Deputados na Assembleia da República (AR) decretaram, no âmbito da Lei do Orçamento para
2019 a inclusão de umas tantas vacinas que a DGS (Direção-Geral de Saúde) tinha escrúpulos a incluir, pois não fora ouvida previamente
nem fora dado o parecer prévio favorável da CTV (Comissão Técnica de Vacinação). Este facto legislativo provocou alguma polémica. Na altura, a Direção-Geral
da Saúde pediu mais tempo para se realizarem estudos sobre essas vacinas e o Governo,
sem desrespeitar o Parlamento, decidiu esperar pelo parecer técnico, que veio
agora, embora tarde e para mais tarde. Enquanto o pau levanta, folgam as costas
e o Estado financeiro não despendeu dinheiro do OE 2019.
Trata-se da inclusão de vacinas contra meningite
B para todos, rotavírus para grupos de risco e contra o HPV (vírus do papiloma humano) para rapazes no Programa Nacional
de Vacinação (PNV).
Assim, o PNV
será alterado e, a partir de 1 de outubro de 2020, incluirá a vacina contra a
meningite B, que será para todos (aliás, todas as crianças nascidas a
partir de 2019), o rotavírus
para grupos de risco e contra o HPV para rapazes a partir dos 10 anos.
As
alterações ao PNV foram anunciadas hoje, dia 27, pela Diretora-Geral da Saúde,
Graça Freitas, e pelo Secretário de Estado da Saúde, António Sales, e a inclusão das
vacinas no PNV tem “aval da Comissão Técnica de Vacinação”.
Sobre a
vacina da meningite B, que vai ser
alargada a todas as crianças, foi referida a recomendação de que as três doses devem ser administradas ao
primeiro ano de vida, mais concretamente “aos 2, aos 4 e aos 12 meses”, mas
abrange apenas “os nascidos a partir de 1 de janeiro de 2019”, sendo que “o
esquema de vacinação [pode] ser
iniciado ou completado, de acordo com a história vacinal individual”. Ou seja,
as crianças que nasceram antes de
2019 não estão incluídas. A recomendação é que esta vacina seja feita
logo no primeiro ano de vida, mas pode ser administrada até aos 5 anos. Graça
Freitas esclareceu que as crianças
até aos 2 anos podem fazer as 3 doses da vacina, mas entre os 2 e os 5, só devem ser administradas
duas doses. A partir dos 5
anos, não há recomendação para que se faça a vacinação contra a
meningite B.
Esta vacina
já constava no PNV, mas apenas para um grupo restrito de crianças com graves
deficiências. Outras crianças podiam ser vacinadas contra a meningite B, mas a sua
vacina tinha de ser paga.
A vacina contra o HPV para os rapazes também
passa a fazer parte do PNV. Deve administrada em duas doses a rapazes a
partir dos 10 anos, com intervalo de 6 meses, e aplica-se aos nascidos a partir
de 1 de janeiro de 2009, podendo o esquema de vacinação ser iniciado ou
completado, de acordo com “a história vacinal individual”. Os rapazes têm até aos 18 anos para fazer a primeira
dose, a partir dessa idade, já não podem dar início a esta vacinação.
Apenas aqueles que fizeram a primeira toma antes da idade limite é que fazem a
segunda seis meses depois, mesmo que nessa altura já tenham completado os 18
anos.
Esta vacina
para as raparigas já faz parte do PNV e é administrada em duas doses aos 10
anos, o que sucederá com os rapazes. Com esta vacina, vão passar a ficar cobertos 40 mil rapazes por
ano. Segundo Graça Freitas, à partida será administrada aos rapazes
e às raparigas a mesma vacina, ou seja, será uma vacina contra 9 genótipos.
Isto está dependente, contudo, da indústria farmacêutica – e da quantidade de
vacinas que são comercializadas a nível mundial – e do concurso a lançar pelo SPMS (Serviço
Partilhado do Ministério da Saúde). “Se, em
sede de concurso, o preço for favorável, compraremos a mesma vacina”, disse
Graça Freitas. Se não for possível administrar esta vacina aos rapazes, será
suficiente uma vacina com 4 genótipos.
Já a vacina
contra o rotavírus passa a
integrar o programa, mas apenas “para grupos de risco”. A Diretora-Geral
esclareceu que a CTV ainda não definiu quais são esses grupos de risco. Quando
isso acontecer, será emitida uma norma pela DGS.
***
A inclusão
destas três vacinas no PNV foi decretada, como se disse, em 2018 no
Parlamento, na discussão da especialidade do Orçamento do Estado para 2019. Chegou-se
a tal deliberação sem consulta prévia à DGS, o que provocou alguma polémica,
mas os partidos proponentes e que se bateram pela aprovação da norma escudaram-se
em pareceres sólidos de grupos profissionais com competência baseada no estudo
e na experiência, como, por exemplo, a Sociedade Portuguesa de Pediatria. A
polémica era uma guerrinha de capelinhas e de estruturas do Estado, devendo tudo
estas fazer do ponto de vista técnico para secundar as deliberações do poder
político legítimo ou esclarecer os termos em que o poder político está a deliberar
erradamente, não em ficar-se pela não consulta prévia ou pela alegável ultrapassagem
de competências dos departamentos executórios das políticas públicas.
