O Expresso e o Observador deram voz, a 9 de janeiro, à informação de que o Tribunal
Constitucional (TC) recusara a
tese de que a CESE (Contribuição Extraordinária sobre o Setor da Energia) seja inconstitucional, num acórdão em que se
pronuncia sobre um pedido da REN (Redes Energéticas Nacionais), mas que pode ter impacto para as outras grandes
empresas do setor que contestam judicialmente esta taxa criada em 2014.
Com efeito,
dados disponíveis desde há um ano indicavam que estava em contencioso a
cobrança de 520 milhões de euros da CESE, contestada pelas empresas de
energia nos tribunais administrativos. O acórdão do TC refere-se apenas à REN,
mas pode ter consequências nos processos que opõem o Fisco à Galp e à EDP e que
se encontram em tribunal administrativo. A Galp é a empresa que contesta o
valor mais elevado porque nunca pagou esta contribuição.
O caso da empresa
liderada por Rodrigo Costa foi mais rápido porque recorreu aos tribunais
arbitrais da administração tributária para contestar a CESE, tendo a reclamação
sido considerada improcedente. Da decisão desfavorável de 2015, recorreu
para o TC. E o acórdão, datado de 8 de janeiro, era aguardado com expectativa
na área energética por criar jurisprudência para outros processos em tribunal,
sobretudo quanto ao argumento da constitucionalidade da CESE.
Segundo o Observador, o acórdão do TC concluiu não
haver “violação dos princípios da
equivalência e proporcionalidade”, pois o critério do legislador para
delimitar a base de incidência “não é
totalmente desligado da finalidade que com a contribuição se procura realizar”.
Com efeito, parte da receita da CESE destina-se à redução do défice tarifário,
embora esse destino só tenha sido concretizado na dimensão prevista em 2018,
permitindo uma descida dos preços da eletricidade em 2019. Por outro lado,
os juízes consideraram que o critério que definiu o montante “não é
manifestamente injusto, flagrante e intolerável”.
A REN
contestava a qualificação de contribuição financeira consagrada na decisão do
Tribunal Arbitral do fisco em 2015. Porém, apesar de contestar o pagamento da
CESE, nunca deixou de a pagar, rondando, no caso desta empresa gestora das
redes, 30 milhões de euros por ano, ao invés da Galp, que nunca a pagou e
acumula já contestações de liquidações da contribuição sobre contratos de gás e
ativos de gás natural e petróleo na casa dos 400 milhões de euros.
A
petrolífera tem vindo a contestar as liquidações da CESE, primeiro junto do
fisco e, depois, junto do respetivo Tribunal Administrativo. Não se conhece qualquer
decisão sobre estas contestações, mas, apesar de não ter pago, a Galp tem os
valores da CESE, que não liquidou, provisionados nas suas contas desde 2014.
Por sua vez,
a EDP suspendeu o pagamento da CESE em 2017, mas retomou no final de 2018, na
sequência do compromisso do Governo em calendarizar o fim progressivo desta
contribuição extraordinária. Apesar disso, a elétrica tem também ações em
tribunal contra a CESE.
***
Porém,
como referem os jornais digitais de hoje, a decisão do TC não pode ser aplicada
depois de 2014 (E eu não percebo porquê). Assim, segundo o Jornal Económico, a REN (Redes
Energéticas Nacionais)
considera, em comunicado divulgado, que
“a decisão agora comunicada pelo TC não pode ser extrapolada para a CESE dos
anos posteriores a 2014. Na verdade, a REN reagiu à decisão do TC, que
se pronunciou pela constitucionalidade do pagamento da CESE (Contribuição
Extraordinária sobre o Setor Energético),
criada em 2014, argumentando que o Tribunal limitou o objeto do recurso a esse
ano.
