segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Seguiu a vida militar para servir os irmãos na fé perseguidos


É o que referem alguns cronistas a propósito de Sebastião, que não teria natural inclinação para a carreira das armas, mas que se propusera segui-la para melhor servir os cristãos perseguidos pelo poder que então dominava o mundo, sendo que os não pertencentes ao Império eram considerados ‘bárbaros’ (palavra onomatopaica) por alegadamente não falarem língua de gente.
Já antes do nascimento de Cristo os romanos chamavam ao Mediterrâneo (mar no meio da Terra) Mare Nostrum (nosso mar), visto que todas as terras por ele banhadas faziam parte do Império romano. Foi numa região costeira, na província da Gália, correspondente à atual cidade de Narbonne (França), que Sebastião veio ao mundo. A sua família, nobre, era de Milão (na atual Itália: por isso, alguns têm-no como natural de Milão), e não era inclinado à vida militar, tendo-a seguido pelo desejo de servir os irmãos na fé, que sofriam a perseguição por mor do Reino de Deus.
Os numerosos homens que dão pelo nome de Sebastião, Bastião ou simplesmente Tião (e as mulheres de nome Sebastiana e Tiana), bem como as inúmeras paróquias que o têm como orago, lhe dedicam uma igreja ou uma capela ou ainda as que lhe veneram uma imagem – e é o padroeiro principal da grande cidade e arquidiocese do Rio de Janeiro, no Brasil, e da vetusta diocese de Lamego, em Portugal e dá o nome a muitos bairros, ruas, vilas e freguesias – permitem imaginar quanto e como este santo militar é admirado e venerado em inúmeras nações, especialmente no Ocidente.
É também assumido como padroeiro dos soldados, arqueiros e atletas, sendo muito invocado no combate às epidemias ou pestes, às fomes e às guerras. 
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Os registos oficiais a seu respeito são escassos. Não obstante, há dele muitas informações que emanam da indissociável combinação entre a história e a piedade popular, complexo por vezes escorrente da lenda que enforma o espírito da realidade com que este militar cristão, servindo no exército de Diocleciano, um dos mais sanguinários imperadores romanos, ajudou numerosas almas a não enfraquecerem na fé, confortando-as e permitindo-lhes enveredar de cabeça erguida pelo caminho do Paraíso, sem qualquer laivo de desânimo. E ele próprio não deixou, no momento certo, de se declarar cristão, dando o testemunho e servindo de exemplo a numerosos outros seguidores de Jesus que enfrentavam as perseguições da Era dos Mártires, como foi denominado o período de busca e morte aos fiéis conforme ordem imperial.
Sebastião desempenhou corretamente o dever militar, mas por baixo da farda pulsava o genuíno cristão; e o seu corpo fazia palpitar um coração ardente de desejo de apoiar os perseguidos e ajudá-los a seguir o Mestre, não só nesta vida, mas também quando se encontravam prestes a partir para a outra. Mantinha em segredo a fé, como era comum entre os cristãos em tempo de perseguição, pois assim podia ajudar os que dele precisavam, mas não tinha receio de perder os bens ou a própria vida. Uma das suas ações apostólicas refere-se aos gémeos Marcos e Marceliano, que aprisionados em Roma, eram visitados diariamente por Sebastião. Depois de serem submetidos a chicotadas, apesar de membros de família de senadores, foram condenados à decapitação, tendo os seus familiares obtidos do administrador Cromácio um prazo para que se tentasse demovê-los das suas convicções. Acorrentados na casa de Nicóstrato, escriba da prefeitura, eram submetidos a tentativas de convencimento por parte dos amigos, pais, esposas e filhos ainda pequenos. E, quando estavam em risco de fraquejar, foram as palavras do oficial Sebastião que os reanimaram, o que impressionou todos aqueles que as ouviram.
