Decorreu, no
Centro Salesianum, em Roma, de 21 a 25 de
agosto, a Assembleia Geral da CMIS (Conferência
Mundial de Institutos Seculares),
sendo os seus temas centrais a “formação dos membros de Institutos seculares” e
a “identidade da consagração dos próprios Institutos”.
O evento reuniu responsáveis gerais dos Institutos Seculares
membros da CMIS e presidentes das conferências nacionais e continentais dos
Institutos Seculares. No total, foram mais de 140 os participantes, representando
25 países de 5 continentes. A Missa de abertura foi presidida pelo cardeal Dom
João Braz de Aviz, Prefeito da CIVCSVA (Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as
Sociedades de Vida Apostólica), no dia 22. Além de ter relatado as atividades da CMIS nos últimos 4
anos, apreciado as suas contas e promovido a eleição dos seus órgãos de governança,
o encontro examinou subtemas importantes para o próximo quadriénio, no âmbito
dos temas centrais acima referidos, como: a laicidade como sede natural da
formação; as novidades emergentes de diferentes culturas e continentes; os
vários perfis e andamentos dos Institutos; e a redescoberta do valor duma
vocação evangélica que não busca visibilidade ou eficiência. E, a 24 de agosto,
teve lugar a audiência com Papa Francisco, que saudou os participantes na Assembleia
Geral da CMIS e lhes disse:
“Com fervorosos bons votos de que o atual Jubileu da
Misericórdia seja para vós e para as vossas famílias um tempo de graça e de
renovação espiritual, invoco sobre vós a alegria e a paz do Senhor Jesus!”.
Também se tornou central a reflexão
sobre o 70.º aniversário da “Provida
Mater Ecclesia”, a Constituição Apostólica sobre Institutos seculares,
assinada por Pio XII em 1947. A Assembleia elegeu os órgãos da governança, de
que se destaca o Conselho executivo, a quem é confiada a tarefa de executar as
orientações da Assembleia Geral.
Entretanto, o Papa, em mensagem assinada pelo Cardeal
Secretário de Estado enviou a cada Instituto uma fórmula de “síntese renovada”
entre o aspecto laical e o de consagração desta peculiar vocação: “criar
unidade entre consagração e secularidade, entre ação e contemplação”. E,
citando Paulo VI, afirmou que estes Institutos estão numa “misteriosa
confluência entre as duas poderosas correntes da vida cristã”, a laical e a
voltada para Deus pela profissão dos conselhos evangélicos – correntes que
Francisco não quer ver separadas nem subordinadas uma à outra. A explicitar
esta sua visão integradora, sustenta:
“Não se é antes leigos e depois consagrados,
mas nem mesmo antes consagrados e depois leigos, é-se contemporaneamente leigos
e consagrados”.
E acrescenta:
“Deriva também outra consequência
importantíssima: é necessário um discernimento contínuo, que ajude a
concretizar o equilíbrio; um comportamento que ajude a encontrar Deus em todas
as coisas”.
Para tanto,
urge uma cuidadosa formação que esclareça como, mesmo não “sendo exigida” aos
leigos dos Institutos Seculares a vida comunitária, “é essencial a comunhão com
os irmãos”. Ademais “a secularidade move-se com um amplo respiro, em vastos
horizontes”, o que leva quem faz parte dele, a aceitar “a complexidade, a fragmentação
e a precariedade do nosso tempo” e a ser criativo em “imaginar soluções novas,
inventar respostas inéditas e mais adequadas às novas situações que se apresentam”,
“vivendo uma espiritualidade capaz de conjugar os critérios que vêm “do alto”,
da graça de Deus, e os critérios que vêm “de baixo”, da história humana”, lida
e interpretada”.
Depois, o Papa exorta estes Institutos a
intensa “vida de oração”, a “serem uma chama acesa” para homens e mulheres que buscam
uma luz e, por estarem mergulhados no mundo, a serem “testemunhas do valor da
fraternidade e da amizade”. Nestes termos, “o maior desafio, para os Institutos
Seculares, é o de serem escolas de santidade”, com os conselhos evangélicos de
castidade, pobreza e obediência, testemunhando que se pode ser livre e humilde
e estar a serviço dos outros, muitos dos quais são “pessoas que perderam a fé
ou que vivem como se Deus não existisse, jovens sem valor e ideais, famílias
desagregadas, desempregados, idosos sozinhos, imigrantes...”. E aponta como modelo
Maria, que “levava uma vida normal, parecida com a de tantos outros, e assim
colaborava com a obra de Deus”.
