segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Virão adorar o Senhor todos os povos da Terra


Celebrou-se hoje, 6 de janeiro, a Solenidade da Epifania do Senhor e os textos assumidos para a liturgia foram Is 60,1-6 (1.ª leitura), Ef 3,2-3a.5-6 (2.ª leitura) e Mt 2,1-12 (3.ª leitura, Evangelho).
O termo epifania é uma modalidade da teofania. Houve, de facto, muitas teofanias ou manifestações de Deus no AT (Antigo Testamento). São conhecidas as plasmadas no arco-íris, na nuvem, no trovão e na Sarça Ardente. Só que estas são de âmbito limitado, reservadas aos velhos Patriarcas e aos líderes de Israel. E o Natal é a grande teofania de Deus manifestado num menino reclinado na manjedoura dum estábulo, cantado pelos anjos e visitado pelos pastores, mas tudo na Palestina. Ora, a Epifania é a manifestação do Senhor para fora, ou seja, a revelar-Se aos gentios, hoje representados pelos Magos (cf Ef 3,6), desvendando-se “a verdade sublime de que “Deus veio para todos: todas as nações, línguas e povos são acolhidos e amados por Ele” – facto simbolizado na luz, que tudo alcança e ilumina (cf homilia do Papa, de hoje).
E esta revelação sucede por iniciativa de Deus, que dá os seus sinais e Se mostra em Jesus, o qual põe os discípulos a correr o mundo anunciando a Boa-Nova. Com efeito, Paulo conhece “o mistério”, desígnio ou projeto salvador de Deus, definido desde toda a eternidade, escondido durante séculos, revelado e concretizado plenamente em Jesus, comunicado aos apóstolos, desfraldado e dado a conhecer ao mundo na e pela Igreja. E a Paulo, apóstolo como os Doze, também foi revelado esse “mistério” que ele desvela aos crentes de fora da Palestina.
E o mistério consiste na verificação de que, em Cristo, chegou a salvação definitiva para os homens, que não é exclusivamente para os judeus, mas se destina a todos os povos da terra, sem exceção. Agora, judeus e gentios são membros de um mesmo e único “corpo” (o “corpo de Cristo” ou “Igreja”), partilham o mesmo projeto que os faz, em igualdade de circunstâncias, “filhos de Deus” e todos participam da promessa feita por Deus a Abraão (cf Gn 12,3) – promessa que Jesus realizou em pleno. E o profeta Isaías apresenta a luz de Deus que incide sobre Jerusalém. Inspirado pelo sol nascente que ilumina as belas pedras brancas das construções de Jerusalém e faz a cidade transfigurar-se pela manhã, o profeta anuncia a chegada da luz salvadora de Deus, que dará à cidade um rosto jovial e atraente.
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Mas a Epifania tem de acontecer também pelo movimento dos homens. O profeta refere que a predita luz fará concentrar na cidade iluminada os olhares de todos os que esperam e procuram a salvação. Por consequência, Jerusalém será abundantemente repovoada (com o regresso de muitos “filhos” e “filhas”) e os povos convergirão para Jerusalém, inundando-a de riquezas (nomeadamente, incenso para o serviço do Templo) e cantando os louvores de Deus. 
E o Papa Francisco, um profeta dos nossos tempos diz que surpreende o modo como o Senhor Se revela a todos. Na homilia de hoje, refere que o Evangelho mostra “o redopio de gente desencadeado em torno do palácio do rei Herodes”, quando se designa Jesus como rei.
Os magos, vindos do Oriente e que tinham visto a estrela do Rei dos Judeus, perguntavam onde estava o rei dos judeus que acabava de nascer. Haviam de O encontrar. Encontrá-Lo-iam, não no palácio real de Jerusalém, “mas numa casa humilde de Belém” – diz o Pontífice.
Já tinha sucedido isso no Natal: nenhum dos poderosos de então se apercebeu de ter nascido, nos seus dias, o Rei da história. E, mais tarde, quando Jesus Se manifesta publicamente, tendo o Batista como precursor, o Evangelho proporciona a apresentação do contexto: depois de elencar todos os grandes de então, no poder secular e no religioso (Tibério César, Pôncio Pilatos, Herodes, Filipe, Lisânias, os sumos-sacerdotes Anás e Caifás), conclui que “a Palavra de Deus foi dirigida a João, filho de Zacarias, no deserto” (Lc 3,2), ou seja, não foi dirigida a nenhum grande. E esta é a surpresa: Deus não sobe à ribalta do mundo para Se manifestar – frisa o Papa.