Na altura, a
DGS, com razoabilidade, acabou por solicitar mais tempo para se realizarem
estudos sobre as vacinas e Governo decidiu prudentemente esperar pelo parecer
técnico.
Em
entrevista ao Observador, em outubro passado,
a Diretora-Geral da Saúde considerou que os deputados deviam “ter tido um
bocadinho mais de confiança nos seus próprios órgãos técnicos” e disse que,
sendo a DGS uma instituição do Ministério da Saúde e escrutinada pelos
parlamentares, eles tinham forma de a escrutinarem, lhe fazerem recomendações e
saberem o que ela estava a fazer. “Dito isto, as coisas poderiam ter ocorrido
de outra forma, obviamente”, disse a Diretora-Geral da Saúde.
Obviamente que
Graça Freitas tem razão no sentido de que teoricamente os deputados têm a possibilidade
de escrutinarem o funcionamento dos departamentos governamentais, mas também
devia saber que esse escrutínio tem os seus trâmites e que o Governo e os seus
departamentos os podem tornar excessivamente morosos. De resto, cabe ao Governo
e ao Parlamento, de vez em quando, puxar pela locomotiva da técnica, espicaçar
a ciência e ultrapassar a lógica burocrática e economicista que se instala com
facilidade.
Agora, a
Diretora-Geral da Saúde garantiu que “foi com aval da Comissão Técnica de Vacinação” que se
decidiu alargar a vacina contra a meningite B a todas as crianças no primeiro
ano de vida, incluir os rapazes na vacinação contra o HPV e a introduzir a
vacina contra o rotavírus apenas para grupos de risco.
“Todas estas
vacinas foram recomendação da CTV à DGS. Nós acolhemos essa recomendação e
propusemos à tutela, que aprovou”, afirmou Graça Freitas, na conferência de
imprensa de hoje.
A Proposta
de Lei do Orçamento do Estado para 2020 inscreveu um encargo de 10,9 milhões de euros com o
alargamento do PNV. Aquando da polémica, a Diretora-Geral da Saúde tinha
dito que a inclusão destas vacinas no programa teria um custo de 15 milhões de
euros. Na conferência de imprensa, esclareceu que esse seria o valor se as
vacinas fossem extensivas a toda a população, o que não irá acontecer – o
rotavírus será apenas para grupos de risco –, pelo que a verba prevista no Orçamento de Estado, de
acordo com Graça Freitas, é suficiente.
A Vacina contra o HPV para rapazes está “no
limiar do que é custo efetivo ou não é”.
***
Estas atualizações do PNV serão publicadas em Diário da República. Em seguida, proceder-se-á
à compra destas vacinas para todo o país, o que está dependente “da sua
disponibilidade no mercado internacional” – e serão elaboradas e divulgadas normas
de modo a possibilitar a operacionalização destas alterações por parte dos
serviços de saúde e dos profissionais, “a nível regional e local”. Será feita a
“atualização da plataforma de registo central de vacinas” e criados dois
planos: o de formação, para os profissionais de saúde que vão promover e
aplicar estas vacinas; e o de comunicação aos cidadãos.
Na predita entrevista,
Graça Freitas tinha falado sobre estas vacinas. Sem revelar que vacinas iriam
ou não ser incluídas no PNV nem quais tinham sido as recomendações da DGS,
disse que foi feita uma avaliação custo-efetividade e que a vacina contra o HPV
para rapazes está “no limiar do que é custo efetivo ou não é”. E explicou:
“ (…) Quando um país como nós tem elevadíssimas taxas de cobertura no
sexo feminino, é muito difícil que a vacina [do HPV para os rapazes] seja
custo-efetiva, porque isso funciona como reservatórios do vírus”.
A
Diretora-Geral da Saúde explicou ainda que a inclusão de vacinas para
“determinados grupos de risco” no Programa Nacional de Vacinação – caso a meningite
B – era a forma que tinha de “garantir que sempre vão ter sustentabilidade
financeira e que ninguém as põe e tira”.
***
Enfim, alegadamente
por falta de consolidada informação científica e por insuficiente preparação técnica,
escondeu-se a perspetiva economicista, que persiste embora mitigada, para poupar
cerca de 5 milhões não se estendem as vacinas a toda a população com potencial necessidade
delas. Prefere-se, por economicismo ou por guerrilhas institucionais (que
emergiram), atrasar a
tomada e implementação medidas preventivas e restringir a sua aplicação, como se
fosse preferível à prevenção o tratamento e a cura muito mais onerosos ou, na
falta de dinheiro, o abandono à sorte, às orações e à morte dos doentes que
poderiam não o vir a ser.
Triste sorte
a dum povo entregue a quem devia colocar acima de tudo o bem comum, mas se
compraz em obedecer à ditadura das Finanças (Todos somos Centeno…)!
2019.12.27 –
Louro de Carvalho
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