Não é tão
surpreendente como alguém poderia supor, mas os eleitores catalães baralharam o
sistema com a corrida em massa às urnas no passado dia 21 de dezembro.
O “Ciudadanos”
de Inês Arrimadas obteve o maior número de votos, mas os grupos de
independentistas fazem a maioria no Parlamento, com 70 deputados num universo
de 135. Por isso, enquanto Arrimadas canta vitória, Carlos Puigdemont ganha
força.
Numa votação
com uma afluência histórica, os catalães evidenciaram nas urnas a forte divisão
que lhes atravessa a sociedade. O “Ciudadanos” foi o partido mais votado, mas
os partidos independentistas reconseguiram maioria parlamentar. E o PP (Partido
Popular) aparece como o grande derrotado
conseguindo apenas três deputados. Puigdemont surpreendeu ao conquistar um
inesperado segundo lugar. É o preço que Rajoy paga por ter marcado eleições regionais
e manter o líder da oposição à vontade de Madrid preso e exilado por delito
político.
A Catalunha
votou mas o problema permanece, com constitucionalistas e independentistas a
reclamarem vitória.
Os catalães,
chamados a votar, insistem na apresentação dum resultado complexo nas eleições.
E foram perto de 82 por cento os eleitores que se deslocaram às urnas, numa
afluência histórica para umas eleições regionais.
Nas urnas,
os catalães fizeram do “Ciudadanos” de Inês Arrimadas a força política mais
votada, mas deram clara maioria absoluta ao bloco independentista, constituído
pelo “Juntos pela Catalunha” de Carles Puigdemont, pela “Esquerda Republicana
de Catalunha” de Oriol Junqueras e pela “Candidatura de Unidade Popular”.
***
Na análise
por forças partidárias, o “Ciudadanos” (C’s) é o grande vitorioso destas eleições – apesar de parecer incapaz de
conseguir apoio parlamentar, fruto da maioria independentista. A força política
de Inês Arrimadas e Albert Rivera consegue 25,36% dos votos, valor superior aos
17,90 por cento de votos conquistados em 2015. Este partido liberal de
centro-direita passa de 25 para 37 deputados, segundo o que revelam os dados da
Generalitat quando estavam escrutinados 99,8 por cento dos votos.
Em segundo
lugar fica o “Juntos pela Catalunha” (JUNTSxCAT) de Carles Puigdemont. O presidente destituído do
Governo catalão surge também como vencedor, conseguindo um resultado superior
ao que as sondagens indiciavam. Com 21,66% dos votos e 34 deputados, Puigdemont
ultrapassa o seu ex-parceiro de coligação, a “Esquerda Republicana de Catalunha”
(ERC-CatSí), que obteve 21,39% dos votos e fez eleger 32
deputados.
A ERC, neste
terceiro lugar, fica aquém do que era esperado para um partido que era dado
pelas sondagens como possível vencedor.
Em quarto
lugar, o “Partido Socialista da Catalunha” (PSC) obtém 13,87% dos votos e faz eleger 17 deputados.
Em quinto
lugar encontra-se o “Catalunha em Comum” (CatComú-Podem), partido próximo do “Podemos”. Este partido defende
a realização de um referendo à independência, tendo-se oposto à independência
unilateral e à aplicação do artigo 155.º. Com 7,48% dos votos e oito deputados,
o “Catalunha em Comum” perde força, mas pode ainda ter relevância no futuro
político da Autonomia.
Em sexto
lugar surgem os radicais de esquerda da CUP, também eles independentistas. É um
partido perde força política em relação a 2015. Passa a ter quatro deputados,
frutos dos seus 4,45% dos votos, contra os dez deputados que tinha
anteriormente.
Em sétimo
lugar, vem o “Partido Popular da Catalunha” (PPC). A filial catalã do partido de Mariano Rajoy apresenta-se como grande derrotada:
passa de 11 para três deputados, mercê dos magros 4,24% dos votos que obteve, e
não conseguirá sequer formar um grupo parlamentar.
(cf https://www.rtp.pt/noticias/mundo/eleicoes-na-catalunha-carles-puigdemont-ganha-forca-apesar-do-resultado-do-ciudadanos_n1047873)
Se a análise
for feita a partir dos blocos partidários por interesses políticos, sucede que
um partido liberal de centro-direita foi o que mais votos conquistou nas urnas.
