O Primeiro-Ministro António Costa escreveu uma
carta à presidente da Comissão Europeia a solicitar a alteração dos critérios
sobre o princípio da estabilidade do IVA, para que a taxa varie consoante o
consumo dos clientes, segundo os vários escalões. O anúncio foi feito no debate quinzenal deste dia 10 de dezembro, mas sem
grandes detalhes.
Costa, sabendo que em termos técnicos a decisão é
difícil, pede a Bruxelas uma decisão política. Efetivamente variar a taxa de IVA em função do consumo de
eletricidade foge aos princípios do imposto, mas são invocadas alterações
climáticas para o pedido da decisão política. Naturalmente que o
Primeiro-Ministro, que tem fugido à discussão parlamentar do Orçamento do
Estado por a considerar precoce neste momento, pretende contornar a hipótese de
uma maioria negativa no Parlamento a forçar a descida do IVA para 6% para todos
os consumidores. E terá sido nesta perspetiva que no penúltimo debate quinzenal
prometeu uma agradável surpresa para os diversos partidos, abrindo a via para a
redução da fatura sem mexer na taxa do imposto. Mas deve ter pensado que isso
não seria o suficiente para acalmar as hostes
Na carta que
escreveu a Ursula von der Leyen, divulgada pelo jornal ECO, o Chefe do Governo reconhece
que tem a noção de que esta proposta
portuguesa “não está alinhada com o princípio tradicional de neutralidade do
sistema IVA”, mas sustenta que o imposto “precisa de ser adaptado para
integrar os nossos objetivos climáticos”.
Sinalizando
que o pedido feito por Portugal para voltar a mexer na taxa da eletricidade,
será analisado pelo comité do IVA – Centeno já enviou o pedido –, Costa
defende perante Von der Leyen que esta é “uma decisão eminentemente política”, não
técnica, pelo que apela à chefe do executivo comunitário que se envolva na
avaliação desta proposta numa abordagem que não tenha uma base técnica, mas que considere a
“necessidade de adaptar as nossas
economias ao objetivo estratégico de lutar contra as alterações climáticas”.
Nesta carta,
António Costa não refere o
argumento financeiro e orçamental que tem sido usado dentro de
portas para recusar a descida do IVA para a taxa reduzida, medida que, nas contas
do Governo, custaria pelo menos 700 milhões de euros líquidos. Já na resposta a
Catarina Martins do BE, no debate quinzenal, o Chefe do Governo invocou o
argumento da “emergência climática” para
depois revelar o que está o Governo a fazer, em resposta à intenção manifestada
por vários partidos (PCP, BE e PSD) de avanço
com propostas de redução do IVA da luz para 6%.
A
alternativa, segundo Costa, passaria por uma taxa variável ajustada ao consumo.
Em vez de baixar a taxa para todos os consumidores que estejam nas potências contratadas mais baixas, como
aconteceu este ano (e apenas para a parte da fatura que corresponde à
potência, excluindo a energia) o Governo
põe em cima da mesa a ideia de variar a taxa do IVA em função de escalões de
consumo. Assim, quem mais consumir
pagará uma taxa mais elevada pela energia consumida, o que
implicaria aplicar taxas diferenciadas para o mesmo bem.
Esta
proposta, inédita no IVA aplicado à energia na UE (União
Europeia), terá de ser validada pelo comité do IVA, onde têm assento os
membros da UE, mas também a Comissão Europeia que será quem tem mais peso nesta
análise, daí o apelo à presidente Ursula von der Leyen. Costa não deixa claro
se a pretensão portuguesa envolve uma mudança das regras do IVA, que é um
imposto europeu, o que implicaria o consentimento de todos os membros da UE ou
apenas um pedido de atenção para deixar passar a proposta específica para
Portugal.
Sem esquecer
os compromissos de Portugal com a UE, o Primeiro-Ministro frisa o nosso
compromisso com a neutralidade carbónica, observando:
“Portugal deseja contribuir ativamente para o objetivo europeu de
neutralidade carbónica. A nível nacional, já propomos não só que isso é
possível, mas também que vale a pena atuar. Mas queremos fazer mais.
Acreditamos que os nossos sistemas fiscais devem também ser adaptados às novas exigências ambientais, não
apenas através da criação de novas taxas e incentivos fiscais que nos ajudem a
atingir a neutralidade carbónica, mas também por via de impostos como o IVA.”.