A estrela de Jesus poderia ter aparecido em Roma, sede do Império, que se tornaria cristão de imediato, ou poderia ter brilhado no palácio de Herodes e este poderia “fazer o bem em vez do mal”. Porém, em vez do êxito, poderíamos assistir ao insucesso, revolta ou encandeamento. E Francisco assegura que “a luz de Deus não vai para quem brilha de luz própria” e “Deus propõe-Se, não Se impõe; ilumina, mas não encandeia”. E esclarece o mysterium lunae  da Igreja:
É sempre grande a tentação de confundir a luz de Deus com as luzes do mundo. Quantas vezes corremos atrás dos clarões sedutores do poder e da ribalta, convencidos que prestamos um bom serviço ao Evangelho! Mas, assim, voltamos os holofotes para o lado errado, porque Deus não estava lá. A sua luz amável resplandece no amor humilde. Além disso, quantas vezes tentamos, como Igreja, brilhar de luz própria! Mas, não somos nós o sol da humanidade; somos a lua que, mesmo com as suas sombras, reflete a luz verdadeira, o Senhor. A Igreja é mysterium lunae e o Senhor é a luz do mundo (cf Jo 9,5). Ele…, não nós!”.
Vincando que “a luz de Deus vai para quem a acolhe”, comenta o texto de Isaías, segundo o qual “a luz divina não impede as trevas e o nevoeiro denso de cobrirem a terra, mas resplandece em quem está pronto para a receber”, não na indiferença e inércia (de escribas e sacerdotes do palácio). Assim, o profeta convida interpelando: “Levanta-te e resplandece”. E considera o Papa:
É preciso levantar-se, isto é, erguer-se do próprio sedentarismo e prontificar-se a caminhar. Caso contrário, fica-se parado como os escribas consultados por Herodes, que sabiam bem onde nascera o Messias, mas não se moveram. Além disso, é preciso revestir-se de Deus – que é a luz – todos os dias, até que Jesus Se torne a nossa vestimenta diária.”.
Porém, para se revestir da luz de Deus, é preciso despojar-se das roupas vistosas que impedem de receber a divina luz, como aconteceu com Herodes. Já os magos cumprem a profecia, pois, como diz o Bispo de Roma, “levantam-se para serem revestidos de luz”. Só eles viram a estrela de Jesus no céu.
Depois, é preciso ter em conta que, para encontrar Jesus, é preciso enveredar pelo caminho certo e permanecer nele. Quando os magos se desviaram da rota certa, deixaram de ver a estrela e foram ter a Jerusalém em vez de Belém, ao Palácio em vez da casa humilde. Não se pode seguir o caminho de Herodes (distinto do caminho do mundo), do medo, da inveja, do cinismo, da perfídia. Ao direcionarem-se para Belém, recuperaram a visão da estrela e chegaram ao sítio certo. E o Papa assegura que, na conclusão desta passagem evangélica se diz que os magos, tendo encontrado Jesus, ‘regressaram ao seu país por outro caminho’ (Mt 2,12), um caminho como o percorrido pelos que estão com Jesus no Natal: Maria e José, os pastores. Como eles, os magos, deixaram as suas casas e tornaram-se peregrinos pelas rotas de Deus. De facto, “só encontra o mistério de Deus quem deixa os próprios apegos mundanos e se põe a caminho”.
E não basta saber onde nasceu Jesus, como os escribas, se não caminharmos até ao lugar indicado; não basta saber que Jesus nasceu, como Herodes, se não O encontrarmos. Quando o onde de Jesus se torna o nosso, Jesus nasce dentro e torna-Se Deus vivo para cada um de nós.
