Entre
uma e o outro que venha o diabo e escolha, se é que lhe apetece.
Vem
o tema a propósito de dois casos: a geringonça das votações no seio do Conselho
de Segurança a ONU com a melhor votação para António Guterres pelas duas vezes
consecutivas em que se procedeu a tal votação; e a escolha, pela primeira vez,
de um português para o comando do JALLC (sigla inglesa de: Joint
Analysis and Lessons Learned Centre),
ou seja, o centro de investigação analítica da NATO localizado em Lisboa (Monsanto).
***
A
21 de julho, o Expresso on line
noticiava que António Guterres fora o candidato mais votado na 1.ª votação para
secretário-geral da ONU e que imediatamente atrás do candidato português ficara
o ex-Presidente esloveno Danilo Turk. Além disso, explicava:
“Na
corrida ao cargo de secretário-geral estão, neste momento, 12 candidatos,
metade dos quais mulheres, entre elas a Ministra dos Negócios Estrangeiros da
Argentina, Susana Malcorra, a antiga chefe do governo neozelandês e dirigente
do Programa da ONU para o Desenvolvimento, Helen Clark, e a ex-ministra dos
Negócios Estrangeiros búlgara e diretora da UNESCO, Irina Bokova”.
Por outro
lado, anotava que a indicação dum candidato pelo Conselho de Segurança à
Assembleia Geral requeria, pelo menos, 9 votos a favor, incluindo os dos 5
membros permanentes do Conselho de Segurança (China, França, Estados Unidos, Reino Unido e Rússia).
A 5 de
agosto, o Jornal de Negócios referia
que o ex-primeiro-ministro português consolidara a sua posição entre as
preferências do Conselho de Segurança para poder tornar-se o 9.º
secretário-geral da ONU, ao destacar-se de novo na votação dos 15 países membros
do Conselho de Segurança. Com efeito, o candidato recebeu 11 votos de
encorajamento, 2 de desencorajamento e 2 sem opinião, continuando à frente de Danilo Turk – o esloveno estava em 2.º lugar na 1.ª ronda de votações
e agora passou para 4.º. Logo a seguir a Guterres, nesta votação, ficou
Vuk Jeremic, ex-ministro sérvio dos Negócios Estrangeiros, com
8 votos de encorajamento (mas com 4 de desencorajamento e 3 sem opinião). Também com 8 votos de encorajamento ficou a
ministra argentina dos Negócios Estrangeiros, Susana Malcorra (mas 6 de
desencorajamento e 1 sem opinião).
Estão, pois, na corrida ao posto cimeiro da ONU
11 candidatos – 6 homens e 5 mulheres – depois de Vesna
Pusic, ex-ministra croata dos Negócios Estrangeiros, ter desistido. Porém,
apesar de Guterres ter vencido estas duas votações, há senãos.
Nesta votação indicativa feita pelos 15 Estados que atualmente
compõem o Conselho de Segurança da ONU (5 permanentes e 10 não-permanentes), o candidato recebeu 2 votos de
desencorajamento. Se estes 2 votos foram provenientes dum dos membros
permanentes, por exemplo da Rússia ou da China, de nada lhe servirá a liderança
atual. O português tem contra si o princípio da rotatividade, segundo o
qual, desta vez, deveria ser alguém proveniente da Europa de Leste a ocupar a liderança
da ONU. Por outro lado, acreditava-se que, desta vez, seria indicada para o
cargo uma mulher.
Acresce um outro fator potencialmente desfavorável
a Guterres. Moscovo tem-se oposto a candidatos provenientes de países-membros
da NATO. E Portugal é um dos fundadores desta organização atlântica. Por sua
vez, Ban Ki-moon –
que, em recente visita a Portugal a convite do Presidente da República, elogiou
António Guterres, que considera “um grande líder, com uma forte visão” e por
quem tem uma grande admiração (que “deu um grande contributo à
Humanidade como Alto Comissário para os Refugiados“, tendo deixado “um grande
legado”) – referiu há,
poucos dias, que estava na hora de a ONU ser liderada por uma mulher.
Por mim, pergunto-me por que motivo vem a
realizar-se esta palhaçada das votações. Se querem um candidato de Leste ou uma
mulher, digam-no claramente. E, sobretudo, acabem de vez com o direito de veto
de alguns membros do Conselho de Segurança.
Também se torna irritante o facto de a candidata da
Argentina, depois de Angola ter declarado o seu apoio a Guterres, ir a Angola
pescar em águas turvas a coberto do hipotético facto de Guterres representar
para os angolanos o passado de colonialismo (vd Expesso de hoje, 20 de agosto).
Será que a Argentina ainda vive o trauma do
colonialismo espanhol ou britânico? Ainda não cresceu? Ou será que Angola já
não teve tempo de em 40 anos se desfazer desse trauma? Para negócios, os angolanos
não têm traumas. Mas alguns esqueceram que foi com a formação académica em
Portugal que os seus antepassados revolucionários reconheceram o colonialismo.
***
Também,
há dias, foi notícia que pela primeira vez, o JALLC (sigla
inglês para designar “Joint Analysis and Lessons Learned Centre”), ou seja, o Centro Conjunto de Análises e Lições Aprendidas da NATO,
vai ser comandado por um português.
