Em nome do episcopado português e do episcopado espanhol, o
cardeal Dom António Marto, vice-presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), proferiu, a 25 de março,
solenidade da Anunciação do Senhor, na Basílica de Nossa Senhora do Rosário, em
Fátima, o ato de consagração de Portugal e de Espanha ao Sagrado Coração de
Jesus e ao Imaculado Coração de Maria, rogando o seu auxílio e proteção no
momento de tribulação que vivemos atualmente.
A iniciativa surgiu do pedido dum conjunto de leigos, que reuniu
milhares de assinaturas, dirigido ao presidente da CEP, que, depois, consultou
todos os bispos portugueses, que anuíram ao pedido e confiaram a Dom António
Marto, Bispo de Leiria-Fátima a proclamação desta histórica e inédita consagração ao Sagrado Coração
de Jesus e ao Imaculado de Maria.
Em ato de consagração e entrega, naquele dia solene, celebrando a
Igreja celebra o anúncio do anjo Gabriel a Maria de que ela seria a Mãe de
Jesus, os bispos portugueses e espanhóis pediram a sua intercessão pelas “vítimas diretas e indiretas” da pandemia; pelos “profissionais de saúde, incansáveis nos seus
esforços por socorrer os doentes”; pelas “autoridades, no seu esforço para encontrar soluções”; e por “todos nós e pelas nossas famílias”.
Apesar de o ato de consagração ter sido previsto apenas para
Portugal e Espanha, a celebração, precedida da recitação do terço, presidida
pelo referido cardeal e bispo de Leiria- Fátima e orientada pelo Padre Carlos
Cabecinhas, Reitor do Santuário, contou com a adesão de várias conferências episcopais
do mundo, de que muitos países estão intimamente ligados a Fátima e à sua
Mensagem, tendo o Reitor do Santuário anunciado: Albânia, Bolívia, Colômbia,
Costa Rica, Cuba, Eslováquia, Guatemala, Hungria, Índia, México, Moldávia,
Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, Polónia, Quénia, Republica Dominicana,
Roménia, Tanzânia, Timor Leste e Zimbábue.
A certo momento, o purpurado português confiava ao Senhor o olhar
suplicante da Igreja:
“A Igreja peregrina
sobre a terra, em Portugal e Espanha, nações que tuas são, olha para o teu lado
aberto, sua fonte de salvação, e suplica: nesta singular hora de sofrimento,
assiste a tua Igreja, inspira os governantes das nações, ouve os pobres e os
aflitos, exalta os humildes e os oprimidos, cura os doentes e os pecadores,
levanta os abatidos e os desanimados, liberta os cativos e os prisioneiros e
livra-nos da pandemia que nos atinge”.
E pedia ao Coração Cristo, “médico das almas” um “abraço” de amparo e conforto para “as crianças, os anciãos e os mais vulneráveis,
os médicos, os enfermeiros, os profissionais de saúde e os voluntários
cuidadores”, bem como o reforço “da
cidadania e da solidariedade”.
Ajoelhado frente ao grande crucifixo da capela-mor da Basílica e ante
a imagem da Senhora que se venera na Capelinha das Aparições e que, naquele
dia, esteve na Basílica de Nossa Senhora do Rosário de Fátima para a ocasião, o
cardeal invocou os Santos Pastorinhos, sepultados naquela Basílica, também eles
vítimas de pandemia que alastrou pela Europa na 2.ª década do século XX, com
referência especial a Santa Jacinta Marto, de cuja morte celebramos o
centenário e que experimentou a solidão do hospital nos seus últimos momentos
de vida.
Declarando que, ao consagrar-se ao Sagrado Coração de
Jesus, a Igreja se entrega à guarda do Coração Imaculado de Maria,
configurado pela luz da Páscoa e aqui revelado a três crianças como refúgio e
caminho que ao seu coração conduz, fez votos por que “seja a Virgem Santa
Maria, a Senhora do Rosário de Fátima, a Saúde dos Enfermos e o Refúgio” dos
discípulos de Cristo gerados junto à Cruz do amor divino. E a oração terminou
com um pedido lancinante:
“Nesta singular hora
de sofrimento, acolhe os que perecem, dá alento aos que a Ti se consagram e
renova o universo e a humanidade. Ámen.”.