Zoé, esposa de Nicóstrato, vendo em Sebastião um homem de Deus, atirou-se-lhe aos pés e por gestos indicou-lhe a doença de que padecia e que lhe fizera perder a fala. Sebastião fez o sinal da cruz sobre a boca de Zoé e, em voz alta, rogou ao Senhor a cura. E, de imediato, ela recobrou a dicção e pôs-se a louvar aquele homem, acrescentando crer em tudo o que ele acabara de dizer. Face à cura da esposa, Nicóstrato lançou-se aos pés de Sebastião e pediu perdão por ter mantido os dois cristãos aprisionados e libertou-os declarando-se feliz se fosse aprisionado e morto em vez deles. E os dois irmãos, ora libertados, recusaram abandonar a luta para a ela exporem outrem e firmaram-se na fé ao verem a ação de Deus, que anulou todos os esforços para os fazer abandonar a Igreja, em que ingressaram os donos da casa em que estiveram aprisionados. E mais pessoas abraçaram a fé cristã nas horas subsequentes, sendo 68 o número de pessoas convertidas e batizadas por Policarpo, ali chamado por Sebastião: Nicóstrato, Zoé, toda a família de Nicóstrato e seu irmão Castor, o carcereiro Cláudio com dois filhos e sua esposa Sinforosa, Tranquilino, o pai dos gémeos, com a sua esposa Márcia e 6 amigos, as esposas dos gémeos e 16 outros encarcerados.
O prefeito Cromácio, que havia concedido aos gémeos o período de espera visando a renúncia à fé, sentindo-se enganado, chamou o pai de ambos e ordenou que eles oferecessem incenso aos deuses. Porém, Tranquilino afirmou-se cristão, dizendo que seria curado da enfermidade de que o prefeito também padecia. Cromácio disponibilizou dinheiro para a cura, arrancando de Tranquilino risos, tendo este assegurado que, para ser curado, bastaria recorrer a Cristo.
Após um instrutivo catecumenado, em que foi explanada a superioridade da fé sobre a simples cura da doença, Cromácio e o filho tornaram-se cristãos, permitindo que fossem quebradas mais de 200 estátuas de ídolos expostos à adoração e que fossem destruídos os instrumentos utilizados para astrologia e outras práticas divinatórias. Porém não só pai e filho se tornaram cristãos em sua casa, mas um total de 1.400 pessoas, incluindo escravos a quem deu a liberdade dizendo que os que passaram a ter Deus como pai não mais podiam ser escravos de homem.
Diocleciano, tendo assumido o império, conservou Sebastião no curso das armas e deu-lhe o posto de capitão general da guarda pretoriana em Roma, depositando nele toda a confiança.
Chegada a hora de Sebastião se afirmar cristão, após cuidar de que muitos trilhassem o caminho do Paraíso, o imperador avisado pelo governador Fabiano, inconformado, condenou-o à morte. Assim, foi preso a um tronco e o corpo perfurado por flechas. Crendo-o morto, os supliciantes abandonaram-no, mas Irene, uma piedosa viúva, querendo sepultá-lo cristãmente, encontrando-o vivo, cuidou dele para que se restabelecesse. Tempo depois, ei-lo a apresentar-se a Diocleciano (surpreendido ao vê-lo vivo), a quem censurou pela injustiça com que perseguia os cristãos, pois estes rezavam pelo império e pelos seus exércitos e, em contrapartida, eram supliciados como se fossem inimigos do Estado. Mas o imperador, obstinado no erro, ordenou que Sebastião fosse prestes levado a um local próximo e morto a bordoadas. Foi sepultado na catacumba que atualmente leva o seu nome, sobre a qual se ergue uma das sete principais igrejas de Roma, a Basílica de São Sebastião, na Via Appia. Assim, como refere Santo Ambrósio, São Sebastião, mártir que, oriundo de Milão, partiu para Roma, onde grassavam violentas perseguições e aí sofreu martírio, na Urbe romana, aonde tinha acorrido como hóspede, o seu corpo granjeou domicílio de imortalidade perpétua. No dia 20 de janeiro de 288 ou de 300, foi depositado nas Catacumbas de Roma.   
