sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Bruxelas anuncia acordo de princípio sobre termos do Brexit

Há já um acordo de princípio entre Bruxelas e o Reino Unido em torno do Brexit. E Juncker recomenda passagem à segunda fase das negociações.
Segundo o que anunciou a Comissão Europeia hoje, dia 8 de dezembro, chegou-se a um “acordo equilibrado” com o Reino Unido neste dossiê, pelo que o Presidente decidiu recomendar aos Estado-Membros que se passe à 2.ª fase das negociações sobre o futuro relacionamento.
Apesar de o mais difícil ainda estar para vir, como alertou o Presidente do Conselho Europeu, os mercados e os empresários receberam a notícia de forma positiva.
A recomendação de Bruxelas baseia-se no relatório conjunto dos negociadores da Comissão e do Governo do Reino Unido, hoje subscrito pela Primeira-Ministra britânica, Theresa May, numa reunião, em Bruxelas, com o Presidente do executivo comunitário, Jean-Claude Juncker.
Para Bruxelas, foram efetuados “progressos suficientes” nos três domínios prioritários: direitos dos cidadãos; diálogo sobre a Irlanda/Irlanda do Norte; e acordo financeiro com o Reino Unido. E o negociador-chefe da UE, Michel Barnier, considera que “serão protegidas as opções de vida dos cidadãos da UE que vivem no Reino Unido”. Com efeito, “estes cidadãos, assim como os cidadãos britânicos que vivem na UE a 27, conservarão os seus direitos após a saída do Reino Unido da UE. Por outro lado, a Comissão garantiu que “todos os procedimentos administrativos para os cidadãos da UE que vivem no Reino Unido serão simples e pouco dispendiosos”.
Segundo Barnier, o documento pode servir de “base para um acordo final”. De facto, “após seis meses de trabalho”, surgiu um relatório conjunto com os objetivos alcançados até agora, que, depois da aprovação pelo Conselho Europeu e de uma votação no Parlamento Europeu, na próxima semana, pode ser uma boa base para um acordo final. Mas Barnier, reconhecendo que “há ainda muito trabalho a fazer“, salientou que “a versão final deve estar pronta até outubro de 2018, dentro de menos de um ano, e adiantou que o ambiente entre Londres e Bruxelas é “positivo” para as negociações que se seguem.
Se os chefes de Estado e de Governo da UE, que se vão reunir em Bruxelas na próxima semana, concordarem com esta avaliação, poderão então ter início “de imediato” os trabalhos para a segunda fase das negociações, referente à futura relação (designadamente na vertente comercial) entre a UE a 27 e o Reino Unido.
***
Nos termos do acordo, qualquer cidadão da UE que tenha chegado ou chegue ao Reino Unido – e vice-versa – antes do Brexit, mantém todos os direitos de trabalho após a saída efetiva da UE, assim como garantida a reunião familiar.
No atinente a fronteiras, o acordo de princípio ora alcançado sobre os termos da saída do Reino Unido da UE garante que não existirá uma fronteira física entre a República da Irlanda e a Irlanda do Norte, nem serão cobradas importâncias em nome de quaisquer direitos aduaneiros.
Em termos financeiros, o Reino Unido irá honrar os compromissos assumidos enquanto Estado-Membro e contribuirá para o quadro financeiro que caduca em 2020.
As partes chegaram ainda a acordo sobre os princípios para calcular a fatura de saída. O Reino Unido conta que a fatura atinja os 40 ou 45 mil milhões de euros. Segundo fonte britânica citada pela Reuters, o custo das obrigações financeiras para efetuar o Brexit poderá oscilar entre 34,8 e 39,2 mil milhões de libras – um valor a pagar ao longo de várias décadas. Tal valor é bastante inferior aos 100 mil milhões que vários diplomatas que acompanham as negociações, avançaram ao Financial Times, no final de novembro. 
