É um bom ponto de partida para ensinar esta
postura que se respira, quer na aula sinodal, quer nos seus bastidores. Presente
na Sala de Imprensa da Santa Sé no briefing
do dia 8, o auditor Thomas Leoncini (de 33 anos), escritor, estudioso de modelos psicológicos e sociais, expressou
satisfação pelo encontro sinodal, que manifesta a vontade de escuta da Igreja,
não se limitando à “simples tomada de consciência”, mas buscando “respostas
radicais”, pois, como referiu, o Sínodo não se dirige somente aos jovens católicos, mas também aos
ateus, agnósticos”, a todos “aqueles jovens que buscam uma esperança e um
futuro” nestas sociedades “líquidas”.
No mesmo briefing Dom Charles Scicluna, Padre sinodal e Arcebispo
metropolitano de Malta, destacou os temas que surgiram até então durante o Sínodo: a
solidariedade entre as gerações, a contribuição das mulheres na missão da
Igreja, a questão das migrações e da sexualidade, bem como a da santidade. E,
assegurando que “sem justiça não se pode viver”, apontou que, no caso dos abusos,
“buscar
a verdade é essencial”.
Respondendo
aos jornalistas credenciados, o prelado disse que o escândalo dos abusos sexuais,
que figura no parágrafo 66 do “Instrumentum laboris” (Instrumento de trabalho) é fonte de “vergonha”, sobretudo porque “a maior
parte das vítimas é constituída de jovens, com feridas infligidas por quem
deveria curá-las” e que é preciso elevar o “nível de responsabilidade”. Porém,
advertiu que a “justiça não deve tomar para si um tempo exagerado” e que o Papa
sofre com esta morosidade, embora consciente do tempo necessário da “jurisdição
civil”. E insistiu, atendendo à fraqueza humana, no facto de que “todos
precisamos de misericórdia”, mas que “a misericórdia é vazia se não
respeita a verdade e a justiça”.
Evocando o
encontro realizado no Vaticano entre os dias 21 a 24 de fevereiro de 2019, para
discutir a proteção dos menores e a prevenção aos abusos, disse da importância
de ir à “raiz” do problema, sendo que o “ministério deve ser um serviço e não um
abuso de poder”. Por fim, recordou aqueles muitos sacerdotes “santos”
que trabalham e “confiam no Senhor”, frisando que “a santidade é o encontro entre a fraqueza do homem e a misericórdia de
Deus”.
Durante o
briefing o Padre sinodal e Bispo auxiliar de Lyon, Dom Emmanuel Gobilliard, tendo
presente também os temas que surgiram até então durante o Sínodo, declarou que “todo
o jovem é chamado à felicidade, à santidade, ao encontro com Cristo”. E,
recordando as recomendações de Francisco aos bispos, afirmou que o ser humano “deve ser acolhido em sua complexidade e não
encerrado numa simples identidade”, ou seja, deve “ser substantivo e não adjetivo”.
***
Por sua vez, o Cardeal Dom
Lorenzo Baldisseri,
secretário-geral do Sínodo, deu entrevista sobre a 1.ª fase da Assembleia que
se concluiu no dia 9, em que afirmou: “queremos
dar espaço suficiente aos jovens, seja na Igreja, seja na sociedade e no mundo
da política e da economia”.
As três
fases do Sínodo correspondem às partes do Instrumentum Laboris, a referência da Assembleia por
conter a síntese de testemunhos, reflexões e demandas provenientes de
diferentes partes do mundo. A 1.ª parte do Documento de Trabalho foi de
reconhecimento, com a Igreja “escutando” a realidade, como explica o Cardeal
Baldisseri:
“Este é o momento em que os Padres
apresentam os relatórios ao público, porque já estão efetivamente publicados a
todos os círculos menores, entre os grupos de trabalho. E já temos uma ideia de
como os Padres são concernentes e profundamente incluídos no assunto que
estamos trabalhando, através dos modos e emendas do texto-base, do Instrumentum
Laboris, muito importantes e eficazes.”.
