quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Gerar debate e criar conhecimento válido para as (e das) IPSS

A CNIS (Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade) promove, no próximo dia 30 de setembro, um seminário no âmbito da Saúde, intitulado “IPSS Promotoras de Saúde – Uma influência positiva nos determinantes da Saúde”. O evento é integrado na 10.ª edição da Festa da Solidariedade, que se realiza em Coimbra, vem responder à preocupação e importância crescentes no seio da Confederação e vai ao encontro dos anseios expressos pelas IPSS (Instituições Provadas de Solidariedade Social) da área da Saúde no sentido de a CNIS promover mais encontros de trabalho sobre a temática.
Maria João Quintela, da Direção da CNIS com o pelouro da Saúde e líder do grupo organizador do seminário explica o objetivo: “O que pretendemos é reforçar a ligação às questões da Saúde com uma abordagem mais específica”. Sobre o papel das IPSS em relação à saúde, sustenta:
“As instituições da Saúde e com mais ligação a esta área têm uma função muito importante desde a prevenção, passando pelo tratamento e até à reabilitação, que por força das alterações que se assistem na sociedade, desde as questões da natalidade ou do aumento da longevidade, entre muitas outras, cria um conjunto de necessidades alargadas que precisam de respostas de proximidade e as IPSS são quem melhor pode desempenhar esse papel”.
E sublinhando:
“Ninguém responde a estas necessidades como as IPSS, até no apoio que presta às famílias, cada vez mais necessário face ao envelhecimento da população. As IPSS, pela sua proximidade, são quem melhor responde a estes desafios”.
Realçando a relevância do papel das IPSS que trabalham especificamente na área da Saúde e reconhecendo “o papel essencial que todas as instituições têm na saúde”, toma o exemplo das campanhas de vacinação e cuidados com fenómenos climatéricos extremos, como seja o muito calor no verão ou o muito frio no inverno, para apontar:
“As populações e as entidades oficiais parecem não ter consciência do enorme papel que todas as instituições sociais têm na prevenção, promoção e proteção da saúde em Portugal”.
Neste contexto, se compreende a escolha dos temas a debater: a RNCCI (Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados), a resposta da Saúde mais disseminada pelas instituições associadas da CNIS; o envelhecimento ativo; e a Saúde Mental e Solidariedade.
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M. João Quintela, assegurando que “as IPSS são um veículo de informação muito útil das entidades da Saúde”, diz que a CNIS, com este encontro, visa também contribuir para “o reconhecimento do importante trabalho das instituições da Saúde em áreas específicas” e mesmo nas atividades indiretamente conexas com a saúde, pois todas as IPSS tratam da “prevenção, promoção e proteção da saúde, ao longo de todas as fases da vida”. Por exemplo, as instituições da área da infância têm um papel decisivo na promoção da saúde ao promoverem a nutrição saudável e o exercício físico, para obviar ao problema hodierno da obesidade infantil.
Assim, o seminário da CNIS tem como principais objetivos: o fomento da troca de experiências positivas das IPSS, na comunidade e na proximidade dos cidadãos; a promoção da solidariedade pelo maior conhecimento do trabalho das mesmas; a potenciação das parcerias com os diversos intervenientes no sistema de saúde; a divulgação do conhecimento das reformas previstas e em curso; e a promoção do reconhecimento do papel inaliável e imprescindível das IPSS.
Por outro lado e face ao crescimento galopante do número de demências, agendaram-se dois painéis de debate sobre temas relacionados com a problemática: envelhecimento ativo e Saúde Mental e Solidariedade.
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O presidente do CNSM (Conselho Nacional de Saúde Mental), António Leuschner, que será um dos intervenientes do último painel, considera a questão da demência “um tema complicado, porque já não se trata de saber onde começa o social e acaba a saúde”, “mas onde começa o mental e o neurológico”. E adianta, para encarecer a premência cada vez maior do problema:
“Hoje fala-se muito mais de demências do que há 20 anos porque as pessoas duram mais e, como o principal fator de risco é a idade, aparecem muito mais casos atualmente e torna-se muito mais visível”.
Ora, segundo o clínico, a situação tem levantado alguns problemas às instituições que laboram na área da terceira idade e que diariamente se debatem com esta realidade, tentando fazer o melhor em prol dos utentes, sejam eles de ERPI (Estrutura Residencial para Pessoas Idosas), de SAD (Serviço de Apoio Domiciliário), sejam de Centro de Dia ou de outra qualquer resposta social.
M. João Quintela defende que “as instituições precisam de apoio para melhor servirem as pessoas”, o que postula “sensibilização, informação e formação”. Por outro lado, porque “há boas práticas nas instituições”, “é preciso dar a conhecer melhor o que as instituições fazem, dar visibilidade ao trabalho que é feito e dar às instituições mais informação e formação”.
Por isso, o seminário integra apresentações de boas práticas das IPSS, seja no âmbito da RNCCI, seja no do envelhecimento ativo; e visa “reconhecer o enorme papel do voluntariado” nesta atividade fundamental das instituições, não olvidando a importância da “ligação às universidades”, centros de saber e de conhecimento, tão úteis ao bom desempenho das IPSS.
Sobre o papel das IPSS no âmbito da RNCCI, que o Governo quer pôr no terreno ainda este ano, Leuschner sustenta que o Setor Social está em lugar privilegiado, dizendo:
