terça-feira, 26 de dezembro de 2017

A 3.ª mensagem de Natal de Costa desmente a sua alegada insensibilidade

Na tradicional mensagem de Natal do Primeiro-Ministro, podem distinguir-se três momentos diferentes. O primeiro consistiu na referência aos incêndios florestais do ano que agora termina; o segundo tem a ver com os aspetos económicos e financeiros atingentes ao país; e o terceiro tem como alvo os portugueses da diáspora. É claro que as palavras-chave do discurso serão naturalmente: incêndios, crescimento e fim da austeridade.
António Costa não se esqueceu de salientar o “maior crescimento económico desde o início do século” e de apontar a criação de emprego “digno” como a grande aposta do próximo ano.
Um ano fustigado pelos incêndios de junho e de outubro, pelo crescimento económico e pelo fim da austeridade e conquista da “credibilidade” são dimensões por que se move o Primeiro-Ministro em torno do ano de 2017.
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Quanto ao momento que gera o luto nacional, António Costa lembrou a “dor e o sofrimento das pessoas” afetadas pelos incêndios deste ano, dizendo que o Governo nunca esquecerá esta dor e o sofrimento, “nem o nível de destruição” provocado por estas catástrofes.
Recordando que “o ano que agora termina foi dramaticamente marcado pela perda de vidas humanas em incêndios que enlutaram famílias e devastaram uma grande parte do nosso território”, classificou o facto como “uma tragédia para todo o País” e “um momento de luto nacional, que sofremos coletivamente”.
Porém, assegurou que agora “é tempo de dar nova vida ao que o fogo consumiu” e “reerguer as casas destruídas, recuperar a capacidade produtiva das empresas atingidas e devolver o verde aos territórios e a esperança às populações”. E reiterou o “compromisso de fazer tudo o que tem de ser feito para prevenir e evitar, naquilo que é humanamente possível, tragédias como as que vivemos”, através da melhoria da “prevenção, o alerta, o socorro e a capacidade de combater as chamas” e, sobretudo, com a “revitalização do interior e o reordenamento da floresta”.
E foi claro do compromisso do Governo em relação aos termos acima apontados:
Reafirmo, perante os portugueses, o compromisso de fazer tudo o que tem de ser feito para prevenir e evitar, naquilo que é humanamente possível, tragédias como a que vivemos. Melhorando a prevenção, o alerta, o socorro, a capacidade de combater as chamas.”.
Na perspetiva do Chefe do Governo, porém, a par dos meios de prevenção e de combate aos fogos, o país deve concentrar-se também “com persistência no que exige tempo, mas que é o mais decisivo e estrutural: a revitalização do interior e o reordenamento da floresta”.
Depois de ter lamentado as consequências dos incêndios de junho e de outubro, que provocaram mais de 100 mortos, cerca de 350 feridos e milhões de euros de prejuízos, declarou:
Os portugueses estão unidos e mobilizados para esta causa. É um grande desígnio de Portugal e dos portugueses. Todos juntos vamos alcançá-lo.”.
Depois, de salientar o peso da tragédia incendiária para as famílias que perderam familiares e bens, para as populações e terras fustigadas pelo fogo e para o país inteiro, enalteceu, depois “a coragem, o altruísmo, a entreajuda, a enorme onda de solidariedade” que cresceu em Portugal. E, aproveitando a ocasião para destacar a importância da ação desenvolvida pelas populações das zonas atingidas, dos autarcas, dos bombeiros voluntários e profissionais, dos militares, das forças de segurança, dos escuteiros, de médicos e enfermeiros, vincou:
Não esqueceremos a vontade de não desistir, de não abandonar, de reconstruir o que foi destruído, de fazer renascer o que foi devastado. Disso tenho sido testemunha nas muitas visitas de trabalho que tenho feito aos concelhos atingidos.”.
Nem se percebe como é que as populações classificaram o Primeiro-Ministro de insensível, isolando-o do Presidente da República. Será porque não vende a lógica dos afetos como Marcelo Rebelo de Sousa? Será questão de temperamento? Ou porque humanamente a espera das populações de ajuda da parte de quem pode dispor dos meios não tem compreensivelmente a paciência de suportar o tempo? Mas também nestas ocasiões não há lucidez para escolher alvos e eles foram escolhidos. E eu não compreendo a razão de ser desta escolha seletiva para lá do oportunismo e do populismo barato que alguns sabem oferecer e outros sabem promover.
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O crescimento económico e as questões financeiras foram o segundo ponto-chave do discurso de Costa, que voltou a salientar o “virar de página da crise”.
Neste capítulo, o Primeiro-Ministro congratulou-se com os resultados alcançados em 2017, apontando que o país saiu do Procedimento por Défices Excessivos na União Europeia, que o crescimento será “o maior” desde o início do século e que foram criados 242 mil novos postos de trabalho.
Antes de adiantar que o emprego “é a prioridade” que o Governo definiu para 2018, considerou:
Libertámo-nos da austeridade e conquistámos a credibilidade. Chegou o tempo de vencer os bloqueios ao desenvolvimento.”.
E apresentou o desígnio governamental para o próximo ano:
Emprego digno, salário justo e oportunidade de realização profissional são condições essenciais para os jovens perspetivarem o seu futuro em Portugal. Não um futuro adiado, mas um futuro alicerçado em boas oportunidades de formação e de emprego qualificado, de habitação acessível, numa sociedade dinâmica, aberta ao mundo, que garanta a liberdade de plena realização pessoal.”.
António Costa defendeu depois a tese de que só com emprego de qualidade Portugal poderá ter “um crescimento sustentável”, estando preparado para “agarrar as oportunidades que o futuro traz e para enfrentar os desafios tão complexos do século XXI, como as alterações climáticas, a construção da sociedade digital ou o declínio demográfico”. E acrescentou:
Este ano confirmou que, perante as dificuldades, os portugueses se unem na solidariedade e com determinação. É com essa energia e com essa vontade que contamos em 2018 continuar com mais crescimento, melhor emprego, maior igualdade.”.
O facto de este ano termos o maior crescimento económico desde o início do século – espera-se que seja sustentável e consolidado –, a criação de 242 mil novos postos de trabalho por parte das empresas, a diminuição da pobreza e da desigualdade, que é a batalha de todos os dias, o cumprimento das metas orçamentais, com o registo do défice mais baixo em democracia, que assegurou a saída do Procedimento por Défices Excessivos, permitiu “diminuir o peso da nossa dívida” e “reduzir os seus custos”, o que, por sua vez, segundo Costa, liberta “recursos para investir responsavelmente na melhoria do nosso sistema de ensino, do serviço nacional de saúde e na modernização do país”.
Mais: no dizer do Primeiro-Ministro, “libertámo-nos da austeridade e conquistámos a credibilidade“, sendo que agora, “chegou o tempo de vencer os bloqueios ao nosso desenvolvimento”. Por isso, a criação de emprego será o grande investimento a fazer no próximo ano. Porém, não se trata apenas de mais emprego, mas de “melhor emprego”. Esta é a prioridade definida para o ano de 2018: emprego digno, salário justo e oportunidade de realização pessoal e profissional. E concluiu este ponto dizendo:
Só assim teremos um crescimento sustentável, um país preparado para agarrar as oportunidades que o futuro nos traz e para enfrentar os desafios tão complexos do século XXI”.
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Na sua mensagem de Natal, tal como nos dois anos anteriores, o Primeiro-Ministro deixou palavras de “especial carinho” às comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, de “louvor e reconhecimento aos militares das Forças Armadas e aos elementos das forças de segurança que se encontram em missões de paz”, assim como palavras de “gratidão aos que se encontram a trabalhar” neste período de festas.
É de inteira e afetiva normalidade lembrar os portugueses que lutam pela sobrevivência ou pelo êxito pessoal e profissional longe da terra natal – ou por espírito de aventura ou porque o país não lhes deu possibilidades de singrar na vida ou, ainda, porque governantes mal avisados lhes apontaram como porta de saída a emigração; e é com sentido de justiça que se aprecia o trabalho daqueles que estão encarregados de garantir a tranquilidade, a segurança, o conforto, o descanso ou a paz dos demais.
Nestes aspetos, António Costa não é diferente dos outros Chefes de Governo que o precederam. É o sentido de Estado e a dimensão social do cargo que o postulam.
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Se, há dois anos, Costa falava dos desafios “enormes”, agora destacou “o maior crescimento económico desde o início do século” e o “reconhecimento internacional”.

Na verdade, a 25 de dezembro de 2015, o Primeiro-Ministro recém-empossado transmitia a sua primeira mensagem de Natal aos portugueses com o discurso de promessas. Então, António Costa prometeu “virar a página da austeridade”, “colocar Portugal no caminho do crescimento” e “quebrar o ciclo de empobrecimento”. Em 2016, focou o discurso na educação e passou a promessas menos abstratas. Agora, a par do luto que invadiu o país por força das vítimas mortais dos incêndios e da onda de destruição por eles provocada, foca os efeitos económicos e financeiros já obtidos e as promessas contém uma ambição mais qualitativa.
No Natal de 2015, António Costa era Chefe do Governo havia um mês, depois de ter sido empossado por Cavaco Silva a 26 de novembro. Nessa altura, o contexto económico era muito diferente do de hoje: a economia preparava-se para crescer 1,8% nesse ano, a taxa de desemprego estava nos 12,5% e o défice ficou em 4,4% do PIB. Dizia então António Costa:
Estamos a chegar ao fim de um ano muito exigente para todos os portugueses. Um ano que ainda impôs às famílias enormes sacrifícios e que continuou a revelar bloqueios económicos e sociais do país. Um ano em que as consequências da austeridade se revelaram nas desigualdades e nas dificuldades na vida dos portugueses.”.
Logo a seguir, passava à melancolia otimista:
O caminho que temos pela frente não será fácil, enfrentamos enormes desafios e teremos muitos obstáculos a ultrapassar, mas estou confiante de que os vamos superar”.
Em 2016, nem por uma vez Costa usou a palavra austeridade. O foco foi a educação e a mensagem foi transmitida a partir de um jardim de infância. E uma das promessas mais concretas foi a garantia da educação pré-escolar gratuita para crianças a partir dos três anos.
Por essa altura, o Primeiro-Ministro classificava o “conhecimento” como “o nosso maior défice”, comparando Portugal com o resto da Europa e garantia, por isso, que a prioridade era “investir na cultura e na ciência, na educação e na formação ao longo da vida”. A economia tinha crescido e o emprego aumentado, mas a qualidade continuava a ser discutível.
Agora, já é tempo de colher alguns louros, pois os resultados merecem o reconhecimento internacional, permitem diminuir o peso e custos da dívida, o que possibilita mais investimento na melhoria do sistema de ensino, no serviço nacional de saúde e na modernização do país.  

2017.12.26 – Louro de Carvalho  

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