A 2.ª fase
de interpretação, como esclareceu Dom Baldisseri, será feita por uma comissão
de integração do Instrumentum Laboris, inicialmente de caráter
provisório, mas fundamentalmente para ver como os Padres Sinodais interpretam o
texto-base, pois todos os procedimentos do Sínodo estão regulamentados com
vista a facilitar os debates e a troca de opiniões, de modo que emerja a voz
das Igrejas espalhadas pelo mundo ao refletir a atual realidade juvenil. E vincou:
“Estamos dentro deste grande tema que é global e não como uma forma, mas
uma indicação substancial da realidade de hoje em que os jovens, infelizmente,
não têm espaço. Nós queremos dar espaço suficiente seja na Igreja, seja na
sociedade e no mundo da política e da economia. Esses jovens, como
consequência, não veem um futuro. E nós queremos dar-lhes esperança.”.
***
Nos círculos menores, evidencia-se a ideia dos
jovens como sismógrafo da realidade e
protagonistas da Igreja, dizendo os Padres sinodais, em nome da
necessidade de uma Igreja
empática, em diálogo, que “os jovens devem ser valorizados”. E desenvolvem:
“A sua participação ativa na vida eclesial deve ser promovida e
relançada, o seu compromisso deve ser bem aproveitado numa perspetiva de
verdadeira sinodalidade, para que sejam protagonistas, com responsabilidade, de
processos e não de eventos individuais. Deste modo, eles serão evangelizadores
de seus coetâneos.”.
Em 14
sínteses, 6 línguas e um tema, “a escuta”, se articula o trabalho dos Círculos
Menores centrado na 1.ª parte do Instrumentum
Laboris a afirmar a necessidade duma Igreja empática, em diálogo, que evite
autorreferencialidade e preconceitos e evidencie pontos sobre a credibilidade
do testemunho. Com efeito, sendo “sismógrafo da realidade, os jovens são
Igreja”, como reitera o Sínodo. Por isso, é preciso oferecer-lhes com alegria
as razões para viver e esperar, evitando moralismos e mostrando que a vida é a
resposta à vocação que Deus dá a cada um de nós, pois, “no fundo, a vida é bonita porque tem sentido” e, sendo os jovens capazes
de tomar decisões, “é preciso ajudá-los a
tomar decisões a longo prazo”.
Os Círculos
menores detêm-se detalhadamente sobre o tema da cultura digital, rica de luz,
mas também de sombras, como aumento do sentimento de solidão, risco duma
atitude compulsiva para com a “cultura da tela”, duma “demência digital” que
implica a incapacidade de concentração e compreensão de textos complexos, duma
“migração virtual” que leva os jovens para um mundo próprio, às vezes fruto da
invenção. Aí, a presença da Igreja é essencial para os acompanhar, advertindo-os
que a internet deve ser usada, mas sem que sejam usados, e sendo de recordar
que muitos jovens “não conectados” vivem em áreas rurais sem internet.
Também o
tema dos abusos também foi examinado pelos 14 Círculos menores como escândalo
que ameaça a credibilidade da Igreja e deve ser abordado de forma profunda,
reconquistando a confiança dos fiéis, sem se esquecer o que já foi feito pela
Igreja para combater e prevenir esse crime e evitar outras faltas
catastróficas. É importante ajudar os sobreviventes dos abusos a encontrar o
caminho do perdão e da reconciliação. Por outro lado, sublinha-se a
necessidade duma articulação melhor da questão da sexualidade, que deve ser
enfrentada com clareza e humanidade, sem negligenciar a linguagem teológica.
O olhar da
Sala Sinodal dirige-se ao tema da migração (que afeta muitos jovens) como o paradigma do interesse que os jovens dedicam
ao compromisso da Igreja no campo da justiça e da política, pelo que urge uma
pastoral adequada ao setor e um envolvimento conjunto das Conferências
Episcopais afetadas diretamente por esse fenómeno. Daí se infere a necessidade
de defender a causa do migrante internacionalmente criando canais de legalidade
e segurança e a importância de promover oportunidades nos países de proveniência
e nos de acolhimento, não devendo ser esquecidas as pessoas deslocadas e os
migrantes internos, bem como os perseguidos e martirizados em muitas áreas do
mundo.