O Reino Unido, ao longo das negociações, vinha a pressionar para que a fatura descesse para os 40 ou 45 mil milhões de euros – o valor ora avançado pela fonte britânica citada pela Reuters – tendo em conta as receitas e deduções feitas durante os anos em que pertenceu à UE. E o Reino Unido tem defendido que os pagamentos sejam calculados ao longo do tempo, à medida que obrigações específicas vão expirando. Por seu turno, a UE estava a pedir, pelo menos, 60 mil milhões de euros (71 mil milhões de libras) para obviar às responsabilidades financeiras que o Reino Unido assumiu enquanto membro e que não desaparecem no momento em que decide deixar de pertencer ao clube europeu, nomeadamente uma percentagem do orçamento da UE, cujos planos de despesa são desenhados a sete anos, as chamadas perspetivas financeiras que se materializam, por exemplo, no caso português, no Portugal 2020 e nos fundos estruturais de que o país beneficia.
Na fatura devem ainda constar as responsabilidades assumidas ao nível das pensões dos responsáveis europeus e deputados do Parlamento Europeu que, o ano passado, subiram 5% para 67,2 mil milhões de euros, tendo o Reino Unido a seu cargo dez mil milhões de euros.
O argumento britânico para baixar este valor é o de que 60 mil milhões de euros é, por exemplo, mais do que o orçamento para a defesa anual do Reino Unido.
***
Os principais índices bolsistas, segundo dados europeus recolhidos pelo Eco, arrancaram a sessão de hoje em forte alta, animados pelo anúncio da Comissão Europeia de que chegou a um “acordo equilibrado” com o Reino Unido sobre o Brexit. As ações europeias seguem com ganhos em torno de 1%.
Perante este cenário, o Stoxx 600, índice que agrega as 600 maiores empresas europeias segue a valorizar 0,89%, para os 389,85 pontos, com os títulos do setor financeiro a liderarem os ganhos. Os títulos do setor financeiro seguem em alta pelo 2.º dia consecutivo, valorizando nesta sessão perto de 3%, animados pela perspetiva de que a remuneração aos acionistas aumentará depois de o compromisso de Basileia não ter conduzido a “uma subida significativa” das necessidades de capital. As mineiras também dão fôlego ao índice europeu.
Os ganhos são transversais aos principais índices bolsistas europeus, com o Dax a valorizar 1,25%, o CAC a acelerar 0,68%, e o Ibex a somar 1,07%. Também o britânico Footsie segue em alta, com ganhos de 0,31%. O PSI-20, por seu turno, acompanha o sentimento dos pares europeus, embora com subidas mais modestas. O índice bolsista da praça lisboeta segue a valorizar 0,43%, para os 5.415,08 pontos, num dia em que os CTT se destacam com ganhos acima de 4%.
Já o Euro não segue o mesmo rumo. A moeda única recua 0,27%, para os 1,1741 dólares, naquele que é o mais extenso ciclo de desvalorizações desde o ano passado: 6 sessões no vermelho. O Euro também perde terreno face à libra: desvaloriza 0,22%, para 87,18 pences.
E o setor empresarial britânico expressou hoje “alívio” com o acordo alcançado em Bruxelas sobre o Brexit, que permite passar à segunda fase das negociações, centradas na relação comercial entre o Reino Unido e a UE.
Stephen Martin, Diretor-Geral do Instituto de Diretores (IdD), disse que as empresas poderão respirar de “alívio”, pois um dos assuntos de maior inquietação era a situação legal dos cidadãos comunitários que vivem no Reino Unido. Com efeito, após intensas negociações, o Presidente da Comissão Europeia, Jean Claude Juncker, anunciou hoje em Bruxelas que havia suficientes progressos para passar à segunda fase, depois de acordar a situação dos comunitários, a fatura que deverá pagar o Reino Unido pela sua retirada da UE e a fronteira norte-irlandesa. E Stephen Martin sublinhou à comunicação social:
O assunto de maior preocupação para as companhias do Reino Unido era o pessoal comunitário, que precisava urgentemente de uma certeza sobre o seu futuro no país”.
E acrescentou:
Temos razões para esperar que os nossos membros possam agora enviar aos seus empregados os votos natalícios com um melhor sentimento sobre a sua situação neste país […]. Pedimos ao Reino Unido e à UE que construam sobre este momento positivo […]. É de grande interesse para ambas as partes começar a trabalhar na nossa futura relação económica.”.
