segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Parceria entre ensino secundário e ensino superior, a solução


Segundo os dados conhecidos, apenas 4 em cada 10 alunos que frequentam e concluem o ensino secundário prosseguem estudos no ensino superior, ou seja, 60% dos alunos do ensino secundário não prosseguem estudos superiores e, entre estes, estão os que frequentam o ensino profissional, que menos interesse mostram em obter um diploma universitário ou politécnico. A isto junta-se, segundo texto do “educare.pt”, de hoje, dia 7 de janeiro, a taxa de 55% de adultos entre os 25 e os 64 anos que não tem o ensino secundário completo, estando encontrados, assim, os dois grandes públicos-alvo por onde o ensino superior poderá ainda crescer, do ponto de vista da investigadora Cláudia Sarrico, uma das oradoras na Convenção do Ensino Superior 2020-2030, no ISCTE-IUL, em Lisboa, promovida pelo CRUP (conselho de reitores das universidades portuguesas).
A mesma investigadora do CIPES (Centro de Investigação de Políticas do Ensino Superior), professora no ISEG (Instituto Superior de Economia e Gestão) e analista de políticas de ensino superior da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), sustenta que uma das soluções para incrementar o aumento do número de alunos nas universidades e institutos politécnicos pode ser numa parceria entre ensino secundário e ensino superior. E entende que é “sobretudo do lado dos adultos, onde o potencial e necessidade de formação é ainda elevado”, que melhor se aplicaria uma colaboração maior entre o ensino secundário e o ensino superior, delineando “formações à medida dessas pessoas”, de conclusão do ensino secundário que permitam a prossecução para o ensino superior e a motivem.
Além disso, pensa que, tanto para os adultos como para os alunos mais novos, é preciso “diversificar a oferta” e ligá-la às empresas, serviços públicos, setor social e municípios, pois “só nesta base de diálogo será possível ter um ensino superior que contribua para o desenvolvimento da economia e da sociedade”. A este respeito, Cláudia Sarrico disse à Lusa:
O objetivo tem que ser aumentar a participação de forma sustentada e a oferta tem que ser adequada e diversificada. Se vamos buscar novos públicos, vamos ter que diversificar a oferta. Portugal não tem tido essa tradução e parece-me que pode criar isso.”.
E citou exemplos que estudou e conhece bem, como o caso holandês, onde a ligação do ensino profissional ou vocacional às universidades de ciências aplicadas (equivalentes aos institutos politécnicos portugueses) e destas aos parceiros sociais se tem mostrado profícua e tem revelado sucesso, sobretudo no atinente à inserção no mercado de trabalho.
Ainda no âmbito do exemplo da Holanda, mas no respeitante ao financiamento do ensino superior, a analista adianta que o sistema de empréstimos a estudantes com garantia do Estado “está a ganhar terreno na Europa”, retirando parte da responsabilidade do custo às famílias, e refere que, no caso português, “o peso do financiamento suportado pelas famílias, através das propinas, tem um peso relativo superior a outros países europeus e pode estar a funcionar como entrave ao acesso”. E diz a investigadora e analista:
O que muitos países estão a introduzir são os sistemas de empréstimo com garantia do Estado. É a ideia de um estudante poder pedir empréstimo para estudar e aí não há entrave, porque todos recebem o empréstimo desde que sejam elegíveis para frequentar o ensino superior. Vão pagá-lo se e quando atingirem determinado nível de rendimento.”.
Admitindo riscos neste modelo de financiamento (ainda com expressão muito reduzida em Portugal), diz que, para evitar casos de incumprimento e de peso na despesa do Estado, é precisa regulação, desde logo na seleção de alunos à entrada, que se mostrem motivados para concluir o curso e obter as competências necessárias para emprego com um nível remuneratório suficientemente elevado que permita pagar o empréstimo, evitando que as universidades possam estabelecer o recrutamento de alunos sem critério, apenas com o objetivo de obter o financiamento que cada estudante representa por via do empréstimo concedido ‘a priori’. Mas é também preciso, segundo ela, “regular as propinas, estabelecendo um limiar máximo nos valores que as instituições podem cobrar, não permitindo que entrem numa lógica de mercado e de competição em serviços e instalações oferecidas aos alunos sem efeitos na qualidade do ensino”.
O financiamento do ensino superior é um dos painéis de discussão na predita convenção e tem, entre os oradores, o presidente do SNESup (Sindicato Nacional do Ensino Superior), Gonçalo Leite Velho, que revelou à Lusa aproveitar o momento, que contará com a participação do Secretário de Estado do Orçamento, João Leão, para alertar para “o défice de financiamento”, sendo que as instituições precisam do reforço de 200 milhões de euros para garantir o normal funcionamento.
À pressão no financiamento com a redução do valor de propinas cobradas pelas universidades acresce a tensão com as progressões remuneratórias dos docentes, ainda por resolver, e a precariedade, com Leite Velho a advertir que aumentou o número de docentes a lecionar a tempo inteiro, mas com contratos a tempo parcial, dando o exemplo da UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro), liderada pelo presidente do CRUP, António Fontainhas Fernandes.