“Já houve passos e iniciativas, algum esforço para passar à ação, mas ainda não se passou à ação. É preciso atualizar alguma legislação e agora vai tentar-se fazer uma atualização da Portaria de 2011 para ainda este ano começar a pôr-se no terreno algumas iniciativas”.
Porém, na ótica do clínico, é um dado adquirido que o Estado só por si não consegue responder às necessidades, pelo que o recurso à sociedade civil, na qual as IPSS têm papel determinante, é “essencial”. Com efeito, “há a necessidade de apoio social e de apoio de saúde às pessoas afetadas por doença mental, porque a doença existe e precisa de ser tratada e, de apoio social, para suprimir a incapacidade de desempenho social”. E é aqui que surgem as necessidades e a ideia dos Cuidados Continuados. No entanto, Leuschner opõe objeção à designação de Rede de Cuidados Continuados, explicando:
“Tenho dificuldade em achar que esta designação seja muito boa, entende-se o significado mas fica demasiado à vista que parece ser uma forma à parte de prestar cuidados e não é assim tão distante. O que tem que garantir é que entre os cuidados primários, os cuidados hospitalares e os cuidados sociais haja um continuum. Os Cuidados Continuados são, de alguma forma, a garantia desta continuidade e não uma coisa à parte. E o conceito de Cuidados Continuados foi muito colado à ideia de haver uma rede que nada tem que ver com as outras e não é bem isso. E uma caraterística que esta rede tem, e as pessoas muitas vezes não enfatizam, é que ela é de cuidados de saúde e de apoio social. E, aqui, a continuidade dos cuidados tem que ir para além da saúde”.
O especialista avança com números de 2015, que indicam que dos 2 milhões de pessoas com 65 ou mais anos, 1,2 milhões vivem ou sozinhas ou com outra pessoa de idade similar, enquanto só as restantes vivem no seio das famílias – o que significa que muitas pessoas facilmente ficam sem ter quem cuide delas. Por isso, Leuschner deixa o alerta:
“E a sociedade no seu conjunto tem que encontrar soluções. E a sociedade tem mecanismos de entreajuda, onde o Setor Social tem um papel importante e tem procurado encontrar respostas eficientes. Muitas vezes são eficientes, mas não são suficientes”.
E adverte:
“Temos que ter cuidados para todos, mas o tipo de cuidados de cada grupo é diferente e é preciso que saibamos hierarquizar os cuidados consoante as necessidades e não com o que nos dá jeito”.
Ao falar-se em planeamento de cuidados, segundo o especialista em saúde mental, dispõe-se que o Estado garanta o que são as respostas mais caras e mais difíceis, mas que depois faça alianças com o Setor Social e, se for o caso, com os privados. A este respeito, o clínico frisa:
“No entanto, acho que o Setor Social tem uma maior proximidade e maior analogia com o Estado do que o privado que funciona em outra lógica”.
Ora, esta parceria – que vem já desde 1998, ano da publicação do Despacho Conjunto n.º 407/98, de 18 de junho – está consubstanciada em protocolos entre dois ministérios (Saúde e Solidariedade) e o Setor Social e é virtuosa “para evitar duplicações, sobreposições e conflitos, porque, quando os recursos são escassos só dá guerra”. E fazer para além do desejável – diz o clínico – “não é aconselhável quando os recursos são escassos, pelo que é necessária, cada vez mais, esta articulação e integração, para que a pessoa que precisa de cuidados os receba quando, como e onde precisa”.
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Neste sentido, a CNIS espera-se que nova portaria, a publicar brevemente, dê cobertura à transformação das unidades criadas ao abrigo do despacho conjunto n.º 407 para se integrarem na nova legislação. Aliás, isto está previsto desde 2006, em que a legislação estabeleceu que as experiências do 407 continuavam em vigor até serem substituídas por novas experiências ao abrigo do diploma. Porém, o diploma regulamentador não veio. E umas instituições continuam, algumas sobrevivem com grandes dificuldades e outras infelizmente acabaram por ser extintas. Ora, o que se pretende é desenvolver esse tipo de resposta que foi interessante. Estamos a caminho dos 20 anos e a verdade é que elas tiveram um caráter pioneiro em Portugal no sentido da criação desta articulação entre a Saúde e o Social. E tem-se em vista que a nova legislação as albergue com melhores condições.
M. João Quintela destaca a importância de seminário da CNIS no sentido de “levar a sociedade e as próprias instituições a tomarem consciência da importância do seu papel, que tem de ser mais conhecido e reconhecido em prol da saúde das populações, pelo seu papel na prevenção, promoção e proteção da saúde e ainda da sua necessária interligação com o sistema de saúde e deste com as IPSS”.
É neste contexto que o Padre Lino Maia enquadra a necessidade da celebração da Festa da Solidariedade:
“Tem que haver uma Festa da Solidariedade, pois é importante que por todo o País passe esta mensagem da solidariedade, no sentido da envolvência e de termos cada vez mais gente, não apenas a apreciar os que são solidários, mas também levá-los a interrogarem-se se não poderão entrar neste barco solidário”.
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Perante as necessidades crescentes a todos os níveis – sobretudo obesidade de crianças, demência senil, doença e isolamento, sinistralidade, maior longevidade das pessoas – importa relevar a função do Estado e o papel insubstituível dos privados, quer ao nível institucional que ao do voluntariado. Importa que não se desista do caminho iniciado. Importa que não se desista das pessoas. Importa que se trabalhe cada em maior coesão e solidariedade pelo bem-estar de todos.
Para tanto, divulgação das boas práticas, sensibilização, formação, entrega às grandes causas!  

2016.08.17 – Louro de Carvalho 

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