Depois, Francisco refere que os magos “não discutem, caminham”; não ficam de fora a ver, entram na casa; não se colocam no centro, prostram-se-lhe aos pés; não se fincam nos seus planos, prontificam-se a tomar outro rumo; têm um contacto estreito com Jesus, uma abertura radical, um envolvimento total. Mais: os magos vão ter com o Senhor, não para receber, mas para dar. Com efeito, o Evangelho contém uma trilogia de prendas: ouro, incenso e mirra. O ouro, como o elemento mais precioso, lembra que Deus merece o primeiro lugar, o da adoração, para o que temos de nos privar do primeiro lugar e “considerar-nos necessitados, não autossuficientes”; o incenso, que simboliza o relacionamento com o Senhor na oração, sendo que, para exalar o seu perfume, se deve queimar, lembra que é preciso ‘queimar’ um pouco de tempo na oração com o Senhor; e a mirra, unguento que seria utilizado para envolver amorosamente o corpo de Jesus descido da cruz (cf Jo 19,39), sugere que agrada ao Senhor que cuidemos dos corpos provados pelo sofrimento, da sua carne mais frágil, de quem ficou para trás”. Com efeito, recorda o Pontífice fazendo a apologia da gratuitidade:
É preciosa aos olhos de Deus a misericórdia com quem não tem para restituir, a gratuitidade. É preciosa aos olhos de Deus a gratuitidade. Neste tempo de Natal que está a terminar, não percamos a ocasião para dar um lindo presente ao nosso Rei, que veio para todos, não nos cenários faustosos do mundo, mas na pobreza luminosa de Belém. Se o fizermos, resplandecerá sobre nós a sua luz.”.
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Sobre a Epifania, o SNPC (Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura), no respetivo site, publica um texto de Ermes Ronchi (a parti do Avvenire), traduzido por Rui Jorge Martins, sob o título “Epifania, festa dos buscadores de Deus a caminho”. 
Segundo o autor, esta é “a festa dos buscadores de Deus, dos que estão longe”, mas que se puseram a caminho atrás de palavras como as de Isaías: “ergue a cabeça e vê” – dois verbos belíssimos, em que um (ergue a cabeça) faz olhar para o alto e à volta e leva a abrir “as janelas de casa ao grande respiro do mundo”; e o outro () faz procurar “uma fissura, um espaço de céu, uma estrela polar, e de lá interpreta a vida, a partir de uma perspetiva elevada”.
E diz o autor que o Evangelho (Mt 2, 1-12) “narra a procura de Deus como uma viagem, ao ritmo da caravana, nos passos de uma pequena comunidade”. Na verdade são três (uma comunidade) que “caminham juntos, atentos às estrelas” e “uns aos outros”; e fixam “o céu e os olhos de quem caminha ao lado, abrandando o passo segundo a medida do outro, de quem está mais fatigado”.
A seguir, regista que surpreendentemente:
O caminho dos magos está cheio de erros: perdem a estrela, encontram a grande cidade em vez da pequena povoação; perguntam pelo menino a um assassino de meninos; procuram um palácio e encontram um casebre. Mas têm a infinita paciência de recomeçar”.
E extrai a lição: “o nosso drama não é cair, mas rendermo-nos às quedas”.
Depois, os magos veem o Menino nos braços da mãe, prostram-se e oferecem-Lhe presentes, mas o presente mais precioso é “a sua própria viagem” ou “os meses passados à procura, andar e andar atrás de um desejo mais forte que desertos e fadigas”.
E outra lição: “Deus tem sede da nossa sede: o nosso presente maior”.
“Entraram, viram o Menino e a Sua Mãe e adoraram-No”. E isto constitui uma lição misteriosa: não adoraram aqui “o homem da cruz” ou “o ressuscitado”, nem “um sábio de palavras de luz nem um jovem na plenitude do vigor”, mas “simplesmente um menino”. De facto, “não é só no Natal que Deus é como nós, não só é o Deus connosco, mas é um Deus pequeno entre nós”, de quem “não se pode ter medo” nem “distância”. Por isso, Se fez menino.
Herodes mandou que se informassem com cuidado sobre o Menino e lho transmitissem, para que também ele O fosse adorar. É “o homicida de sonhos ainda embrulhados em faixas” que também “está dentro de nós”, com “o cinismo, o desprezo que destroem sonhos e esperanças”. Era pertinente, como diz o autor, “resgatar aquelas palavras da profecia de morte com que foram proferidas e repeti-las ao amigo, ao teólogo, ao artista, ao poeta, ao cientista, ao homem de rua, a cada um: ‘encontraste o Menino?’, para recomendar depois:
Continua à procura, cuidadosamente, na história, nos livros, no coração das coisas, no Evangelho e nas pessoas; continua a procurar atentamente, fixando os abismos do céu e os abismos do coração, e depois conta-mo como se conta uma história de amor, para que também eu vá adorá-lo, com os meus sonhos resgatados de todos os Herodes da história e do coração”.