Os princípios
do IVA, defende Costa, devem ser adaptados para nos ser permitido lutar melhor
contra as alterações climática, pelo que frisa:
“É por isso que enviámos uma proposta concreta ao comité do IVA para
criar taxas diferenciadas em função dos níveis de consumo de forma a
desencorajar o consumo excessivo de eletricidade”.
Ao explicar a medida que Propõe à Comissão
Europeia, o Primeiro-Ministro reiterou que é
necessário “ser coerente” quando se discutem estas matérias. E ele é coerente,
não com os princípios do IVA, nomeadamente da neutralidade e da estabilidade,
mas com os objetivos de redução do défice tarifário e de contributo para a
neutralidade carbónica e, em última análise, para a minimização dos efeitos das
alterações climáticas em curso. Diz o governante:
“Temos de baixar o custo da energia, de
continuar a reduzir o défice tarifário. Antes de propormos benefícios
fiscais para a energia, convém lembrar que estamos em emergência climática.”.
Esta iniciativa costista tinha já sido adiantada por Marques Mendes no seu
comentário dominical na SIC, do passado dia 8, como sendo o Plano B do Governo.
Perante a possibilidade de uma maioria negativa que force o Governo a baixar o
IVA, Marques Mendes revelou que António Costa iria tentar “convencer” Bruxelas
a aceitar que o imposto possa variar em função do consumo. Neste cenário, a perda de receitas será menor.
As contas do Governo apontam para uma perda líquida de receita de 771
milhões de euros se o IVA da luz baixar para 6%, ou de 454 milhões de euros se
a descida for para 13%.
No seu comentário, Mendes deixou ainda pistas sobre o que poderá constar
no Orçamento de Estado para 2020 que o Governo entregará no
Parlamento no próximo dia 16. Até esse dia, intensificam-se as operações de
bastidores.
Diz o comentador que o documento “prevê mais investimento e mais dinheiro para a Saúde, Habitação e para as Forças de
Segurança”.
Em relação ao descongelamento das carreiras, Mendes
afirma que vai custar 500 milhões de euros no próximo ano – numa altura em que
todos os funcionários públicos já estarão a receber as progressões sem cortes –
valor que já tinha sido avançado pelo Ministério das Finanças.
E, na parte fiscal, o comentador revela não haver mexidas no IRS,
sendo que “a prioridade será o apoio às empresas”, que ficará dependente de
acordo em sede de Concertação Social.
O comentador não desvenda que impostos vão mudar para as empresas, mas os
socialistas já prometeram melhorar o regime do IRC para as empresas que
reinvistam os lucros, através de um aumento de 10
para 12 milhões de euros no limite máximo que pode ser objeto de dedução.
***
EDP aplaude IVA variável na eletricidade. Assim,
a partir de
Madrid, António Mexia, presidente executivo da elétrica portuguesa considerou “lógica” e
“socialmente mais justa” a proposta do Governo de a taxa do IVA da energia
variar consoante o consumo em função dos diferentes escalões de consumo.
Disse o presidente da EDP à agência Lusa,
à margem de uma mesa redonda em que participou no âmbito da COP25:
“Tem lógica. Se o caminho for esse […], eu
acho que o objetivo que se está a tentar é garantir que haja uma
progressividade nessa medida, que ela seja socialmente mais justa.”.
Para o presidente da EDP, trata-se de eventual decisão de política fiscal
que compete ao Parlamento e ao Governo, sem “nenhuma influência no negócio da
EDP”, embora uma variação desse tipo da taxa de IVA fosse “beneficiar
quem mais precisa”, dito de outra forma, “quem tem menos rendimentos,
quem consome menos e quem tem menos condições”. Para Mexia, a lógica da medida “vai
no sentido de uma medida mais progressiva e não regressiva”.
***
Veremos no
que vai dar. A Comissão e o Comité do IVA acolherão o pedido de Costa? Isto
será suficiente para o OE2020 ser aprovado? A Carta do Primeiro-Ministro
juntamente com um intenso jogo de bastidores neutralizará a ameaçadora
coligação negativa? Não haverá outros problemas orçamentais?
Haja quem
nos governe com sentido de missão e apurada noção de serviço público! Será este
o rumo de Costa quando equaciona a possibilidade de se candidatar a um terceiro
mandato?
2019,12.10 – Louro de Carvalho
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