domingo, 1 de dezembro de 2019

Não importa como montar o presépio, mas, sim, que fale à nossa vida



É esta a grande asserção da visita papal de hoje, dia 1 de dezembro e 1.º domingo do Advento, à cidade de Greccio, a 100 quilómetros a norte de Roma, onde Francisco assinou, como prometera, a 27 de novembro, uma carta apostólica sobre o significado e valor do Presépio.
O título do predito documento é “Admirabile Signum”, “Admirável Sinal”. E com ele o Pontífice propõe-se “apoiar a tradição bonita das nossas famílias de prepararem o Presépio, nos dias que antecedem o Natal, e também o costume de o armarem nos lugares de trabalho, nas escolas, nos hospitais, nos estabelecimentos prisionais, nas praças…”.
O texto é dirigido a todo o povo de Deus, mas sobretudo ao núcleo familiar, como uma forma de valorizar a transmissão da fé entre avós, pais, filhos e netos.
O Papa Francisco diz que se trata de um “exercício de imaginação criativa” e faz votos de que esta prática “nunca desapareça” e de que, “onde porventura tenha caído em desuso, se possa redescobrir e revitalizar”.
Organizado em 10 pontos, o texto da Carta Apostólica “Admirabile Signum” recorda a origem do presépio com São Francisco de Assis, a sua obra de evangelização, as figuras e o simbolismo que o compõem.
O termo “presépio” provém do latim “praesepium”, que significa “manjedoura”, tendo passado, depois, a significar todo o cenário presepial. As Fontes Franciscanas narram de forma detalhada o que aconteceu na cidade de Greccio, que fica no Vale de Rieti, onde o “Poverello” de Assis se deteve, quando vinha de Roma onde recebera, do Papa Honório III, a aprovação da sua Regra, em 29 de novembro de 1223. E põe a Carta Apostólica a hipótese de aquelas grutas, após a viagem do “Poverello à Terra Santa, lhe terem feito “lembrar de modo particular a paisagem de Belém” e de, em Roma,” ele ter ficado encantado “com os mosaicos, na Basílica de Santa Maria Maior, que representam a natividade de Jesus e se encontram perto do lugar onde, segundo uma antiga tradição, se conservam precisamente as tábuas da manjedoura”.
Efetivamente, 15 dias antes do Natal daquele ano, Francisco de Assis chamou João, um homem daquela terra, e pediu-lhe ajuda para concretizar um desejo: “representar o Menino nascido em Belém, para de algum modo ver com os olhos do corpo os incómodos que Ele padeceu”.
E assim foi: no dia 25 de dezembro de 1223, chegaram a Greccio muitos frades e também homens e mulheres das casas da região, com flores e tochas para adornar e iluminar aquela noite santa num lugar designado. Francisco, ao chegar, encontrou a manjedoura com palha, o boi e o burro. “Assim nasce a nossa tradição: todos à volta da gruta e repletos de alegria, sem qualquer distância entre o acontecimento que se realiza e as pessoas que participam no mistério” – escreve o Papa, que assegura:
Com a simplicidade daquele sinal, São Francisco realizou uma grande obra de evangelização”.
Como é bom de ver, a origem do Presépio fica-se a dever a alguns poucos pormenores do nascimento de Jesus em Belém, referidos no Evangelho. O resto é mais fruto da imaginação e da lógica, bem como do ambiente que possa condizer com o significado presepial. O evangelista Lucas limita-se a dizer que, tendo-se completado os dias de Maria dar à luz, “teve o seu filho primogénito, que envolveu em panos e recostou numa manjedoura, por não haver lugar para eles na hospedaria” (Lc 2,7). Mas isto foi o sinal que o Anjo deu aos pastores para encontrarem o Messias Senhor que ele lhes anunciou e que seria de alegria para eles e para todo o povo.
Na verdade, ao entrar neste mundo, o Filho de Deus encontra lugar no sítio aonde os animais vão comer. A palha torna-se a primeira enxerga para Aquele que se há de revelar como ‘o pão vivo, o que desceu do Céu’ (Jo 6,51) – simbologia que Santo Agostinho, a par doutros Padres da Igreja, entrevira quando escreveu: “Deitado numa manjedoura, torna-se nosso alimento”. Assim, o Presépio inclui, de certo modo, vários mistérios da vida de Jesus, fazendo-os aparecer familiares à nossa vida diária.
Para o Papa Francisco, armar o Presépio em nossas casas ajuda a reviver a história que aconteceu em Belém. Imaginando as cenas, estimulam-se os afetos e sentimo-nos envolvidos na história da salvação. De facto, “o Presépio é um convite a ‘sentir’, a ‘tocar’ a pobreza que escolheu, para Si mesmo, o Filho de Deus na sua encarnação, tornando-se assim, implicitamente, um apelo para O seguirmos pelo caminho da humildade, da pobreza, do despojamento”.
E o Papa comenta o simbolismo presente nos vários elementos que compõem o presépio: a escuridão da noite, a paisagem e as personagens. As ruínas e os pobres ali representados recordam que eles são os privilegiados deste mistério. A mensagem do despojamento que surge do presépio é clara: “não podemos deixar-nos iludir pela riqueza e por tantas propostas efémeras de felicidade” – refere o Pontífice, que observa: “Jesus nasceu pobre, levou uma vida simples, para nos ensinar a identificar e a viver do essencial”.
Nascendo no presépio – escreve o Papa – Deus dá início à única verdadeira revolução: a revolução do amor e da ternura, através da “força meiga” de um menino. Na verdade, da manjedoura belemita, tornada humilde, mas eloquente, púlpito do Presépio, “Jesus proclama o apelo à partilha com os últimos como estrada para um mundo mais humano e fraterno, onde ninguém seja excluído e marginalizado”. Deste modo, o presépio torna-se para os fiéis um convite a se tornar discípulos de Cristo, a refletir sobre a responsabilidade de evangelizar e ser portador da Boa Nova com ações concretas de misericórdia.
Por outras palavras, Francisco diz-nos que não é importante como armar o presépio: “O que conta é que fale à nossa vida”. E conclui:
Queridos irmãos e irmãs, o Presépio faz parte do suave e exigente processo de transmissão da fé. (…) E educa para sentir que nisto está a felicidade. Na escola de São Francisco, abramos o coração a esta graça simples, deixemos que do encanto nasça uma prece humilde: o nosso ‘obrigado’ a Deus, que tudo quis partilhar connosco para nunca nos deixar sozinhos.”.
***
Na homilia da Missa que celebrou, pela manhã, no Altar da Cátedra para a comunidade congolesa de Roma, em comemoração dos 25 de instituição desta capelania católica em Roma, Francisco salientou que o Senhor veio, que o Senhor vem e que o Senhor virá. No entanto, garantiu que hoje o verbo “vir” tem de ser conjugado, não apenas por Deus como sujeito, mas também por todos e por cada um de nós. Com efeito, São Mateus diz: “virá o Filho do Homem” (Mt 24,44). E Isaías profetiza:
Virão muitos povos e dirão: ‘Vinde, subamos ao monte do Senhor”.
Enquanto o mal na terra deriva do facto de cada um seguir o seu caminho sem os outros, o profeta oferece a visão maravilhosa em que todos vêm em conjunto ao monte do Senhor, onde está a casa de Deus, que é para todos. Ora, se, como o presépio mostra, Jesus vem, é imperativo que nos decidamos a ir ao seu encontro, esteja Ele no presépio, na cruz, no altar, à mesa, esteja Ele no rosto do pobre. Vem aí o Natal e o Natal cristão é principalmente dos pobres!
2019.12.01 – Louro de Carvalho  

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