E, se não houver uma cambalhota política como a que ocorreu em Portugal em
2015, o partido de Arrimadas será chamado à governança, mas ser-lhe-á difícil
negociar à esquerda e a negociação à direita será insuficiente. Com efeito, as
forças que defendem a independência da Catalunha continuam a ter maioria no
Parlamento.
Ao somar-se
o número de deputados dos “Juntos pela Catalunha” e da “Esquerda Republicana da
Catalunha” verifica-se que estes dois partidos conquistam 66 deputados,
conseguindo aumentar o número de parlamentares em relação às eleições de 2015, que
eram 62.
Apesar de
juntos não conseguirem ainda os 68 deputados, conseguem ter mais votos juntos
do que os três partidos constitucionalistas (“Ciudadanos”, “Partido Popular” e “Partido
Socialista”) e do que o
“Catalunha em Comum”. Ou seja, o “Juntos pela Catalunha” e a ERC nem precisarão
de contar com os votos favoráveis dos radicais da CUP, de quem estiveram dependentes
na última legislatura.
A “Catalunha em Comum” não apoia a independência unilateral, mas defende a
realização de um referendo. Nesse sentido e, como sublinhou Carles Puigdemont
no seu discurso do dia 21, os partidos que querem que seja, pelo menos,
realizado um referendo à independência obtêm 78 deputados contra os 57
parlamentares dos partidos que se opõem à sua realização.
E, com o “Ciudadanos”
a ser a força política mais votada num Parlamento que vai ser dominado por
deputados independentistas, os dois campos reivindicam a vitória nestas
eleições. Inês Arrimadas agradeceu aos catalães pelo resultado obtido,
sublinhando o forte crescimento conseguido pelo partido nos últimos anos e
dizendo: “Somos os vencedores das
eleições da Catalunha”. E sublinhou que os partidos independentistas não
poderão mais falar em nome “de todos os catalães”.
Convicta de
que “ficou ainda mais claro que que a
independência não tem futuro”, assegurou que “o Governo dos partidos separatistas perdeu as eleições, perdeu votos,
perdeu assentos no Parlamento e perdeu força” e prometeu luta.
Em Bruxelas,
Carlos Puigdemont fez interpretação em sentido contrário ao dizer que “a Republica da Catalunha ganhou à monarquia
e ao artigo 155.º”. E declarou com firmeza: “A República catalã ganhou. Ouçam-no bem, tomem nota”.
Puigdemont
exigiu a libertação imediata dos políticos que estão presos em Madrid, pois,
como garantiu, “a receita que Rajoy receitou aos catalães e apresentou à Europa
fracassou”, sendo que agora “as coisas estão ainda melhores para o independentismo”. E,
apresentando-se como “presidente legítimo da Catalunha”, pediu à Europa que
tome nota de que “a receita de Rajoy não funciona” e apoie os catalães.
Para já, a
União Europeia já disse manter a mesma posição. O porta-voz da Comissão
Europeia avançou à France Presse que
a posição de Bruxelas não vai mudar perante estes resultados. A este respeito, Alexandre
Winterstein declarou:
“Tratando-se de uma eleição regional, não
temos qualquer comentário a fazer”.
***
Porém, Inês
Arrimadas não está tão confiante como quer fazer crer. Com efeito, Os três partidos que formam o bloco independentista
(Juntos pela Catalunha, ERC e CUP) conseguem somar mais de 70 deputados e com
isso formar maioria, que significa que, apesar de ter ganho as eleições do dia
21 na Catalunha, o partido “Ciudadanos” não conseguiu garantir a mais de metade
dos 135 assentos necessários para um governo de maioria. É esta matemática que
leva Inés Arrimadas, a líder do “Ciudadanos”, a considerar a lei eleitoral catalã
“injusta” pois “dá aos independentistas uma maioria em deputados que não têm
nos votos, nas ruas”.
***
Ora,
se o Primeiro-Ministro espanhol atirava à Catalunha com a Constituição e com a
legalidade a despeito do referendo e da declaração unilateral de independência,
também Arrimadas tem que aceitar a lei catalã, que nem é tão esquisita como
parece. Em Portugal também assim é. São as virtualidades do método de representação
proporcional que impede a absolutização do poder por parte de quem ganha, mas
que pode criar situações de difícil governabilidade.
E
agora Rajoy não pode continuar com o argumento da constitucionalidade e da
legalidade. Tem de dialogar com as duas frentes, onde não há vencedores inequívocos,
e deve apoiar quem governe, não podendo ater-se a quem ganhou literalmente as
eleições. É a democracia que tem regras, mas que tem de ser aceite.
2017.12.23 –
Louro de Carvalho
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