segunda-feira, 8 de agosto de 2016

A ação de São Domingos de Gusmão

Celebra-se, a 8 de agosto, a memória litúrgica de São Domingos de Gusmão, famoso pelo combate aos hereges, denominados de cátaros (puros) ou albigenses (por medrarem na região de Albi), por incrementar a recitação do santo rosário e por vir a fundar a Ordem dos Pregadores (e o seu ramo feminino), uma das ordens mendicantes que se criaram no século XIII para consolidar a doutrina e reformar os costumes.
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As ordens mendicantes são formadas por frades (padres e/ou leigos) ou freiras que vivem habitualmente em conventos, não em mosteiros. Centram a sua ação e apostolado na oração, na pregação, na evangelização no serviço aos pobres e nas demais obras de caridade estruturadas e estruturantes. O seu apostolado mais ativo no mundo secular implica que eles não vivam tão enclausurados como os monges. Não obstante, vivem em comunidades disciplinarmente austeras e reservadas. Surgiram numa época em que aumentavam as concentrações urbanas e, porque este seu estilo de vida respondia às necessidades de evangelização das cidades, receberam forte apoio dos Papas. A sua principal caraterística reside no facto de a sua sobrevivência depender das esmolas e dádivas dos outros, já que os seus membros renunciaram à posse de quaisquer bens, comprometendo-se em viver radicalmente na pobreza e na humildade. As esmolas e dádivas são obtidas principalmente através da pregação e de outras obras atinentes ao seu apostolado.
Os exemplos mais notáveis de mendicantes foram Francisco de Assis e Domingos de Gusmão, ambos fundadores de duas ordens mendicantes notáveis, que emparceiraram bem com os agostinianos, mercedários e carmelitas e desempenharam um papel fundamental na reforma católica e na evangelização das Américas.
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Filho de Joana de Aza e Félix de Gusmão, Domingos nasceu, em Caleruega, na zona de fronteira do Reino de Castela, cerca do ano 1170 e faleceu em Bolonha (Itália), a 6 de agosto de 1221. Os pais, pertencentes à pequena nobreza guerreira, que tinha o encargo de assegurar as praças militares da fronteira com o sul dominado pelos muçulmanos, deram-lhe esmerada educação. E, notando a sua inclinação para a vida religiosa, mandaram-no estudar, em 1189, para Palência e, concluídos dos estudos, em 1196, tornou-se presbítero e membro do cabido de Osma, sua diocese natal, de que chegou a ser subprior.  
Em 1203, o rei de Castela encarregou Diogo, Bispo de Osma, de negociar o casamento do filho com uma princesa da Dinamarca e de a trazer para o reino, tendo Domingos acompanhado o seu bispo na viagem. Durante esta, Domingos ficou deveras impressionado com o desconhecimento dos povos da Europa do norte sobre a doutrina cristã, tornando-se-lhe evidente a necessidade de ir evangelizar aqueles povos, em especial os cumanos. E, para consecução do objetivo inicial, Domingos e Diogo realizaram, em 1205, nova missão ao norte da Europa e uma peregrinação a Roma e a Cister. Encontraram, no sul de França, junto a Montpellier, legados do Papa a pregar contra a heresia dos cátaros (albigenses), que afirmavam que dois princípios dividiam o Universo: o princípio espiritual, bom; e o princípio material, mau. O homem, juntando em si os dois princípios era um anjo aprisionado num corpo e tinha como objetivo libertar-se do próprio corpo através da purificação espiritual. Proibiam o casamento e a procriação, porque isso era ajudar o demónio a aprisionar almas em corpos. Por conseguinte, incentivavam o suicídio, o aborto e a eutanásia, enquanto meios de acelerar a libertação da alma. Também negavam ao Estado o direito de punir criminosos, bem como contestavam a validade dos juramentos, os quais, na Idade Média, constituíam a base da confiança social. E negar a sua validade era tão grave como negar hoje a validade da lei. Com aquela ética, os cátaros tinham dificuldade em ajuntar sequazes. Sendo assim, estabeleceram dois tipos de fiéis: os “perfeitos” e os “simples”. Os perfeitos seguiam a ética cátara, vivendo em comunidades isoladas. Os simples não tinham de seguir um código de conduta, bastando-lhes como penhor do Céu o “consolamentum”, um tipo de extrema-unção. Em suma, a heresia cátara defendia uma dupla moral: vida ascética para a minoria; e libertinagem para a maioria, com a salvação obtida sem esforço. Por isso, a heresia acabou por conquistar muitos adeptos. A Igreja demonstrou grande paciência antes de tomar medidas contra o catarismo. De 1119, ano em que o catarismo foi condenado no Concílio de Toulouse, até 1179, Roma contentou-se com enviar pregadores, embora grande sucesso. Diogo e Domingos, face à evidência das dificuldades na missão dos legados papais, convenceram-nos a adotar uma estratégia de simplicidade ao estilo apostólico e mendicante, pois que os Legados se deslocavam com grande pompa. Os Legados deixam-se convencer, despachando para casa todo o supérfluo, na condição de que Diogo e Domingos os acompanhassem e os dirigissem na missão – o que estes fizeram. O Papa Inocêncio III, descobrindo virtudes nesta nova forma de pregação, aprovou-a e mandou Diogo e Domingos para a “santa pregação”. Diogo, sendo bispo, por razão das suas responsabilidades e não podendo ficar muito mais tempo na região, regressou à diocese, falecendo passado algum tempo. Domingos continuou, muitas vezes só.
