Em artigo
recente dei conta da posição do Ministro da Educação sobre os resultados do
PISA 2018, que refere ser o sistema
educativo português “o único da OCDE que apresenta melhorias significativas”,
explicando:
“Os resultados que agora conhecemos,
recolhidos em 2018, mostram bem como as competências reveladas agora pelos
jovens nascidos no ano de 2002 resultam de muitos fatores que a enriqueceriam.
Estes estudantes ingressaram no 1.º Ciclo em 2008 encontrando-se, a maioria, no
ano letivo de 2015/2016, o primeiro da nossa governação já no 8.º ano.”.
Ora, eu se não soubesse que as reformas educativas
produzem só frutos a longo prazo, podia dizer que os bons resultados de 2015 se
devem às “reformas” de Nuno Crato e o ligeiro decréscimo de 2018 se deve às
“reformas” de Brandão Rodrigues. Não cometo essa injustiça, pois devo dizer que
a grande reforma na Educação – que mobilizou o país – foi a de Roberto Carneiro
(nunca
percebi por que motivo não repetiu mandato), mas que
ficou estrangulada quando Ferreira Leite definiu rubricas mínimas em todas as
disciplinas do ensino secundário para efeitos de exame nacional no futuro.
Depois, houve as mexidas de Ana Benavente, David Justino, Lurdes Rodrigues,
Nuno Crato e Brandão Rodrigues à mescla com avanços e ruturas.
Também não fica bem ao Secretário de Estado Adjunto e
da Educação a petulância de dizer que os indicadores “permitem contrariar a
expressão: no antigamente é que era bom”.
O funcionamento do sistema deve ser avaliado em si e em contexto, não por ser
antigo ou novo.
Desde 2000, Portugal apresentou, segundo o Ministro,
“um caminho de melhoria contínua e significativa nos três domínios” (Leitura, Matemática
e Ciências) e acima da média da OCDE, com que
se concorda. Na sua opinião, a descida do nível médio de competências dos
alunos em Leitura e Ciências, embora ligeira, deve ser motivo de preocupação,
porquanto:
“Para Portugal, mais do que um ranking internacional, o PISA [Programa de
Avaliação Internacional de Alunos] é um
poderoso instrumento de cooperação internacional e de aprendizagem com os
outros”.
***
Na
verdade os alunos
portugueses mantêm resultados a Matemática, descem ligeiramente a Leitura, e
baixam 9 pontos em Ciências, sendo significativo em Portugal o efeito do ESCS (estatuto
socioeconómico e cultural) no
desempenho escolar. Assim, as expectativas são maiores em contextos mais
favorecidos. Mas a indisciplina e a falta de concentração também são
condicionantes: mais de metade dos alunos não escuta o que os professores
dizem, 50% chegaram tarde à escola nas duas semanas antes do PISA e o gosto por
ler diminuiu, apesar de se terem multiplicado os incentivos, mas sem anular ou
minorar os fatores de distração e de indisciplina, bem como das indigências
económicas e mentais. Que pena ler-se pouco!
Como era expectável, o PISA voltou a avaliar a literacia de leitura, a
literacia científica e a literacia matemática dos alunos de 15 anos de idade de
79 países. Segundo os dados revelados, os nossos estudantes estão na média da OCDE
(Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) nos três domínios. Este estudo trienal envolveu mais de 600 mil alunos.
Em Portugal, participaram 276 escolas, 5 932 alunos e 5 452 professores, de
todas as regiões do país.
Os desempenhos médios globais no PISA não variaram significativamente
nas últimas duas décadas e Portugal é dos poucos países que apresenta uma
trajetória de melhoria nos três domínios avaliados, estando a par da média da
OCDE. China, Singapura e Macau, do continente asiático, obtiveram as melhores
pontuações médias nas três áreas disciplinares examinadas.