Por seu lado, o Diretor-Geral das Câmaras de Comércio Britânicas, Adam Marshall, frisou que as empresas poderão “respirar de alívio” por se ter conseguido um “progresso significativo” sobre o ‘Brexit’. E declarou que, na sequência dos problemas dos últimos dias, as notícias de um progresso nas negociações serão “bem recebidas” pelas empresas de todo o Reino Unido.
Por sua vez, Donald Tusk, Presidente do Conselho Europeu advertiu hoje que o mais difícil das negociações com o Reino Unido sobre o ‘Brexit’ ainda está para vir, pois “romper é difícil, mas romper e construir uma nova relação ainda é mais difícil”. Foi isto que declarou à imprensa, após uma reunião com a Primeira-Ministra britânica, nos termos seguintes:
 Temos de ter em mente que o desafio mais difícil está ainda pela frente. Sabemos que romper é difícil, mas romper e construir uma nova relação é ainda mais difícil”.
***
O mais difícil está, de facto, ainda para vir, como diz Tusk. Na verdade, após acordar os termos da saída, é preciso negociar o futuro, designadamente o período de transição, de dois anos, que o Reino Unido solicitou para concretizar a saída do bloco europeu, assim como os moldes da futura relação – comercial, mas não só – entre as duas partes.
E Tusk lembrou que, “desde o referendo britânico” que decidiu o Brexit, já passou cerca de ano e meio, lamentando que “tanto tempo tenha sido gasto com a parte mais fácil” da negociação, quando agora se dispõe de menos de um ano para negociar o período de transição e o futuro.
A este respeito, a UE recorda que as negociações deverão ser concluídas até ao outono de 2018, para dar tempo suficiente ao Conselho Europeu para celebrar o acordo de saída do Reino Unido após ter obtido a aprovação do Parlamento Europeu, assim como permitir que o Reino Unido possa aprovar o acordo, em conformidade com os respetivos procedimentos, até 29 de março de 2019, data da concretização do Brexit.
Entretanto, é de recordar que o negociador-chefe da UE afirmou, a 20 de novembro, que Bruxelas estava pronta a oferecer a Londres “o mais ambicioso” acordo comercial após a saída da comunidade, desde que o Reino Unido respeitasse as condições da separação. Sobre isto, Michel Barnier afirmou num discurso em Bruxelas:
Se conseguirmos negociar uma saída ordenada e estabelecer regras de jogo que sejam justas, a nossa relação futura terá todas as razões para ser ambiciosa”.
Nestas condições, a UE estará pronta a oferecer ao Reino Unido a abordagem mais ambiciosa no que diz respeito aos tratados de livre-comércio. A abertura das negociações comerciais com Londres requer um prévio estabelecimento de regras quanto às condições da saída, como por exemplo as regras financeiras ou as consequências de uma separação para a Irlanda.
O Presidente do Conselho Europeu deu ao Reino Unido até ao início de dezembro para avançar com estes ‘dossiês’ prioritários. Se Londres não avançasse com este processo, Tusk não poderia propor aos dirigentes dos 27 restantes Estados-membros que dessem luz verde ao início da segunda fase de negociações com o Reino Unido. Assim, esta proposta surgirá no decorrer da próxima cimeira da UE, em meados de dezembro.
Londres vinha a reclamar, de forma insistente, a abertura de negociações paralelas sobre a futura relação comercial com o bloco da UE, o que Bruxelas recusou. Os restantes 27 queriam primeiro fechar o acordo do Brexit e só depois negociar um tratado comercial – o que doravante será possível.
No entanto, na última cimeira europeia – em outubro – os Estados-Membros aceitaram – como um gesto de boa vontade – iniciar os “preparativos internos” com vista às negociações futuras.
De qualquer forma, disse Michel Barnier, a UE estava pronta para o cenário de “fim das negociações sem acordo”, mesmo que não o deseje.
***
Importa, pois, que as situações fiquem totalmente claras e que não fique nada por resolver. É o interesse da UE e do Reino Unido que está em causa, acima de todas as suspeitas. É a diplomacia que tem de vencer em prol do bem-estar dos cidadãos e da eficácia das instituições.

2017.12.08 – Louro de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário