sexta-feira, 5 de agosto de 2016

O sentido mariano do dia 5 de agosto

No dia 5 de agosto, celebra-se a memória litúrgica de Santa Mãe de Deus ou, em termos populares, de Nossa Senhora das Neves. Em Roma, o Milagre da Neve é lembrado cada ano desde 1983 com um espetáculo de som e luz, no qual a neve é representada por uma chuva de pétalas brancas lançadas do teto sobre o hipogeu da Basílica de Santa Maria Maior.
Embora a solenidade de Santa Maria Mãe de Deus, por via da reforma da Liturgia estipulada pelo Concílio Vaticano II, se celebre no dia 1 de janeiro, no início do ano civil e Dia Mundial da Paz, nem por isso se deslustra este dia festivo de agosto, dado que se comemora a dedicação da basílica de Santa Maria em Roma (introduzida a festa no santoral romano em 1568), em que a Virgem Mãe de Deus é venerada sob o título de Santa Maria Maior, por se tratar do primeiro templo romano (e muito grande) dedicado a Santa Maria e ainda a primeira igreja do Ocidente dedicada a Nossa Senhora. A construção foi determinada sobre uma construção anterior menos imponente, pelo papa Sisto III no ano de 431, a seguir ao Concílio de Éfeso, no qual foi solenemente proclamado o reconhecimento de Maria como a Mãe de Deus (theotókos) e não apenas a mãe do Cristo homem (Christotókos), como afirmava Nestório. A dedicação ocorreu em 440.
Além disso, a basílica guarda numa capela especial o célebre ícone mariano bizantino “Salus Populi Romani” (Salvação do Povo Romano ou Protetora do Povo Romano), que a tradição histórica diz ter sido pintado pelo evangelista Lucas, mas crê-se que seja, pelo menos, do início da era cristã. Trata-se dum título dado no século XIX àquele ícone bizantino da Virgem com o Menino Jesus. Tem sido historicamente o mais importante ícone mariano em Roma, embora a devoção a ele tenha diminuído em relação a outras imagens (como a de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro – um ícone muito parecido). Não obstante, ao longo dos séculos, recuperou um certo estatuto, especialmente ao ser coroada pelo Papa Pio XII em 1954. E, nos últimos tempos, a basílica de Santa Maria Maior tem profundos vínculos com os papas. João Paulo II mandou colocar e manter acesa dia e noite uma lâmpada de óleo sob a efígie da Salus Populi Romani e, a 8 de dezembro de 2001, dia da Imaculada Conceição, inaugurou na basílica o Museu de Santa Maria Maior, com obras de arte históricas sobre Maria. Depois, em 2003, o mesmo Papa deu aos jovens da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) uma cópia contemporânea deste antigo e sagrado ícone como símbolo de fé para ser levado pelo mundo, a acompanhar a cruz da JMJ, dizendo:
“Hoje eu confio-vos... o ícone de Maria. De agora em diante, ele vai acompanhar as Jornadas Mundiais da Juventude, junto com a cruz. Contemplai a sua Mãe! Ele será um sinal da presença materna de Maria próxima dos jovens que são chamados, como o apóstolo João, a acolhê-la em suas vidas” (Roma, 18.ª JMJ, 2003). 
Bento XVI visitou a Basílica várias vezes pedindo a intercessão da Salus Populi Romani; e Francisco, entre visitas públicas e privadas, já foi mais de 20 vezes saudar Maria nesse templo romano, ao qual nunca deixa de ir antes e depois de suas viagens pontifícias internacionais.
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Deve-se ao frade Bartolomeu de Trento, que viveu no século XIII, a versão sobre a origem da basílica de Santa Maria Maior. Segundo a tradição, no ano 352, vivia em Roma Giovanni, o representante do imperador, que se tinha transferido para Constantinopla. O fidalgo riquíssimo não sabia como gastar toda a sua fortuna. Não tinha filhos e, de acordo com a esposa, queria construir obras pias para a Igreja, em honra de Deus e de Maria, mas não sabia quais escolher.
Entretanto, sucedeu o inesperado: “signum de caelo descendens”.
Durante a noite de 4 para 5 de agosto, apareceu-lhe em sonho a Virgem Maria, que lhe ordenou construir uma igreja no lugar que estivesse com neve pela manhã. O rico senhor acordou e pôs-se a pensar que a neve em Roma era uma coisa estranha, pois agosto era a estação de verão, extremamente quente naquela cidade. Porém, o mais interessante foi que a Virgem, na mesma noite, apareceu também ao Papa Libério a dizer-lhe que, logo ao raiar do dia, subisse a colina do monte Esquilino, pois encontraria o local cheio de neve e lá deveria erguer uma igreja. Pela manhã, aquele facto inédito verificou-se e, enquanto a notícia se espalhava por toda a cidade de Roma e arredores, o Papa e Giovanni, caminhando por vias diferentes, seguidos por uma multidão encontraram-se. E lá em cima, no monte Esquilino, comprovaram a neve. Com um bastão Libério traçou a área para edificação da igreja que o patrício construiu apenas com o seu dinheiro. Nascia a igreja de Santa Maria da Neves ou igreja liberiana.