O Centro Conjunto de
Análises e Lições Aprendidas da NATO, em Monsanto, que depende do Comando Aliado da Transformação (Norfolk, EUA), foi inaugurado no final de 2002 pelo então Ministro da Defesa
Paulo Portas. Instalado,
pois, na capital há 14 anos, o JALLC é o agente da NATO (sigla,
em inglês, da Organização do Tratado do Atlântico Norte) perito em análise conjunta, que
tem 66 pessoas ao seu serviço, entre militares e civis, oriundos de 16 países. E,
a partir de 19 de agosto, é comandado por Mário da Salvação Barreto,
brigadeiro-general da Força Aérea, que sucede ao brigadeiro-general Mircea Mîndrescu, da Roménia.
A
cerimónia de tomada de posse, que decorreu nas instalações do JALLC a 19 de
agosto, contou com a presença do Ministro da Defesa Nacional, Azeredo Lopes, e
com Manfred Nielson, da NATO. Jorge Saramago, 2.º comandante, explicou à
agência Lusa que “este centro se
situa ao mais alto nível da estrutura da Aliança Atlântica”, apesar de ser
“pouco conhecido em Portugal e na própria NATO porque se dedica a procurar
soluções, a apresentar propostas para problemas ao mais alto nível”, problemas que
não especificou.
Sendo
um centro de estudo, o JALLC é “talvez uma das estruturas mais multinacionais
de toda a NATO”, na qual são analisados problemas complexos e apresentadas
soluções aos dois grandes comandos estratégicos da Aliança Atlântica para
“melhorar o emprego operacional das forças ou até a própria estrutura” da organização.
De acordo com o seu 2.º comandante, o centro tem ainda a responsabilidade de
interagir “com a nação hospedeira, neste caso Portugal, para apoiar toda a
comunidade da Aliança Atlântica que reside por motivos de serviço no país”.
O JALLC é o
centro responsável pela análise conjunta das atuais missões operacionais da
NATO, assim como dos treinos e exercícios, fazendo depois recomendações sobre o
desenvolvimento ou melhoria dos conceitos, doutrina e capacidades militares da
Aliança. Um exemplo do trabalho do JALLC é o relatório sobre a proteção de vítimas
civis no Afeganistão, publicado há um ano e elaborado a partir da missão da
NATO nesse país entre 2001 e 2014.
Outra
particularidade é o facto de Portugal voltar a ocupar, ao fim duma década, o
principal cargo num órgão da estrutura de comandos da NATO – agora com um
oficial general da Força Aérea. Tal havia acontecido (entre 1982 e
2004) com militares da Marinha, à frente
do comando operacional da Aliança em Oeiras.
Com a posse
de Mário Barreto, piloto-aviador dos caças F-16 e ex-comandante da Base Aérea
de Beja, cria-se também uma situação rara, senão única, num órgão multinacional
da estrutura de comandos da NATO, os dois cargos principais serem ocupados por
oficiais da mesma nacionalidade. Esta coincidência passará a ocorrer de três em
três anos e decorre da última distribuição de cargos pelos países da NATO, em
que ficou assente que o comando do Centro passaria a ser ocupado de forma
rotativa entre Portugal e a Roménia. Isto resulta também de o cargo de chefe do
Estado-Maior do JALLC, que assegura a ligação da agência ao país hospedeiro, se
manter ocupado por um oficial superior português, o coronel Jorge Saramago (Exército).
***
A
NATO é uma aliança militar composta por 28 países, com sede em Bruxelas (Bélgica), e Portugal foi um dos membros fundadores,
em 1949. Por isso, é normal que o comando das suas unidades seja ou não
exercido por oficiais portugueses. Porém, a reflexão atinente a esta matéria prende-se
com um comentário despudorado de alguém que, em rede social, sustenta que a
participação de Portugal na Nato é ilegal, porque então o regime português era
fascista.
Sem
responder com as palavras do falecido almirante José Batista Pinheiro de
Azevedo, apetece-me dizer que o comentador deve ser ilegal, pois terá nascido
de pais nascidos (ou será neto de avós nascidos e criados) num país de regime fascista e é
herdeiro de localidade, educação, saúde, função pública, forças armadas, casa, agricultura,
floresta, minas, comércio, banca, amigos, cafés e tabernas, hotéis e bares, fisco,
polícia, segurança social, justiça, desporto, ruas, animais, árvores, jardins,
matas, ouro, ferro, aço, igrejas… – tudo com marcas de fascismo. À luz da candeia
deste iluminado, eu sou ilegal porque nasci durante o regime anterior. Apesar de
tudo, ilegal e fascista como, pelos vistos sou, pago impostos, dei aulas em escolas
democráticas como aquelas em que o comentador terá aprendido (pouco,
pelos vistos) e,
mesmo sem querer, contribuo para a sua liberdade sem limites, saúde ou doença,
trabalho ou preguiça e, infelizmente, para a sua atitude de despudor e
petulância. Que o leve o diabo!
Finalmente,
recordo que o povo democrata aceitou a revolução que garantiu o respeito pelos
acordos internacionais e tem votado em partidos que se relacionam com a NATO, a
ONU, A UE, o EURO, a Santa Sé, a CPLP.
Será
que o douto comentador, a 25 de abril de 1974, pegou em armas ou em cravos,
gritou? Ou estaria ainda no hiperurânio?
Será que a ONU, com toda a sua hipocrisia e diversão, será menos colonialista e
mais democrática que a NATO, que o antigo Pacto de Varsóvia, a OUA, a CPLP ou a
OMC?
2016.08.20 – Louro de Carvalho
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