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A 17 de novembro de 2018, a Comissão Europeia dava conta de que os portugueses estão entre os europeus que mais pagam para se diplomarem e que Portugal é dos países que exigem propinas mais altas aos estudantes estrangeiros.
Por outro lado, na celebração do Dia internacional do Estudante, data que tem sido assinalada, nos últimos anos, com várias manifestações e protestos um pouco por todo o país, as associações de estudantes exigiam a redução do valor da propina ou mesmo a sua eliminação – um tema que tem dividido a opinião pública, as bancadas no Parlamento e até os reitores e os presidentes das várias universidades e politécnicos.
Porém, o Orçamento do Estado para 2019 contempla uma descida de 200€ no valor da propina máxima, medida que vem contrariar a rota crescente de evolução do valor da propina no ensino superior português. Com efeito, entre 1991 e 2015, o valor aumentou de 6,50€ para os atuais 1.063,47€ números que colocam as famílias portuguesas entre as que mais pagam pelo ensino superior. Estes números constam do 7.º relatório anual da rede Euridyce, intitulado ‘National Student Fee and Support Systems in European Higher Education’ e disponibilizados, a 16 de novembro, pela Comissão Europeia.
Regra geral, as famílias do norte da Europa são as que têm menos encargos com um filho a frequentar o ensino superior. E, na Dinamarca, Noruega, Finlândia e Escócia, os estudantes não pagam qualquer taxa para se licenciarem. O mesmo se passa em países do sul da Europa como a Grécia, a Áustria e a Turquia. Porém, obter um diploma em Portugal, até este ano letivo, custa entre 3.000 a 9.000 mil euros – o mesmo que em Espanha, Suíça, Itália, Hungria, Holanda e Irlanda. Ainda assim, estes países têm em conta a condição financeira das famílias, sendo os custos suportados em parte ou na totalidade pelo Estado. Em Portugal, as bolsas cobrem a parte ou totalidade do valor da propina; e, noutros países, para lá das bolsas de estudo é possível a concessão de empréstimos bancários, sendo que, na Inglaterra, as famílias apenas podem recorrer a empréstimos bancários.
Ao mesmo tempo que o OE 2019 vai obrigar as universidades e institutos politécnicos a reduzirem a propina, o Governo abrirá mais 2.500 vagas para estudantes estrangeiros. Este ano podiam estudar nas instituições de ensino superior portuguesas 10.200 estrangeiros, ao passo que, em 2019, vão ser 12.700 – o que levará a comunidade estudantil estrangeira a representar já 1/6 de toda a comunidade académica, apesar de, segundo o relatório da Comissão Europeia, Portugal estar entre os países que mais cobra aos estudantes estrangeiros. Desde 2014, um estudante estrangeiro cá paga mais que o português. Com a entrada, então, do novo estatuto, as instituições de ensino superior passaram a poder cobrar um valor (de propina) equivalente ao custo real da formação e, como a lei não estabelece limites, cabe-lhes a elas fixar valores.
Regra geral, os países europeus cobram aos estudantes internacionais mais que aos seus estudantes nacionais ou, pelo menos tanto como a estes, destacando-se a Noruega onde nenhum estudante paga para se licenciar: nem norueguês, nem internacional.
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Segundo se lê no Portal do Governo, o MCTES (Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior) afirmou que o Governo tem o objetivo de reduzir os custos das famílias com filhos no ensino superior para promover a igualdade de oportunidades e uma sociedade mais equitativa”.
Com efeito, em Lisboa, na Convenção Nacional do Ensino Superior 2030, o governante referiu que a intenção é “ir ao encontro dos ideais europeus que ‘levam a pensar que não são os estudantes e as famílias que têm de cobrir grande parte das despesas, mas sim aqueles que beneficiam do ensino superior’, tendo destacado que, nos últimos três anos, o Governo já aumentou em 24% o número de bolsas de ação social escolar e que os portugueses terão de fazer um esforço coletivo para que Portugal possa acompanhar a tendência europeia”. E disse:
Temos um sistema muito diversificado na Europa, mas a tendência normal é reduzir, no prazo de uma década, os custos das famílias sem reforçar a carga fiscal, mas equilibrando os rendimentos, para que sejam os beneficiários individualmente e os empregadores a ter maiores contribuições no ensino superior”.
O Ministro referiu que “aprender no ensino superior garante acesso a melhores empregos”, sendo, assim, “fulcral alargar esta possibilidade a mais jovens, reduzindo os custos diretos das famílias e promovendo a igualdade de oportunidades na construção de uma sociedade mais equitativa e com um ensino superior menos elitista, massificado e mais aberto a todos”.