O ESCS é um dos fatores analisados. Em Portugal, o
contexto socioeconómico do aluno continua a ter impacto expressivo no
desempenho escolar. A probabilidade de um estudante, entre os 25% mais
desfavorecidos, obter uma pontuação abaixo do nível 2 de proficiência é
aproximadamente três vezes maior do que a de um com ESCS superior. Por exemplo,
o efeito do ESCS no desempenho em Leitura é maior em Portugal que no conjunto
dos países da OCDE. A diferença da pontuação em Leitura entre os alunos
portugueses mais favorecidos e os menos favorecidos é de 95 pontos (na OCDE é de
89 pontos), sendo que o ESCS pode explicar 13,5%
da variação dos resultados. Em Portugal, 22% dos alunos têm possibilidade de se
matricularem em escolas frequentadas por estudantes que atingem níveis mais
elevados, mais que a média da OCDE, de 17%. São resilientes 10% dos nossos
alunos (não
divergindo da média da OCDE, de 11%). Apenas um
em cada 10, provenientes de famílias mais desfavorecidas, teve um desempenho em
Leitura no quartil superior, ou seja, obteve uma pontuação entre as 25%
melhores.
Quanto às expectativas, 73,6% dos nossos alunos querem
concluir um curso do Ensino Superior (percentagem superior ao da OCDE, de
69%). Portugal é dos países em que a
diferença entre os alunos mais e menos favorecidos quanto à expectativa de
concluir o Ensino Superior é mais expressiva, de 43%. Quase todos os alunos (93,1%), de meios com ESCS mais favorecidos querem concluir
o Ensino Superior, enquanto só 50% dos alunos com ESCS mais baixo o querem.
Em relação a hábitos de leitura, em 2009 e em 2018, a
proporção de alunos portugueses de 15 anos que “gosta de falar de livros com
outras pessoas” foi superior à observada para a média da OCDE. No entanto, a
percentagem de jovens portugueses que mantém esse gosto diminuiu 11 pontos em
2018. A percentagem de alunos portugueses que “só lê se for obrigado” e que
considera a leitura uma “perda de tempo” aumentou em 2018 nove e três pontos
percentuais respetivamente, seguindo a mesma tendência da OCDE.
Mais de metade dos nossos alunos (53,5%) não escuta o que os professores dizem em algumas
aulas e cerca de 1/5 em muitas aulas. E 30% contam que os professores demoram
muito tempo até sossegarem a turma. As queixas projetam-se nos resultados. Os
alunos que dizem ter sempre indisciplina e barulho nas aulas tiveram menos 17
pontos na avaliação à Leitura, em relação aos que não se queixam desses
problemas. Por outro lado, os alunos portugueses faltam mais e chegam mais
vezes atrasados às aulas do que a média da OCDE. E 28% dos alunos faltaram um
dia às aulas e 50% chegaram tarde à escola nas duas semanas que antecederam o
PISA (na OCDE
foram 21% e 48%, respetivamente).
***
Na Leitura, Portugal obteve a pontuação média de 492
pontos (5 pontos
acima da média da OCDE, de 487 pontos), menos 6
pontos da média nacional de 2015, mas acima das médias de 2000 e 2009. Entre
2000 e 2018, considerando a variação média em ciclos de 3 anos, Portugal foi dos
países que apresentaram evolução positiva e significativa em literacia de
leitura, ou seja, de mais 4,3 pontos, acima da variação média da OCDE, que foi
de 0,4 pontos. Perto de 80% dos nossos alunos atingiram, pelo menos, o nível 2
de proficiência em leitura, enquanto na OCDE essa percentagem ficou nos 77%.
Neste nível, os alunos conseguem
identificar a ideia principal de um texto moderadamente longo, localizar
informação mediante critérios explícitos embora complexos, compreender relações
ou atribuir significado a uma parte específica de um texto, fazendo inferências
simples, refletir sobre a finalidade e a forma dos textos, mediante indicações
explícitas. Cerca de 7% dos alunos nossos atingiram os níveis superiores da
escala de proficiência em leitura, os níveis 5 e 6. Na OCDE esta média sobe
para 9%. Nestes níveis, os alunos conseguem compreender
textos de leitura demorada, lidar com conceitos abstratos ou contraintuitivos e
distinguir factos de opiniões baseados em dados que dizem respeito ao conteúdo
ou à fonte de informação.