O terço foi recitado em português, espanhol, inglês e polaco; e todas
as dioceses portuguesas e espanholas estiveram, particularmente, unidas na
oração do rosário pelas intenções de todo o mundo. Como ficou dito, embora o
ato de consagração tenha sido preparado para os dois países ibéricos, mais 20
conferências episcopais (foram
ao todo 24), de todos os continentes aderiram,
bem como numerosos fiéis de todo o mundo, a esta oração a partir de Fátima, transmitida
em direto por inúmeros canais de televisão, em sinal aberto e por cabo, estações
de rádio e canais da internet, em parceria entre o Santuário de Fátima e a TV
Canção Nova. Só no canal youtube do Santuário de Fátima foi seguida em direto e
em permanência por 49 mil subscritores.
***
Pela sua profundidade teológica, incidência antropológica e índole
desempoeirada, aqui transcrevo o belo texto orante pronunciado em Fátima no dia
da Anunciação do Anjo e que tive também o ensejo de rezar – uma oração repetível
quando nos aprouver:
Coração de Jesus Cristo, médico das almas, Filho amado e rosto da misericórdia
do Pai, a Igreja peregrina sobre a terra, em Portugal e Espanha, nações que
tuas são, olha para o teu lado aberto, sua fonte de salvação, e suplica:
– Nesta singular hora de sofrimento, assiste a tua Igreja, inspira os
governantes das nações, ouve os pobres e os aflitos, exalta os humildes e os
oprimidos, cura os doentes e os pecadores, levanta os abatidos e os
desanimados, liberta os cativos e os prisioneiros e livra-nos da pandemia que
nos atinge.
Coração de Jesus Cristo, médico das almas, elevado no alto da Cruz e tocado
pelos dedos do discípulo no íntimo do cenáculo, a Igreja peregrina sobre a
terra, em Portugal e Espanha, nações que tuas são, contempla-Te como imagem do
abraço do Pai à humanidade, esse abraço que, no Espírito do Amor, queremos dar
uns aos outros segundo o teu mandato no lava-pés, e suplica:
– Nesta singular hora de sofrimento, ampara as crianças, os anciãos e os
mais vulneráveis, conforta os médicos, os enfermeiros, os profissionais de
saúde e os voluntários cuidadores, fortalece as famílias e reforça-nos na
cidadania e na solidariedade, sê a luz dos moribundos, acolhe no teu reino os
defuntos, afasta de nós todo o mal e livra-nos da pandemia que nos atinge.
Coração de Jesus Cristo, médico das almas e Filho da Virgem Santa Maria, pelo Coração de tua Mãe, a quem se
entrega a Igreja peregrina sobre a terra, em Portugal e Espanha, nações que,
desde há séculos, suas são, e em tantos outros países, aceita a consagração da
tua Igreja. Ao consagrar-se ao teu Sagrado Coração, entrega-se a Igreja à
guarda do Coração Imaculado de Maria, configurado pela luz da tua Páscoa e aqui
revelado a três crianças como refúgio e caminho que ao teu coração conduz. Seja
a Virgem Santa Maria, a Senhora do Rosário de Fátima, a Saúde dos Enfermos e o
Refúgio dos Teus discípulos gerados junto à Cruz do teu amor. Seja o Imaculado
Coração de Maria, a quem nos entregamos, connosco a dizer:
– Nesta singular hora de sofrimento, acolhe os que perecem, dá alento aos
que a Ti se consagram e renova o universo e a humanidade. Ámen.
***
Esta iniciativa é uma das tantas que a Igreja Católica tem
indicado e desenvolvido nesta situação de confinamento às nossas residências
evitando os contactos físicos e sociais. Entre essas, conta-se o esforço de transmissão
regular da celebração da Eucaristia pela TV, pela rádio e pela Internet, os subsídios
catequéticos e orantes fornecidos por tantas instituições e grupos em suporte
de papel e digital para acompanhar a vida e a oração dos crentes, a convocação papal
de todos à oração do Pai Nosso às 12 horas do dia 25, a bênção papal Urbi et Orbi no próximo dia 27, pelas 17
horas de Lisboa.
Por outro lado, a iniciativa vem na sequência de outras congéneres.
Por exemplo, a 20 de outubro de 2019, os bispos consagraram a Igreja ao Sagrado
Coração de Jesus, em Fátima, durante a missa de encerramento do Ano
Missionário, no Santuário de Fátima, assinalando também os 175 anos de presença
em Portugal do Apostolado da Oração.