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Em 1206, um grupo de mulheres por si convertidas do catarismo pede-lhe apoio; e ele acha, em 1207, uma casa para elas morarem em Prouille, dá-lhes uma regra de vida simples, de oração e reclusão, no que veio a ser a primeira comunidade religiosa dominicana de monjas de clausura. Domingos assume esta comunidade feminina como ponto de apoio à santa pregação, pois aquelas religiosas, por meio da oração, seriam o apoio dos pregadores. Em 1208, encontra-se completamente só na missão de pregar pelas localidades do sul de França; em 1210, está na região de Toulouse, palco de violentos combates entre senhores feudais e cátaros; e, em 1214, em Carcassonne, assiste a duras batalhas entre as duas partes e começa a juntar um pequeno grupo de companheiros que com ele adotam a vida de pregadores itinerantes. No mesmo ano, torna-se pároco de Fanjeaux, junto a Prouille e à sua comunidade feminina.
Em 1215, em Toulouse, adota uma regra de vida para a sua comunidade de pregadores, obtendo a aprovação do Bispo local. No entanto, o objetivo era criar uma ordem religiosa masculina que não ficasse restrita a uma diocese, mas que tivesse um mandato geral, por forma a poder atuar em todos os territórios onde fosse necessária a evangelização. Dirige-se, nesse mesmo ano, a Roma, onde decorria o IV Concílio de Latrão, a fim de obter o reconhecimento da Ordem. No entanto, o concílio, perante tantos e diferentes novos movimentos que surgiram por todo lado, e para evitar a anarquia, decide proibir que sejam aceites novas ordens religiosas. Aconselhado pelo Papa e de regresso a Toulouse, Domingos e companheiros estudam as várias Regras de vida religiosa já existentes e optam pela Regra de Santo Agostinho. Entretanto, o Papa Inocêncio III morre e o novo Papa, Honório III, é um admirador e amigo de Domingos e dos pregadores. Em 1216, Domingos volta a Roma com a Regra atualizada e, a seu pedido, o Papa insta à Universidade de Paris o envio de alguns professores para Toulouse destinados ao ensino e à pregação. Entretanto, o Papa confirma, pela bula Religiosam Vitam (22.12.1216), a regra da Ordem dos frades pregadores como religiosos “totalmente dedicados ao anúncio da palavra de Deus”. Logo após o reconhecimento da Ordem, Domingos envia os primeiros discípulos, dois a dois, a fundar novas comunidades em Paris, Bolonha, Roma e Espanha. Domingos acreditava que apenas o estudo profundo da Bíblia daria os meios necessários à pregação eficaz. Assim, envia os irmãos para as principais cidades universitárias da época, para adquirirem os conhecimentos necessários e agirem e recrutarem novos membros entre as camadas estudantis e intelectuais.
Foi prodigiosa a sua atividade nos últimos 5 anos de vida: ida a Roma; visita aos frades em Espanha, Provença, Paris e Bolonha; convocação e presidência dos dois primeiros Capítulos Gerais em Bolonha (1220 e 1221). Uma tradição, evocada por alguns Papas, dá-o como instituidor do Rosário. Morreu no regresso da pregação na missão do Norte de Itália. E, passados 12 anos, foi canonizado e o seu culto difundiu-se com rapidez. Varão evangélico e homem apostólico são os títulos que melhor o definem.
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A Igreja atribui a Domingos de Gusmão, conhecido como o “Apóstolo do Rosário”, a difusão e posterior expansão do Rosário. E esta devoção propagou-se nos católicos como arma contra o pecado e contra a heresia albigense, que assolava a região de Toulouse.
Segundo uma respeitada tradição, Nossa Senhora revelou, em 1214, numa aparição a São Domingos a devoção ao Rosário como meio para salvar a Europa da heresia. Com efeito, os albigenses, infiltrando-se nos meios católicos para melhor captarem simpatia, contagiavam com os seus erros diversos países a partir do norte da Itália e da região de Albi, no sul da França. Tais hereges, além do que foi dito acima, pregavam o panteísmo, o amor livre e a abolição das riquezas, da hierarquia social e da propriedade particular.