Nas subescalas que avaliam a Leitura, Portugal obteve
melhores desempenhos em “Avaliar e
Refletir”, com 494 pontos, mais que nos processos cognitivos que implicam “Localizar Informação” com 489 pontos e “Compreender”, com 489 pontos, seguindo a
tendência internacional. A pontuação média obtida por Portugal, em qualquer uma
das subescalas da Leitura, corresponde a uma proficiência de nível 3, o que
significa que os alunos conseguem localizar
vários elementos de informação que obedecem a várias condições e, em alguns
casos, conseguem identificar relações entre esses elementos. Ainda no
processo “Compreender”, “os alunos
conseguem integrar várias partes de um
texto para identificar uma ideia principal, compreender relações ou atribuir
significado a uma palavra ou a uma frase”. Nas tarefas que implicam “Avaliar e Refletir” conseguem estabelecer relações, fazer comparações,
produzir explicações e avaliar um aspeto particular de um texto.
As raparigas obtiveram melhores desempenhos que os
rapazes em Leitura, à semelhança do que se tem verificado. As raparigas
obtiveram, em média, 24 pontos acima da pontuação média alcançada pelos
rapazes, ou seja, 504 pontos versus
480 pontos. A diferença é menor que a de 2009 e semelhante à de 2000. Assim,
lê-se no relatório nacional:
“Portugal seguiu a tendência internacional,
embora a diferença de pontuação entre rapazes e raparigas portugueses seja
menor do que a observada para a maioria dos países/economias”.
Na Leitura, China, Singapura, Macau e Hong Kong (no
continente asiático) tiveram os
resultados mais altos (pontuações superiores a 520 pontos). A pontuação de Portugal não é muito diferente da
pontuação alcançada pela Alemanha (498 pontos), Eslovénia (495 pontos), Bélgica (493 pontos), França (493 pontos), República Checa (490 pontos) e Holanda (485 pontos).
***
Os alunos portugueses obtiveram uma média de 492 pontos
em literacia matemática (3 pontos acima da média da OCDE), os mesmos que foram alcançados em Leitura. Em
Matemática, verifica-se um aumento de 26 pontos relativamente a 2003 e de 5
pontos relativamente a 2012. Entre o ciclo de 2015 e o de 2018, a pontuação
média em Matemática não se alterou significativamente, a subida foi de mais 0,9
pontos. China, Singapura, Macau, Hong Kong e Taipé Chinês obtiveram os melhores
resultados do PISA, todos acima dos 500 pontos. China com o melhor desempenho
atingiu 591 pontos, mais 99 do que Portugal.
Entre 2003 e 2018, há um crescimento de 6 pontos e, no
mesmo período, a OCDE registou uma tendência negativa evidenciando um ligeiro
decréscimo, de menos 0,6 pontos. Cerca de 12% dos nossos alunos alcançaram os
níveis superiores da escala de proficiência em matemática (resultado
superior ao verificado em 2003 e em 2012 e semelhante à média da OCDE, de 11%). Nos níveis 5 e 6 da escala de proficiência, os
alunos conseguem modelar matematicamente
situações complexas e selecionar, comparar e avaliar estratégias adequadas para
resolver problemas. Atingiram pelo menos o nível 2 de proficiência em
matemática 77% dos alunos, percentagem semelhante à média da OCDE, de 76%.
Neste nível, os estudantes conseguem interpretar
e reconhecer, sem instruções diretas, como se pode representar matematicamente
uma situação simples. Por cá, os rapazes obtiveram mais 9 pontos que as
raparigas (497 para os rapazes, 488 para as raparigas).
“Os rapazes revelaram níveis de proficiência
superiores em todos os ciclos PISA em que a Matemática foi domínio principal
(2003 e 2012), embora a diferença tenha diminuído em 2018. Ainda assim, foi
superior à diferença verificada no conjunto de países da OCDE (492 vs. 487 – 5
pontos favoráveis aos rapazes).” – lê-se no relatório.