Nos últimos três anos, registou-se um crescimento de “cerca de 290 milhões de euros do investimento público e privado na investigação e desenvolvimento”, mas Heitor reiterou as metas mais ambiciosas para alcançar até 2030: “duplicar a despesa pública e multiplicar por quatro a despesa privada”. E acrescentou a meta de aumentar a percentagem de jovens no ensino superior: “se hoje temos 4 em cada 10 jovens de 20 anos no ensino superior, temos de chegar a 6 em cada 10 jovens com 20 anos a participar no ensino superior”.
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Porém, segundo a Lusa, o MCTES clarificou que o fim das propinas no prazo duma década “deve ser um cenário favorável”, reconhecendo que tal só será possível com “um esforço coletivo de todos os portugueses”. Pelo menos, diz que têm de se implementar políticas que garantam a redução dos custos das famílias com filhos no ensino superior e admitir o fim das propinas.
Na sua intervenção na predita Convenção Nacional, Manuel Heitor lembrou os ideais europeus que garantem a frequência do ensino superior sem sobrecarga para as famílias. E lembrou que, nos últimos 3 anos, o Governo aumentou, como se disse, em 24% o número de bolsas de ação social escolar, que passaram de cerca de 64 mil em 2015 para quase 80 mil atualmente, com destaque para as bolsas de mobilidade para o interior no país, que triplicaram. No entanto, o Ministro, entendendo que “tem de ser repensada” a ação social escolar, disse:
Cada vez mais, os ideais europeus nos levam a pensar que não são os estudantes e as famílias que têm de cobrir grande parte das despesas, mas sim aqueles que beneficiam do ensino superior”.
À margem do encontro e em declarações aos jornalistas, Manuel Heitor, clarificando que o fim das propinas no prazo de uma década “deve ser um cenário favorável”, reconhecendo que tal só será possível através de “um esforço coletivo de todos os portugueses”, discorreu:
Temos um sistema muito diversificado na Europa, mas a tendência normal é reduzir, no prazo de uma década, os custos das famílias sem reforçar a carga fiscal, mas equilibrando os rendimentos, para que sejam os beneficiários individualmente e os empregadores a ter maiores contribuições no ensino superior. […] Hoje temos a certeza de que aprender no ensino superior garante acesso a melhores empregos. Temos de alargar essa possibilidade a mais jovens, reduzindo os custos diretos das famílias.”.
Fez estas declarações reforçando a ideia de uma sociedade mais equitativa, com um ensino superior “menos elitista, massificado e mais aberto a todos.”.
Durante o debate, o investigador Pedro Teixeira, do CIPES, apontou o caso das propinas como um dos pontos negativos de Portugal em relação à Europa: “Estamos onde não devíamos estar na promoção da igualdade. Temos propinas acima da OCDE”. E vincou que o financiamento por aluno “é claramente mais baixo do que a média da OCDE”, uma “situação que piorou entre 2010 e 2015”, bem como os recursos investidos no ensino superior em Portugal estão “muito abaixo da OCDE”.
Entretanto, Manuel Heitor lembrou que, nos últimos três anos, houve um crescimento de “cerca de 290 milhões de euros do investimento público e privado na investigação e desenvolvimento”, mas reconheceu que é preciso muito mais, fazendo referência às metas para 2030, acima enunciadas. Com efeito, aumentar a presença de alunos no ensino superior é um dos desafios apontados pelo Ministro para os próximos anos.
Os números mais recentes indicam que a maioria dos jovens de 20 anos não chega ao superior, apesar de ter havido melhoria nos últimos anos, mas o próprio governante sublinha que “não chega”: “Hoje temos 120 mil jovens com 18 anos e damo-nos ao luxo de só formar metade deles”, afirmou perante uma plateia composta por reitores, presidentes de institutos politécnicos, ex-ministros e atuais responsáveis governamentais, evocando estudos da OCDE a indicar que os estudantes vão triplicar em todo o mundo e as nossas instituições devem apostar cada vez mais no ensino em várias línguas, tendo em conta a presença de estudantes estrangeiros.
Atrair estudantes estrangeiros também foi defendido pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, que disse: “Nós podemos ser a Austrália da Europa”.
E o presidente do CRUP, à margem do encontro, reforçou a ideia de Santos Silva, frisando que “a internacionalização não passa apenas por trazer estudantes”, mas lembrou a importância de não se apresentarem medidas avulsas, mas assegurando perante os jornalistas:
É preciso modernizar, rejuvenescer as instituições, chamar os mais jovens. Este é um percurso que se faz, mas que é preciso ser visto a longo prazo e não pode ser feito com medidas avulsas.”.
É objetivo dos promotores que da convenção resulte uma “Nova Agenda Estratégica para o Ensino Superior”, visando a próxima década, em que se pretende fortalecer este sistema.
Seja, mas se o país paga, os recém-formados têm de honrar esse esforço do país pensando duas vezes antes de sair dele e não enveredar pelo exagero de preços a cobrar pelos serviços de especialidades (as negociatas com a saúde e em outras profissões liberais são escandalosas)!  
2019.01.07 – Louro de Carvalho

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