***
Fundada
em 1972, a CMIS
recebeu a aprovação da Santa Sé em 1974. É um projeto com o objetivo de contribuir
com a colaboração dos Institutos Seculares de modo que possa ser efetivamente
no mundo “fermento para o vigor e o crescimento do Corpo de Cristo”, isto é, a
Igreja (vd
Perfectae Caritatis, 11).
Assim, coopera com cada Instituto para que alcance o seu próprio fim. Em
particular, a CMIS:
favorece os contactos, trocas de experiências e a ajuda fraterna entre os
institutos e mantém relações regulares com outros grupos, como as conferências
nacionais e territoriais em espírito de serviço; promove estudos e pesquisas
para aprofundar a atual missão dos Institutos Seculares, tomando como base os
documentos da Santa Sé e do Concílio, tendo em consideração as experiências
vividas pelas mesmas instituições; e manifesta as necessidades, os interesses,
as opiniões dos Institutos à Santa Sé. (Estatutos,1). A CMIS é
um lugar de encontro, de troca e de pesquisa ao serviço dos Institutos (Estatutos,
2).
***
Mas o que são Institutos Seculares?
Toda a gente ouviu falar de frades e freiras – homens e/ou mulheres que
acrescentam à consagração batismal a consagração específica em torno dos
valores ou conselhos evangélicos (pobreza voluntária,
obediência inteira e castidade perpétua). Se vivem isolados no deserto, chamam-se eremitas ou anacoretas; se
vivem em comunidade de vida contemplativa com clausura, oração e trabalho no
mosteiro ou cenóbio, são monges (cenobitas); se vivem em comunidade ou
nela se encontram regular e periodicamente, entregues sobretudo à ação (pregação, ensino, saúde, promoção social, missões…), são irmãos e vivem no
convento ou em pequenas comunidades. Muitos dos frades recebem a ordenação sacerdotal,
mas, em vez da promessa da obediência ao bispo diocesano e sucessores, prestam obediência
ao seu ordinário e sucessores.
E os institutos seculares? Formam-se a partir de homens e/ou mulheres que se encontraram com Jesus e se
apaixonaram por Ele, mas, seguem-No pela profissão dos conselhos evangélicos
vivendo no mundo (a sós ou em família ou em grupo de amizade), sem hábito e exercendo normalmente uma profissão. É
o que se designa por consagração secular e/ou
secularidade consagrada.
À pergunta, “porquê esta paixão
pelo mundo?”, respondem com a vida, “porque
esta é a paixão de Deus!”. Chamados a
uma plena e completa consagração a Deus vivida em pleno mundo, desejam viver e
atualizar o mistério da Vida e Ressurreição de Jesus a partir de dentro do
mundo e com os meios do mundo como Jesus nos seus 30 primeiros anos na família
de Nazaré.
A sua
consagração impele-os à radical fidelidade ao Evangelho até as últimas consequências.
Estar no mundo, como fermento e sal, com presença discreta, mas ativa e
transformadora das pessoas e da realidade, constitui a sua estratégia específica
e privilegiada de evangelização. A opção pela secularidade consagrada é fruto
de resposta a uma vocação divina para contribuir para que o mundo seja o que e
como Deus quer; é amar o mundo onde Deus os coloca, para o transfigurar com o
testemunho de vida a partir de dentro. É Evangelização a partir da presença pessoal
no meio familiar, sociopolítico, cultural e profissional em conformidade com a
vocação pessoal discernida à luz do evangelho e realidade em que se vive.
Os
Institutos Seculares, embora ensaiados antes, por exemplo por Santo António
Maria Claret, ganharam estatuto eclesial e fundamento sólido com os documentos
do Magistério de Pio XII: a Constituição Apostólica “Provida Mater Ecclesia” (1947); o Motu Proprio “Primo Feliciter” (1948); e a Instrução Cum
Sanctíssimus (1948). Mais proximamente,
referem-se-lhes discursos de Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI, o Decreto Perfectae Caritatis (n.º 11) o Código de Direito Canónico (cânones
710-739) e a Exortação Apostólica Vita Consecrata (n.º 10).