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O mártir é uma referência que inspira a viver o Evangelho na identificação com Jesus Cristo, morto e ressuscitado. Ainda que tenha vivido em contexto social, cultural e religioso muito diferente do hodierno, é mister conhecer a sua vida, acolher o testemunho, a adesão e fidelidade a Cristo, a defesa do Evangelho e dos cristãos. Quem O reconhece como padroeiro, invoca-O como intercessor junto de Deus, como amigo de Jesus, através de quem se confia à soberania do Senhor Deus do Universo, e procura imitá-Lo no seguimento aguerrido e apaixonado por Jesus.
Os mártires ganharam uma enorme projeção nas comunidades cristãs dos primeiros séculos e pelos seguintes. Nesta ótica, Sebastião, Eufémia, Inês, Luzia, o diácono Vicente e Bárbara impõem-se por todo o mundo cristão pela fidelidade ao Evangelho e a Jesus, arriscando a própria vida. E contribuem para catequizar as comunidades através de exemplos concretos.
A vida de Sebastião, no que a tradição assimilou e transmitiu, é exemplo de como a fé ajuda a ultrapassar os obstáculos da vida e como o cristão se pode santificar em diversas profissões e/ou ocupações, pois, mais forte que tudo é o amor a Deus. As suas qualidades são amplamente elogiadas: imponente de figura, prudente, bondoso e bravo, era estimado pela nobreza e respeitado por todos.
De Milão, o jovem soldado deslocou-se para Roma, onde a perseguição era mais intensa e feroz, para testemunhar a fé e defender os cristãos. Primeiro cai nas graças do imperador; depois, a defesa da fé cristã e a intercessão pelos cristãos perseguidos desencadeiam a sua morte. Cada novo mártir que surgia tornava-se um alento e um desafio para Sebastião.
A iconografia é muito plástica a seu respeito, inconfundível. Sebastião é representado com o corpo praticamente desnudo e pejado com várias setas, e surge preso a um tronco de árvore.
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Logo após o seu martírio começou a ser venerado como santo. Testemunhou a fé com coragem e alegria, a partir da sua vida, como jovem militar, cristão. Daqui se conclui que a santidade é possível em qualquer trabalho, em qualquer vocação, em qualquer compromisso humano – exemplo do que o leigo pode fazer.
O nosso tempo e ambiente não são, entre nós, de perseguição declarada aos cristãos, sendo-o infelizmente em muitas partes do mundo e de forma cruciante, mas a nossa tarefa não é mais fácil. A sua fé confrontou-se com a perseguição, ajudando os que estavam perto do desânimo; e nós, hipócrita e debilmente, deixamo-nos contagiar pelo contexto, por valores e leis contrários à fé que professamos, desperdiçamos muitas oportunidades de nos afirmarmos cristãos, por cobardia, sufragamos (por medo da chacota) formas de perseguição aos valores que dizemos defender; e descuramos os cristãos que precisam de que os animemos na fé, na sua caminhada espiritual… Vale a pena ler um texto de Ambrósio sobre o Salmo 118, apresentando Sebastião como testemunha fiel de Cristo, e que é apresentado na Liturgia das Horas, no Ofício de Leitura:
É necessário passar por muitas tribulações para entrar no reino de Deus. As muitas perseguições correspondem muitas provações: onde há muitas coroas de vitória tem de ter havido muitos combates. É bom para ti que haja muitos perseguidores, pois entre tantas perseguições mais facilmente encontrarás o modo de ser coroado. Consideremos o exemplo do mártir Sebastião, que hoje celebramos. Nasceu em Milão. Talvez o perseguidor já se tivesse afastado, ou talvez ainda não tivesse vindo a este lugar, ou seria mais condescendente. De qualquer modo, Sebastião compreendeu que aqui, ou não haveria luta, ou ela seria insignificante.
