sábado, 9 de dezembro de 2017

Instituto da Padroeira de Portugal para os Estudos da Mariologia – IPPEM

Segundo a agência Ecclesia, um conjunto de investigadores decidiu criar o Instituto da Padroeira de Portugal para o Estudo da Mariologia (IPPEM), a fim de aprofundar os estudos sistemáticos sobre a Imaculada Conceição e a “cultura religiosa mariana”.
Tal associação sem fins lucrativos – é esta a figura jurídica assumida pelo IPPEM – foi criada por escritura no passado dia 1 de dezembro, subscrita por 19 membros fundadores, estando previsto o ato solene de fundação para o início de 2018.
Entre os subscritores do protocolo da fundação estão os reitores dos Santuários de Fátima e de Vila Viçosa, respetivamente os padres Carlos Cabecinhas e Francisco Couto, o historiador José Eduardo Franco, sacerdotes da arquidiocese de Évora, membros da Régia Confraria e investigadores de universidades portuguesas, entre outros.
Segundo uma nota de imprensa enviada ao Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura (SNPC), o organismo terá sede em Vila Viçosa e visa aprofundar os estudos sistemáticos sobre a Padroeira e a “cultura religiosa mariana” em Portugal.
José Eduardo Franco, um dos 19 membros fundadores, em texto publicado no dia 8 de dezembro, no Semanário Ecclesia, assinala:
Não é excessivo considerar que aspetos importantes da herança cultural estão eivados de marianismo entendido como o influxo de elementos típicos da devoção àquela que é considerada a Mãe de Deus no quadro da tradição cristã de confissão católica”.
No dia em que a Igreja Católica celebrava a solenidade da Imaculada Conceição, o investigador frisava que a cultura e a identidade portuguesas têm sido, “desde a sua génese, modeladas pela espiritualidade e pelas marcas pluriformes da devoção a Nossa Senhora”. E sublinhava:
A assunção plena desta espiritualidade mariana na relação com derivas decisivas da história de Portugal observa-se no período da Restauração Portuguesa em que o então Rei de Portugal, Dom João IV, o primeiro da nova dinastia de Bragança, coroa Nossa Senhora da Conceição como Rainha de Portugal, contribuindo para posicionar o nosso país entre as monarquias europeias que mais valorizaram o papel teológico e histórico da Mãe de Jesus”.
Assim, o IPPEM assume, entre os seus objetivos, “promover, fomentar e organizar iniciativas científicas e culturais para o aprofundamento dos estudos sistemáticos” sobre a Padroeira de Portugal e promover a investigação científica, tanto na Teologia como numa vertente interdisciplinar, particularmente na área das Ciências Sociais e Humanas – com vista à perceção científica e crítica do fenómeno que perpassa a História de um povo.
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Na verdade, a cultura e a identidade portuguesas têm sido, desde a sua génese, modeladas pela espiritualidade e pelas marcas pluriformes da devoção a “Nossa Senhora”, o cognome mais referenciado para designar com veneração a Mãe de Jesus de Nazaré. Podemos observar o influxo dos elementos típicos da devoção a Maria não apenas na vivência religiosa do cristianismo, mas também nas tradições populares mais diversas, até ao seu reflexo na cultura erudita, na literatura, na música, na arquitetura, na iconografia e nas mais diversas expressões da Arte.  O facto de Portugal ter como um dos seus mais antigos cognomes o de “Terra de Santa Maria” é, segundo Franco, “uma das expressões mais eloquentes da influência da espiritualidade mariana que tem embebido transversalmente todas os setores sociais ao longo dos tempos”, tanto no campo das elites como no do povo simples que “aclama e venera a Mãe de Cristo como sua mãe também e universal Protetora e cujo culto remonta aos inícios da nacionalidade”, mas atravessando e modelando toda a História.
A assunção desta espiritualidade mariana, além dos factos históricos, que a relevam expressa e reiteradamente, espelha-se no calendário litúrgico de Portugal em que a Imaculada Conceição é tomada como a padroeira principal. Trata-se duma valorização que acaba por realçar e fazer vingar uma das correntes teológicas em polémica desde a Idade Média, a corrente imaculista, “que defendia o reconhecimento pela Igreja de um estatuto antropoteológico especial para a Mãe de Cristo”, que será consagrado no século XIX pela proclamação do dogma da Imaculada Conceição pelo Papa Pio IX, defendido sustentavelmente pela universidade de Coimbra desde as suas origens, e, no século XX, pela proclamação do dogma da Assunção de Nossa Senhora pelo Papa Pio XII.
E não é irrelevante o papel desta cultura mariana em Portugal para se entender a centralidade da afirmação internacional no século XX da espiritualidade mariana decorrente da experiência das Aparições da Cova da Iria em 1917. A edificação do Santuário de Fátima que, cem anos depois, ganhou uma projeção global como um dos santuários marianos mais importantes do mundo não se pode desligar da cultura e da mentalidade e mesmo da espiritualidade coletiva tonificada pelo culto a Nossa Senhora.
