domingo, 29 de março de 2020

Conselho Europeu de 26 de março e o Covid-19 – muita parra


No passado dia 26 de março, reuniu, por videoconferência, o Conselho Europeu (ou: Conselho) sob a presidência de Charles Y. J. Gh. Michel (estiveram em reunião os Chefes de Estado e de Governo), para efetuar o seguimento da resposta da UE ao surto de Covid‑19, tendo também analisado o alargamento da UE, o sismo na Croácia e a situação nas fronteiras externas da UE.
Segundo o teor da comunicação conjunta, foram abordados os seguintes itens no respeitante ao Covid-19: limitação da sua propagação; fornecimento do equipamento médico; investigação; combate às consequências socioeconómicas; e apoio aos cidadãos retidos em países terceiros.
Quanto à limitação da propagação do vírus, foi referido que os Estados-Membros tomaram medidas firmes para conter e retardar a propagação, segundo as indicações das suas autoridades nacionais de saúde, baseadas nas orientações do ECDC (Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças) e do painel consultivo da Comissão sobre o Covid-19. Continuarão a ser emitidas orientações, quando necessário, e o Conselho acompanhará a evolução da situação através do IPCR (Mecanismo Integrado da UE de Resposta Política a Situações de Crise).
Está reforçado o controlo das fronteiras pela restrição (temporária, renovável) das viagens não necessárias para a UE. Em controlos temporários nas fronteiras internas, está assegurada a gestão harmoniosa das fronteiras para a circulação de pessoas e mercadorias e o funcionamento do mercado único. Responder-se-á, com o apoio da Comissão, aos problemas que subsistem no concernente aos cidadãos da UE retidos nas fronteiras internas da União e impedidos de regressar aos países de origem e aos trabalhadores transfronteiriços e sazonais que têm de continuar a exercer atividades essenciais. O mesmo se aplica ao fornecimento de bens e serviços essenciais, por via terrestre, marítima ou aérea.
Além disso, o Conselho aposta no combate à desinformação pela comunicação transparente, atempada e baseada em factos e na ação, reforçando a resiliência das nossas sociedades.
Em relação à garantia do fornecimento de equipamento médico, o Conselho exorta a Comissão a acelerar os esforços para garantir o fornecimento urgente e adequado de equipamento médico em toda a UE, a prioridade mais premente, devendo os Estados fornecer à Comissão, em tempo útil, dados fiáveis. A Comissão, em cooperação com o setor, fornecerá uma panorâmica das existências, produção e importações; tomará medidas para melhorar a situação; prosseguirá ativamente as suas iniciativas de contratação conjunta para a aquisição de equipamento de proteção individual, ventiladores e material de despistagem; e aumentará, segundo o necessário, o orçamento inicial para a reserva estratégica rescEU de equipamento médico, nomeadamente o da prestação de cuidados intensivos, vacinas e meios terapêuticos. A decisão de exportação de equipamento de proteção individual conduzirá ao levantamento integral de todos os tipos de proibições ou restrições internas, pois, à luz das recomendações da OMS, é urgente aumentar a capacidade de despistagem, pelo que os Estados informarão a Comissão sobre a situação.
No atinente à promoção da investigação, o Conselho diz que fará tudo o que puder para apoiar a investigação, coordenar os esforços e procurar sinergias dentro da comunidade científica e de investigação europeia, maximizando o pleno potencial da investigação em toda a UE. Informa que foram mobilizados 140 milhões de euros para 17 projetos, incluindo projetos relacionados com o desenvolvimento de vacinas e que trabalhará em conjunto com os principais parceiros, conforme consta das recentes declarações do G7 e do G20, pois há “uma necessidade urgente de partilhar informações científicas e de colaborar, tanto a nível da UE como a nível mundial, no sentido de desenvolver uma vacina no mais curto prazo possível e de a disponibilizar a todos os que dela necessitam”, pelo que haverá reforço e aceleração do apoio às equipas de investigação e às empresas europeias. Assim, o Conselho congratula-se com as iniciativas da Comissão, do Conselho Europeu da Inovação e do Grupo do BEI (Banco Europeu de Investimento) no sentido de prestar apoio financeiro à resposta clínica e de saúde pública ao Covid-19.