Os seus membros são seculares (leigos) consagrados. A vocação destes Institutos é a especial consagração
vivida de modo secular e a vida plenamente secular vivida de modo consagrado. E
os seus membros encontram no exercício profissional o meio de
sobrevivência e o espaço de missão e de testemunho do Reino: consagram a
secularidade; vivem os conselhos evangélicos a partir do mundo: a sua
consagração é secular. Paulo VI (26/09/70) define-os assim: “Pertenceis à Igreja a título especial, o
vosso título de seculares consagrados”. E o facto de a maioria destes Institutos não terem obras próprias torna os
seus membros abertos ao pluralismo no campo profissional. Escolhem livremente a
profissão conforme as suas habilidades, discernimento e desafios do carisma. Como
já foi dito, os membros dos Institutos Seculares residem com as suas
famílias, sozinhos ou em pequenos grupos de pessoas que partilham ou não a
mesma vocação.
Nestes casos,
a formação
e acompanhamento acontecem com a pessoa a conviver no ambiente familiar,
profissional e social, tendo encontros periódicos com os (as) formadores(as),
encontros mensais e retiros do Instituto. Esta missão no mundo exige
maturidade humana e evangélica para ser testemunha de Jesus Cristo e do seu
amor pela humanidade e postula o cultivo de intensa vida de oração litúrgica e
pessoal a desembocar na experiência pessoal de convivência íntima com Aquele a
quem se escolhe como Único Amor e sentido absoluto da vida.
Importa a unidade com a Igreja. Os(as)
consagrados(as) seculares guardam discrição e, em alguns casos, sigilo sobre a sua
vocação, mas devem ter acompanhamento espiritual e levar ao conhecimento do
Bispo a presença do Instituto na Diocese. A consagração compromete-os(as) com a
Igreja e fá-los(as) sempre interessados(as) e dispostos(as) a conhecer, acolher
e viver as suas diretrizes e projetos de evangelização. Fazem-no como
filhos(as) que se colocam ao serviço da Mãe Igreja sempre que puderem, de
acordo com as suas condições e necessidades de atuação. Normalmente, o Instituto
não dirige a ação dos seus membros e cada um assume a sua missão em caráter
pessoal na Igreja.
A consagração secular expressa-se
pela profissão dos conselhos evangélicos em consequência da radical opção pelo
seguimento de Jesus Cristo, que durante a sua vida terrena teve Deus como único
amor (castidade), seu único bem (pobreza) e o fiel cumprimento da vontade do Pai como
sua única vontade (obediência).
O dom da pobreza evangélica voluntária
é o fascínio pelo estilo de vida que Jesus viveu; purifica o olhar para
discernir o definitivo e o transitório, levando a escolher o definitivo;
compromete a pessoa no uso definido e limitado dos bens e, na consagração
secular, inclui o exercício de trabalho civil. É o Amor que se doa e se compromete
a compartilhar tudo o que possui – dons e talentos e/ou o que se adquire com o
fruto do trabalho, indo ao encontro dos mais necessitados, em rostos concretos
que se encontram na vida.
O dom da obediência inteira leva a contemplar, aprender e seguir a
obediência de Jesus, que fez em tudo a vontade do Pai; é o Amor que se entrega
sem reservas e descobre a vontade do Pai, manifestada na Igreja, na Norma de Vida e nos irmãos/irmãs do
Instituto, nos factos da vida concreta e no cumprimento dos deveres
profissionais e civis; é a confirmação do “Sim!” a Deus, no quotidiano da vida.
O dom da castidade consagrada e
perpétua valida a opção exclusiva por Deus; é o Amor que se sacrifica e dá
a vida disponibilizando o coração para o amor universal no anseio de se
configurar ao amor de Deus, indo ao encontro das pessoas, especialmente dos
deserdados do amor, vitimados pelo abandono, pobreza e/ou outras vicissitudes
da vida.
Pio XII, no Motu Proprio “Primo Feliciter”, ensina que toda a vida dos membros dos Institutos
Seculares se deve converter em apostolado, “exercido, constante e santamente
por uma tal pureza de intenção, uma tal intimidade com Deus, um tal generoso
esquecimento e abnegação de si próprio, um tal amor das almas, que seja capaz
de revelar o espírito interior que o anima e na mesma proporção o alimente e
renove sem cessar” – apostolado que “deve exercer-se fielmente não só no mundo,
mas dalgum modo, a partir do mundo e, por isso, em profissões e atividades,
formas, lugares e circunstâncias correspondentes a esta condição secular”.
***
São um modo
de exprimir o ser e a missão da Igreja, estando no mundo sem ser do mundo e
implorando que o Pai nos livre, não do mundo, mas do mal.
2016.08.30 – Louro de Carvalho
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