito trabalhoso arrancar uma palmeira
adulta do solo. A palmeira destaca-se, é visível a longas distâncias.
Como
ela é o servo de Deus: é notado pela sua maneira especial de ser. O seu amor e
testemunho alcançam vidas, mesmo que estas estejam em lugares longínquos.
Mais: sujeito a “ventos fortes e
tempestades”, por vezes, fica machucado, mas a graça de Deus sustenta-o dando-lhe
vida e vigor para amparar os mais fracos.
Por seu turno, o cedro
do Líbano cresce devagar, mas chega a atingir a altura de até 40 metros. Nos
primeiros três anos de vida, as raízes crescem até metro e meio de
profundidade, enquanto a planta tem somente cerca de cinco centímetros. Só a
partir do quarto ano é que a árvore começa a crescer. O cristão é como o cedro
do Líbano, pois tem a promessa de crescer sem desfalecimento. Ainda que o seu
crescimento seja lento conforme a experiência do cedro, crescerá e se tornará
visível e útil a todos.
E quero considerar
Dom Manuel Martins como a palmeira florescida e o cedro do Líbano crescido.
2018.01.30 – Louro de Carvalho
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