Está em vigor, desde o passado dia 1 de fevereiro, o Decreto-Lei n.º 170/2019, de 4 de dezembro, que procede à décima primeira alteração ao Código dos
Contratos Públicos, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de
janeiro, e à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 112/2012, de 23 de maio.
Diz, no
preâmbulo, o Governo que a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 112/2012,
de 23 de maio, representou uma alteração no paradigma nacional no atinente ao
enquadramento legal aplicável às parcerias público-privadas, tendo sido levada
a cabo uma reforma ampla e abrangente em matéria de parcerias que incidiu,
designadamente, sobre os procedimentos subjacentes à preparação,
desenvolvimento, execução e acompanhamento de parcerias. Além disso, criou a
Unidade Técnica de Acompanhamento de Projetos, em que se concentram várias
competências, nomeadamente as relativas à preparação e ao acompanhamento das
parcerias e ao apoio técnico a entidades públicas em matérias relacionadas com
parcerias, que eram exercidas por várias entidades.
Surge agora
a necessidade de modificar aquele regime, adaptando-o à realidade social atual.
As alterações introduzidas incidem sobre três aspetos: aprovação da constituição
e modificação de parcerias (incluindo o seu âmbito, a aprovação das suas regras,
pressupostos e peças procedimentais); o
procedimento a seguir, para que sejam constituídas ou modificadas parcerias; e o
regime aplicável aos casos em que o parceiro público determine unilateralmente
uma modificação objetiva do contrato.
Assim,
passam a competir ao Conselho de Ministros – no que diz respeito ao Estado e
institutos públicos –, mediante resolução, todas as decisões relativas à
criação e modificação de parcerias, elevando-se, com esta alteração, o nível a
que são tomadas as decisões respeitantes a parcerias, sem prejudicar a
exigência de um trabalho técnico em momento prévio à tomada de decisão e no
decurso do contrato.
O diploma
clarifica o âmbito de incidência dos artigos 20.º e 21.º do Decreto-Lei
n.º 112/2012, de 23 de maio, passando a determinar expressamente que o art.º
20.º se aplica exclusivamente aos casos em que o parceiro público determine, de
forma unilateral, a modificação objetiva do contrato. E o regime do art.º 21.º aplica-se
nos casos em que, na sequência ou não da aplicação do artigo 20.º, se possa
verificar situação suscetível de causar distribuição de benefícios, reposição
de equilíbrio financeiro ou renegociação do contrato.
Entretanto, está prevista para a sessão plenária
da Assembleia da República do dia 6 de março, a pedido do PSD, a discussão em
termos de apreciação parlamentar do diploma em referência.
O PSD e o PCP querem acabar com as novas regras
das PPP enquanto o Bloco de Esquerda e o CDS-PP defendem alterações ao
decreto-lei, que revê o regime das PPP e que, segundo o executivo, “eleva para o Conselho de Ministros a competência para
as decisões” anteriormente tomadas por despacho ministerial.
Em termos gerais, a oposição considera que as
alterações introduzidas aumentam a “opacidade” do processo e diminuem o
escrutínio das PPP e critica a eliminação dos anteriores pressupostos
previstos na lei para a sua constituição. Porém, não é ainda possível antecipar
se as votações cruzadas dos partidos da oposição permitirão fazer ‘cair’ o
decreto-lei, já que, pelo menos, PCP e CDS, remetem o anúncio de voto
nas iniciativas dos outros partidos para o decurso do debate.
A votação na generalidade incidirá sobre os projetos de resolução de
cessação de vigência – o do PCP já consta do guião de votações e o do PSD irá
dar entrada – e, se algum for aprovado, o decreto-lei em causa deixa de vigorar
no dia da publicação da resolução no Diário
da República, não podendo voltar a ser apresentado no decurso desta sessão
legislativa. Neste caso, manter-se-iam em vigor as anteriores regras aplicáveis
ao regime das PPP, que datam de 2012.
De acordo com o regimento da Assembleia da República, caso não seja
aprovada a cessação da vigência do decreto-lei e tenham sido apresentadas
propostas de alteração, “o decreto-lei, bem como as
respetivas propostas, baixam à comissão parlamentar competente para proceder à
discussão e votação na especialidade, salvo se a Assembleia deliberar a análise
em plenário”.
Na exposição de motivos da apreciação parlamentar, entregue em dezembro, o
PSD aduz que, com as alterações introduzidas pelo Governo, a generalidade das
decisões relativas às parcerias público-privadas passa a ser tomada através de
resolução do Conselho de Ministros, “tendo como consequência uma clara
diminuição dos poderes do Ministro das Finanças”. E frisa:
“Por outro lado, uma matéria tão relevante
como a dos pressupostos do lançamento e adjudicação do contrato de parceria –
16 pressupostos que se encontravam elencados e claramente identificados,
devendo ser observados em todas as parcerias público-privadas – deixa de
constar da legislação e passa a ser definida, para cada parceria, por resolução
do Conselho de Ministros”.
Já o BE – que irá “acompanhar” todas as iniciativas na matéria – pretende
fazer duas alterações ao decreto-lei, como explicou à Lusa a deputada Isabel Pires: a reintrodução do visto prévio do
Tribunal de Contas, “que foi retirado para as PPP autárquicas e de habitação”;
e a reposição da obrigatoriedade da análise custo-benefício, um dos
pressupostos eliminado no novo diploma.
Já o CDS-PP (o primeiro partido a anunciar que pretendia alterar o
documento) quer repor os pressupostos a que
todas as PPP têm de obedecer, destacando o da análise custo-benefício, e voltar
a responsabilizar os ministros das Finanças e do setor pelo lançamento da PPP,
com Cecília Meireles a defender que “é importante não diluir a
responsabilidade” no Conselho de Ministros.
No debate quinzenal do dia 4 de março, o líder do PSD, Rui Rio, questionou
diretamente o Primeiro-Ministro sobre o tema, reiterando que
as modificações introduzidas diminuem a transparência do processo. Em
resposta, António Costa negou que o novo regime das PPP menorize o papel
do Ministro das Finanças, desde logo porque é ele quem tem o poder de submeter
as propostas ao Conselho de Ministros. E, vincando que os critérios para a
elaboração das PPP “são muito rigorosos e não passou a ser ao calhas”,
assegurou:
“Não há maior opacidade, há maior publicidade:
sempre ouvi dizer que quatro olhos veem melhor que dois, mas se calhar os
senhores deputados acham o contrário”.
***
Percebe-se que o PCP pretenda a abolição das PPP,
pelo que pretende a anulação do decreto-lei, mas acaba por favorecer o PSD, que
deseja voltar à ortodoxia do diploma que o Governo de Passos Coelho aprovou e
que responde ao desígnio da intervenção dos privados em matéria que o Estado
tem querido avocar. Já o BE e o CDS parecem, neste aspeto, ser mais
consentâneos com a filosofia da aceitação das melhorias aconselhadas pela
experiência e sem desmerecimento do trabalho do executivo. E não vejo que uma resolução
do Conselho de Ministros redunde em diluição das responsabilidades, antes
concita a responsabilidade solidária do órgão colegial. Já me parece mau que,
em vez de figurarem aspetos relevantes no Decreto-Lei, estes sejam remetidos
para ulterior resolução do Conselho de Ministros tomada “ad casum”.
Veremos qual o desfecho em relação ao Decreto-Lei n.º 170/2019, de 4 de dezembro.
2020.03.05 – Louro de Carvalho
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