Os Padres
sinodais enfrentam o tema da formação e da educação – sólida, interdisciplinar
e integral. E, evocando a relevância das escolas e universidades católicas, que
devem ser valorizadas e não instrumentalizadas, para que possam formar os jovens
na fé e na vida cristã, reiteram que o ensino é uma das principais tarefas da
Igreja e que, muitas vezes, ante fenómenos como o fundamentalismo e a
intolerância, a resposta melhor está na promoção duma educação para o respeito
e para o diálogo inter-religioso e ecuménico. A formação passa também através
do desafio duma pastoral familiar adequada que ajude na transmissão da fé entre
as várias gerações, pois, atualmente, segundo os participantes no Sínodo, “a família está a passar por uma fase de
crise, devido à sua desestruturação e ao enfraquecimento da figura paterna”.
Os adultos, em geral, muito jovens e individualistas, não ajudaram a perceção
da Boa Nova entre os adolescentes. Ora, é responsabilidade de todo fiel
acompanhar os jovens ao encontro pessoal com Jesus, porque a juventude se
constrói com base no que recebe na família. Por isso, a Igreja, “família
de famílias”, deve oferecer-lhes uma verdadeira experiência familiar,
na qual se sintam acolhidos, amados, cuidados e acompanhados em seu
crescimento, desenvolvimento integral e realização de seus sonhos e esperanças.
E, como afirma o Sínodo, a
formação correta também diz respeito aos pastores. Na verdade, é necessário um
novo estilo de vida sacerdotal e são necessários bispos que saibam acompanhar
de forma competente os jovens, porque parecem faltar, no momento, estratégias
pastorais eficazes, capazes de se confrontar com o secularismo e com a
globalização, que apresenta oportunidades para conciliar modernidade e
tradição. No fundo, a Igreja, mãe e mestra, deve ser escola de ensino para cada
jovem, superando a falta de sintonia entre ela e os adolescentes.
Além disso,
de vários Círculos surge a proposta de que do Sínodo saia uma mensagem aos
jovens e que tenha um estilo narrativo adequado para lhes transmitir a
esperança cristã com palavras proféticas que relatam o olhar de Deus sobre a
juventude. Nesta ótica, é também sugerido o uso de multimédia, a fim de se
dirigir aos jovens não apenas com um texto escrito, mas também com vídeos e
imagens.
***
Também o Cardeal
Fernando Filoni, Prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos, sublinhando que “a
dinamicidade dos jovens é riqueza para a Igreja”, afirmou, aos microfones
de Rádio Vaticano, Itália, numa pausa dos trabalhos desta XV Assembleia Geral
ordinária:
“É importante que o mundo inteiro, não somente a Igreja, mas também por
exemplo a política, considere com atenção a questão sobre que mundo estamos a
deixar aos nossos jovens. Como diz o Papa, os jovens não devem deixar-se
aprisionar, devem permanecer livres, em busca, seguir adiante.”.
Prosseguindo,
disse:
“Faço votos para que deste Sínodo saia uma imagem do mundo juvenil como
mundo de busca, sempre predisposto à abertura espiritual, interior, psicológica
e moral. Jovens abertos às novidades que não se contentam com realidades
predefinidas e que se tornarão adultos conscientes e responsáveis.”.
Considerando
a índole da juventude, afirmou:
“Os jovens não são uma categoria estática: há uma dinamicidade, porque
quem é jovem move-se, no espaço de poucos anos torna-se maduro e carrega
consigo esta riqueza. Esta dinâmica da abertura é um grande valor e, se o
Sínodo conseguir valorizá-la, já será um grande fruto.”.
Tendo em conta
que os jovens como “realidade dinâmica” indubitavelmente “obrigam a Igreja a
repensar-se a si mesma” e não tendo nós fórmulas que valham para todos,
questionou-se de qual juventude falamos. Com efeito, “se falamos da fase entre
os 14 os 16 anos, estamos a falar de adolescentes” – uma “fase muito diferente
da fase da juventude propriamente dita, entre os 25 e 28 anos”, mas “depois há
uma fase intermédia”. E inferiu:
“Em suma, não se pode falar genericamente de jovens, caso contrário
corre-se o risco de dizer coisas que são corretas para uma faixa de idade e não
para outra. Por exemplo, no campo da formação.”.