Efetivamente,
lê-se no aludido comunicado:
“O Tribunal Constitucional limitou o objeto
do recurso a 2014 e não se pronunciou pela constitucionalidade das normas que
regulam a CESE nos anos seguintes, isto é, de 2015 a 2019”.
Por
seu turno, o ECO refere que a REN informou, esta quinta-feira, o mercado de que o TC
decidiu não haver inconstitucionalidade nas normas do regime jurídico da CESE,
realçando que o acórdão se limita ao primeiro ano da sua vigência. Nestes termos,
lê-se no comunicado enviado à CMVM (Comissão do Mercado de Valores
Mobiliários):
“O Tribunal Constitucional [TC] limitou o
objeto do recurso a 2014 e não se pronunciou pela constitucionalidade das
normas que regulam a CESE nos anos seguintes, isto é, de 2015 a 2019. Por esta
razão, a REN considera que a decisão agora comunicada não pode ser extrapolada
para a CESE dos anos subsequentes”.
No dito comunicado, a empresa liderada por Rodrigo Costa adianta que foi,
esta quinta-feira, “pelas 12h30”, notificada “do acórdão do TC que apreciou o
recurso interposto pela REN Armazenagem SA com vista à declaração da
ilegalidade dos atos de liquidação da CESE relativos ao ano de 2014”, em que o TC
concluiu “pela ausência de inconstitucionalidade das normas em causa do Regime
Jurídico CESE, aprovado pela Lei 83-C/2013, de 31 de Dezembro (Lei de
Orçamento de Estado para 2014)”.
***
Recorde-se
que a REN – Redes
Energéticas Nacionais, SGPS, SA é uma
empresa de transporte de eletricidade e gás natural, responsável pela gestão
global do SEN (Sistema Elétrico Nacional) e do SNGN (Sistema Nacional de Gás Natural). A sua missão é garantir o
fornecimento de eletricidade e gás natural sem interrupção, ao menor custo, com
qualidade e segurança. Procura ainda assegurar o equilíbrio entre todos os
intervenientes no mercado energético, incluindo geração, distribuição e consumo.
Foi criada em agosto de 1994 na sequência da cisão da EDP (Eletricidade de Portugal, SA) de que já fazia parte como DORE (Direção Operacional da Rede Elétrica). Todavia, a sua
história, remonta a 1947, ano da fundação da CNE – Companhia Nacional de
Eletricidade, S.A.R.L., empresa pioneira no transporte de energia elétrica em
Portugal e, portanto, a sua antecessora original.
Quanto à CESE, é de referir que – instituída em 2014
e fixada em 0,85% sobre os ativos
das empresas de energia, incidindo sobre a produção, transporte ou distribuição
de eletricidade e de gás natural, bem como a refinação, tratamento,
armazenamento, transporte, distribuição ou comercialização grossista de petróleo
e produtos de petróleo – tem
sido alvo de processos judiciais intentados pelas energéticas portuguesas,
tendo a REN sido uma das primeiras empresas deste setor a intentar uma ação
contra o Estado através da subsidiária REN Armazenagem, aduzindo que esta taxa
violava seis princípios da CRP (Constituição da República
Portuguesa),
nomeadamente “da igualdade, da tributação das empresas pelo lucro real, da
proporcionalidade, da livre iniciativa, da propriedade privada e da não
consignação”, como consta do acórdão do TC.
O
TC pronunciou-se pela constitucionalidade da CESE porque a classifica como contribuição
financeira e não como imposto. Regra geral, o imposto é tratado como tal porque
as receitas estão afetas a fazer face a interesses difusos da sociedade. De
resto, “a REN Armazenagem, tal como as outras sociedades do Grupo REN, procedeu
ao pagamento da CESE dos vários anos em causa, não tendo qualquer valor em
dívida à Autoridade Tributária”.
Em causa está um montante total que, segundo o Expresso, chega a 750 milhões de euros. A Galp nunca pagou a CESE e está a contestar a
medida em tribunal. A EDP deixou de a pagar em 2017, mas anunciou em 2018 que
vai voltar a pagá-la, embora também a conteste em tribunal.