Sobre o combate às consequências socioeconómicas, o Conselho, reconhecendo a gravidade das consequências socioeconómicas da crise sanitária, fará tudo o que for necessário para responder a este desafio num espírito de solidariedade; apoia a ação resoluta do BCE (Banco Central Europeu) no sentido de garantir condições de financiamento favoráveis em todos os países da área do euro; e toma boa nota dos progressos realizados pelo Eurogrupo, convidando-o a apresentar propostas no prazo de duas semanas, propostas que terão em conta a natureza inédita do choque provocado pelo Covid-19, devendo a resposta (do Conselho) ser intensificada mediante novas medidas tomadas de forma inclusiva, à luz da evolução da situação, para assegurar uma resposta abrangente. Coisa linda, mas longe da eficácia!  
Diz o Conselho que, tendo os Estados tomado importantes medidas de apoio às suas economias e de atenuação dos problemas sociais e de emprego, recorrerá aos instrumentos da UE para apoiar as suas ações na medida do necessário, pois os Estados precisam de flexibilidade para fazer tudo o que for preciso. Assim, o quadro temporário proposto pela Comissão para as medidas de auxílio estatal destinadas a apoiar a economia durante o atual surto constitui um avanço importante, tal como o é o recurso sem precedentes à cláusula de exceção geral no âmbito do Pacto de Estabilidade. A proposta da Comissão relativa à iniciativa de investimento de resposta à crise disponibilizará 37 mil milhões de euros em investimento no âmbito da política de coesão para fazer face às consequências da crise. Segundo a alteração proposta ao Fundo de Solidariedade da UE, que se espera rápida, este poderá também ser utilizado em situações de emergência no domínio da saúde pública, como o surto de Covid-19.
E o Conselho saúda a disponibilidade da Comissão para aumentar mais a flexibilidade e a alavancagem na utilização dos instrumentos da UE; louva o contributo do Grupo BEI na mobilização de recursos para as garantias bancárias e os investimentos destinados às empresas europeias, em especial as pequenas e médias, incluindo a utilização do orçamento da UE; convida os ministros das Finanças a explorarem, célere, as possibilidades de aumentar a resposta do Grupo BEI ao coronavírus; acolhe as orientações da Comissão na análise do investimento direto estrangeiro; e apela aos Estados a que tomem todas as medidas necessárias para proteger os ativos e a tecnologia estratégicos de investimentos estrangeiros suscetíveis de ameaçar os objetivos das políticas públicas, passo útil para a autonomia estratégica da UE, durante a crise e posteriormente. E, porque o Covid-19 afeta pessoas e sociedades em todo o mundo e terá impacto a longo prazo na economia e comércio mundiais, A UE compromete-se a cooperar a nível internacional e a procurar soluções multilaterais para combater a pandemia e as suas consequências; e fará tudo o que estiver ao seu alcance para apoiar os países e as comunidades no combate à crise, bem como para reforçar a sustentabilidade das cadeias de valor e de abastecimento integradas a nível mundial, para as adaptar conforme necessário e para atenuar o impacto negativo da crise em termos socioeconómicos.
No apoio a cidadãos retidos em países terceiros, o Conselho, com o apoio ativo do alto representante e da Comissão, continuará a intensificar os esforços para garantir que os cidadãos da UE retidos em países terceiros que pretendam regressar a casa o possam fazer. A Comissão apresentará uma adenda às orientações relativas à gestão das fronteiras, a fim de facilitar os regimes de trânsito para os cidadãos da UE repatriados.
O SEAE criou um grupo de trabalho consular que age em coordenação com a Comissão e com os Estados. O CCRE (Centro de Coordenação de Resposta de Emergência) presta assistência aos esforços de repatriamento em curso através do Mecanismo de Proteção Civil da União, que deverá ser provido dos recursos necessários. Embora, de momento, o mais urgente seja o combate à pandemia e suas consequências imediatas, contudo, temos de preparar as medidas necessárias para voltar ao funcionamento normal das nossas sociedades e economias e ao crescimento sustentável, integrando nomeadamente a transição para a economia verde e a transformação digital. Para tal, urge a estratégia de saída coordenada, o plano de recuperação abrangente e o investimento sem precedentes. Por isso, o Conselho convida a presidente da Comissão e o presidente do Conselho, em consulta com as outras instituições, especialmente o BCE, a iniciarem os trabalhos sobre um roteiro acompanhado de um plano de ação, pois chegou o momento de criar um sistema de gestão de crises mais ambicioso e abrangente na UE.