Admitindo que
aos 29 anos um jovem já recebeu a formação e está à procura de trabalho,
enquanto aos 16 ainda está em processo de busca ou desorientado, entende que
não se podem considerar os jovens “como
uma realidade compacta,” mas que se devem “compreender as várias exigências”.
Assim, não é a mesma coisa falar sobre os jovens da África, da Ásia ou da Europa.
É falar de quase dois biliões de pessoas. E, prosseguindo, disse
“Os expoentes das Conferências Episcopais que se pronunciaram no Sínodo
trouxeram diferentes experiências. Temos jovens como os do contexto africano
que participam muito na vida da Igreja. Em outros contextos, ao invés, esta
realidade é muito mais problemática.”.
Depois, no
quadro do realismo que lhe assiste, verificou:
“O mundo juvenil sempre teve dificuldade em se integrar na Igreja ou em
responder de modo completo. Tivemos respostas extraordinárias em muitos casos, em
muitos grupos […]. Mas o mundo juvenil, por si, é sempre uma realidade que
tende a distanciar-se. Distancia-se da família, da sociedade tradicional,
distancia-se também da Igreja. Pensar que o afastar-se, o distanciamento
espontâneo dos jovens seja uma realidade somente eclesiológica é, a meu ver,
equivocado.”.
Entendendo a
realidade psicossocial do afastamento juvenil, concluiu:
“É o próprio jovem que, em seu processo de busca, se questiona sobre
como estar dentro da Igreja, sobre como ser Igreja. São fases típicas da busca
juvenil que depois, por vezes, retornam em períodos sucessivos da maturidade,
até mesmo muito mais lá adiante. O entusiasmo juvenil, talvez momentaneamente
adormecido, muitas vezes retorna com uma maturidade e sabedoria inesperadas.”.
***
E, no âmbito concreto da lusofonia, são de destacar as seguintes posições:
Dom Gilson Andrade da Silva, Bispo
coadjutor de Nova Iguaçu (Rio de Janeiro), falando da
interação lusófona nos círculos menores a demonstrar a pluralidade da juventude,
frisou:
“Isso favorece uma amplidão de vista sobre a situação, um olhar maior
sobre a realidade. O bonito também é perceber que entre todos os bispos,
naquele grupo de língua portuguesa existe uma paixão comum, que é a paixão pela
evangelização da juventude.”.
E Dom
Gabriel MBILINGI, Arcebispo do Lubango, em Angola, e Presidente do Simpósio das
Conferências Episcopais de África e Madágascar (SECAM), em entrevista ao Vatican News,
referiu o contributo específico dos jovens do continente africano para este
Sínodo e para o futuro da Igreja em geral, falando duma Igreja jovem e viva,
Igreja fundamentalmente formada por jovens que carateriza a África, apesar dos
diferentes contextos, “uma Igreja, enfim,
em que os jovens participam na vida da Igreja, apesar das dificuldades por que
passam”.
E, sobre o
Sínodo, acentuou o seu caráter “fundamentalmente de escuta e em que os jovens
são protagonistas” e cuja metodologia se distingue dos anteriores pela presença
de jovens (mais de trinta, de todos os Continentes) nas Congregações gerais. Salientou que, “depois de cada cinco intervenções, o Papa introduziu um momento de
silêncio para os Padres Sinodais interiorizarem o que acabam de ouvir”,
configurando assim um convite à renovação da própria Igreja e uma chamada à
conversão dos Padres Sinodais, para lá dos próprios jovens.
E evocou a
sessão de encontro e festa com os jovens no sábado no dia 6 de outubro em que, além
de testemunhos comoventes, os jovens apresentaram questões ao Santo Padre e aos
Padres Sinodais, que serão integradas nos trabalhos dos círculos menores.
***
Um
Sínodo multicolor realista, mas carregado de esperança!
2018.10.10 –
Louro de Carvalho
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