Partiu para Roma, onde grassavam severas perseguições por causa da fé; aí foi martirizado, isto é, aí foi coroado. Deste modo, ali onde tinha chegado como hóspede, encontrou a morada da imortalidade eterna. Se não houvesse mais que um perseguidor, talvez este mártir não tivesse sido coroado. Mas o pior é que os perseguidores não são só os que se veem: há também os que não se veem, e estes são muito mais numerosos. Assim como um único rei perseguidor emitia muitos decretos de perseguição, e desse modo havia diversos perseguidores em cada uma das cidades ou das províncias, também o diabo envia muitos servos seus a mover perseguições, não apenas no exterior, mas dentro da alma de cada um.
Destas perseguições foi dito: ‘Todos os que querem viver piedosamente em Cristo Jesus sofrem perseguição’. E disse ‘todos’, não excluiu nenhum. Quem poderia na verdade ser excetuado, quando o próprio Senhor suportou os tormentos das perseguições? Quantos há que, em segredo, todos os dias são mártires de Cristo e dão testemunho do Senhor Jesus! Conheceu esse martírio aquele apóstolo e testemunha fiel de Cristo, que disse: ‘Esta é a nossa glória e o testemunho da nossa consciência’.”.
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São Sebastião é invocado pelas gentes de Roma, cerca do ano de 680, para proteção de uma terrível peste. A partir daquela altura, passa a ser invocado para a proteção de cidades, vilas e burgos contra as pestes, que na Idade Média martirizaram as populações europeias. Só as pestes por volta de 1348 provocaram a morte de um terço da população europeia. Houve lugares que ficaram quase desabitados e as Terras de Santa Maria, em que a Feira se insere, não foram exceção. Foi durante uma das pestes que as gentes de Santa Maria invocaram o Santo e a prece foi atendida. Por isso, foi decidida uma festa de ação de graças anual com a colaboração dos condes da Feira.
Esta festividade teve início, provavelmente, por volta de 1505 sob financiamento do 2.º Conde da Feira, Dom Diogo Pereira. No cumprimento do voto, os ofertantes participavam numa procissão que saía do Paço dos Condes, a seguir passava pela Igreja do Convento do Espírito Santo (Loios), onde eram benzidas as fogaças, partidas e distribuídas pelo povo.
Nos tempos atuais, da parte da manhã, sai o cortejo cívico dos Paços do Concelho para a Igreja Matriz, onde se celebra Missa Solene com sermão, se benzem as fogaças que são levadas por centenas de meninas, as fogaceiras (este ano, foram 362), e aí permanecem até à tarde. Então, a procissão sai da Igreja, percorre as ruas da zona histórica da cidade, regressando à Igreja. No final da procissão, as crianças levam consigo as fogaças que transportaram, sendo uma das maiores oferecidas a quem preside à festa, muitas vezes o Bispo do Porto ou um dos Bispos Auxiliares e as outras a autoridades locais.
Durante 4 anos a tradição quebrou-se e a peste regressou, o que fez reatar a tradição com o aumento da devoção.
Um guia do concelho feirense afirma que a data de início do culto é o ano de 1505 e sob o patrocínio do 2.º Conde da Feira, Dom Diogo Pereira. Porém, este só ascendeu ao título a 2 de janeiro de 1515. Terá sido o seu patrocínio concedido não sendo ainda o conde? Terá sido no tempo do 1.º conde da Feira, o conde de Moncorvo Dom Rui Pereira (não quis usar deste título, por já ter sido dado por Dom Afonso V a outros fidalgos, e ordenou aos vassalos que lhe chamassem conde dalguma das suas terras e eles o intitulavam conde de Santa Maria da Feira), 4.º senhor das terras de Santa Maria e 2.º senhor do seu castelo.  
FONTES: António José Coelho (2003). Santos de cada dia I, Braga: Apostolado da Oração; CEP (1989), Liturgia das Horas, vol. III, Gráfica de Coimbra; J. H. BARROS DE OLIVEIRA (2003). Santos de todos os Tempos, Apelação: Paulus Editora; Padre Rohrbacher (1959). Vida dos Santos, vol II, Editora das Américas; “Lendas de Santa Maria da Feira”; http://www.arqnet.pt/dicionario/feiracondes.html https://pt.wikipedia.org/wiki/Conde_da_Feira.
2019.01.21 – Louro de Carvalho

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