A REN era, como se viu, outra das empresas a contestar o pagamento da CESE,
alegando que a contribuição era inconstitucional, violando os princípios já enunciados. Mas o TC rebateu todos os seus argumentos.
Na visão do
TC, a CESE é mesmo uma contribuição e não um imposto. E, no primeiro acórdão
sobre o assunto, considera a medida como constitucional. Porem, como lembra o Expresso, esta decisão não vincula
futuras decisões sobre o mesmo assunto, mas poderá apontar para a derrota da
EDP e da Galp nas pretensões de não pagar esta contribuição.
***
Como é sabido, a EDP – que chegou
a pagar a CESE, entre 2014 e 2016, tendo nessa altura recorrido para o tribunal
contestando inclusive os pagamentos já realizados, de cerca de 60 milhões de
euros – vai voltar a pagar a CESE e avançar com o pagamento dos anos em atraso,
2017 e 2018, por considerar estarem reunidas as condições.
“O
montante a pagar pela EDP regulariza os pagamentos pendentes relativos à CESE”,
disse, à Lusa, fonte oficial do
Ministério do Ambiente e da Transição Energética.
Na
base desta alteração de comportamento da elétrica nacional está o facto de considerar
que, neste momento, estão reunidas as condições
para avançar com o pagamento. A EDP alegava que a CESE deveria
ser temporária e que os montantes pagos deveriam ser canalizados para reduzir o
défice tarifário, o que foi concretizado em 2018, com a transferência de 155
milhões de euros da CESE para abatimento do défice tarifário e com a decisão do
Executivo, em novembro, de reforçar o contributo do FSSSE (Fundo para a Sustentabilidade
Sistémica do Setor Energético) para a redução do défice tarifário da energia. Assim, passam a ser
transferidos para abater a dívida tarifária dois terços da verba disponível, e
não apenas um terço.
A par
do reforço da transferência desta contribuição para a redução do défice, o
alargamento desta taxa aos produtores de energias renováveis é um dos vértices
do triângulo orçamental proposto pelo Executivo de Costa para baixar a fatura
da eletricidade neste ano.
A este
respeito, António Mexia declarava no início de dezembro:
“Sobre
a CESE sempre tivemos uma posição muito clara. Percebíamos que houvesse um
esforço temporário no sentido da redução do défice [tarifário] e que ela
deveria acabar, que é o que está previsto. Se essas regras forem cumpridas,
estaremos cá para cumprir o nosso papel”.
Mexia
garantiu que o acordo não deverá ter impacto nos
preços até porque a maior parte do que é pago pelos consumidores diz respeito a
pagamento de redes e impostos. “Aparentemente, a proposta do
conselho tarifário é que haja uma redução das tarifas no próximo ano”, referiu,
na altura. E as suas declarações foram confirmadas pela proposta da ERSE
de redução de 3,5% dos preços da eletricidade no mercado regulado em 2019,
redução acompanhada pelo mercado livre, embora com taxas eventualmente
diferenciadas.
***
Entendo que
o lucro deve ser taxado e que paga quem tem de pagar, sendo incompreensível como
há tanta reclamação sobre impostos e contribuições por parte das empresas. Não sei
se há a mesma condescendência para com os cidadãos.
Também entendo
que nos termos do n.º 4 do art.º 282.º da CRP o TC, fundamentando, fixe os
efeitos da inconstitucionalidade com alcance mais restrito, por
segurança jurídica, equidade ou interesse público. Mas julgar uma lei constitucional
num ano e não nos seguintes não percebo.
Como
diziam os populares no tempo das liturgias em latim: Eles lá o leem, lá o entendem! Mas a justiça, muito menos a justiça
constitucional não pode estar do lado dos poderosos…
2019.01.10 –
Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário