Na tradicional mensagem de Natal do Primeiro-Ministro,
podem distinguir-se três momentos diferentes. O primeiro consistiu na referência
aos incêndios florestais do ano que agora termina; o segundo tem a ver com os
aspetos económicos e financeiros atingentes ao país; e o terceiro tem como alvo
os portugueses da diáspora. É claro que as palavras-chave do discurso serão naturalmente:
incêndios, crescimento e fim da austeridade.
António Costa não se esqueceu de salientar o “maior
crescimento económico desde o início do século” e de apontar a criação de
emprego “digno” como a grande aposta do próximo ano.
Um ano fustigado pelos incêndios de junho e de outubro, pelo crescimento
económico e pelo fim da austeridade e conquista da “credibilidade” são
dimensões por que se move o Primeiro-Ministro em torno do ano de 2017.
***
Quanto ao momento
que gera o luto nacional, António
Costa lembrou a “dor e o sofrimento das pessoas” afetadas pelos incêndios deste
ano, dizendo que o Governo nunca esquecerá esta dor e o sofrimento, “nem o
nível de destruição” provocado por estas catástrofes.
Recordando que “o ano que agora termina foi dramaticamente marcado pela
perda de vidas humanas em incêndios que enlutaram famílias e devastaram uma
grande parte do nosso território”, classificou o facto como “uma tragédia para
todo o País” e “um momento de luto nacional, que sofremos coletivamente”.
Porém, assegurou que agora “é tempo de dar nova vida ao que o fogo
consumiu” e “reerguer as casas destruídas, recuperar a capacidade produtiva das
empresas atingidas e devolver o verde aos territórios e a esperança
às populações”. E reiterou o “compromisso de fazer tudo o que
tem de ser feito para prevenir e evitar, naquilo que é humanamente
possível, tragédias como as que vivemos”, através da melhoria da “prevenção, o
alerta, o socorro e a capacidade de combater as chamas” e, sobretudo, com a
“revitalização do interior e o reordenamento da floresta”.
E foi claro do compromisso do Governo em relação aos termos acima apontados:
“Reafirmo, perante os portugueses, o
compromisso de fazer tudo o que tem de ser feito para prevenir e evitar,
naquilo que é humanamente possível, tragédias como a que vivemos. Melhorando a
prevenção, o alerta, o socorro, a capacidade de combater as chamas.”.
Na
perspetiva do Chefe do Governo, porém, a par dos meios de prevenção e de
combate aos fogos, o país deve concentrar-se também “com persistência no que
exige tempo, mas que é o mais decisivo e estrutural: a revitalização do interior
e o reordenamento da floresta”.
Depois de
ter lamentado as consequências dos incêndios de junho e de outubro, que
provocaram mais de 100 mortos, cerca de 350 feridos e milhões de euros de
prejuízos, declarou:
“Os portugueses estão unidos e mobilizados
para esta causa. É um grande desígnio de Portugal e dos portugueses. Todos
juntos vamos alcançá-lo.”.
Depois, de
salientar o peso da tragédia incendiária para as famílias que perderam
familiares e bens, para as populações e terras fustigadas pelo fogo e para o
país inteiro, enalteceu, depois “a coragem, o altruísmo, a entreajuda, a enorme
onda de solidariedade” que cresceu em Portugal. E, aproveitando a ocasião para
destacar a importância da ação desenvolvida pelas populações das zonas atingidas,
dos autarcas, dos bombeiros voluntários e profissionais, dos militares, das
forças de segurança, dos escuteiros, de médicos e enfermeiros, vincou:
“Não esqueceremos a vontade de não desistir,
de não abandonar, de reconstruir o que foi destruído, de fazer renascer o que
foi devastado. Disso tenho sido testemunha nas muitas visitas de trabalho que
tenho feito aos concelhos atingidos.”.
Nem se percebe como é que as populações
classificaram o Primeiro-Ministro de insensível, isolando-o do Presidente da
República. Será porque não vende a lógica dos afetos como Marcelo Rebelo de
Sousa? Será questão de temperamento? Ou porque humanamente a espera das
populações de ajuda da parte de quem pode dispor dos meios não tem
compreensivelmente a paciência de suportar o tempo? Mas também nestas ocasiões
não há lucidez para escolher alvos e eles foram escolhidos. E eu não compreendo
a razão de ser desta escolha seletiva para lá do oportunismo e do populismo
barato que alguns sabem oferecer e outros sabem promover.
***
O crescimento económico e as questões financeiras foram o segundo
ponto-chave do discurso de Costa, que voltou a salientar o “virar de página da crise”.
Neste
capítulo, o Primeiro-Ministro congratulou-se com os resultados alcançados em
2017, apontando que o país saiu do Procedimento
por Défices Excessivos na União Europeia, que o crescimento será “o maior”
desde o início do século e que foram criados 242 mil novos postos de trabalho.
Antes de adiantar
que o emprego “é a prioridade” que o Governo definiu para 2018, considerou:
“Libertámo-nos da austeridade e conquistámos
a credibilidade. Chegou o tempo de vencer os bloqueios ao desenvolvimento.”.
E apresentou
o desígnio governamental para o próximo ano:
“Emprego digno, salário justo e oportunidade
de realização profissional são condições essenciais para os jovens
perspetivarem o seu futuro em Portugal. Não um futuro adiado, mas um futuro
alicerçado em boas oportunidades de formação e de emprego qualificado, de
habitação acessível, numa sociedade dinâmica, aberta ao mundo, que garanta a
liberdade de plena realização pessoal.”.
António
Costa defendeu depois a tese de que só com emprego de qualidade Portugal poderá
ter “um crescimento sustentável”, estando preparado para “agarrar as
oportunidades que o futuro traz e para enfrentar os desafios tão complexos do
século XXI, como as alterações climáticas, a construção da sociedade digital ou
o declínio demográfico”. E acrescentou:
“Este ano confirmou que, perante as
dificuldades, os portugueses se unem na solidariedade e com determinação. É com
essa energia e com essa vontade que contamos em 2018 continuar com mais
crescimento, melhor emprego, maior igualdade.”.
O facto de este ano termos o maior crescimento económico desde o início do século
– espera-se que seja sustentável e consolidado –, a criação de 242 mil novos
postos de trabalho por parte das empresas, a diminuição da pobreza e da
desigualdade, que é a batalha de todos os dias, o cumprimento das metas orçamentais,
com o registo do défice mais baixo em democracia, que assegurou a saída do Procedimento por Défices Excessivos, permitiu
“diminuir o peso da nossa dívida” e “reduzir os seus custos”, o que, por sua
vez, segundo Costa, liberta “recursos
para investir responsavelmente na
melhoria do nosso sistema de ensino, do serviço nacional de saúde e na
modernização do país”.
Mais: no dizer do
Primeiro-Ministro, “libertámo-nos da austeridade e conquistámos a
credibilidade“, sendo que agora, “chegou o tempo de vencer os bloqueios
ao nosso desenvolvimento”. Por isso, a criação de emprego será o grande
investimento a fazer no próximo ano. Porém, não se trata apenas de mais emprego,
mas de “melhor emprego”. Esta é a prioridade definida para o ano de 2018: emprego
digno, salário justo e oportunidade de realização pessoal e profissional. E concluiu
este ponto dizendo:
“Só assim teremos um crescimento
sustentável, um país preparado para agarrar as oportunidades que o futuro nos
traz e para enfrentar os desafios tão complexos do século XXI”.
***
Na sua
mensagem de Natal, tal como nos dois anos anteriores, o Primeiro-Ministro
deixou palavras de “especial carinho” às comunidades portuguesas espalhadas
pelo mundo, de “louvor e reconhecimento aos militares das Forças Armadas e aos
elementos das forças de segurança que se encontram em missões de paz”, assim
como palavras de “gratidão aos que se encontram a trabalhar” neste período de
festas.
É de inteira
e afetiva normalidade lembrar os portugueses que lutam pela sobrevivência ou
pelo êxito pessoal e profissional longe da terra natal – ou por espírito de
aventura ou porque o país não lhes deu possibilidades de singrar na vida ou, ainda,
porque governantes mal avisados lhes apontaram como porta de saída a emigração;
e é com sentido de justiça que se aprecia o trabalho daqueles que estão
encarregados de garantir a tranquilidade, a segurança, o conforto, o descanso
ou a paz dos demais.
Nestes aspetos,
António Costa não é diferente dos outros Chefes de Governo que o precederam. É o
sentido de Estado e a dimensão social do cargo que o postulam.
***
Se, há dois anos, Costa falava dos
desafios “enormes”, agora destacou “o maior crescimento económico desde o
início do século” e o “reconhecimento internacional”.
Na verdade,
a 25 de dezembro de 2015, o Primeiro-Ministro recém-empossado transmitia a sua
primeira mensagem de Natal aos portugueses com o discurso de promessas. Então, António
Costa prometeu “virar a página da austeridade”, “colocar Portugal no caminho do
crescimento” e “quebrar o ciclo de empobrecimento”. Em 2016, focou o discurso
na educação e passou a promessas menos abstratas. Agora, a par do luto que
invadiu o país por força das vítimas mortais dos incêndios e da onda de
destruição por eles provocada, foca os efeitos económicos e financeiros já
obtidos e as promessas contém uma ambição mais qualitativa.
No
Natal de 2015, António Costa era Chefe do Governo havia um mês, depois de ter
sido empossado por Cavaco Silva a 26 de novembro. Nessa altura, o contexto
económico era muito diferente do de hoje: a economia preparava-se para crescer
1,8% nesse ano, a taxa de desemprego estava nos 12,5% e o défice ficou em 4,4% do
PIB. Dizia então António Costa:
“Estamos a chegar ao
fim de um ano muito exigente para todos os portugueses. Um ano que ainda impôs
às famílias enormes sacrifícios e que continuou a revelar bloqueios económicos
e sociais do país. Um ano em que as consequências da austeridade se revelaram
nas desigualdades e nas dificuldades na vida dos portugueses.”.
Logo a seguir, passava à melancolia otimista:
“O
caminho que temos pela frente não será fácil, enfrentamos enormes desafios e
teremos muitos obstáculos a ultrapassar, mas estou
confiante de que os vamos superar”.
Em 2016, nem por uma vez Costa usou a palavra austeridade.
O foco foi a educação e a mensagem foi transmitida a partir de um jardim de
infância. E uma das promessas mais concretas foi a garantia
da educação pré-escolar gratuita para crianças a partir dos três anos.
Por essa altura, o Primeiro-Ministro classificava o “conhecimento” como “o
nosso maior défice”, comparando Portugal com o resto da Europa e
garantia, por isso, que a prioridade era “investir na cultura e na ciência, na
educação e na formação ao longo da vida”. A economia tinha crescido e o emprego
aumentado, mas a qualidade continuava a ser discutível.
Agora, já é tempo de colher alguns louros, pois os resultados merecem o
reconhecimento internacional, permitem diminuir o peso e custos da dívida, o
que possibilita mais investimento na melhoria do sistema de ensino, no serviço
nacional de saúde e na modernização do país.
2017.12.26 –
Louro de Carvalho
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