A primeira consagração de Portugal ao Imaculado Coração de Maria
aconteceu a 13 de maio de 1931, oito meses depois do reconhecimento oficial das
aparições pelo então Bispo de Leiria, Dom José Alves Correia da Silva, no final
da 1.ª peregrinação nacional do episcopado português a Fátima. E fez, a 25 de
março, 36 anos que o Papa São João Paulo II consagrou o mundo ao
Imaculado Coração de Maria, diante da imagem da primeira escultura de Nossa
Senhora do Rosário de Fátima, que se venera na Capelinha (que, este ano, completa o
centésimo aniversário) e
que se deslocou ao Vaticano nessa ocasião cumprindo a sua sétima saída da Cova
da Iria. O Pontífice fê-lo em resposta aos apelos da Mensagem de Fátima, um ano
depois de ter iniciado o Ano Santo dedicado à Redenção. O Papa polaco fez ações
orantes parecidas com esta em Fátima a 13 de maio de 1982 e de 1991 e
fizeram-nas Bento XXI a 13 de maio de 2010 e Francisco a 13 de maio de 2017.
Por fim, devo transcrever a Consagração da Diocese do Porto à Bem-aventurada
Virgem Maria feita
pelo Bispos do Porto e seus bispos auxiliares no passado dia 23 de maio na
Sé Catedral, pelo que tem de belo, dramático, afetuoso e orante:
Santíssima
Virgem Maria, Senhora da Assunção, Senhora da Conceição, Senhora de Fátima! Senhora de todos os nomes bonitos, Senhora do nome mais bonito: Mãe
de Deus e nossa Mãe!
Como
sabes, estamos todos a passar mal. Não estamos zangados com o Teu Filho, que não é castigador. Mas, nós, às vezes, não respeitamos este belo jardim que Ele
nos deu (Gn 2,8) e fizemos dele um
matagal; e, em vez de flores, saíram-nos espinhos. E agora é isto… Estamos todos a passar mal e alguns, mesmo muito mal.
Senhora
da Assunção, Senhora da Conceição, Senhora de Fátima! Queremos voltar a reaprender
na Escola do Teu Filho; procuraremos ouvir, na nossa vida, o Teu conselho: “Fazei
tudo o que Ele vos disser” (Jo 2,5). Precisamos de perceber o que Ele nos quer
dizer nas entrelinhas desta calamidade. Já percebemos que devemos cuidar uns
dos outros, que devemos cuidar-nos a nós próprios, que devemos continuar a
trabalhar muito para encontrar[mos] remédios para este mal. Não queremos comprar a Tua ajuda com as
nossas promessas. Mas precisamos de Ti! Sim, precisamos muito de ti!
Pedimos-Te,
pelo carinho de Mãe, que faças o que nós não sabemos fazer. Com o atrevimento de
meninos pequenos, que sabem pedir sem saber o que pedem, pedimos o milagre de
que cesse este mal: na nossa Diocese, na nossa Pátria, no nosso Mundo. Com o
exemplo e a silenciosa generosidade de São José, ajuda-nos a refazer o jardim e
a reorganizar a casa comum.
Protege,
Mãe de Deus e nossa Mãe, a todos quantos, nas variadas frentes, arriscam
a própria vida para dar a vida ao próximo. Pensamos nos profissionais de saúde,
nas forças de segurança e de socorro. Pensamos nos funcionários dos nossos
Centros Paroquiais e de outros organismos similares. Pensamos nos cientistas e
investigadores e em quantos não descansam para encontrarem remédio que minore
este mal.
Recebe
no Teu regaço materno a quantos passaram já para a Casa do Pai.
Obrigado,
Mãe! Um beijo. Nosso e de todos os homens e mulheres que habitam na Diocese do Porto: sabes bem quanto gostam de ti!
Mãe, se esta cidade onde se encontra a sede da Diocese é a “cidade da Virgem”, esta Diocese do Porto foi, é e será sempre a “Diocese da Virgem”!
Enfim,
nesta singular hora de crise e dramatismo, é conveniente que os crentes
levantem a sua voz ao céu enquanto se desvelam pelo bem-estar de todos, em
especial por quem mais sofre a doença e a solidão, lançando no mundo as
sementes da esperança e da justiça e fazendo que elas frutifiquem. E rezar é
algo que todos podem fazer. E quem não tem fé pode refletir sobre a vida e seus
enigmas apostando na serenidade e no otimismo informado.
2020.03.26 –
Louro de Carvalho
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