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Também António Costa fez uma declaração pública sobre este Conselho, que se centrou “nas consequências económicas e sociais” da “situação de paralisia generalizada da economia à escala europeia, com uma forte pressão sobre o emprego e o rendimento das famílias”. E o frisou, entre outros aspetos, que o Conselho procurou “agir concertadamente”, tendo tomado “duas decisões importantes” neste campo. 
A primeira foi atribuir ao Eurogrupo o mandato para, em duas semanas, apresentar ao Conselho as condições de mobilização duma linha do instrumento de estabilidade europeia para financiar os Estados no combate à crise, no montante de 240 mil milhões de euros, do qual cada Estado pode levantar até ao limite de 2% do seu PIB. O dinheiro servirá para os investimentos na saúde e para as medidas de apoio ao emprego, ao rendimento e à estabilização das empresas, o que é fundamental para assegurar a maior calma e a maior confiança possíveis nos três meses mais próximos, para que todos possamos chegar a junho nas melhores condições e então olhar o futuro e perspetivar uma estratégia de relançamento da economia.
A segunda, foi mandatar a presidente da Comissão e o presidente do Conselho, em articulação com as outras instituições (Eurogrupo, Banco Central Europeu e Presidente do Parlamento Europeu), para “começar a preparar um programa de recuperação da economia europeia para o [tempo] pós-crise”. Com efeito, embora ninguém saiba o momento de fim da crise, “é necessário que tudo esteja pronto para que, assim que a pandemia estiver controlada e pudermos ir levantando as medidas de confinamento e de paralisação da atividade económica, possamos não perder tempo no relançamento da economia”.
O Primeiro-Ministro disse que, até agora, no campo económico, foi muito importante a ação determinada do BCE “para controlar o risco de qualquer crise de dívidas soberanas”. Na verdade, depois dum movimento inicial de especulação, tem havido uma acalmia dos mercados e uma descida acentuada das taxas de juro, ainda não para os valores de antes, mas com uma boa tendência, que deve ser mantida. E o BCE começou por fazer “o anúncio de mobilização de 750 mil milhões de euros para intervenção no mercado e, no dia 25, retirou qualquer limitação à aquisição de dívida dos países”, o que representou um “contributo decisivo, que foi, até agora, o mais importante da União Europeia” – disse Costa.
O Chefe do Governo referiu “outros contributos importantes”, como “a flexibilização do pacto de estabilidade e das regras da concorrência que proíbem ajudas de Estado”, pelas quais o Governo pôde “dar garantias de Estado que permitem baixar consideravelmente as taxas de juro dos três mil milhões de euros de linhas de crédito que estão a ser abertas esta semana para apoiar os setores económicos mais atingidos”.
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É claro, o Primeiro-Ministro, nesta comunicação, não se perdeu na divergência sobre a emissão de “coronabonds”, que o Conselho não aprovou por não aceitação por parte dos países do Norte, especialmente na sua irritação (vindo a ter o apoio solidário de Marcelo) com o estadista da Holanda que acusou a Espanha de não ter orçamento para combater o Covid-19. Costa preferiu sublinhar os dados positivos desta reunião importante, que só o será se chegar à mutualidade da dívida, aos “coronabonds”. Para já, resta a compra da dívida dos países do Eurogrupo resultante do Covid-19 pelo BCE, mesmo que ultrapasse 1/3 da dívida do respetivo país, a contenção dos juros, a suspensão das regras atinentes ao défice, à divida e à ajuda estatal a empresas.
Para Carlos Costa, governador do nosso banco central ou há “coronabonds” ou a UE se desfaz.
Outras reuniões do Conselho serão menos líricas e mais solidárias e audazes ou a UE afundará.  
2020.03.29 – Louro de Carvalho

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