Por isso, “não deixa de constituir uma lacuna significativa que um país como Portugal”, com “uma tão interessante e estruturadora cultura mariana”, não esteja dotado dum “centro de estudos especializado no conhecimento científico desta herança espiritual e cultural, tendo por referência a sua padroeira e as tradições, devoções e criações artísticas e patrimoniais geradas em torno desta relação estreita entre Nossa Senhora e a modelação da identidade portuguesa”.
É para colmatar esta lacuna que se cria o IPPEM “para promover, fomentar e organizar iniciativas científicas e culturais para o aprofundamento dos estudos sistemáticos sobre a Padroeira de Portugal e a cultura religiosa mariana no nosso país, na sua relação com a suas expressões e correntes internacionais”.
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Nos termos da comunicação de José Eduardo Franco no predito semanário, os seus fins são:
- Prosseguir ações de caráter científico, cultural, social, valorização patrimonial e de intervenção cívica em torno da Padroeira de Portugal e da espiritualidade religiosa, cultura e património ligado à devoção a Nossa Senhora.
- Promover a investigação científica, de teologia, a temas ligados à Padroeira e à mariologia no seu conjunto.
- Apoiar e desenvolver a investigação de vertente interdisciplinar, particularmente na área das Ciências Sociais e Humanas e cooperação com outras áreas do saber.
- Refletir criticamente sobre a identidade cultural de Portugal na relação com a cultura mariana e com o processo devocional específico à Padroeira de Portugal.
- Valorizar o património material e imaterial mariano e promovê-lo nas redes globais.
- Fomentar a pedagogia do espírito intercultural democrático através da cultura do diálogo, da tolerância e do respeito entre indivíduos e entre povos tendo por referência Maria como Mãe Universal, estimulando a cultura de cidadania e de participação.
E o IPPEM prossegue os seguintes fins específicos:
- Cooperar com instituições do Ensino Superior para criar programas de graduação, no âmbito da formação superior, nomeadamente nos ciclos de estudos de mestrado e doutoramento, que promovam o aprofundamento dos estudos da Padroeira e da Mariologia e a sua relação com a história global.
- Fomentar a divulgação de obras e autores marianos através de edições, reedições e traduções.
- Preparar projetos de investigação para estudar as várias vertentes da cultura mariana da Padroeira de Portugal, em articulação, com as disciplinas da Arte, a Literatura, o Património e a Espiritualidade.
- Conceder bolsas de estudo em todas as áreas científicas, em parceria com outras instituições universitárias, nos termos da legislação aplicável.
- Desenvolver ações culturais, tais como conferências, colóquios, congressos, encontros, exposições, roteiros turísticos em estreita ligação com outras entidades públicas e privadas.
Enfim, o IPPEM propõe-se “desenvolver ações culturais, tais como conferências, colóquios, congressos, encontros, exposições, roteiros turísticos em estreita ligação com outras entidades públicas e privadas”; e, por ouro lado, “fomentar a divulgação de obras e autores marianos”, “conceder bolsas de estudo em todas as áreas científicas, em parceria com outras instituições universitárias” e “criar programas de graduação” que “promovam o aprofundamento dos estudos da Padroeira e da Mariologia” estão entre os objetivos da instituição.
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A Igreja católica considera que a solenidade da Imaculada Conceição, “festa do começo absoluto”, decorre da iniciativa de Deus, que, para preparar a chegada de Jesus à humanidade, “preservou a Virgem Maria de toda a mancha de pecado original”. Assim, o papa Pio IX, em 1854, definiu como dogma de fé a Conceição Imaculada da Virgem, verdade na qual Maria se nos apresenta como a primeira redimida pela Páscoa (passagem da morte à ressurreição) de Cristo.
Em Portugal, a fé nesta virtuosidade de Maria é vivida pelo menos desde o século XII, a partir do qual se conhecem diversas igrejas, capelas e altares dedicados à Imaculada Conceição, que tem a sua solenidade litúrgica a 8 de dezembro. E o apogeu desta devoção ocorreu quando Dom João IV, em 1646, reunidos os três Estados do Reino, consagrou o país e coroou a Imaculada Conceição como Rainha de Portugal e prescindiu do uso da coroa régia, o que persistiu para a posteridade.
O Santuário de Nossa Senhora da Conceição, em Vila Viçosa, arquidiocese de Évora, é um dos locais mais significativos da devoção portuguesa a Maria e à Imaculada Conceição, a que se juntou, em réplica, no século XIX, o Santuário de Nossa Senhora da Conceição do Sameiro, em Braga, contra a onda galopante do racionalismo e do positivismo e em consonância com as aparições em Lourdes, em que a Senhora se identificou como “A Imaculada Conceição” perante Bernardette Soubirous na margem do Gave.

2017.12.09 – Louro de Carvalho

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