segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

O caso do Padre Giselo já conhece desfecho

Com data de 28 de janeiro de 2018, o Padre Carlos Almada, Secretário Episcopal da diocese do Funchal, tornou pública uma nota da Secretaria Episcopal em que dá conta do decreto do Bispo diocesano, de 25 de janeiro, que nomeia, “como Administrador Paroquial da Paróquia do Monte, o Reverendo Cónego Vítor dos Reis Franco Gomes, pároco da Sé, em regime de acumulação de funções. E aduz que o ora nomeado “já ali paroquiou, conhece o meio e as pessoas e aceitou generosamente prestar esta colaboração”.
Mais refere que se trata de uma situação provisória. Porém, apesar das limitações que lhe são inerentes, garante que “tudo se fará para levar por diante os projetos em curso, nomeadamente a tão desejada construção da capela da Imaculada Conceição, nas Babosas, como sinal de consolação e esperança”.
É verdade que a mesma nota refere que a nomeação do novo administrador da paróquia surge para substituir o Padre Giselo Andrade.
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A referida nota da Secretaria Episcopal reconhece a ampla difusão que, na Madeira e não só, foi dada ao caso do sacerdote diocesano, até agora pároco do Monte, “que assumiu publicamente a paternidade de uma criança”. E sublinha que o sacerdote manifestara, com tal gesto e “no compromisso de assumir todas as responsabilidades inerentes à situação criada” apurado sentido de responsabilidade.
Este sentido de responsabilidade foi apreciado por muita gente, muito embora se tenham também percebido os aspetos negativos que o caso comporta.
E o documento episcopal recorda que, “na verdade, os sacerdotes católicos aceitam e comprometem-se, em plena liberdade, a viver o dom do celibato no seu ministério de serviço ao Povo de Deus, em conformidade mais plena a Cristo Pastor, com frutos abundantes para a Igreja, ainda que com o sacrifício de algumas expressões e alegrias da vida familiar”.
Por outro lado, salienta o facto de esta situação ter gerado, “nos órgãos da comunicação social e nas redes sociais”, tanto “uma oportunidade de debate e reflexão” como um pretexto e “uma ocasião ou motivo para questionar e contestar a atual disciplina da Igreja, desconhecendo-se o sentido espiritual da mesma”.
Com efeito, o celibato sacerdotal obrigatório é-o para a Igreja Latina e com hiatos ao longo da História da Igreja, embora de forma ininterrupta desde o Concílio Tridentino. Não é uma exigência dogmática, mas disciplinar. Tanto assim é que as Igrejas do Oriente, mesmo as que estão em comunhão com o Bispo de Roma, ordenam de presbíteros homens casados. Porém, nem é de entre estes que são escolhidos os Bispos nem eles voltarão a casar se enviuvarem.
Também sucede que os pastores de outras confissões religiosas, casados, que se converterem ao catolicismo, podem continuar na liderança eclesial, se o pretenderem, em consonância com as respetivas esposas, sendo-lhes, para o efeito, ministrado o sacramento da Ordem até ao grau de presbítero, inclusive.
Todavia, apesar de não se tratar de uma exigência dogmática, não devem obnubilar-se as vantagens do celibato eclesiástico, sobretudo se resultar da livre e inteiramente responsável opção pessoal em prol do bem da Igreja, que se sintetizam nos seguintes pontos: conformação mais plena com a Pessoa de Cristo e seu perfil de profeta, sacerdote e rei – na linha da amorosa  e eloquente entrega voluntária e sacrificial ao Pai pela vida dos homens; o testemunho, por antecipação, da vida escatológica, onde as pessoas vivem sem as limitações e exigências corporais; e a maior disponibilidade, sem divisão de coração e dispersão de preocupações.    
Também o documento episcopal da diocese da Madeira refere que “a Igreja não é estática, é dinâmica; tem uma história que lhe permite reconhecer e avaliar os seus valores e as suas faltas, o positivo e o negativo da sua presença junto das pessoas e da sociedade”, mas entende que as mudanças “não se operam por razões de mera popularidade ou estatística de opiniões”.
Ora, isso é inteiramente verdade e assim deve ser. No entanto, a questão merece debate, porquanto, sendo a Eucaristia a expressão eminente da vida da Igreja e a celebração de excelência do mistério da Fé, é temerário prosseguir na privação da celebração eucarística muitas das nossas comunidades. E, embora seja altamente meritório o encargo confiado aos leigos nas celebrações da Palavra com distribuição da Sagrada Comunhão, dentro do quadro que lhes cabe, por direito próprio, por terem sido incorporados em Cristo pelo Batismo, com a mesma força com que lhes foi confiado o múnus de “anunciar e testemunhar Jesus Cristo no mundo (família, escola, trabalho, diversão, associações, etc.)”, como escreve o reverendo pároco de Tarouca, tal não devia acontecer exclusivamente por falta de padres. É, pois, justo que se comece a pensar, ao menos, na ordenação de pessoas maduras para o ministério presbiteral, mesmo que sejam casadas.     
É óbvio que todos sabemos que ninguém obrigou os candidatos à ordenação e que eles já sabiam quais eram as condições. Contudo, não estamos a lidar com pessoas perfeitas; e não vale a pena remar contra a corrente quando ela absorve as pessoas. Contra o não querer ou não se sentir capaz pouco há a fazer.
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Relativamente ao até agora pároco do Monte, diz a aludida nota que “ele próprio manifestou o desejo de continuar a exercer o ministério sacerdotal, nas condições exigidas pela Igreja”. Neste sentido e desde logo, se sentiu na necessidade “de um discernimento claro, em ordem a uma opção responsavelmente assumida e maturada na reflexão e na oração, um discernimento feito com serenidade e livre de pressões, acompanhado pelo Bispo da Diocese”
No cume de tal discernimento, “após diálogos com o próprio sacerdote, ouvidas algumas instâncias da Igreja e percecionando um sentido eclesial comum, por parte de sacerdotes, consagrados e leigos”, ou seja, tentando apurar-se um determinado sensus Ecclesiae, entendeu-se constituir “maior bem para o padre Giselo Andrade e para a Igreja diocesana” dispensá-lo da paroquialidade do Monte, mas facultando-lhe a continuação do exercício do ministério pastoral, “através de algumas atividades que lhe estavam já confiadas, na área das comunicações, e outras que eventualmente lhe sejam atribuídas”.
Não se deixa de aplaudir a adoção dum tempo e dum perfil de discernimento consentâneo com a delicadeza da situação, a pressuposta solicitude do clero da diocese e o acompanhamento discreto do Ordinário diocesano. Todavia, parece que seria vantajoso que esse discernimento pudesse ter começado ainda antes da pública assunção da paternidade, que não devia fazer-se esperar (ou seja, tal assunção não foi feita demasiado cedo). Por outro lado, embora entenda que tenha sido favorável uma saída do pároco da paróquia do Monte, questiono-me por que motivo não lhe são atribuídas funções de paroquialidade noutra freguesia ou como pároco in solidum ou como adjunto paroquial.
Um padre no ministério sacerdotal em funções na área das comunicações parece configurar uma solução menor e de meio-termo ou, mesmo, uma postura de querer agradar a gregos e a troianos, o que não é de todo esclarecedora.
Oxalá eu não tenha razão. Não queria que eventualmente se tivesse perdido a oportunidade de clarificar a posição da Igreja não dando azo às más-línguas que tudo querem derrubar ou àqueles para quem está sempre tudo bem ou por servilismo ou por indiferença.

2018.01.29 – Louro de Carvalho

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