Várias regiões da Europa do século XIII ficaram infestadas por esta heresia, e toda a ação católica que visava contê-la mostrava-se ineficaz. Os hereges, após conquistar muitas almas, destruir muitos altares e derramar muito sangue católico, pareciam vitoriosos e, definitivo.
Domingos empenhou-se intrepidamente no combate à heresia albigense, não conseguindo, porém, sobrepujar o ímpeto dos hereges, que continuavam a perverter os católicos. E os que não se pervertiam eram massacrados. Desolado, Domingos suplicou a Maria que lhe indicasse um meio espiritual capaz de vencer aqueles adversários da Igreja.
O Bem-aventurado Alain de la Roche (1428 – 1475), célebre pregador da Ordem Dominicana, no livro Da dignidade do Saltério, narra a aparição de Nossa Senhora a São Domingos, em 1214. Nessa aparição, Ela instou o Santo a pregar o Rosário (também chamado Saltério de Maria, em lembrança dos 150 salmos bíblicos) para salvação das almas e conversão dos hereges. 
Na obra de São Luís Grignion de Montfort, vem transcrita a narrativa da aparição, referindo que Domingos, ao ver que os pecados dos homens criavam obstáculos à conversão dos albigenses, entrou num bosque próximo de Toulouse e passou nele três dias e três noites em contínua oração e penitência, não cessando de gemer, chorar e macerar o corpo com disciplinas para aplacar a cólera de Deus, a ponto de cair meio morto. Entretanto, a Virgem apareceu-lhe seguida de três princesas celestes para responder à sua inquietação.
Disse-lhe Maria que a peça principal da bateria de que a SS.ma Trindade se servira para reformar o mundo foi a saudação angélica (ave-maria).
O Santo, sabendo que, depois de Jesus Cristo, o principal instrumento da salvação foi Maria, percebeu que a saudação Angélica, fundamento do Novo Testamento, é útil para ganhar para Deus os corações endurecidos. E o conjunto de 150 ave-marias (saudação angélica) faz o Saltério de Maria. Assim, recitando 3 séries de 5 dezenas de ave-marias – antecedidas cada uma do “pai-nosso” e seguidas do “glória ao Pai” – faz-se um conjunto de 150 ave-marias. Cada série de 5 dezenas (um terço) deve propiciar a meditação dos mistérios do plano salvífico de Deus. Assim, o primeiro terço faz meditar os 5 mistérios gozos; o segundo terço faz meditar os 5 mistérios dolorosos; e o terceiro terço faz meditar os 5 mistérios gloriosos. João Paulo II adicionou mais um conjunto de 5 dezenas em que se asila a meditação dos 5 mistérios luminosos.
Domingos levantou-se muito consolado e, abrasado de zelo pelo bem daquela gente, entrou na sé catedral; e, no mesmo momento, os sinos tocaram para reunir os habitantes. No princípio da pregação, formou-se uma espantosa tormenta: a terra tremeu, o sol obscureceu-se, os repetidos trovões e os relâmpagos fizeram estremecer e empalidecer os ouvintes e aumentou o terror quando se viu uma imagem da Santíssima Virgem, exposta em lugar proeminente, levantar os braços três vezes ao Céu a pedir o auxílio de Deus contra os hereges, se não se convertessem e não recorressem à proteção da Santa Mãe de Deus.
A tormenta cessou. O santo orador continuou o sermão e explicou com tanto fervor e entusiasmo a excelência do santo Rosário que os moradores de Toulouse (um dos principais focos da heresia) o abraçaram quase todos e renunciaram aos seus erros, vendo-se em pouco tempo uma grande mudança na vida e nos costumes da cidade. 
Exibindo a potente arma do Rosário,  Domingos retornou ao combate, pregando sem cessar na França, Itália e Espanha a devoção que a própria Senhora do Rosário lhe ensinara e por toda a parte reconquistava as almas: os católicos tíbios se afervoravam, os fervorosos se santificavam; as ordens religiosas floresciam; os hereges se convertiam e, abjurando seus erros, voltavam à Igreja; os pecadores se arrependiam e faziam penitência; os demónios eram expulsos de possessos; e operavam-se milagres e curas.
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Enfim, rezar o Rosário (coroa de rosas oferecida à rosa das rosas) não substitui, para quem deve e/ou pode, a oração do saltério – distribuída pelas diversas horas canónicas da Liturgia das Horas (ou pela Bíblia). Mas quem não pode ou não sabe rezar o saltério pode muito bem santificar-se e interceder pelos outros recitando o rosário e meditando os divinos mistérios. E quem reza o saltério deve disponibilizar a sua humildade e pobreza espiritual para rezar o rosário como oração de pobres, sim, mas sobretudo como oração que, por Maria, leva a rezar a oração que Jesus ensinou e a louvar a Santíssima Trindade.  
São Domingos bem pode ser uma inspiração e um auxílio espiritual, com dois poderosos meios: a Bíblia e o Rosário.

2016.08.08 – Louro de Carvalho

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