Alguns dizem que Giovanni procurara o Papa Libério para lhe contar o sonho e que ficara surpreso quando o Pontífice revelara que também havia tido idêntica visão. Depois, juntos com a população foram ao alto do monte Esquilino e demarcaram sobre a neve o terreno onde a igreja havia de ser construída, seguindo o perímetro do terreno nevado. Assim se verifica que as tradições se mesclam por obra da alma popular que sempre uniu poesia/ficção à história.
As colinas do monte Esquilino tinham sido, na Antiguidade, um lugar de despejo de lixo, zona de imundices; posteriormente, tornou-se em lugar de sepultara de escravos. Na época do Império, porém, as colinas eram ocupadas por imensas vilas de nobres. Mas não deixava de ser um lugar de estranhas lembranças e que a comunidade evitava frequentar.
Com a edificação da igreja da Santa Maria da Neve ou das Neves, o local reconquistou a visita popular. Tanto é verdade que cerca de um século depois, para celebrar os resultados do Concílio de Éfeso, que proclamou inequivocamente e com o aplauso dos fiéis a “maternidade divina da Virgem Maria”, o Papa Xisto III quis mandar construir uma basílica em honra da Mãe de Deus. Mas, querendo que fosse grande, muito grande, escolheu o mesmo local onde fora construída a igreja indicada pela Virgem em sonho ao Papa Libério. No dia 5 de agosto de 431, foi lançada a nova igreja, a substituir a anterior, que foi consagrada depois, com o nome de basílica de “Santa Maria Maior”. Nela foi realizado o primeiro presépio de que há notícia na Igreja, pelo que também ficou conhecida como basílica de “Santa Maria do Presépio”. Nesta basílica – um dos maiores e mais belos santuários marianos de toda a cristandade – encontram-se os primeiros e mais ricos mosaicos alusivos a Nossa Senhora.
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A Basílica de Santa Maria Maior  é uma das Basílicas Papais de Roma ou uma das quatro Basílicas Maiores, que são: São João de Latrão, São Pedro, São Paulo Fora dos Muros e Santa Maria Maior.
Todas as Basílicas Maiores têm a porta santa e o altar maior ou altar papal. A porta santa é aberta com um ritual especial pelo Papa ou por um delegado seu somente durante o Jubileu e tem uma importante função na concessão da indulgência plenária. Do altar papal apenas o Papa e os seus delegados podem celebrar a missa.
Santa Maria Maior é a única basílica que conservou a estrutura paleocristã (cristã primitiva). Tendo sido enriquecida com vários acréscimos posteriores – nomeadamente em termos do recheio, como como capelas e obras de arte – por confrarias, cardeais e papas.
O seu valor artístico é inestimável. Nela está o túmulo de Gian Lorenzo Bernini, notável escultor, arquiteto e pintor italiano.
De acordo com o Tratado de Latrão (1929) a basílica pertence à Santa Sé, apesar de estar localizada em território italiano, gozando de um estatuto semelhante ao das embaixadas.
A primeira Igreja dedicada a Virgem Maria no Ocidente e uma das mais belas e adornadas de toda a cidade, abriga entre outras coisas, abaixo do altar central, um relicário com um pedaço da manjedoura do menino Jesus. A sua exuberância, representada pela mais pura perfeição artística, tornou-se um dos mais convidativos locais para recolhimento e oração.
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O facto de albergar o primeiro presépio escultórico (Francisco de Assis apresentou mais tarde um presépio vivo) de que há memória a evocar a gruta do nascimento de Jesus em Belém mostra-nos a economia salvífica segundo a qual Maria, a Mãe, nos aponta a direção do Filho Jesus e lhe aponta a Ele a nossa direção. Os seus cuidados – sob a Palavra – de maternidade expectante, de maternidade no nascimento e da infância, de maternidade na adultez de Jesus e no transe do Calvário, de maternidade da Igreja (Corpo Místico de Cristo) nascente e da Igreja que vive em cada comunidade e em todo o mundo bem demonstram que a Mãe de Deus é não só a Salus Populi Romani, mas a mãe da Igreja e, em Cristo, a Salvação de Todo o Mundo e a nossa Mãe.

O Ofício de Leitura da Liturgia das Horas sugere a leitura dum excerto da Homilia do bispo São Cirilo de Alexandria, proferida no Concílio de Éfeso (Homilia 4: PG 77, 991.995-996) (Século V) – em  Louvor de Maria, Mãe de Deus

Contemplando a assembleia dos homens santos, alegres e exultantes, que, movidos pela santa Mãe de Deus, ali acorreram com prontidão, Cirilo manifesta alegria por aquele “bom e agradável convívio dos irmãos” que saúdam a Santa Trindade que os reuniu naquela “igreja de Santa Maria, Mãe de Deus”. E à Mãe de Deus chama “venerando tesouro de toda a terra, lâmpada inextinguível, coroa da virgindade, cetro da doutrina verdadeira, templo indestrutível, morada d’Aquele que nenhum lugar pode conter, Mãe e Virgem, por meio da qual nos santos Evangelhos Jesus é chamado Bendito O que vem em nome do Senhor. 
O orador saúda Maria, que trouxe no seio virginal “Aquele que é imenso e infinito”. E justifica:
“Por Vós, a santa Trindade é glorificada e adorada; por Vós, a cruz preciosa é adorada no mundo inteiro; por Vós, o Céu exulta; por Vós, alegram-se os Anjos e os Arcanjos; por Vós, são postos em fuga os demónios; por Vós, o diabo tentador foi precipitado do Céu; por Vós, a criatura decaída é elevada ao Céu; por Vós, todo o género humano, sujeito à insensatez da idolatria, chega ao conhecimento da verdade; por Vós, o santo Batismo purifica os crentes; por Vós, nos vem o óleo da alegria; por Vós, são fundadas as Igrejas em toda a terra; por Vós, os povos são conduzidos à penitência.
Por Ela, o Filho Unigénito de Deus iluminou os que jaziam nas trevas e na sombra da morte; os Profetas anunciaram as coisas futuras; os Apóstolos pregaram a salvação aos povos; os mortos são ressuscitados; e reinam os reis em nome da santa Trindade. E, querendo que o louvor a Maria chegue por boas mãos à Santíssima Trindade, o orador homilético formula o voto:
“Queira Deus que todos nós reverenciemos e adoremos a Unidade, que em santo temor veneremos a indivisível Trindade, ao celebrarmos os louvores da sempre Virgem Maria, templo santo de Deus, que é seu Filho e Esposo imaculado. A Ele a glória pelos séculos dos séculos. Amen.” 

2016.08.05 – Louro de Carvalho

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