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Também, antes da recitação do Angelus, o Papa Francisco falou aos peregrinos frisando a manifestação de Jesus simbolizada pela luz, que, nos textos proféticos, é promessa. Isaías, de facto, dirige-se a Jerusalém convidando: “Levanta-te, brilha, pois chegou a sua luz, a glória do Senhor brilha sobre ti”. E este convite “aparece surpreendente, porque se insere depois do duro exílio e das inúmeras opressões que o povo havia vivido” diz o Papa, que vinca:
Este convite, hoje, ressoa também para nós, que celebramos o Natal de Jesus e nos encoraja a deixar-nos alcançar pela luz de Belém. Também nós fomos convidados a não nos deter nos sinais exteriores do acontecimento, mas a recomeçar dele e percorrer em novidade de vida o nosso caminho de homens e fiéis.”.      
Com efeito, “a luz que o profeta Isaías tinha pré-anunciado, no Evangelho está presente e foi encontrada. É Jesus, nascido em Belém, que veio trazer a salvação a próximos e a distantes: a todos – sendo que Mateus mostra diversos modos pelos quais se pode encontrar Cristo e reagir à sua presença. Assim, o Papa sublinhou que “Herodes e os escribas”, com um coração duro e obstinado, rejeitaram a visita do Menino, fecharam-se “para a luz”, representando todos os que “têm medo da vinda de Jesus e fecham o coração aos irmãos e às irmãs que necessitam de ajuda”. Herodes, com medo de perder o poder, não pensa no bem das pessoas, mas na própria vantagem; e os escribas e chefes do povo têm medo porque, não sabendo olhar além das próprias certezas, não conseguem colher a novidade que está em Jesus.
Já os magos, vindos de longe, representam todos os povos distantes da fé hebraica e deixam-se guiar pela estrela, abertos à “novidade”. Revela-Se-lhes Deus feito homem e eles prostram diante de Jesus e oferecem dons simbólicos, porque “a busca do Senhor implica não só a perseverança no caminho, mas também a generosidade do coração”. Depois, regressaram ‘ao seu país’, não pela via de Herodes, mas levando dentro de si o mistério daquele Rei humilde e pobre. Terão contado a experiência: a salvação oferecida por Deus em Cristo é para todos os homens. Não é possível tomar posse do Menino, um dom para todos. E o Pontífice exorta:
Façamos também nós um pouco de silêncio em nosso coração e deixemo-nos iluminar pela luz de Jesus que provém de Belém. Não permitamos que os nossos medos nos fechem o coração, mas tenhamos a coragem de nos abrir a esta luz que é mansa e discreta.[…] Então, como os Magos, experimentaremos uma grande alegria que não poderemos manter para nós. Que nos sustente neste caminho a Virgem Maria, estrela que nos conduz a Jesus, e Mãe que mostra Jesus aos Magos e a todos aqueles que se aproximam dele.”.
Depois do Angelus, Francisco referiu alguns aspetos da atualidade:
- Sabendo que, durante vários dias, 49 pessoas resgatadas no Mediterrâneo estão a bordo de dois navios de ONGs, em busca de refúgio seguro para a terra, dirigiu “um apelo sincero aos líderes europeus para que demonstrem a sua solidariedade para com essas pessoas”.
- Anotando que algumas igrejas orientais, católicas e ortodoxas, seguindo o calendário juliano, celebrarão o Natal no dia 7, saudou-as cordial e fraternamente “no sinal de comunhão entre todos nós cristãos, que reconhecem a Jesus como Senhor e Salvador”. 
- Referindo a Epifania é também o Dia Missionário da Juventude, frisou que este ano convida os jovens a serem “atletas de Jesus”, para testemunhar o Evangelho na família, na escola e nos locais de lazer.
- Dirigiu cordial saudação a todos os peregrinos, famílias, paróquias e associações, provenientes da Itália e de diferentes países e, em particular, aos fiéis de Marsala, Peveragno e San Martino in Rio, os meninos do Cresima di Bonate Sotto e o grupo “Fraterna Domus”. E endereçou uma saudação especial à procissão histórico-folclórica que promove os valores da Epifania e que este ano é dedicada ao território de Abruzzo, mencionou a procissão dos magos que ocorre em muitas cidades da Polónia com grande participação de famílias e associações; e saudou os músicos da banda que ouviu tocar, incitando a que continue a tocar a alegria deste dia da Epifania.
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Enfim, doutrina, reflexão, preocupação e simpatia!
2019.01.06 – Louro de Carvalho

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