***
Em Ciências, Portugal obteve 492 pontos na avaliação (3 pontos
acima da média da OCDE), mas há quebra
de 9 pontos em relação aos resultados divulgados em 2015, embora essa tendência
decrescente seja generalizada. Apesar disso, quando se analisa a variação média
em ciclos de 3 anos, Portugal é dos 13 países que apresenta uma variação
positiva e significativa de mais 4,3 pontos na avaliação das Ciências. À
semelhança do verificado na avaliação da Leitura, China, Singapura e Macau são
os três países com melhor desempenho. Mas 80% dos nossos alunos atingiram pelo
menos o nível 2 de proficiência (percentagem ligeiramente superior à
média dos países da OCDE, de 78%). Neste
nível, os alunos são capazes de utilizar conhecimentos do dia a dia acerca
de conhecimentos e procedimentos elementares para identificar uma explicação
científica apropriada, interpretar dados e identificar a questão investigada
num delineamento experimental simples. Nos níveis de desempenho que exigem
o domínio de tarefas de maior complexidade, níveis 5 e 6, os resultados de
Portugal são inferiores aos da média da OCDE. Apenas 6% dos nossos alunos conseguiram
atingir, pelo menos, 633 pontos na escala das ciências enquanto, em média, no
conjunto dos países da OCDE foram 7%. Nestes níveis de proficiência, os alunos
conseguem, por exemplo, aplicar o seu
conhecimento de ciências e sobre ciências de forma autónoma e criativa a uma
grande variedade de situações, mesmo as menos familiares.
Os rapazes tiveram melhor desempenho em Ciências que
as raparigas, embora não seja significativa a diferença (494 pontos
para 489 pontos). A
tendência é comum aos resultados nacionais em ciclos anteriores, mas não aos
resultados da OCDE. Os resultados médios da OCDE, em função do género, mostram
diferenças menos acentuadas que as verificadas em Portugal e sobretudo
favoráveis às raparigas em 2018.
No conjunto dos nossos alunos com melhores
desempenhos, um em cada 2 rapazes pensa desenvolver profissão na área das
ciências e das engenharias, enquanto uma em cada 7 raparigas pensa fazê-lo. Ou
seja, 48% dos rapazes e 15% das raparigas (resultados significativamente
diferentes dos do conjunto dos países da OCDE, com uma média de 25% dos rapazes
e 14% das raparigas). Na área
da Saúde, a tendência inverte-se com a preferência de 47% das raparigas e 15%
dos rapazes.
***
O relatório internacional apresenta Portugal como uma
das 7 economias, entre 79 analisadas, onde, no PISA, os resultados foram de
progresso consistente nos três domínios avaliados. Além de Portugal, apenas
Albânia, Colômbia, Macau (China), República
da Moldávia, Peru e Qatar o conseguiram. Para Brandão Rodrigues, há um caminho
a percorrer e muito a fazer, pelo que diz:
“E porque precisamos de fazer mais dentro e
fora da escola, resgatámos a centralidade do Programa Ciência Viva e do Plano
Nacional de Leitura. Precisamos fazer ainda mais e melhor na equidade, pois o
estatuto económico dos pais ainda é prescritor de sucesso escolar maior em
Portugal do que noutros países.”.
Os resultados dos alunos de origem socioeconómica mais
favorecida ficam 95 pontos acima dos mais desfavorecidos (diferencial superior
à média da OCDE, de 89 pontos). Entre os
alunos com desempenho de topo na Leitura, 16% são de classes mais altas e 2% de
origem desfavorecida.
É preciso “um trabalho mais profundo” e analisar a
fundo as nossas fragilidades e minorá-las. Não vale a pena tapar o sol com a
peneira. O PNPSE, a educação inclusiva e a flexibilização curricular não
resultarão (a não ser para fins estatísticos), se não se
angular 180º a melhoria em disciplina, autoridade dos professores, moderação do
hipercriticismo dos encarregados de educação e na otimização das condições de democracia
na gestão e funcionamento da escola.
2019.12.11 – Louro de Carvalho
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